Ambos os movimentos de fato ocorreram. Porém, é errôneo afirmar que até 2002 o PT recebia mais votos entre a classe média do que entre os pobres. Nunca foi assim. Uma observação da votação do PT por zona eleitoral no município de São Paulo nas eleições presidenciais de 1998, 2002 e 2006, e municipais de 2000 e 2004 ajudam a desmentir esta tese. Na verdade, mesmo nas eleições de 1998, 2000 e 2002, antes do Lula assumir, elevar o salário mínimo e implementar o Bolsa Família, o PT teve votação melhor nas zonas pobres do que nas zonas de classe média em São Paulo.
O gráfico a seguir, que relaciona a votação do Lula no primeiro turno em 1998 com a votação de Lula no primeiro turno em 2006, nas 41 zonas eleitorais de São Paulo, mostra que as zonas que deram mais votos ao Lula em 2006 foram as mesmas que deram mais votos ao Lula em 1998.
A Zona 5, correspondente ao Jardim Paulista, é o pontinho localizado mais embaixo e mais à esquerda no gráfico (somente no gráfico, é óbvio). Esta zona deu 13,4% para Lula em 1998 e 12,8% em 2006. A Zona 251, correspondente a Pinheiros, deu 18,3% para Lula em 1998 e 15,7% em 2006. A Zona 371, correspondente a Grajaú, deu 37% para Lula em 1998 e 59,8% em 2006. A Zona 375, correspondente a São Mateus, deu 46,2% a Lula em 1998 e 56,4% em 2006.
Considerando a votação total de Lula no município de São Paulo, verifica-se que ele teve 27,7% dos votos válidos em 1998 e 35,7% no primeiro turno de 2006. Nas zonas de classe média alta, houve leve declínio. Nas zonas de periferia, houve forte elevação.
Já o gráfico a seguir, relaciona a votação de Lula no segundo turno de 2002 com a votação de Lula no segundo turno de 2006 nas 41 zonas de São Paulo.
Verifica-se que a forte polarização por classe social ocorrida em 2006 foi apenas uma acentuação do que já havia ocorrido em 2002. No segundo turno daquele ano, Lula teve 51,1% dos votos válidos . No segundo turno de 2006, Lula teve 45,6%. Nas zonas de classe média alta, Lula, que já não tinha sido bem votado em 2002, sofreu forte queda. No Jardim Paulista, caiu de 29,3% para 17,2%. Em Indianópolis, caiu de 31,2% para 19%. Em Pinheiros, caiu de 35,4% para 21,6%. Mesmo em zonas de classe média menos elegantes, como em Tatuapé, Lula sofreu forte queda, de 45,6% para 31,7%. Em zonas pobres, Lula cresceu. Em Guaianases, Lula foi de 63,2% para 67,5%. Em Grajaú, Lula foi de 63,1% para 72,2%. Apesar dessas mudanças, os lugares onde Lula teve mais votos em 2006 foram os mesmos onde ele teve mais votos em 2002.
Para muitos, nunca foi mistério que Lula sempre tenha sido mais bem votado pela população mais pobre. Marta, porém, já foi erroneamente associada com o voto de classe média. Algumas colunas de jornal chegaram a dizer que a classe média foi o determinante da vitória de Marta em 2000 e da derrota dela em 2004. Somente a segunda afirmação é correta.
A observação do resultado eleitoral do segundo turno da eleição municipal de 2000 pode causar essa impressão. O gráfico a seguir relaciona a votação de Marta no segundo turno em 2000 com a votação de Marta no segundo turno em 2004.
Mudanças importantes ocorreram. Em 2000, Marta foi eleita com 58,5% dos votos válidos. A variação de sua votação foi pequena. Não foi inferior a 50% e superior a 67% em nenhuma zona. No segundo turno de 2000, Marta recebeu 63,3% dos votos válidos em Pinheiros e 60,6% dos votos válidos em Perdizes. Em zonas eleitorais de classe média e classe média baixa da Zona Leste, Marta teve desempenho pior. Obteve 50,1% na Mooca, 50% na Vila Maria e 51% em Tatuapé. Porém, a maior votação de Marta ocorreu em zonas periféricas, como Grajaú, onde ela obteve 66,1%, e São Mateus, onde ela obteve 66%. Em 2004, Marta teve 45,1% dos votos válidos e foi derrotada. Em Pinheiros e Perdizes, Marta ficou na faixa dos 30%. Nas mencionadas zonas eleitorais da Zona Leste, Marta teve entre 30% e 40%. Nas zonas mais pobres, Marta manteve sua votação elevada, e em algumas delas, teve sua votação ampliada. Tirando esses casos excepcionais, houve alguma continuidade entre a distribuição de votos na Marta no segundo turno de 2000 e no segundo turno de 2004.
A continuidade fica mais acentuada quando são comparados os resultados do primeiro turno de cada eleição.
Verifica-se que as zonas que deram mais votos para a Marta no primeiro turno de 2004 foram as mesmas que deram mais votos para a Marta no primeiro turno de 2000. Mesmo em 2000, as zonas eleitorais que deram mais votos para a Marta no primeiro turno foram as zonas mais pobres. Em Pinheiros, Marta teve apenas 31,7%. Em Perdizes, 33,5%. Em zonas periféricas, Marta teve mais que 40%. O bom resultado de Marta em zonas de classe média alta no segundo turno aconteceu somente por causa da rejeição ao Maluf. Alckmin recebeu muitos votos nessas zonas no primeiro turno, e a grande maioria dos votos de Alckmin migrou para Marta.
Quando Marta se candidatou ao governo do estado em 1998, não passou para o segundo turno. No primeiro, obteve 12,1% onde reside, no Jardim Paulista, e 28,2% em Guaianases. Estes resultados enfraquecem não apenas a tese de que o PT era um partido de classe média, como também a tese de que políticos que defendem a legalização do aborto e a união civil de homossexuais encontram rejeição mais forte entre os pobres.
A evidência de que o PT é há muito tempo um partido mais votado pelos pobres do que pela classe média pode ser encontrada em outros municípios paulistas. Em 1998, Lula teve 57,3% dos votos válidos em Diadema, 34,8% em Sumaré e 39,3% em Hortolândia. No mesmo ano, Lula teve 30% em Valinhos e 21,4% em Vinhedo. No segundo turno de 2002, Lula obteve 72,8% dos votos válidos em Diadema, 69,1% em Sumaré e 72,6% em Hortolândia. Em Valinhos, teve 61,2%, e em Vinhedo, teve 53%.
Uma grande guinada ocorreu no interior das regiões Norte e Nordeste do Brasil. Antes, eram o local de maior rejeição ao PT. Atualmente, são a maior fortaleza do PT nas eleições presidenciais.
Porém, em regiões metropolitanas, o PT recebe apoio maior da população mais pobre mesmo antes do governo Lula.
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