quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Feliz 2010!!!

À medida que ficamos mais velhos, podemos dizer a mesma coisa que um toboágua falaria se pudesse falar: "os ânus passam depressa".
Na transição de 1999 para 2000, parecia que 2000 estava muito mais distante de 1990 do que hoje parece que 2010 está distante de 2000.

Não vou usar este tópico para fazer um balanço da década zero-zero. Isto só farei no final de 2010, porque eu sou cronopurista. Da mesma forma que o século XXI só começou em 2001, a década de 2000 só começou também em 2001 e, portanto, 2010 ainda faz parte dela.

Uso este tópico para olhar para frente, e não para trás. Vou fazer uns chutes para 2010. Muitas vezes não sou bom nisso, mas de vez em quando eu acerto, como por exemplo, o grupo da Holanda e muitos outros confrontos na Copa do Mundo (veja post do dia anterior ao sorteio).

> A Argentina vai ganhar a Copa do Mundo. Quando a Copa é fora da Europa, europeu não ganha. A Argentina tem jogadores muito bons e a vantagem de não entrar como favorito, porque assim como em conclave, em Copa, quem entra Papa sai Cardeal. Muitas vezes, classificar no sufoco nas eliminatórias ajuda. A Holanda vai eliminar o Brasil nas quartas-de-final e terminar vice.

> Serra vai ser eleito presidente. Ele manteve e mantém enorme vantagem nas pesquisas, Dilma não decolou e no final de 2009, não é mais possível alegar desconhecimento. No segundo turno, Serra terá 55% dos votos válidos e Dilma, 45%.

> Hamilton vai ser bi-campeão mundial de Fórmula 1.

> O PIB brasileiro vai crescer 5,2%.

> O regime comunista chinês vai continuar firme e forte, sem as "tensões sociais" previstas para o caso de um crescimento inferior a 7%.

> O regime teocrático no Irã sofrerá abalos, mas se manterá de pé.

> Nas midterm elections nos EUA, os republicanos obterão maioria na Câmara e diminuirão a vantagem dos democratas no Senado.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

O que Soninha disse, o que Soninha deve ter pensado

Em letras normais, eu reproduzo o mais recente post do blog da subprefeita da Lapa, Soninha Francine. Em itálico, escrevo o que eu penso que ela pensou na hora em que ela cometeu este texto. Como as frases em itálico são o que ela provavelmente pensou, mantenho a primeira pessoa.


L9 - o Fenômeno
Impressionante o que carisma e currículo podem fazer - além de uma estratégia fenomenal de comunicação, oposição desmobilizada e imprensa com receio de ir contra a maré.

Me limito a dizer que a imprensa tem receio de ir contra a maré, porque se eu disser que a imprensa é petista, já vão achar que eu estou parecida demais com Olavo de Carvalho, e eu quero parecer uma opositora progressista e boazinha.

O presidente do Brasil foi escolhido "Homem do Ano" pelo Le Monde, que elogiou (reproduzo o que ouvi na TV, não li o original) o "crescimento econômico", o "combate à miséria" e "o desenvolvimento que privilegia o meio ambiente", entre outras coisas - mais ou menos na mesma linha da exaltação escrita por Zapatero dias atrás no El País.
Essa avaliação se baseia totalmente em impressões subjetivas. No "clima" que exala do governo brasileiro. Na propaganda oficial.

Eu ía dizer que o Le Monde foi patrocinado pela Petrobrás, pelo Banco do Brasil e pela Caixa Econômica Federal, mas não tive tempo de olhar o original para ver se tem anúncio dessas empresas.

O Brasil vai bem? Muito bem? Sim, em prestígio internacional. Em estabilidade institucional e financeira. Assim como o Flamengo, temos a capacidade de transformar limão em limonada (ou caipirinha) como ninguém. Somos o país que inventou a feijoada, transformando os restos indesejados pelos brancos em um prato delicioso (embora não seja exatamente saudável). Não nos deixamos abalar facilmente por coisas como mega escândalos de corrupção; temos uma capacidade de assimilação impressionante. Outros países sobreviveram a várias guerras; nossa resiliência se manifesta na tolerância infinita a desvios de conduta (depois de alguns minutos de indignação seletiva e polarizada).

É menos pior passar por muitas guerras do que por muitos escândalos de corrupção. O Afeganistão é um país maravilhoso.

Mas o Brasil, meu deus, continua horrível. O que é que estamos comemorando, a empolgação de presidentes de outros países? O aplauso da mídia estrangeira? A consagração de nosso governante? Mas é isso mesmo que é o mais importante em um país?
É, o Brasil está na moda. Mais uma vez. Tivemos nosso grande momento nos anos 50 e 60 - Bossa Nova, Cinema Novo... Juscelino, Brasília, indústria automobilística, Copa do Mundo. Tudo muito bacana, charmoso, mas... Enquanto isso, estávamos construindo um país desigual, injusto, cruel.

Antes de JK, o Brasil era igual, justo e humano.

Hoje reclamamos do passado como se ele tivesse sido uma imposição de deuses mitológicos, um acaso astrológico ou algo assim. "Não temos ferrovias! Destruímos nossos rios, desmatamos o litoral, nossas cidades não foram preparadas para o crescimento. Não tem redes adequadas ou suficientes de transporte sobre trilhos, não tem sistemas de drenagem, não tiveram planejamento. Nossa educação é deficiente, há milhões de analfabetos. O campo expulsa a população pobre para as cidades".

Eu li vários historiadores e sociólogos, representativos do pensamento brasileiro a ponto de podermos colocar o que pensam na primeira pessoa do plural, e todos eles dizem que os problemas do passado foram causados por deuses mitológicos. Caio Prado Jr. achava isso, Celso Furtado achava isso, Bóris Fausto achava isso, Florestan Fernandes achava isso.

Verdade, e não foi só o Regime Militar o responsável por esses descompassos. Fizemos da fabricação de automóveis nosso maior orgulho, o passaporte para o primeiro mundo; das estradas de rodagem a coisa mais bonita do mundo. Destruímos serras, várzeas, florestas, mangues. E continuamos nesse passo, longe do desmame do transporte individual motorizado, talvez o mais forte símbolo de sucesso, expressão máxima do consumo como forma de realização pessoal - por extensão, nacional.

Visitei a Alemanha várias vezes e lá eu descobri que a cobertura original da Floresta Negra continua intacta.

Continuamos nos gabando de nossa grandeza e invocando, quando conveniente, nossa condição de pobreza, fragilidade, o chavão consolidado: somos um país "em desenvolvimento". (Desde que eu estava no colégio, o governo - naquela época, o militar - rejeitava o rótulo de "subdesenvolvido". A nova tag acabou pegando). Seremos a 5a maior economia do mundo muito em breve!

O FMI e o Banco Mundial usam a expressão "em desenvolvimento" e não "subdesenvolvido" porque foram influenciados pelo Regime Militar brasileiro.

O petróleo nos transformará em superpotência! Emprestamos dinheiro ao FMI! Mas ainda falamos com desprezo dos "ricos"; os ricos que poluíram e aqueceram o mundo e agora vem encher o saco querendo preservar as florestas, melhorar o clima e blá-blá-blá. Deixem-nos crescer! Se precisarmos desmatar, poluir e aquecer, nós o faremos. No máximo, prometemos não aumentar tanto assim as agressões ao ambiente e pronto, esse é o nosso sacrifício. Em vez de diminuir as emissões de carbono, vá lá, vamos aumentar menos.
(É essa a grande proposta que o governo brasileiro levou à Cop-15... Que um comentarista na Globo News saudou como "audaciosa". Fantástico).

Nós da oposição dividimos o trabalho. Se o governo quer fazer o Brasil crescer, mesmo tendo que imitar a China para atingir tal objetivo, eu, da turma consciente faço chororô. Agora, se o governo não colocar o crescimento como prioridade, aí a turma economicista do PSDB reclama que o Brasil está crescendo muito menos que a China. E sim, a Globo é do PT.

O Brasil continua muito miserável, desigual, cruel, injusto. O campo continua expulsando as pessoas - não porque o mundo mudou e a mecanização chegou a todas as lavouras, mas porque continua gerando muita riqueza para alguns e miséria para tantos outros. Os velhos e aparentemente eternos coronéis, as chamadas "elites" políticas e econômicas continuam mantendo seus currais eleitorais às custas da pobreza, da dependência, do papel de salvadores da pátria. Eles são os que intercedem junto ao poder central de modo a conseguir um auxílio, um socorro, uma esmola. Dirigidos, limitados, finitos, jamais transformadores e capazes de levar à independência, à autonomia.

Não tive muito tempo para olhar os dados sobre êxodo rural na última década, mas tudo bem, acredito que meus leitores não farão o mesmo.

O povo continua na merda (RT @opresidente). As cidades, incapazes de absorver dignamente os expulsos do campo, incham, se espraiam e deterioram. Aumenta a desigualdade, a violência. Não é a pobreza a causa da violência, é a falta de projeto, de uma perspectiva que não a aspiração do prazer imediato e do consumo. Pesquisas recentes traduziram em números o que mitos já observaram no contato direto e diário: a maioria das meninas se prostitui para conseguir bens como celulares. A maioria dos meninos entra para a indústria do crime para se fazer admirar pela "valentia"; para serem admirados pelas meninas que, imersas nesse mundo em que a "ascensão social" se dá pelo crime, adoram as armas ostentadas por eles.

Há cerca de 25 milhões de meninas entre 10 e 24 anos, ou seja, que potencialmente se prostituiriam. Se a maioria delas se prostitui, então há pelo menos 12,5 milhões de jovens prostitutas em todo Brasil. Se o município de São Paulo concentra aproximadamente 5% da população brasileira, então há em torno de 625 mil prostitutas só em São Paulo. Ei, isto seria um absurdo, a conta deve estar errada. Tudo bem, a maioria dos meus leitores não vai reparar.

O Brasil cresceu pouco - aliás, os números da economia no último trimestre foram comentados, muito discretamente, como sendo "decpecionantes" para o governo. E tudo bem. Parece até que vale mais a propaganda ufanista do que o fato em si - "Ah, não vamos abaixar o astral da população, o mundo inteiro aplaudindo o Brasil, o país do momento, e a gente vai contrariar a maioria agora?".

Em 2009 eu sei que o Brasil vai ter um crescimento zero. Estou com preguiça para pesquisar o quanto o Brasil cresceu de 2004 a 2008. Tudo bem, meus leitores não se preocupam com essas coisas.

O Brasil cresceu pouco e redistribuiu muito mal. Tenho curiosidade em saber: quantas pessoas recebem o Bolsa Família há vários anos? O que seria delas AGORA se perdessem o benefício? Transferência de tenda é medida emergencial necessária, mas não pode ser mecanismo de eterna dependência. Além de reunir vários benefícios em um só, qual é, afinal, a grande diferença dessa Bolsa para a do governo Fernando Henrique, que criticamos tanto? O quanto melhorou a VIDA das pessoas - não apenas o COMSUMO? Ironizávamos as declarações do então presidente quando ele dizia que a população estava comprando mais dentaduras, frango e iogurte. Não era disso que falávamos quando exigíamos reformas, revoluções. Mas agora erguemos um brinde à venda de carros e geladeiras, como se a nação estivesse melhor por conta do carnê das Casas Bahia. Sim, as pessoas erguem suas casas com material de construção mais barato, compram eletrodomésticos de última geração - mas moram no Pantanal na Zona Leste de São Paulo, uma obra conjunta da qual as últimas quatro ou cinco administrações podem se orgulhar... E continuam se chacoalhando várias horas por dia na condução, jogando lixo em qualquer lugar à sua volta porque essa é a paisagem a que se acostumaram, e repetindo com os colegas os lugares-comuns sobre os políticos que não prestam.

Trabalho para um prefeito do DEM, e muitos eleitores deste partido acham que redistribuir renda é redistribuir pobreza, que uma distribuição de renda, mesmo muito desigual não é injusta quando obtida a partir de trocas voluntárias, e que cada um deve ter uma renda compatível com seu esforço. Mas eu sou uma esquerdista do PPS e só estou na subprefeitura porque eu gosto da Lapa.
É uma aberração pobre querer ter geladeira. Eu, para dar bom exemplo de consciência ecológica, não tenho geladeira e não me preocupo em conservar meus alimentos. Eu compro comida orgânica todo dia. E pobre consciente não tem carro. Pobre consciente vai ao trabalho de bicicleta, mesmo se morar a mais de 10 km do serviço.

Temos imagens horríveis para mostrar ao mundo, como sempre. Depois da exaltação internacional à India e à China, chegou a vez do Brasil mostrar suas belezas. Assim como India e China, nossa beleza ainda exclui milhões. Nosso sorriso continua banguela. Mas os miseráveis não aparecem tanto, exceto em casos de flagelos - ou nas manisfestações organizadas em cidades governadas pela oposição... Antes, a culpa pela miséria era do governo central. Agora, é dos tucanos, dos demos, de qualquer um, menos do presidente. O presidente combate a miséria e a fome. Se não dá certo, não é ele quem tem de responder por isso.

Falo mal da China e da Índia, mas se precisar, reclamo que não crescemos como estes países, como eu acabei de fazer em parágrafos anteriores.

A história pessoal do presidente é belíssima. Mas o que já foi motivo de chacota indecente agora virou anteparo indevassável; criticar o presidente Lula é quase blasfêmia. E ele investe - inconscientemente, creio - na imagem do homem humilde de baixa escolaridade de modo a acentuar, artificialmente, essas características. O discurso de Lula deputado criticando o Bolsa Escola era muito mais elaborado do que a fala de hoje em dia, com mais expressões chulas e erros de concordância que ele antes não cometia...

Em 2001 e 2002, quando o Bolsa Escola existia, Lula era deputado e eu gostava dele.

Lula antes queria falar de igual para igual com os poderosos e precisava provar que era capaz. Hoje quer provar que é "do povo", e esculacha sua sintaxe para se fazer entender. Não precisa. Não devia. Sua coloquialidade é uma graça; a vulgaridade, um desperdício. Lula consegue se manter com alta popularidade no sétimo ano de governo entoando um discurso de oposição. "Vamos tirar o povo da merda! Vamos mostras às elites quem é que manda". Mas Lula não é mais o sindicalista, o opositor eloquente, o intruso na festa dos bacanas, o delator dos 300 picaretas. Lula é o anfitrião. Lula é governo. Lula tem a caneta, a faixa presidencial, o poder. Mas os governistas se comportam como mártires da oposição, desqualificando toda crítica como invejosa, ressentida, golpista. Lula pode dizer o que quiser que passa como graça, e os grandes movimentos organizados de outrora - sindicatos, estudantes - quedam-se calados, talvez comentando entre eles que "nessa o presidente pisou na bola", mas jamais convocando manifestações, publicando charges, pichando muros. Resta a um ou outro opositor mainstream fazer um comentário crítico, destilar veneno irônico na televisão ou no jornal e aos pequenos movimentos radicais colar lambelambes de "Fora Sarney, Fora Todo Mundo".

Porque se a CUT, a UNE e o MST realmente defendessem o povo brasileiro, eles organizariam grandes passeatas contra os erros de português cometidos por Lula.

Lula é um grande personagem. Mas o governo Lula é muito ruim, especialmente no balanço a longo prazo. Nos primeiros anos, ocupando o Executivo pela primeira vez, é de se esperar que haja dificuldades. Lidar com o Parlamento venal é sempre um problema, mesmo quando não há uma oposição aguerrida, quase encardida como a que fazia o PT. Mas já se passou tempo demais. E, nesse tempo, os oligarcas se acomodaram. As grandes reformas não saíram. Antigas posições foram abandonadas. O governo se deslumbrou com o aplauso das agências de risco, o deslumbramento de banqueiros, o luxo palaciano, a amizade dos poderosos. Agora não quer queimar o filme com os novos amigos, e se vê defendendo Renans e Sarneys, celebrando Collors e quetais.

Meu amigo Serra era amigão do Arruda, mas, tudo bem. Ele não sabia...

Não é raro acontecer essa canonização de um personagem. Quando um Lech Walesa, Nelson Mandela (ou Obama...) chegam ao poder, é difícil criticá-los. Apontar seus erros pode parecer a condenação de toda a luta, de toda a trajetória, da esperança. E não faltará quem aja deliberadamente dessa maneira, pronto a apontar o primeiro deslize, a primeira tentativa frustrada, o primeiro inevitável problema para dizer "Estão vendo? É tudo uma farsa! São todos farinha do mesmo saco! Que saudade de seus antecessores!". E talvez essa reação intolerante, raivosa e injusta seja exatamente o fermento para que, junto com o belo passado, a popularidade de um político aumente sobremaneira. Lula e o PT foram escorraçados de maneira grotesca em vários momentos. Um psicanalista ganhou capa da Folha de São Paulo ao dizer que o acidente da TAM em Congonhas era obra do "governo assassino", uma aberração absoluta. Um canal de TV (se não me engano, a Record) fez um cliping que colava imagens da Marta Suplicy e sua declaração sobre "relaxar" em meio ao caos aéreo à explosão do avião. Uma denúncia de corrupção contra um vereador petista no interior de Minas Gerais gerava uma onda de comentários "e agora, o presidente vai dizer que não sabia de nada?". A governadora do Pará foi cobrada por não saber que um distrito policial a centenas de quilômetros da capital tinha uma menina de 15 anos presa junto com homens. Lula foi vaiado na abertura do Panamericano, mistura de galhofa e grosseria na qual muitos acharam graça. Lula fez uma pergunta sincera, singela e espontânea ("afinal, o Ronaldo está gordo ou não está?") e de novo acharam graça na resposta deselegante de Ronaldo - que estava gordo.

Preciso mostrar que sou uma opositora "esclarecida" e não uma opositora "preconceituosa", porque meus leitores são "esclarecidos", e não "preconceituosos".

E, como se gabavam alguns, Lula cresceu feito massa de pão (quanto mais apanha...). E hoje é isso, um presidente que é descrito segundo sua própria propaganda, independentemente de fatos que o desmintam. Não acabamos com a fome, longe disso. Não diminuímos significativamente a miséria, embora massas tenham adentrado o maravilhoso mundo do crediário. Temos uma rota levemente ascendente? Temos, até porque muitas coisas mudaram no mundo a ponto de se tornarem mesmo mais baratas e acessíveis - a tecnologia, por exemplo. A internet e os benditos celulares. As passagens de avião. Mas no máximo mantivemos uma tendência, quando precisávamos de um salto. Chacoalhar as estruturas, modificar a lógica, revolucionar. E isso não fizemos. Diminuiu um pouco a participação proporcional de São Paulo no PIB? Grande coisa, devia ter diminuído muito mais. Continuamos desiguais demais.

Até cheguei a pensar em procurar as estatísticas do quanto que a miséria diminuiu de 2002 para 2009, para mostrar o quanto a mudança foi insignificante. Mas fiquei com preguiça. Tudo bem, meus leitores não se preocupam com essas coisas.

Será que é porque ainda estamos verdes, nossa recém-conquistada democracia é imatura? Quem sabe. Continuamos reféns de ídolos carismáticos, simpáticos, salvadores. Continuamos dividindo o mundo em bons e maus. Continuamos simplistas, imediatistas, superficiais. E não é só um problema de baixa escolaridade não - graduados e pós-graduados também produzem juízos de valor preconceituosos, auto-referentes, reproduzindo velhos conceitos cristalizados e jamais revistos. Na biblioteca comunitária do Jardim Fontales ou em uma turma da GV, o nível de conhecimento e informação sobre instituições políticas, por exemplo, é parecido. Ninguém sabe quem faz o que. Ninguém nunca teve a chance de aprender.

Para embasar meu argumento, eu ia citar alguma pesquisa que mostra o quanto uma turma da GV conhece as instituições políticas. Mas não achei o link, por isso, fica por isso mesmo. Ninguém vai me cobrar.

Não tenho esperança de que isso melhore a curto prazo. Os que estão dispostos ao debate são muito mais inclinados a simplesmente avacalhar o outro lado do que pensar que não existem só dois lados, duas cores, bons e maus, certos e errados. E há os que sequer estão interessados no debate - "quero saber do meu interesse". Mas se não acreditar que a médio prazo vamos ter mais gente inclinada ao pensamento mais complexo, o olhar generoso e multifacetado, a compreensão das coisas em todas as suas nuances, não sei o que vou fazer. Continuo trabalhando em política, buscando lugares de poder, lendo, escrevendo, debatendo ou vou logo para o Nepal meditar e catar lixo na rua, como oferenda de trabalho? Não sei. No fim de um ano dos infernos como este último não devo estar no melhor dos estados para decidir.

Se a Dilma ganhar, me mudarei para o Nepal. Lá é um paraíso onde as pessoas vão de bicicleta ao trabalho.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

USP à frente da Universidade de Oxford

O Webometrics é um ranking criado pelo Cybermetrics Lab, um grupo de pesquisa que pertence ao Consejo Superior de Investigaciones Científicas, da Espanha. No ranking são listadas as universidades mais visíveis do mundo na web. A idéia dos criadores do ranking foi acesso eletrônico aberto às publicações científicas. Uma universidade é bem rankeada no Webometrics quando são encontradas e citadas muitas publicações acadêmicas e atividades de pesquisadores em Yahoo, Google e similares. O Webometrics é um ranking diferente dos tradicionais, que focam mais nos resultados de pesquisa e na premiação obtida por acadêmicos.
No ranking Webometrics de 2009, o primeiro colocado é o Massachusetts Institute of Technology. A Universidade de Harvard, que lidera os rankings tradicionais, está em segundo. A melhor universidade fora dos Estados Unidos é a de Cambridge, em vigésimo segundo.
Há ótimas notícias para os brasileiros neste ranking. A USP está trigésimo oitavo lugar, na frente de qualquer universidade alemã, francesa e italiana. Há apenas universidades dos Estados Unidos, Reino Unido, Japão, Taiwan e Canadá na frente. Até a Universidade de Oxford ficou atrás, em quadragésimo segundo.
A Unicamp ficou em 115º lugar, colocando-se como a terceira melhor da América Latina. A Nacional Autônoma do México foi a segunda. Entre as dez mais bem rankeadas da América Latina, oito são brasileiras. A de Buenos Aires ficou em décimo primeiro.
Já o ranking ARWU é o mais conhecido dos tradicionais. Valoriza os prêmios vencidos por professores, pesquisadores e ex-alunos, a quantidade de pesquisadores muito citados, a quantidade de papers publicados na Nature e na Science, e os papers presentes no index de citação.
No ranking ARWU de 2009, Harvard ficou em primeiro, Stanford em segundo, Berkley em terceiro, Cambridge em quarto e MIT em quinto. A USP ficou empatada com muitas em 101º. Entre as 100 melhores, ficaram muitas dos países de língua inglesa, algumas do Japão (Tóquio, Kyoto etc), algumas da Suíça (Instituto de Tecnologia de Zurique, Universidade de Zurique, Universidade da Basiléia), algumas da França (Paris 6, Paris 11), algumas da Alemanha (Munique, Heidelberg, Goettingen e Bonn), algumas da Escandinávia, algumas da Holanda e a de Moscou. Empataram com a USP as melhores universidades italianas e as melhores universidades belgas. As melhores universidades coreanas, espanholas e austríacas ficaram atrás. A Unicamp se colocou entre o 200º e o 300º, atrás da Autônoma do México e da de Buenos Aires, e no meio de muitas universidades chinesas. No Webometrics, a terceira e a quarta melhores universidades do Brasil foram respectivamente a Federal de Santa Catarina e a Federal do Rio Grande do Sul. No ARWU, foram, em ordem, as federais de Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Resumindo: as melhores universidades brasileiras, além de estarem lado a lado nos rankings com muitas universidades do mundo desenvolvido; têm desempenho melhor ainda quando se avalia a visibilidade na web. Deve ser lembrado que publicação de pesquisa na web barateia o acesso a seus resultados, aumenta a audiência potencial e aumenta o potencial de internacionalização das universidades.
O que prejudicou um pouco as universidades brasileiras no ARWU foi a falta de Prêmio Nobel.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Flamengo pentacampeão!! Parabéns!!!

Como o time para o qual eu torço não é dos maiores vencedores do Brasil, fica mais fácil reconhecer e admirar o mérito dos demais times que carregam grandes conquistas.

Alguns campeões brasileiros nestes 38 anos de campeonato não tinham equipes tecnicamente espetaculares, mas ganharam principalmente na raça, o que já os fazem merecer admiração.

O Flamengo teve mais que isso. Nas cinco vezes em que foi campeão brasileiro (1980, 1982, 1983, 1992, 2009), o time tinha muita raça e muitos craques. A geração de 1980-1983 compôs um dos melhores times do Brasil dos últimos 40 anos.

E no time de 2009, entre muitas coisas se destacam o talento de Petkovic, a superação de Adriano, e a arrancada sensacional no segundo turno.

Outro grande jogador nas cinco torcidas é a torcida. Além de ser a maior do Brasil, faz um verdadeiro show a parte nas arquibancadas do Maracanã. Nos jogos dos outros três times disputando título, houve espaços vazios.

O Flamengo é um grande exemplo de que para ser campeão, é preciso três coisas:

1. Ter um time superior
2. Entrar em campo
3. Fazer mais gols e sofrer menos gols que o adversário

Quando só o primeiro pré-requisito é cumprido, não dá para ser campeão. De WO não se ganha. De WO se perde.

Em 1980, 1982, 1983, 1992 e 2009, o Flamengo cumpriu brilhantemente estes três pré-requisitos e levou o caneco!

Coluna do Dimenstein é cultura?

Em, 3 de dezembro de 2009, Gilberto Dimenstein escreveu a seguinte coluna:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/gilbertodimenstein/ult508u661085.shtml
Mulher pelada é cultura?
Comentei aqui por diversas vezes que considero o vale-cultura, capaz de envolver até R$ 7 bilhões, um previsível desperdício --o dinheiro seria mais bem usado se focado nos estudantes das escolas públicas. Desde ontem, meu receio aumentou ainda mais, pela possibilidade de que, com esse benefício, mulher pelada também seja cultura. Ou gibi.
Foi
aprovada uma emenda no Congresso permitindo que o vale-cultura seja usado para comprar jornais, revistas e gibis. Senadores argumentaram que, com isso, revistas como a "Playboy" seriam beneficiadas, mas a emenda foi aprovada assim mesmo.
Nada contra a "Playboy", mas mulher pelada não é cultura --muito menos com dinheiro público.




Não conheço muito nem a vida nem a "obra" de Gilberto Dimenstein, mas desde quando escreveu em coluna há alguns meses que não devemos comemorar o pré-sal "ainda mais porque petróleo polui", eu penso que Gilberto Dimenstein é nada mais do que um pseudônimo de um vestibulando treinando redação!
Sobre o assunto mencionado na mais recente coluna, transcrita aqui no post, a resposta é: mulher pelada é cultura sim! O nu é natural. Mas o nu artístico é uma criação do ser humano e portanto É cultura. E o trabalho do fotógrafo É um trabalho artístico. E muitas revistas de mulher pelada tem outros conteúdos interessantes, além de mulher pelada.
Gibi também é cultura. Não é necessário entrar no longo debate "o que é cultura" para fazer esta afirmação. Mesmo considerando que só a chamada "cultura erudita" pode ser considerada "cultura", há gibis que se enquadram nesta categoria.
Não sou um entusiasta muito grande do vale-cultura. O governo tem muitas funções, mas dar palpite na forma com que as pessoas devem gastar seu dinheiro não é uma delas. Esta seria uma boa linha de crítica, principalmente para um jornal com ideologia liberal.
Mas até um colunista de um jornal liberal adere à crítica mais bocó: parte para o paternalismo.
Como disse, não considerei o vale-cultura uma idéia muito interessante, mas considerei bastante positivo que uma vez existindo, os executores do programa não tiveram a idéia idiota de discriminar o que seria "cultura".
Quanto a isso, não vou gastar mais muitas palavras. Basta ler esse texto do Sakamoto. Ele defende o vale-cultura e este é o único ponto no qual eu discordo dele. Mas em relação à crítica ao preconceito e ao elitismo sobre o "que seria cultura", suas palavras são minhas palavras.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Os grupos vão ser esses aí

Os sorteios das Copas mais recentes têm tido alguns padrões:
1. Brasil cai em grupo aparentemente fácil
2. Argentina cai em grupo difícil
3. Os deuses das bolinhas corrigem o problema de cabeças de chave fracos, como resultado de ser país-sede ou de escolhas polêmicas da Fifa. Muitas vezes os cabeça de chave fracos têm azar de cair em seus grupos algum país difícil.

Baseado nestes padrões e em pressentimentos, estimo que os grupos serão estes:

África do Sul, México, Chile, França

Itália, Austrália, Nigéria, Grécia

Brasil, Honduras, Costa do Marfim, Eslovênia

Alemanha, Coréia do Norte, Argélia, Sérvia

Argentina, Coréia do Sul, Gana, Portugal

Inglaterra, Nova Zelândia, Uruguai, Eslováquia

Holanda, Japão, Camarões, Dinamarca

Espanha, Estados Unidos, Paraguai, Suíça




Se eu acertar pelo menos um grupo inteiro, ficarei feliz!

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O Bugrão voltou! Série A 2010


A foto que se vê logo acima foi feita em 25 de novembro de 2008, quando eu ainda estava na Alemanha (postei esta foto no meu blog de viagem). Foi no dia seguinte ao sofrido jogo entre Guarani e Águia de Marabá, que eu acompanhei a muita distância, pelo cosmo.com.br. Naquele jogo, o Guarani havia conseguido o acesso para a Série B em 2009. Na neve eu grafei "Guarani Série A 2010" em um tom meio irônico. Não imaginei naquele momento que o Guarani pudesse subir para a Primeira logo depois de ter subido para a Segunda.
Mas o que poucos torcedores otimistas esperavam aconteceu!














Já de volta a Campinas, tirei estas fotos do jogo entre Guarani e Juventude, em que os campineiros venceram os gaúchos por 2 a 1 e os rebaixaram para a Série C. Não foi o jogo que decidiu o acesso ao Bugre. O time da terra de Carlos Gomes já havia garantido sua vaga à Série A de 2010 na rodada anterior, mesmo perdendo para o Bahia. Isto porque o Figueirense, adversário direto, havia perdido para o Duque de Caxias.
Mas o jogo contra o Juventude foi o jogo da festa. Os ingressos tiveram seu preço reduzido de 30 para 20 reais (ainda salgado). O público compareceu em massa. Houve 16700 torcedores do Guarani e 50 do Juventude. Os torcedores do Guarani confeccionamos um bandeirão do tamanho do tobogã, como pode ser visto em uma das fotos. "Não é mole não, o bandeirão é maior que o chiqueirão" era o que cantávamos quando os torcedores presentes no tobogã abriam o bandeirão no final do primeiro tempo (chiqueirão = estádio de um outro time de Campinas). Eu vi o jogo na cabeceira sul.
Não foi um jogo fenomenal, mas o Guarani jogou o suficiente para não ter sua festa estragada e para obter o vice-campeonato da Série B.
O lance mais cômico do jogo aconteceu fora de campo. Quando um jogador do Juventude perdeu um gol feito, chutando a bola para sua própria torcida, um torcedor gaúcho, bravo, pegou a bola e tentou chutá-la para fora do estádio. Não conseguiu. A bola bateu na mureta e voltou.
No final, os jogadores atiraram camisas aos torcedores. Um jogador recebeu da torcida um grande 1º feito de plástico, em referência à primeira divisão. As cheerleaders, com uma faixa, fizeram apelo aos torcedores para não invadir o gramado. Este apelo foi atendido. Nei Paraíba, machucado, apareceu nos camarotes perto de onde eu estava. Houve grande aglomeração para tirar fotos do ídolo.
No final, teve fogos, trio elétrico e buzinaços. Os bares ao redor do estádio ficaram abarrotados de pessoas vestindo camisas verdes.
Depois de cinco anos amargando as séries B e C, o Guarani está de volta à Série A.
Parabéns ao Leonel pelo ótimo trabalho de recuperação. Parabéns ao técnico Oswaldo Alwarez . E parabéns a Douglas, Maranhão, Bruno, Alemão, Léo Mineiro, Gláuber, Ricardo Xavier, Walter Minhoca, Harison, Fabinho, Nei Paraíba e outros...
E parabéns também a nós torcedores que conseguimos comparecer mais ao campo do que comparecíamos nos anos 90, quando o clube disputava a série A.

domingo, 8 de novembro de 2009

A dignidade de Mino Carta

Colunistas militantes, identificados com determinadas posições políticas, têm como leitores habituais pessoas com posições políticas parecidas. Alguns desses colunistas sofrem de um mal chamado de “bundamolice”. Quando eles têm uma ou outra opinião diferente da de seus leitores habituais, preferem ficar na moita. Em vez do cachorro abanar o rabo, o cachorro acaba aceitando ser abanado pelo rabo. Na verdade, nem o cachorro tem que abanar o rabo, nem o rabo tem que amarrar o cachorro. Os leitores não têm que ter todas as opiniões iguais a do colunista, nem o colunista tem que ter todas as opiniões iguais a de seus leitores. Há muitas pessoas no mundo, há muitos assuntos no mundo para se ter uma opinião. Portanto, é impossível que muitas pessoas tenham opiniões iguais em todos os assuntos. Divergências podem e devem ser expostas e debatidas.
Um exemplo de colunista que jamais sofreu do mal da bundamolice é Mino Carta. Ele teve coragem de ser um dos maiores defensores da extradição de Cesare Battisti, mesmo não sendo esta a posição de muitos de seus leitores. E mais, ele fez isso sem ficar cheio de dedos. Não disse “os ideais de Battisti e de seu bando eram lindos, mas eles exageraram um pouquinho na violência”. Foi algo mais claro: “a Itália era um Estado democrático e de Direito, uns terroristas decidiram afrontar esta situação, e por tais delitos eles devem pagar”. Em nenhum momento Mino Carta tenta abrandar sua posição para fugir da critica de que “ele estaria parecido com a direita”. Se ele realmente estivesse, toda a centro-esquerda italiana também estaria.
Isto tem a ver com outra virtude de Mino Carta: a combinação de exuberância no diagnostico dos problemas com a sensatez na solução da cura. O jornalista italiano parece um extremista de tão grande a sua paixão em denunciar as injustiças sociais. Mas para pregar a solução, opta pela boa e velha social-democracia. Não considera ditaduras de partido único, economia de comando e atentados contra regimes democráticos o caminho para se chegar a uma sociedade mais justa. Porque existem caminhos melhores. A Itália é um bom exemplo. No imediato pós-guerra, o país conseguiu conciliar crescimento econômico com justiça social. O PCI, tendo percebido e contribuído para isso, havia decidido participar do jogo democrático e por isso, atraiu a ira dos terroristas de extrema-esquerda, que sabotaram a possibilidade do partido chegar ao poder pelas urnas.
No caso de Battisti, Mino Carta vem prestando um excelente serviço de combate a desinformação. Mostrou as falhas da teoria de que o julgamento teria sido injusto, esclareceu que as medidas de emergência adotadas pela Itália naquele período nada tinham a ver com autoritarismo. Tais medidas, previstas pela Constituição de 1948, seriam apenas um mecanismo de legitima defesa de um Estado de Direito contra terroristas. E por muitas vezes, Mino Carta teve que esclarecer que quem fez o pedido de extradição foi o Prodi, e que tal pedido tem apoio do PD. Defensores do Battisti no Brasil insistem em tentar dar a entender que quem quer a extradição é o Berlusconi.
Alguns textos de extrema-esquerda que defendem Battisti perdem um pouco a credibilidade por tentar ao mesmo tempo dizer que Battisti não teria cometido os crimes dos quais ele é acusado, e que se ele realmente os tivesse cometido, não seria tão ruim assim.
Outra pessoa que merece destaque pelo seu posicionamento no caso é o jurista Walter Maierovitch, também articulista da revista Carta Capital.
Em alguns fóruns de discussão on-line, pessoas de extrema-esquerda debateram quais seriam os “interesses” de Mino Carta ao defender com tanta vontade a extradição de Battisti. Ora, isso sim é “parecer a direita”. São jornalistas e políticos de direita que acham que Mino Carta tem “interesses” por trás de tudo que escreve. Esses jornalistas e políticos de direita que dizem que “o Mino Carta é insignificante, que ninguém lê sua revista”. Se isso fosse verdade, o redator-chefe de Carta Capital seria o insignificante mais comentado do mundo.
E quais seriam os “interesses” de Mino Carta no caso Battisti? Poderiam ser aversão ao terrorismo, defesa da pratica política por meios pacíficos, defesa do Estado democrático e de Direito, solidariedade com familiares e amigos das vitimas do terrorismo ...

Impugnação da candidatura de Silvio Santos completa 20 anos

Em 9 de novembro de 1989, o muro de Berlim foi aberto e milhares de alemães orientais puderam conhecer o Oeste. Foi um símbolo do fim da Guerra Fria. Mas no dia seguinte, a manchete de capa de um certo jornal paulista foi sobre Senor Abravanel e sua impossibilidade de sair candidato.
Porem, não sejamos injustos. A queda do muro de Berlim foi apenas o principal dos muitos eventos que causaram a queda do comunismo no Leste Europeu, que foi um grande efeito domino.
Em janeiro de 1989, Erich Honecker, o então presidente da Republica Democrática Alemã, disse que o muro de Berlim duraria por no mínimo mais cem anos. Então, tudo mudou de repente naquele histórico ano. Em julho de 1989, a Hungria abriu suas fronteiras com a Áustria, e por isso, muitos alemães orientais puderam ir para o Oeste em seus Trabants. Outro pais que se abriu foi a Tchecoslováquia. Muitos alemães orientais entraram na embaixada da Republica Federal da Alemanha em Praga e obtiveram asilo.
Enquanto isso, em Leipzig, um movimento contra o regime comunista começou a se formar na Nicholaikirche, a principal igreja evangélica da cidade. Este movimento deu origem a gigantes manifestações populares em outubro. O mundo temeu que o regime adotaria a solução chinesa. Felizmente isto não ocorreu.
Em Berlim, no dia 7 de outubro, houve a grande parada de celebração dos 40 anos da Republica Democrática Alemã. O evento foi seguido de grandes protestos contra o regime, que terminaram em conflitos com a policia.
Os protestos de Berlim e Leipzig precipitaram a queda de Erich Honecker, o presidente linha dura. O Partido Socialista Unificado optou por Egon Krenz, um linha um pouco menos dura.
Este novo governo decidiu abrir gradualmente as fronteiras. Mas por um mal entendido, no dia 9 de novembro, milhares de alemães de ambos os lados se aglomeraram perto do muro. Não havia outra opção senão abrir. Mas ainda não foi naquela noite que o regime caiu.
Em janeiro de 1990, quando o povo ocupou a sede da Stasi, o partido não teve como se segurar. Já havia ate mesmo demanda interna por mudanças.
Em marco de 1990, aconteceram as primeiras eleições livres e multipartidárias na RDA. Foi formado um governo do CDU e FDP, favorável a reunificação.
Em junho de 1990, o muro inteiro veio abaixo. Houve também a reforma monetária.
George Bush apoiou a reunificação. Gorbatchev e Mitterand tiveram um pouco de relutância inicial, mas acabaram aceitando. Margaret Thatcher foi a ultima a aprovar.
Em 3 de outubro de 1990, a RDA deixou de existir.
O desnível econômico entre o Leste e o Oeste ainda não foi completamente superado. Recentemente, a renda per capita dos cinco estados do Leste era de 17 mil euros. A de Berlim era 22 mil. A de Rheinland-Pfalz, o estado mais pobre do Oeste, era de 24 mil. E a de Hamburgo, o estado mais rico, 44 mil. O desemprego no Leste é muito alto e por isso, muitos jovens migram para o Oeste. As cidades do Leste não têm pirâmide etária, e sim, cogumelo etário.
Mas o Leste recebeu muito apoio do Oeste, por meio do imposto da reunificação, e da União Européia. Os centros históricos de algumas cidades do Leste foram completamente restaurados. A frota de bondes foi quase que completamente renovadas, e por isso, os veículos são mais novos do que os do Oeste. As estações de trem do Leste também são mais novas que as do Oeste.
A divisão aparentemente persiste na opinião das pessoas. Na eleição parlamentar da Alemanha em 2009, o CDU ganhou a maioria dos distritos no Oeste de Berlim e o Die Linke ganhou quase todos os distritos do Leste da capital. Mas isto não quer dizer muita coisa. Nem quem vota no Die Linke acha que o tempo do comunismo era melhor. Estes normalmente consideram que algumas coisas pioraram e outras melhoraram. Mas quase ninguém deseja viver sob ditadura.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Novo governo de centro-direita: depois de 11 anos, os FDP estão de volta ao poder na Alemanha

Depois de um mês de negociações apos a vitoria nas eleições parlamentares de 27 de setembro, CDU, CSU e FDP finalmente firmaram o contrato (um PDF de 124 paginas) para dar inicio ao novo governo. 11 anos depois da saída de Helmut Kohl, a Alemanha volta a ter um governo completamente de centro-direita.
Foi definida também a nova equipe. Como de costume, o partido minoritário da coalizão, o FDP, terá o Ministério das Relações Exteriores, que ficara com Guido Westerwelle, o líder do partido. Ele substitui Walter Steinmeier, o candidato derrotado do SPD. O FDP também fica com os ministérios da Economia, da Justiça, da Saúde e do Desenvolvimento. O CDU, da chanceler Angela Merkel, fica com os ministérios do Interior, das Finanças, do Trabalho, da Família, do Meio Ambiente e da Educação. O CSU (irmão do CDU na Baviera) fica com os ministérios da Agricultura, da Defesa e dos Transportes.
As principais rupturas em relação ao governo de grande coalizão entre CDU/CSU e SPD, entre 2005 e 2009, estão nos impostos, na saúde, e na política energética. A nova coalizão pretende reduzir o imposto de renda das faixas mais elevadas de renda, mas acabar com o déficit do setor publico no longo prazo. Na saúde, a intenção é liberalizar o sistema (enquanto Obama tenta desliberalizar), desvinculando a contribuição ao seguro da renda do usuário. Pretende-se também introduzir mais concorrência entre as asseguradoras. A política de energia havia sido um dos temas eleitorais mais acalorados. A vencedora coalizão pretende prolongar o funcionamento das usinas nucleares.
Outro tema que foi controverso na campanha foi a introdução do salário mínimo por lei (a Alemanha é o único pais desenvolvido que não tem). Os três partidos de esquerda derrotados eram favoráveis a introduzir um salário mínimo. É pouco provável que a coalizão liberal-conservadora tome essa medida.
Política externa na Alemanha costuma ser consenso, e por isso, não se espera muitas mudanças. Nem os conservadores são euro céticos. A única mudança esperada é uma postura ainda mais avessa em relação à entrada da Turquia na União Européia. Quanto às tropas no Afeganistão, não foi estabelecido prazo de retirada. O SPD queria estabelecer um tempo limite, o Die Linke queria retirada imediata.

Quanto a nova composição do Bundestag, um esclarecimento deve ser feito a quem esta pouco familiarizado com a historia da Alemanha. O suposto “fortalecimento da direita” e a suposta “crise da esquerda” não existem. Em 2009, o CDU/CSU obteve 239 cadeiras (38,4%), o SPD obteve 146 (23,5%), o FDP obteve 93 (15%), o Die Linke obteve 76 (12,2%) e os Verdes obtiveram 68 (10,9%).



Como é possível ver nos gráficos acima, foi o pior resultado do SPD na historia da Republica Federal da Alemanha, fundada em 1949. Mas observando o histórico da composição do Bundestag, o que houve foi simplesmente uma transferência de votos de esquerda do SPD para os Verdes e para o Die Linke. O CDU/CSU também vem perdendo espaço. Há migração de votos de centro-direita para o FDP. Pelo gráfico que mostra a soma da participação da centro-direita (CDU/CSU e FDP) e da esquerda e centro-esquerda (SPD, Verdes, Linke) é possível ver nitidamente que quem ganhou depois da reunificação foi a soma de votos dados em partidos de esquerda e centro-esquerda. Em 1998, quando Schroeder tornou-se chanceler pela coalizão SPD-Verdes, foi a primeira vez na historia da RFA que partidos de esquerda e centro-esquerda obtiveram maioria no Parlamento. Esta maioria se manteve ate a eleição de 2009, quando a direita retomou a maioria, mais modesta, porem, do que a dos tempos da Guerra Fria.
O redução da participação da direita no pos-Guerra Fria foi compensada parcialmente por um deslocamento dos partidos para a direita. Os Verdes já chegaram a ter anarquistas nos anos 80. Agora é um partido que fez as pazes com o establishment. O FDP era um pequeno partido entre 1961 e 1983, quando mesmo assim, escolhia quem governava a Alemanha, porque quase sempre era necessário ter apoio do FDP para governar. Apesar do aliado natural do FDP ser o CDU/CSU, o FDP fez coalizão com o SPD entre 1969 e 1982, durantes os governos de Willy Brandt e Helmut Schimidt, porque ambos os partidos concordavam com uma maior pacificação com os países comunistas. Hoje, a ala mais esquerdista dentro do FDP, mais focada com as liberdades civis em geral esta enfraquecida, e o FDP, atualmente, esta mais focado em uma liberdade: a de mercado. Atualmente, coligar-se com o SPD esta fora de questão para o FDP.
O SPD passou a aceitar mais as reformas neoliberais durante o governo de Schroeder. E vem perdendo drasticamente votos e militantes. Mas uma coisa não é necessariamente conseqüência da outra. E agradável para comentaristas de esquerda aceitar a idéia de que o SPD vem perdendo popularidade porque vem ficando indistinguível dos partidos conservadores. Mas os fatos não comprovam esta hipótese. Quando em 2007 e 2008 o partido quis retornar as suas origens de esquerda, pesquisas de opinião mostravam popularidade ainda mais baixa.
Uma ultima coisa a comentar é a surpresa deste resultado: um ano depois da maior crise do liberalismo dos últimos 30 anos, quem mais teve melhorias em seus resultados eleitorais foi o liberal FDP. O Die Linke também cresceu bastante, mas isso não tem nada a ver com a crise. Antes de setembro de 2008, pesquisas de opinião mostravam apoio ao Die Linke maior do que o que o partido teve na eleição de setembro de 2009.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Novo álbum do Pearl Jam? Já?

Eu, que ando meio desinformado do mundo, fiquei sabendo só nessa semana, quase por incidente, que o Pearl Jam vai lançar um novo álbum ainda neste mês. Eu esperava que o intervalo fosse mais longo, visto que entre o lançamento do Riot Act e do Abacate se passaram quatro anos. Do Abacate para o atual Backspacer, apenas três. O Backspacer tem que ser melhor que o Riot Act e o Abacate para que eu o compre. Tem que ser bem melhor.
Fiquei sabendo só agora que a banda fez alguns shows na Europa em agosto, incluindo um em Berlim, quando eu estava lá. Mesmo se eu soubesse, eu não teria ido ao show. Primeiro, porque eu já fui no do Pacaembu, em 2005 (o melhor show que eu já vi) e segundo show da mesma banda perde a graça. Segundo, porque eu já despendi alguns euros para ver algum tipo de PJ em Berlim. Não despenderia mais.
Porém, eu teria dado uma passadinha perto do local para ver se era possível ouvir alguma coisa.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Palpite pro jogo entre Brasil e Argentina

Dois a um pra Argentina.
Neste clássico, quem entra em campo com três pontos costuma sair com zero. E vice versa. E isto vale para os dois lados.

Pequenas notas automobilísticas

> A contagem de pontos do Barrichello, à primeira vista, parece a contagem de gols do Romário. O piloto brasileiro teve muitos resultados adversos, apenas uma vitória, e está somente 16 pontos atrás de Jenson Button, com chances matemáticas de título.

> Devemos louvar o esforço do Barrichello em se manter na Fórmula 1 durante 16 anos e ainda conquistar algumas vitórias. Seu maior problema são as cordas vocais. Isto decorre de falta e não de excesso de personalidade. Ele era simpático antes do Senna ter ido embora. Anos depois, passou a achar que tinha talento para ser um novo ídolo. Bastava ele ter resistido à pressão galvânica e assumido que não seria um novo ídolo e ponto final. Apenas um bom piloto e um bom mecânico. Mas não, prefere inventar desculpas para justificar o fato de não conseguir acompanhar companheiros de equipe. E o pior de tudo é ficar remoendo a troca de posicoes na Áustria em 2002. A decisão da Ferrari foi absurda (diferente daquela de mandar o Massa dar a vitória ao Raikonnen, quando se tratava de disputa de título). Mas foi devolvida em Indianápolis no mesmo ano. Por que ele de repende voltou a esbravejar ódio contra a ex-equipe alguns anos depois?

> Se for confirmado que Nelson Piquet Jr. bateu no muro em Cingapura de propósito, isto será um banho de água fria nas cordas vocais dele e nas do pai.

> A TV alemã RTL, que transmite Fórmula 1, está desesperada para o Vettel emplacar. Quando o Schumacher corria, a audiência era de 7 milhões de telespectadores. Hoje é de 4 milhões.

Bom texto sobre assunto que eu tinha abordado em post anterior

http://www.cartamaior.com.br/templates/colunaMostrar.cfm?coluna_id=4416

O perigo da utopia

Se as utopias de esquerda levaram - em muitos casos - ao totalitarismo, a utopia liberal e sua permanente negação do papel do poder e da preparação para a guerra, na história do capitalismo e das relações internacionais, leva, com freqüência, os intelectuais e dirigentes destes países mais fracos, à uma posição de servilismo internacional.

"...a geopolítica do equilibro de poderes e a prática do imperialismo explícito deixaram de fazer sentido devido a uma série de novos fatos históricos [...], esta abordagem das relações internacionais não tem mais espaço no mundo em que vivemos, do pós-colonialismo, da globalização, do sistema político global, e da democracia [...] com a globalização, todos os mercados estão abertos e é inimaginável que um país recuse vender a outro, por exemplo, petróleo a preço de mercado..[...] Resulta ainda daqueles fatos que a guerra entre grandes países tambem não faz mais sentido [...] No século XX, as guerras entre as grandes potências não faziam sentido porque todas as fronteiras já estavam definidas?"

LUIZ CARLOS BRESSER PEREIRA, "O mundo menos sombrio", Jornal de Resenhas, nº 1, 2009, USP, p:7.

Na segunda metade do Século XX, em particular depois de 1968, tornou-se lugar comum a crítica dos "novos filósofos" europeus, que associavam a utopia socialista ao totalitarismo. Mas não se ouviu o mesmo tipo de reflexão, depois da década de 80, quando a utopia liberal se tornou hegemônica e suas idéias tomaram conta do mundo acadêmico e político. Logo depois da Guerra Fria, Francis Fukuyama popularizou a utopia do "fim da história" e da vitória da "democracia, do mercado e da paz". E apesar dos acontecimentos que seguiram, suas idéias seguem influenciando intelectuais e governantes, sobretudo na periferia do sistema mundial.

Basta ver a confusão causada pelo anúncio recente da decisão norte-americana de ampliar sua presença militar na América do Sul. Com a instalação ou ampliação de sete bases militares no território colombiano, que deverão servir de "ponto de apoio para transporte de cargas e soldados no continente e fora dele".( FSP,5/8/09) O governo norte-americano justificou sua decisão com objetivos "de caráter humanitário e de combate ao narcotráfico". A mesma explicação que foi dada pelo governo americano, por ocasião da reativação da sua IV Frota Naval, na zona da América do Sul, no ano de 2008 : "uma decisão administrativa, tomada com objetivos pacíficos, humanitários e ecológicos" (FSP, 9/0708).

Uma das funções dos diplomatas é participar deste jogo retórico que às vezes soa até um pouco divertido. E cabe aos jornalistas o acompanhamento destes debates sobre distâncias, raio de ação dos aviões, ameaça das drogas, etc. Todavia os intelectuais têm a obrigação de transcender este mundo da retórica e dos números imediatos, e também, o mundo das fantasias utópicas, o que as vezes não acontece, e não se trata - evidentemente - de um problema de ignorância. Pense-se, por exemplo, na utopia liberal do "fim das guerras" que já não fariam mais sentido entre os grandes países, e contraponha-se este tese com a história passada e a história do próprio século XX e XXI.

Segundo a pesquisa e os dados do historiador e sociólogo norte-americano, Charles Tilly: "de 1480 a 1800, a cada dois ou três anos iniciou-se em algum lugar um novo conflito internacional expressivo; de 1800 a 1944, a cada um ou dois anos; a partir da Segunda Guerra Mundial, mais ou menos, a cada quatorze meses. A era nuclear não diminuiu a tendência dos séculos antigos a guerras mais freqüentes e mais mortíferas [ alias] , desde 1900, o mundo assistiu a 237 novas guerras, civis e internacionais.. [enquanto.] o sangrento século XIX contou 205 guerras" (Charles Tilly, Coerção, capital e Estados europeus , Edusp, 1996, p. 123 e 131.) Mesmo na década de 1990, durante os oito anos da administração Clinton, que foi transformado na figura emblemática da vitória da democracia, do mercado e da paz, os EUA mantiveram um ativismo militar muito grande. E ao contrário da impressão generalizada, "os Estados Unidos se envolveram em 48 intervenções militares, muito mais do que em toda a Guerra Fria, período em que ocorreram 16 intervenções militares". (Bacevich, 2002: p:143). E mais recentemente, os "fracassos" militares dos EUA, no Iraque e no Afeganistão - ao contrário do que dizem - aumentaram a presença militar dos EUA na Ásia Central e o cerco da Rússia e da China, envolvendo, portanto, preparação para a guerra entre três grandes potências.

Em tudo isto, fica clara a dificuldade intelectual dos liberais conviverem de forma inteligente, com o fato de que as guerras são uma dimensão essencial e co-constitutiva do sistema mundial em que vivemos, e que portanto não é sensato pensar que desaparecerão. Ao contrário do que pensam os liberais, a associação entre a "geopolítica do equilíbrio de poderes" e as guerras, não se restringe ao século XIX, ( já havia sido identificada na Grécia), e o sonho do "governo mundial" das grandes potências, já existe pelo menos desde o Congresso de Viena, em 1815, sem que isto tenha impedido o aumento do numero dos estados e das guerras nacionais.

Neste tipo de sistema mundial, por outro lado, é muito difícil acreditar na possibilidade do "fim do imperialismo", e ainda menos, neste início do século XXI, em que as grandes potências - velhas e novas - se lançam sobre a África, e sobre a América Latina, disputando palmo a palmo o controle monopólico dos seus mercados e das fontes de energia e matérias primas estratégicas. E soa quase ingênua a crença liberal nos "mercados abertos", num mundo em que todas as grandes potências impedem o acesso às tecnologias de ponta, não aceitam a venda de suas empresas estratégicas, e protegem de forma cada vez mais sofisticada seus produtores industriais e seus mercados agrícolas.

Neste ponto, chama atenção a facilidade com que os economistas liberais confundem os mercados de petróleo, armas e moedas, por exemplo, com os mercados de chuchu, queijos e vinhos. Em tudo isto, o importante é que a utopia liberal também pode ter conseqüências nefastas, sobretudo para os países que não estão situados nos primeiros escalões da hierarquia de poder do sistema mundial. Se as utopias de esquerda levaram - em muitos casos - ao totalitarismo, a utopia liberal e sua permanente negação do papel do poder e da preparação para a guerra, na história do capitalismo e das relações internacionais, leva, com freqüência, os intelectuais e dirigentes destes países mais fracos, à uma posição de servilismo internacional.


José Luís Fiori, cientista político, é professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

20 anos sem Raul

Raul foi Raul. Se ele nao tivesse sido o que ele foi, nao teria em todo show gente gritando toca Raul.

A música popular tem muitos Fla-Flus, do tipo Beatles ou Stones, Emilene ou Marlinha. Mas Raul fez parte nao de um Fla-Flu, mas sim de um Flamengo-Fluminense-Vasco sobre o nome do rock brasileiro que foi embora cedo: Raul, Cazuza ou Renato Russo? Entre os três, sou mais Raul.

Raul fez "o dia em que a terra parou", música mais da paz do que "imagine", de John Lennon.

Raul foi embora deixando saudades, mesmo para aqueles que nao se lembram dele vivo.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Estão prontos para a guerra?

No ano passado, os Estados Unidos reativaram a IV Frota Naval, na zona da América do Sul, alegando objetivos "pacíficos, humanitários e ecológicos".
Para este ano, o plano é instalar bases militares na Colômbia.

Seria paranóia pensar que os interesses de longo prazo são o controle das florestas equatoriais e das reservas de petróleo da América do Sul? Hmmm...
> Al Gore já disse que a Amazônia é de toda a humanidade. John Major, Mitterand e Gorbatchev fizeram declarações parecidas. Os jornais The New York Times e o The Independent já escreveram editorais contestando implicitamente a soberania dos países que tem a Amazônia em seu território sobre a mesma.
> A mídia dos EUA e da Europa relata freqüentemente a ameaça representada pelo armamento da Venezuela. Por que tanto interesse deles no assunto, se certamente o país nunca teria condições de atingir os EUA e a Europa?
> A alta do preço do petróleo provoca redução do crescimento econômico dos EUA e de muitas outras potências da OCDE. Até quando eles vão tolerar isto?
> O crescimento econômico mundial certamente provoca pressão de demanda por recursos naturais. Por que os países de alta renda per capita aceitariam na boa que grande parte destes recursos permaneçam na periferia, com a possibilidade de governos pouco confiáveis fazerem o preço deles subir?
> Vocês se lembram da invasão ao Iraque em 2003?

Quem difunde a versão de que isto tudo é paranóia é um pouco suspeito. Nesta semana, a revista The Economist fez uma matéria criticando a política externa do Brasil, e de quebra, afirmou que as bases na Colômbia servem apenas para combater traficantes e terroristas, e que a história do interesse na Amazônia e na Venezuela é pura paranóia. Esta mesma revista, neste ano, falou mal do plano do Mangabeira Unger para a Amazônia, dizendo que a necessidade de proteger a Amazônia é pura "paranóia dos militares". Ora, se realmente fosse paranóia, o único dano que o plano de Mangabeira Unger causaria seria o desperdício de dinheiro público. Ora, desperdício de dinheiro público tem em todo lugar. Por que uma revista inglesa estaria tão preocupada com o desperdício de dinheiro público em um certo país da América do Sul? E mais: tal revista costuma defender a relativizacão de soberanias nacionais em nome de causas humanitárias. Algumas de fato são, como em Ruanda, por exemplo. Outras nem tanto. Vocês se lembram do Iraque?

Critiquemos o Hugo Chávez porque ele ameaça estaçoes de rádio e televisão opositoras, porque existe opositores presos, porque ele cria divisoes administrativas regionais para se sobrepor aos governos locais oposicionistas legitimamente eleitos e porque ele faz trapalhadas na economia. Agora, quanto ao rearmamento, ele está certíssimo. A Venezuela está sentada em muitos barris de petróleo e ainda tem um trecho de Floresta Amazônica em seu território. E sua relação gasto militar / PIB é ainda menor que a da Colômbia.
Alerta também deve ser feita a esquerdistas brasileiros. Precisamos reequipar nossas Forças Armadas para garantir nossa soberania. Precisamos dar ouvidos a militares que relatam as ameaças em relação à Amazônia. Chega de intrigas entre esquerda e Forças Armadas. Já se foram 24 anos. As Forças Armadas devem proteger o povo brasileiro independentemente do fato dele eleger um governo de esquerda, centro, ou direita.

A questão abordada neste tópico não tem aver com esquerda X direita, e sim com nação X colônia.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Meu pitaco no debate sobre a ANPEC

Aproveito que hoje é o Dia do Economista para palpitar no debate sobre o exame da ANPEC.
No ano passado, estudantes da UFRJ fizeram um abaixo-assinado para criticar: 1. o conteúdo do exame, 2. a alta taxa de inscrição, 3. a existência reportada de cola.
Sobre os pontos 2 e 3, eu concordo.
Sobre o ponto 1, não.
Os autores do abaixo-assinado afirmam que o exame não deveria ter uma orientação teórica única e hegemônica. Neste tópico são criticados a ausência de espaço para as abordagens heterodoxas da economia e o risco de padronização dos cursos de graduação.

Em primeiro lugar, a orientação teórica única e hegemônica só existe nas provas de Microeconomia e de Macroeconomia. Para fazer a prova de Economia Brasileira, o estudante precisa conhecer um pouco de teorias heterodoxas. E se uma faculdade desejar que seus alunos de pós tenham mais deste conhecimento, é só dar mais peso para a prova de Economia Brasileira. E se a faculdade achar que a maioria dos conhecimentos presentes na prova não são adequados para o perfil desejado do estudante de pós, basta introduzir outros critérios de avaliação. Isto faz, por exemplo, o Mestrado em Desenvolvimento da Unicamp, que só utiliza a prova de Economia Brasileira, a avaliação do projeto e a entrevista, estes dois, fora da ANPEC.
Sobre o conteúdo das provas de Microeconomia e de Macroeconomia, não há problema algum que seja baseado em livros-texto como Varian, Pyndick&Rubinfeld, Blanchard, Dornbusch&Fisher. O lado positivo de focar unicamente do básico da teoria ortodoxa é justamente evitar a padronização dos cursos de graduação. A Micro e Macro destes livros são muito básicas e devem ser lecionadas a estudantes de graduação de qualquer escola, independentemente de sua abordagem teórica.
A economia ortodoxa é praticamente só uma e precisa ser aprendida por ortodoxos e heterodoxos. As economias heterodoxas são várias, e uma chega a competir com a outra. Colocar conteúdo de correntes de pensamento heterodoxas induziria todos os cursos de graduação a acrescentá-las em seus currículos. Como não é possível ensinar todas as correntes heterodoxas na graduação, que são muitas, algumas teriam que ser selecionadas. Isto criaria uma padronização heterodoxa. Quando apenas a Micro e a Macro de livros-texto entram na prova, os cursos de graduação tem mais autonomia para além de lecionar este conteúdo, decidir ensinar a teoria ortodoxa com mais profundidade ou escolher quais teorias heterodoxas a ensinar, sem prejudicar o aluno que pretende fazer o exame.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Basta mudar um pouco as palavras

Editorial de “O Globo” do dia 02 de abril de 1964:

“Ressurge a Democracia”

Vive a Nação dias gloriosos. Porque souberam unir-se todos os patriotas, independentemente de vinculações políticas, simpatias ou opinião sobre problemas isolados, para salvar o que é essencial: a democracia, a lei e a ordem. Graças à decisão e ao heroísmo das Forças Armadas, que obedientes a seus chefes demonstraram a falta de visão dos que tentavam destruir a hierarquia e a disciplina, o Brasil [Honduras] livrou-se do Governo irresponsável, que insistia em arrastá-lo para rumos contrários à sua vocação e tradições.

Como dizíamos, no editorial de anteontem, a legalidade não poderia ser a garantia da subversão, a escora dos agitadores, o anteparo da desordem. Em nome da legalidade, não seria legítimo admitir o assassínio das instituições, como se vinha fazendo, diante da Nação horrorizada.

Agora, o Congresso dará o remédio constitucional à situação existente, para que o País continue sua marcha em direção a seu grande destino, sem que os direitos individuais sejam afetados, sem que as liberdades públicas desapareçam, sem que o poder do Estado volte a ser usado em favor da desordem, da indisciplina e de tudo aquilo que nos estava a levar à anarquia e ao comunismo [e ao chavismo].

Poderemos, desde hoje, encarar o futuro confiantemente, certos, enfim, de que todos os nossos problemas terão soluções, pois os negócios públicos não mais serão geridos com má-fé, demagogia e insensatez.

Salvos da comunização [chavinização] que celeremente se preparava, os brasileiros [hondurenhos] devem agradecer aos bravos militares, que os protegeram de seus inimigos. Devemos felicitar-nos porque as Forças Armadas, fiéis ao dispositivo constitucional que as obriga a defender a Pátria e a garantir os poderes constitucionais, a lei e a ordem, não confundiram a sua relevante missão com a servil obediência ao Chefe de apenas um daqueles poderes, o Executivo.

As Forças Armadas, diz o Art. 176 da Carta Magna, “são instituições permanentes, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade do Presidente da República E DENTRO DOS LIMITES DA LEI.”

No momento em que o Sr. João Goulart [Manuel Zelaya] ignorou a hierarquia e desprezou a disciplina de um dos ramos das Forças Armadas, a Marinha de Guerra, saiu dos limites da lei, perdendo, conseqüentemente, o direito a ser considerado como um símbolo da legalidade, assim como as condições indispensáveis à Chefia da Nação e ao Comando das corporações militares. Sua presença e suas palavras na reunião realizada no Automóvel Clube [tentativa de convocar um referendo para uma nova constituinte], vincularam-no, definitivamente, aos adversários da democracia e da lei.

Atendendo aos anseios nacionais, de paz, tranqüilidade e progresso, impossibilitados, nos últimos tempos, pela ação subversiva orientada pelo Palácio do Planalto, as Forças Armadas chamaram a si a tarefa de restaurar a Nação na integridade de seus direitos, livrando-os do amargo fim que lhe estava reservado pelos vermelhos [chavistas] que haviam envolvido o Executivo Federal.

Este não foi um movimento partidário. Dele participaram todos os setores conscientes da vida política brasileira [hondurenha], pois a ninguém escapava o significado das manobras presidenciais. Aliaram-se os mais ilustres líderes políticos, os mais respeitados Governadores, com o mesmo intuito redentor que animou as Forças Armadas. Era a sorte da democracia no Brasil [Honduras] que estava em jogo.

A esses líderes civis devemos, igualmente, externar a gratidão de nosso povo. Mas, por isto que nacional, na mais ampla acepção da palavra, o movimento vitorioso não pertence a ninguém. É da Pátria, do Povo e do Regime. Não foi contra qualquer reivindicação popular, contra qualquer idéia que, enquadrada dentro dos princípios constitucionais, objetive o bem do povo e o progresso do País.

Se os banidos, para intrigarem os brasileiros [hondurenhos] com seus líderes e com os chefes militares, afirmarem o contrário, estarão mentindo, estarão, como sempre, procurando engodar as massas trabalhadoras, que não lhes devem dar ouvidos. Confiamos em que o Congresso votará, rapidamente, as medidas reclamadas para que se inicie no Brasil [Honduras] uma época de justiça e harmonia social. Mais uma vez, o povo brasileiro [hondurenho] foi socorrido pela Providência Divina, que lhe permitiu superar a grave crise, sem maiores sofrimentos e luto. Sejamos dignos de tão grande favor.”

quinta-feira, 2 de julho de 2009

FIFA e Associação Dinamarquesa de Futebol perdem o Simancol

Fifa repreende comemoração religiosa do Brasil na África
Queixa é de que a seleção brasileira estaria usando o futebol como palco para a religião; entidade pede moderação aos jogadores

RIO DE JANEIRO - A comemoração do Brasil pelo título da Copa das Confederações, na África do Sul, e o comportamento dos jogadores após a vitória sobre os Estados Unidos causaram polêmica na Europa. A queixa é de que a seleção estaria usando o futebol como palco para a religião.

A Fifa confirmou à Agência Estado que mandou um alerta à CBF pedindo moderação na atitude dos jogadores mais religiosos, mas indicou que por enquanto não puniria os atletas, já que a manifestação ocorreu após o apito final.

Ao final do jogo contra os EUA, os jogadores da seleção brasileira fizeram uma roda no centro do campo e rezaram. A Associação Dinamarquesa de Futebol é uma das que não estão satisfeitas com a Fifa e quer posição mais firme. Pede punições para evitar que isso volte a ocorrer.

Com centenas de jogadores africanos, vários países europeus temem que a falta de uma punição por parte da Fifa abra caminho para extremismos religiosos e que o comportamento dos brasileiros seja repetido por muçulmanos que estão em vários clubes da Europa. Tanto a Fifa quanto os europeus concordam que não querem que o futebol se transforme em um palco para disputas religiosas, um tema sensível em várias partes do mundo. Mas, por enquanto, a Fifa não ousa punir o Brasil.

"A religião não tem lugar no futebol", afirmou Jim Stjerne Hansen, diretor da Associação Dinamarquesa. Para ele, a oração promovida pelos brasileiros em campo foi "exagerada". "Misturar religião e esporte daquela maneira foi quase criar um evento religioso em si. Da mesma forma que não podemos deixar a política entrar no futebol, a religião também precisa ficar fora", disse o dirigente ao jornal Politiken, da Dinamarca. À Agência Estado, a entidade confirmou que espera que a Fifa tome "providências" e que busca apoio de outras associações.

As regras da Fifa de fato impedem mensagens políticas ou religiosas em campo. A entidade prevê punições em casos de descumprimento. Por enquanto, a Fifa não tomou nenhuma decisão e insiste que a manifestação religiosa apenas ocorreu após a partida. Essa não é a primeira vez que o tema causa polêmica. Ao fim da Copa do Mundo de 2002, a comemoração do pentacampeonato brasileiro foi repleta de mensagens religiosas.

A Fifa mostrou seu desagrado na época. Mas disse que não teria como impedir a equipe que acabara de se sagrar campeã do mundo de comemorar à sua maneira. A entidade diz que está "monitorando" a situação. E confirma que "alertou a CBF sobre os procedimentos relevantes sobre o assunto". A Fifa alega que, no caso da final da Copa das Confederações, o ato dos brasileiros de se reunir para rezar ocorreu só após o apito final. E as leis apenas falam da situação em jogo.



Dica aos dinamarqueses: ganhem uma Copa e façam sua celebração atéia no campo

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Para não acreditar em Papai Noel



É óbvio que mesmo antes da eleição presidencial, era de notório conhecimento de que havia muitas violações dos direitos civis no Irã. Basta lembrar que este país é um dos líderes mundiais em pena de morte.
Porém, mesmo com todas estas violações, eu achava que o Irã fosse uma semi-democracia, um regime razoavelmente razoável em comparação com as ditaduras árabes sunitas das redondezas. O povo não tinha voz em assuntos como religião e política externa, a cargo do chefe máximo do clero xiita, que controla o Estado. Mas o povo parecia ter ao menos voz nos demais assuntos, ao eleger quem controla o governo. Dentro dos limites impostos pelos aiatolás, chegou haver alternância de poder entre os muito duros e os nem tanto duros. Quem pensava isso até o dia 13 de junho, teve a mesma decepção de uma criança que descobre que Papai Noel não existe. O Irã se comportou como uma republiqueta de bananas a partir de então: eleição opaca, tiros e porretes em manifestantes, prisões, censura etc.

Agora, não é porque caiu um mito que se deve criar outro: o de que a fraude eleitoral foi um fato consumado e que se a eleição tivesse sido honesta, Ahmadinejad teria perdido. A lisura desta eleição certamente deve ser questionada: representantes dos candidatos não tiveram acesso à contagem, não houve divulgação de pesquisas de boca-de-urna logo depois do pleito, conforme acontece em países livres. Isto indica que algumas mutretas podem ter ocorrido sem que ninguém tivesse percebido. Porém, alguns dos argumentos utilizados para defender a teoria de que houve uma fraude monstro capaz de mudar o resultado em 10 milhões de votos são bem fracos. Não precisa ser especialista em Irã para refutá-los, basta ter um pouco de raciocínio crítico:

1. Os votos foram contados rápido demais. No Irã as eleiçoes parlamentares não são simultâneas à presidencial. Portanto, há apenas um papel por eleitor para contar. Não tem motivo para demorar. Na Europa, o voto também é por papel, há países tão populosos quanto o Irã, e a apuração é tão rápida quanto.
2. Em algumas cidades, houve mais votos do que eleitores registrados. No Irã, não é obrigatório um eleitor votar em sua própria zona. Não é impossível que o número de viajantes em uma ou outra cidade seja maior que o de crianças e adolescentes. Esta falta de rigor nas regras tira a credibilidade da eleição do Irã. Mas não prova que os votos a mais nas tais cidades eram necessariamente de fantasmas a favor de Ahmadinejad.
3. Moussavi perdeu em sua província natal. Ora, se isso fosse sinal de fraude, várias eleiçoes no mundo inteiro foram fraudadas.
4. Ahmadinejad venceu em Teerã, onde a população seria mais liberal. Ahmadinejad foi prefeito de Teerã e suas políticas assistenciais pode ter conquistado a população mais pobre. Em Teerã, a vantagem de Ahmadinejad foi menor.
5. Apesar da semelhança da porcentagem de votos em Ahmadinejad em 2005 e 2009, os resultados por província foram diferentes. Durante o governo de Ahmadinejad, o Irã ganhou muito dinheiro com o petróleo caro, e parte deste dinheiro foi para programas sociais. Tais programas podem ter construído novas bases de apoio. O mesmo houve com Lula. Em 2002 e 2006, sua votação foi igual, mas a distribuição regional dos votos foi bem diferente. Em 2002, sua principal base foram as regioes metropolitanas. Os programas sociais fizeram Lula ter muitos votos no interior pobre em 2006.
6. A alta participação tende a favorecer candidatos reformistas. Na reta final da campanha, houve forte mobilização pró-Moussavi. Isto pode ter aumentado também a mobilização realizada por seguidores de Ahmadinejad.
7. Os dois outros candidatos tiveram votação inexpressiva. Quem vê problema nisso até parece que não conhece história de eleiçoes. Quando há polarização entre dois candidatos, os demais são esquecidos. Isto é extremamente normal. Em 2006 no Brasil, ao conversar com pessoas na rua, era possível ver que muita gente tinha simpatia pela Heloísa Helena e pelo Cristóvam Buarque. Mas na hora do vamos ver, ambos tiveram resultados inexpressivos.

Deve ser lembrado também que muitas pesquisas, inclusive uma feita em parceria da BBC com a ABC, apontou antes do pleito que a participação seria alta e que Ahmadinejad venceria na proporção de 2 pra 1.

De qualquer forma, é legítimo os opositores de Ahmadinejad contestarem a legitimidade do pleito, tendo em vista sua falta de transparência.
Eu não tenho nada a ver com comentaristas de blogs de esquerda no Brasil que defendem veladamente Ahmadinejad por achar que ele faz frente ao imperialismo. Pela sua própria biografia, Moussavi está muito longe de ser cordeirinho do ocidente e mesmo se fosse, caberia ao povo iraniano decidir seu líder. Eu estava torcendo para o Moussavi, mas independente de quem fosse o melhor, não dá para negar o óbvio: se houve a fraude houve, se não houve não houve.
Agora, considerar a fraude um fato consumado pode se tornar uma barriga que nem aquela da "pista escorregadia", só que desta vez, em escala internacional.
Como mencionei anteriormente, CNN e BBC se portam de maneira extremamente profissional, mostra a crueldade do regime contra seus opositores como um fato, o que certamente é, mas sempre falam da fraude como uma hipótese. O mesmo não se pode dizer da mídia alemã, que mesmo hoje sendo livre e independente do governo, continua uma fabriqueta de consensos. A rede de televisão ZDF chegou a divulgar como sério o boato de que Ahmadinejad teria ficado em terceiro. A Spiegel fez uma capa entitulada "a rebelião contra os radicais", com uma foto de uma mulher manifestante usando o pano na cabeça e ao fundo, as fotos de Ali Khamenei, Ahmadinejad e ???????? Osama Bin Laden.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Jürgen Habermas, 80 anos

Com oito dias de atraso, deixo uma notinha aqui para celebrar os 80 anos do filósofo alemão Jürgen Habermas.
Muitos artigos que tratam do tema orçamento participativo citam suas idéias a respeito dos problemas da democracia representativa. Li um pouco de Habermas em março, mas não o abordarei na minha tese. Falta-me tempo e espaço para filosofar.
No ano passado, ele esteve em Erfurt. Era uma das poucas oportunidades para vê-lo ao vivo e vivo. Mas, só fiquei sabendo na porta de entrada do recinto onde seria realizada a palestra que era necessário ter se registrado antes para entrar.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Chatices de escrever tese

Em um post anterior, falei sobre uma antiga redação escolar. Agora o desafio pra mim é bem maior: terminar minha tese.
De vez em quando, aparecem umas complicaçoes não de conteúdo, mas de forma.
1. Como delimitar bem o que são idéias de terceiros e o que são idéias minhas? Algumas vezes, eu consigo organizar o parágrafo de um jeito que o texto flui bem, mas que fica obscura a autoria das idéias. Para resolver este problema, obrigatório, pois plágio é proibido, o texto fica meio quebrado.
2. Quando eu vou falar de A, B e C, é melhor começar o parágrafo falando que vai ter A, B e C e depois falar detalhadamente de cada um, ou simplesmente falar detalhadamente de cada um?
3. Repetição de palavras: a tia lá na escola antigamente falava que não era para utilizar mais de uma vez um vocábulo, e para evitar a inclusão adicional, era correto empregar um sinônimo ou simplesmente omitir o termo. De vez enquando, ou de vez em quase sempre, eu ignoro. Antes a feiura da repetição do que o desentendimento.
4. Repetição de idéias: às vezes eu faço isso para que todos os capítulos tenham início, meio e fim. Para finalizar um capítulo, sem cortes abruptos, eu posso falar coisas que já falei em algum capítulo anterior.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

CNN dá show de profissionalismo

A CNN fez uma excelente cobertura da eleição presidencial iraniana. Foi uma cobertura extremamente informativa e não uma torcida organizada contra Ahmadinejad. A torcida contra o atual presidente fica por conta do telespectador, tendo em vista sua retórica repugnante, principalmente em relação ao Holocausto. Já a rede de televisão, esta fez simplesmente o seu trabalho, e muito bem, de mostrar e explicar o que estava se passando naquele país misterioso tão pouco conhecido por nós.
A CNN tinha uma correspondente no local, apurando os fatos. No dia anterior ao pleito, foi mostrado como o país estava agitado e dividido. Aparecem grandes manifestaçoes e comícios de amobos os principais candidatos. Foi mostrado também como estava quente a blogosfera no Irã.
A cobertura não se deu somente na televisão. No site, apareceu uma pequena matéria que continha trechos de entrevistas com eleitores. Quem ia votar em Ahmadinejad ou Mousavi era tratado igualmente. Havia entrevistas com homens e mulheres que votariam em Ahmadinejad.
Na sexta-feira de noite, pouco depois do presidente da comissão eleitoral ter anunciado a parcial, apareceu uma entrevista, feita nos EUA, com um especialista em Irã. Ele estranhou o fato de uma parcial ter sido divulgada, o que não é muito comum, e a falta de transparência devido à ausência de uma pesquisa boca-de-urna. Mas as possibilidades de fraude só foram explicitamente discutidas quando elas ficaram claras. Na entrevista, ainda foi questionada uma assertiva muito comum de que o presidente do Irã não manda nada e que quem dá as cartas é o líder supremo. O especialista disse que isto foi mais verdade nos anos 80 e 90, mas que vem mudando na década mais recente.
No sábado de noite, houve uma mesa redonda com um professor de Harvard e um ex-membro do Departamento de Estado dos EUA. Ambos falaram sobre um racha interno que vinha ocorrendo há algum tempo e que esta eleição apenas expôs claramente. Alguns clérigos xiitas e reformistas estariam diminuindo sua tradicional divergência contra uma preocupação comum: a crescente militarização do país. Estes grupos estariam no lado de Mousavi. Contra eles, havia os militares e o supremo líder aiatolá Ali Khamenei, que pendiam mais para Ahmadinejad.
Em sua, a cobertura da CNN teve notícias fresquinhas e uma bela aula de Irã para leigos. Nada de Ahmadinejad é mau e precisa ser derrotado, porque isto, nós sabemos.

sábado, 13 de junho de 2009

Redação do pirulito, na íntegra

Agradeço à minha irmã por ter me enviado o texto por e-mail

Já está entediante. O Fernando ainda não veio, está mais de meia hora atrasado. Olho para o meu relógio, que marca cinco e meia. Chupo pirulito, este é sabor uva. Vejo o sol perto das colinas. Entediante é não só minha situação, como também esta cidade. Não há mais nada além da pracinha, em um banco da qual estou sentado, da igreja, das casas, de uma padaria, de um mercadinho e de um posto de gasolina. Como será que alguém agüenta morar aqui? Olho para meu relógio, que marca quinze para as seis. Estou chupando outro pirulito, este é de tutti-frutti, mais gostoso que o primeiro. Vejo metade do sol, a outra se pôs.
De barulho, percebo somente os sinos da igreja, os chutes das crianças jogando bola e o vento. Sinto saudade das buzinadas e do cheiro do escapamento dos veículos. Olho para o meu relógio, que marca seis horas, e chupo o terceiro pirulito, este é sabor morango, o mais gostoso dos três. Não vejo mais o sol, apenas uma marca roxa, amarela e azul no céu. Percebo de longe um rosto semelhante ao do Fernando. Levanto-me.
Entardecer em uma cidade pequena. Bonito. Monótono.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Dez anos de redação do pirulito

Estou chupando o segundo pirulito, este, é sabor tutti-fruti, mais gostoso que o primeiro.

Não me lembro exatamente o dia, mas foi em junho de 1999 que tirei meu primeiro dez em uma redação escolar. Dez anos de dez.
Anos terminados em 9 são cheios de aniversários de data redonda: 80 anos do crash em Nova York, 70 anos do início da Segunda Guerra Mundial, 60 anos de República Federal da Alemanha e República Popular da China, 50 anos da Revolução Cubana, 40 anos da chegada do homem à Lua, 30 anos da Revolução Iraniana, 20 anos do massacre na Tiananmen e da queda do muro de Berlim. 1999 é pouco lembrado. Mas foi um ano legalzinho: teve o Mister M, o Padre Marcelo Rossi, os Teletubbies, o início do regime de metas de inflação, o Matrix e o Clube da Luta. E é claro, a redação do pirulito.
Mesmo depois de dez anos, eu não conseguiria escrever um texto artístico melhor que aquele. Parei de evoluir nesta habilidade. Não pretendo ser artista. Minha vida vai ser escrever tese. E depois, papers. E em tempo livre, blog.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

O migué de Ahmadinejad

Quando surgiu a primeira notícia do cancelamento da visita do presidente do Irã ao Brasil, eu cheguei a pensar que a decisão foi brasileira. O Itamaraty poderia ter achado que pegaria mal para o Brasil receber o presidente do Irã pouco depois de ele, em primeira nota à Conferência de Racismo, ter insinuado a possibilidade do Holocausto não ter existido. Acreditei que o Brasil pediu pro Irã falar que a decisão do cancelamento foi iraniana, porque esta versão pegaria menos pior para ambas as partes. Depois de saber que o Itamaraty teria ficado supostamente irritado, penso que pode ter sido diferente. Talvez o Brasil disse que poderia haver reprimenda pública ao comportamento de Ahmadinejad na Conferência de Racismo e ele não ter aceitado esta condição. Ou vai ver, Ahmadinejad é ainda mais louco do que todos esperavam, e olha que já era sabido que ele é louco.
De qualquer forma, foi uma correção a um erro passado. Deve haver sim um intercâmbio diplomático e econômico entre o Brasil e o Irã. Mas encontro presidencial às vésperas da eleição não deveria acontecer, pois o encontro poderia ser usado eleitoralmente por Ahmadinejad (ele perdeu a chance), e no caso, haveria uma interferência involuntária do Brasil no processo eleitoral.
Que o encontro aconteça depois. E de preferência, com outro presidente do Irã.

...

Sobre o fato de haver violaçoes aos direitos humanos no Irã não é motivo para não haver intercâmbio com o Brasil. Países que violam direitos humanos mais fazem isso quanto mais isolados eles ficam.
O regime de Franco começou a se abrir quando o resto do mundo parou de isolar a Espanha.
A China, com todos os seus problemas atuais, é bem menos pior do que era antes de 1973, quando Nixon se encontrou com Mao.
Uma melhor relação entre as duas Alemanhas precedeu a reunificação.
E assim vai.

sábado, 2 de maio de 2009

Quando um auto-denominado "liberal" nada mais é do que um conservador que não saiu do armário

Em terras brasileiras, há "liberais" que não são liberais nem no Planeta Terra nem em Saturno. Falo de quem apresenta estes sinaiss:

1. Prefere
sempre candidatos conservadores a candidatos social-democratas
2. Nos EUA, torce
sempre para os republicanos contra os democratas
3. Fala das virtudes do individualismo, mas acha inadmissível que pobre tenha como critério para votar as melhorias em seu próprio padrão de vida (
só rico pode)
4. Odeia as falas do Bono Vox sobre política
5. Acha que todo mundo que critica níveis elevados de concentração de renda é socialista
6. Defende o direito de livre escolha do consumidor, com uma exceção, os transgênicos. É contra a rotulação que permitiria o consumidor escolher entre comprar um transgênico ou não.
7. Diz que o simples fato de haver falhas de mercado, como bens públicos, monopólios, externalidades e informação assimétrica, não justifica intervenção do Estado porque Estado é ineficiente e o setor privado é criativo para superar tais falhas. Mas para uma falha de mercado em especial, a propriedade intelectual, vira um defensor árduo da intervenção do Estado
8. Arruma alguma desculpa ser contra legalização das drogas
9. Arruma alguma desculpa para ser a favor da proibição de manifestaçoes a favor da legalização das drogas (ou isso já seria coisa de auto-denominado "conservador" que não passa de fascista que não saiu do armário)
10. Idolatra Roberto Campos e não discorda dele em nada
11. Fala que o Astrólogo erra algumas vezes como articulista, mas diz que "como filósofo ele é muito bom"
12. Fala mal do Astrólogo, mas já chegou a publicar colunas em seu jornal eletrônico
13. Odeia revistas patrocinadas por empresas públicas, exceto, é claro, aquelas patrocinadas pela Nossa Caixa
14. Acha a revista The Economist meio social-democrata
15. Ataca o programa Bolsa Família mesmo quando todos os seus colegas economistas o defendem
16. Fica questionando o que o beneficiado faz com o dinheiro do Bolsa Família, como se isso tivesse alguma relevância
17. Fala mal da França por proteger sua indústria cinematográfica contra a dos EUA, porque estaria supostamente protegendo incompetentes contra competentes, e também fala mal da França por deixar entrar muitos imigrantes árabes e africanos que supostamente destruiriam a cultura civilizada (Em outras palavras: acha que deve haver livre competição de culturas entre a francesa e a americana, devendo prevalecer a mais competente, mas não pode haver livre competição de culturas da civilizada francesa com as bárbaras árabe e a africana. Seria o medo dessas culturas bárbaras se mostrarem mais "competentes"?)
18. Diz ser contra a censura, mas defende que o governo censure livros didáticos "comunistas" mesmo quando são professores que os escolhem, e não o Ministério da Educação
19. Diz ser contra a violência policial, mas diz achar normal as "pessoas comuns" serem a favor, como uma reação natural aos altos índices de criminalidade
20. É contra a possibilidade de presidentes sul-americanos disputarem o terceiro mandato, exceto, é claro, para o Uribe
21. É contra "projetos de engenharia social", mas defendeu a operação realizada para "levar a democracia ao Iraque"
22. É contra "projetos de engenharia social", mas acha o máximo o que os Chicago Boys fizeram no Chile
23. Quando escreve algum texto sobre o Pinochet, coloca no primeiro parágrafo o quanto ele era um ditador malvado, e nos parágrafos seguintes, coloca um monte de elogios, e inclui até alguas justificativas veladas para o que ele fez
24. Diz que os dois defeitos da ditadura militar brasileira foram o "excesso de estatização da economia e a repressão política", como se fossem problemas do mesmo grau de intensidade
25. Xinga a Constituição de 1988 porque ela "deu direitos sociais sem especificar quem iria bancá-los", mas ignora o fato de que esta Constituição garantiu direitos individuais como o de ir e vir
26. Diz que Hitler e Mussolini eram "de esquerda" porque eram "muito estatizantes", mas faz alguns elogios ao Generalíssimo Franco, mesmo tendo este chegado ao poder apoiado pelos dois "esquerdistas"
27. Defende o direito de comerciantes vetar pretos, gays e mal vestidos em seus estabelecimentos porque "o local é dele e portanto ele tem todo o direito de só deixar entrar quem ele bem entende"

Como os posts do blog são modificáveis, eu acrescento mais alguns se eu lembrar...

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Parabéns!!!



Há vários aniversários em 29 de abril.
Em primeiro lugar, a minha irmã.
Em segundo lugar, uma das minhas muitas primas.
Também tem os comediantes brasileiros Dedé Santana (1936) e Olavo de Carvalho (1947), e o norte-americano Jerry Seinfeld (1954).
E ainda as vilãs do Batman: Michelle Pfeifer (1958) e Uma Thurman (1970).
E o tenista norte-americano Andre Agassi (1970).

Wikipedia serve pra essas coisas.

terça-feira, 28 de abril de 2009

Fio dental vira item obrigatório em Santos (SP)

http://br.noticias.yahoo.com/s/28042009/25/manchetes-fio-dental-vira-item-obrigatorio.html

Eu vi essa notícia no Yahoo quando fui checar meu e-mail. Mas, é sério, na hora em que eu vi o título, em pensei que era sobre as mulheres nas praias, e nao sobre higiene bucal.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Sobre o boicote à Conferência de Racismo

Concordo em gênero, número e degrau com um texto de Seumas Milne, publicado pelo Guardian, sobre o boicote de alguns países ocidentais à Conferência de Racismo. Disse tudo e mais um pouco. Fantástico!

http://www.guardian.co.uk/commentisfree/2009/apr/23/un-race-conference-walkout-ahmadinejad


What credibility is there in Geneva's all-white boycott?

The Iranian president's repugnant rhetoric doesn't give Israel's sponsors the right to cry foul when it's called racist

What do the US, Canada, ­Australia, New Zealand, the Netherlands, Germany, Poland, Italy and Israel have in common? They are all either European or European-settler states. And they all decided to boycott this week's UN ­conference against racism in Geneva – even before Monday's incendiary speech by the Iranian president Mahmoud Ahmadinejad which triggered a further white-flight walkout by representatives of another 23 European states.

In international forums, it's almost unprecedented to have such an ­undiluted racial divide of whites-versus-the-rest. And for that to happen in a global meeting called to combat racial hatred doesn't exactly augur well for future international understanding at a time when the worst economic crisis since the war is ramping up racism and xenophobia across the world.

Didn't Canada or Australia have anything to say about the grim condition of their indigenous people, you might wonder, or Italy and the Czech Republic about violent attacks on Roma people? Didn't any of the boycotters have a contribution to make about the rampant Islamophobia, resurgence of anti-semitism and scapegoating of migrants in their countries over the last decade?

The dispute was mainly about Israel and western fears that the conference would be used, like its torrid predecessor in Durban at the height of the Palestinian intifada in 2001, to denounce the Jewish state and attack the west over colonialism and the slave trade. In fact, although it was the only conflict mentioned in the final Durban declaration, the reference was so mild (recognising the Palestinian right to self-determination alongside Israel's right to security) that the then Israeli prime minister, ­Shimon Peres, called it "an accomplishment of the first order for Israel".

In this week's Geneva statement, Israel isn't mentioned at all. But the US bizarrely still used its reaffirmation of the anodyne Durban declaration to justify a boycott, to the anger of African American politicians such as Jesse Jackson and Barbara Lee, who chairs the US Congressional Black Caucus. In fact, like the other boycotting governments, the US administration had been intensely lobbied by rightwing pro-Israel groups, who had insisted long in advance that the conference would be a "hatefest".

Ahmadinejad's grandstanding played straight into that agenda. The most poisonous phrases in the printed version of his speech circulated by embassy officials referred to the Nazi genocide as "ambiguous and dubious" and claimed Zionist "penetration" of western society was so deep that "nothing can be done against their will". That a head of state of a country of nearly 70 million people is still toying with Holocaust denial and European antisemitic tropes straight out of the Tsarist antisemitic forgery, The Protocols of the Elders of Zion, is not only morally repugnant and factually absurd. It's also damaging to the Palestinian cause by association, weakens the international support Iran needs to avert the threat of attack over its nuclear programme, and bolsters Israel's claims that it faces an existential threat.

But, perhaps as a result of an appeal by the UN secretary general Ban Ki-moon, Ahmadinejad dropped those provocations at the last minute. What in fact triggered the walkout of European Union ambassadors was his reference to Israel as a "totally racist regime", established by the western powers who had made an "entire nation homeless under the pretext of Jewish suffering" and "in compensation for the dire consequences of racism in Europe".

The rhetoric was certainly crude and inflammatory. Britain's foreign secretary David Miliband called it "hate-filled". But the truth is that throughout the Arab, Muslim and wider developing worlds, the idea that Israel is a racist state is largely uncontroversial. The day after Ahmadinejad's appearance, the Palestinian Authority foreign minister, Riyad al-Maliki, echoed the charge in the conference hall, describing Israeli occupation as "the ugliest face of racism". It's really not good enough for Britain's ambassador to the UN in Geneva, Peter Gooderham – who led the Ahmadinejad walkout – to say of the charge of Israel's racism, "we all know it when we see it and it's not that".

This is a state, after all, created by European colonists, built on the ethnic cleansing of the indigenous population, whose founding legal principles guarantee the right of citizenship to any Jewish migrant from anywhere in the world, while denying that same right to Palestinians born there along with their descendants. Of course, Israel is much else besides, and the Jewish cultural and historical link with Palestine is a ­profound one.

But even those Palestinians who are Israeli citizens face what the then Israeli prime minister Ehud Olmert last year called "deliberate and ­insufferable" discrimination by a state which defines itself by ethnicity. For Palestinians in the occupied territories, ruled by Israel for most of the state's existence, where ­ethnic segregation and extreme ­inequality is ruthlessly enforced, the situation is far worse – even without the relentless military assaults and killings. And Israel now has a far-right ­government whose foreign minister, Avigdor Lieberman, has said 90% of Israel's Arab citizens have "no place" in the country, should be forcibly "transferred", and only be allowed citizenship in exchange for an oath of loyalty to Israel as a Zionist Jewish state.

But if Lieberman had turned up to speak at the Geneva anti-racism conference, who believes that western delegates and ambassadors would have staged a walkout? Of course, there's a perfectly ­reasonable argument to be had about the nature of Israel's racism and whether it should be compared to apartheid, for example. But for western governments to hold up their hands in horror when Israel is described as a racist state has no global credibility whatever.

Israel's supporters often complain that, whatever its faults, it is singled out for attack while the crimes of other states and conflicts are ignored. To the extent that that's true in forums such as the UN, it's partly because Israel is seen as the unfinished business of European colonialism, along with the Middle East conflict's other special mix of multiple toxins. The Geneva boycotters, fresh from standing behind Israel's carnage in Gaza, are in denial about their own racism – and their continuing role in the tragedy of the Middle East.