domingo, 28 de setembro de 2014

Eduardo Jorge e as manifestações de 2013


Não é possível falar das manifestações de 2013 como somente aquelas que ocorreram em junho, porque muitas manifestações ocorreram de janeiro a dezembro daquele ano. Nem é possível falar de um movimento homogêneo porque houve diversos grupos políticos se manifestando, diversas ideologias, diversas causas, encontrando-se até mesmo umas causas opostas a outras. Nem é possível falar de movimentos que tiveram início em 2013, porque muitos dos movimentos bastante presentes em 2013 tiveram início bem antes, e 2013 foi apenas o ano do auge.

As mais conhecidas manifestações de 2013 foram as dos dias 17 e 20 de junho na Avenida Paulista / Avenida Rio Branco. Foram as que se seguiram às manifestações do Movimento Passe Livre da semana anterior, e reuniram de tudo, desde o próprio Passe Livre até a extrema-direita que repudiava as ideias deste movimento, e, embora o transporte público estivesse ainda na pauta, os muitos cartazes tratavam de muitos outros temas, como corrupção, educação, saúde, grandes eventos esportivos. Mas ao longo de 2013, também ocorreram manifestações como o “Fora Renan”, “Não vai ter Copa”, “Fora Feliciano”, “Contra a Cura Gay”, “Contra o Estatuto do Nascituro”, “Onde está Amarildo”, “Fora Cabral”, a greve dos professores no Rio, as manifestações em defesa dos atingidos por Belo Monte e a continuação de manifestações que já ocorriam há alguns anos, como as paradas gay, as marchas da maconha e as marchas das vadias.

Os integrantes do Movimento Passe Livre, de esquerda, que foi o estopim das maiores manifestações, muito provavelmente são eleitores da Luciana Genro. Mas entre os participantes de outras manifestações, apesar da já mencionada heterogeneidade, caracterizam um novo movimento de opinião pública no Brasil: jovens, com ensino superior ou nele cursando cursando, insatisfeitos com o lulismo, mesmo tendo alguns apoiado no início, mas não se alinhando a nenhuma das oposições mais conhecidas. A oposição de esquerda, mais representada pelo PSOL, defende um sistema econômico mais socialista. A oposição de direita, mais representada pelo PSDB, defende um sistema econômico mais liberal. Opostas no espectro político, estas oposições compartilham uma característica em comum: têm como foco a discussão sobre sistemas econômicos, que inclui a discussão sobre a interação entre o Estado e os agentes privados. Já este novo movimento de opinião não tem como foco a interação entre o Estado e os agentes privados, mas a qualidade do Estado. Por isso, ataca a corrupção e o fisiologismo, e defende melhor qualidade da educação, saúde e transporte público, sem falar de imposto sobre grandes fortunas, como faz o PSOL, nem de redução da carga tributária, como faz o PSDB. Outro obstáculo deste movimento se alinhar com o PSDB é que não é possível criticar o status quo e defender o PSDB ao mesmo tempo, uma vez que um viajante que se desloca por terra de Curitiba a Belém só transita por estados governados pelos tucanos. Outra característica comum a vários manifestantes de 2013 é serem progressistas em temas como gênero, aborto, homossexualidade, religião, drogas e direitos humanos, e defende a preservação do meio ambiente. Ressalvas aos manifestantes e a este movimento de opinião pública devem ser feitas. Não é porque muitos dos manifestantes são escolarizados que suas ideias são complexas e profundas. Pouco se discutiu sobre como diminuir a corrupção, e melhorar a educação, a saúde e o transporte público, apenas que isso deve ser feito. Alguns questionamentos presentes nas ruas sobre os grandes eventos esportivos foram muito pobres, culminando nas infelizes palavras de ordem "não vai ter copa".

Já vi um colunista escrever que o embrião das manifestações de 2013 é a candidatura da Marina Silva em 2010. Na verdade, vem de antes. Teve início com a candidatura de Cristóvam Buarque em 2006. Foi a primeira a representar uma crítica ao lulismo sem ser “pela esquerda” ou “pela direita”. O senador brasiliense só teve 2%, mas muitos dos que viriam ser os futuros eleitores de Marina Silva quatro anos mais tarde também se viram representados pela Heloísa Helena, que ao contrário de Plínio Sampaio e Luciana Genro, não teve eleitorado restrito à esquerda. No Rio de Janeiro, muitos adeptos deste movimento de opinião que esteve presente nos protestos de 2013 votaram no Marcelo Freixo para deputado estadual em 2010 e para prefeito em 2012 unicamente por identificarem com sua agenda de direitos humanos, sem apoiarem outros candidatos do PSOL.

Em 2014, o programa que mais bem representa este movimento de opinião que esteve presente nas ruas em 2013 é o do Eduardo Jorge, do Partido Verde. http://divulgacand2014.tse.jus.br/divulga-cand-2014/proposta/eleicao/2014/idEleicao/143/UE/BR/candidato/280000000061/idarquivo/83?x=1409866177000280000000061 Contempla a agenda social modernizadora semelhante à do programa de Luciana Genro, como a legalização do aborto, o casamento gay e a legalização da maconha, e trata de fortalecimento dos mecanismos de democracia direta, mas ao contrário do programa do PSOL, não tem uma agenda socialista para a economia. E também não tem uma agenda de direita anti-Estado social. O programa de Eduardo Jorge defende corte de custos através da contensão dos salários dos congressistas, redução do número de congressistas e assessores, redução do número de ministérios e descentralização de atribuições e receita para os municípios, mas não defende redução das atribuições do Estado. E óbvio, há uma agenda a favor do meio ambiente e dos povos indígenas.

O Eduardo Jorge é na verdade o que a Marina Silva poderia ter sido e que não foi. É aquilo que alguns dos eleitores da Marina Silva de 2010 queriam que ela fosse. Se em 2010 ela já não era aquilo que alguns de seus eleitores queriam que ela fosse, em 2014 ficou mais diferente ainda. Defende uma agenda econômica semelhante à do PSDB. Quase não fala mais de meio ambiente. E no ano passado, deu declaração favorável a Feliciano, um dos maiores alvos de muitas manifestações.

Outra semelhança de Eduardo Jorge com as manifestações de 2013 é a forma de usar a Internet. Todos os candidatos têm página no Facebook para divulgar a campanha. Mas os demais geralmente usam linguagem de jornal e televisão na Internet. Já Eduardo Jorge usa a linguagem própria de Internet, na sua bem humorada página YES WE QUERO https://www.facebook.com/yeswequero

Ainda assim, Eduardo Jorge não tem mais de 1% nas pesquisas de intenção de voto. É um nome desconhecido. O maior cargo executivo que teve foi de secretário municipal. A fraqueza do PV, satélite do PSDB e DEM em alguns estados, também prejudicou. Provavelmente ele passará dos 3% no Flamengo, Laranjeiras, Botafogo, Catete e Santa Teresa, mas não muito mais do que isso.

Uma menção que deve ser feita antes de terminar o texto é que Dilma Rousseff também incorporou parte do espírito das manifestações de 2013. Apesar dela ser governo e protestos serem anti-governo por natureza, foram feitas políticas como o Estatuto da Juventude, o Marco Civil da Internet, a alocação dos royalties do Pré-Sal na educação e na saúde, o Plano Nacional de Participação Social e o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil.