Atualizei o Atlas das Eleições Presidenciais https://sites.google.com/site/atlaseleicoespresidenciais/ , já mostrado neste blog, com uma página de curiosidades. Ler esta página é divertido e esclarecedor.
Eurico Gaspar Dutra e Getúlio Vargas foram os candidatos preferidos dos eleitores mais pobres em 1945 e 1950, respectivamente. Um foi supostamente “o candidato dos marmiteiros”, o outro foi o “pai dos pobres”. Ainda assim, eles tiveram melhor votação nos estados mais ricos. Fenômeno semelhante ocorre com os candidatos democratas nos EUA dos dias atuais, mas não ocorria nos EUA naquele tempo.
Getúlio Vargas pode não ter sido muito querido pelas elites econômicas e intelectuais de São Paulo. Mas na eleição de 1950, ele teve 64,3% dos votos no Estado de São Paulo e 48,7% em todo o Brasil.
Candidatos de direita como Eduardo Gomes, Juarez Távora, Ademar de Barros e Jânio Quadros tinham votação melhor no antigo Distrito Federal (atual cidade do Rio de Janeiro) e no antigo Estado da Guanabara (atual cidade do Rio de Janeiro) do que no antigo Estado do Rio de Janeiro.
Em 1960, na última eleição presidencial direta antes da ditadura militar, 12,6 milhões de pessoas votaram, o que correspondia a 17,7% do total da população brasileira na época. Em 1989, na primeira eleição presidencial direta depois da ditadura militar, 70,3 milhões de pessoas votaram, o que correspondia a 47,8% do total da população brasileira na época. Este grande aumento da participação ocorreu porque a base da pirâmide etária brasileira teve redução relativa e porque o direito ao voto foi estendido aos analfabetos. Em 2010, 106,6 milhões de pessoas votaram, o que corresponde a 55,9% do total da população brasileira.
No primeiro turno de 1989, a soma de votos na esquerda (Lula+Brizola+Freire+Gabeira) foi 23.685.866. A soma de votos na direita (Collor+Maluf+Afif+Chaves+Caiado) foi 32.959.732. A soma de votos no centro (Covas+Guimarães) foi 10.995.324. Lula só poderia ter vencido no segundo turno se tivesse obtido a transferência da quase totalidade dos votos no centro. Não conseguiu.
José Serra e Geraldo Alckmin nasceram e fizeram carreira política no Estado de São Paulo. Foram derrotados para o PT em 2002, 2006 e 2010. Apesar disso, Alckmin e Serra venceram em São Paulo, respectivamente, em 2006 e 2010, e Serra perdeu em São Paulo em 2002 por uma diferença menor do que no Brasil inteiro. Aparentemente, o eleitor paulista é bairrista e prefere candidatos do próprio estado. Mas em 1989, Collor teve maior vantagem sobre Lula no Estado de São Paulo do que no Brasil inteiro. Portanto, provavelmente o conservadorismo da maioria do eleitorado paulista pesou mais do que o bairrismo.
Collor teve 64,4% no primeiro turno e 76,1% no segundo turno no Estado de Alagoas em 1989. Poderia ser um sinal de bairrismo do eleitorado alagoano. Mas em 1994 e 1998, Fernando Henrique teve maioria bem mais folgada em Alagoas do que no Brasil inteiro. Em 2002, Alagoas foi o único estado que deu maioria a Serra, e em 2006 e 2010, Alagoas deu a segunda menor vantagem para o PT no Nordeste. Portanto, assim como ocorre em São Paulo, o conservadorismo do eleitorado pode ter sido mais determinante do que o bairrismo.
Desde o retorno das eleições diretas para presidente, gaúchos e alagoanos nunca entraram em um acordo. Lula venceu no Rio Grande do Sul em 1989, 1994, 1998 e 2002 e perdeu em 2006, e a Dilma perdeu em 2010. Lula perdeu em Alagoas em 1989, 1994, 1998 e 2002, e venceu em 2006, e a Dilma venceu em 2010.
Considerando a média dos resultados do segundo turno de 1989, 2002, 2006 e 2010 e do primeiro turno de 1994 e 1998, o município de São Francisco do Conde na Bahia foi o município que deu a melhor votação ao candidato do PT. Curiosamente, é o município de maior PIB per capita do Brasil. Infelizmente, este PIB vem do petróleo e grande parte da população não se beneficia desta riqueza.
Entre os dez municípios que deram maior votação ao candidato do PT para presidente entre 1989 e 2010, sete se localizam no Estado da Bahia.
Entre 1989 e 2010, o município que deu a menor votação ao candidato do PT para presidente foi Anajás, no Pará.
Entre dez municípios que deram menor votação ao candidato do PT para presidente entre 1989 e 2010, três se localizam no Mato Grosso, dois se localizam em Minas Gerais, dois se localizam em Goiás, um se localiza no Pará, um em Santa Catarina e um em São Paulo. O município localizado em São Paulo não é nenhuma cidadezinha desconhecida. É Ibiúna, a cidade do frustrado congresso de 1968.
De 1989 a 1998, Lula teve desempenho melhor nas capitais do que fora delas, e no Sul e no Sudeste do que no Norte e no Nordeste. Em 2006 e 2010, Lula e Dilma tiveram desempenho melhor fora das capitais do que nas capitais, e um desempenho melhor no Norte e no Nordeste do que no Sul e no Sudeste.
As grandes mudanças ocorreram no Rio Grande do Sul, que passou de uma área de apoio ao PT para uma área de rejeição, e no interior das regiões Norte e Nordeste, que passou de uma área de rejeição para uma área de apoio ao PT.
A votação em Minas Gerais foi sempre um bom retrato da votação no Brasil. De 1989 a 2010, o vencedor da eleição presidencial teve vantagem levemente maior em Minas Gerais do que no Brasil como um todo. O sul “paulista” de Minas Gerais foi sempre uma área de rejeição ao PT. O leste “fluminense” de Minas Gerais foi sempre uma área de apoio ao PT. O norte “baiano” de Minas Gerais era a área de maior rejeição ao PT de 1989 a 2002, e passou a ser a área de maior apoio em 2006 e 2010.
Mesmo assim, seria um erro superestimar as mudanças na geografia eleitoral no Brasil. Algumas tendências foram preservadas de 1989 a 2010. O Estado do Rio de Janeiro, o Distrito Federal, os arredores de Belo Horizonte e as capitais do Nordeste foram de 1989 a 2010 áreas de forte apoio ao candidato do PT a presidente. Os Estados de São Paulo, Paraná e a Região Centro-Oeste foram de 1989 a 2010 áreas de forte rejeição ao candidato do PT a presidente.
As correlações de votação em municípios no Lula em 2006 e na Dilma em 2010 com a votação de Lula em 1989 são mais próximas de zero do que de um, mas ainda assim são positivas.
O mapa da eleição presidencial de 2006 por microrregião mostrou um norte mais vermelho e um sul mais azul e isto retratou bem o que foi aquela eleição. O mapa da eleição presidencial de 2002 por microrregião mostrou um sul mais vermelho e um norte mais azul. Isto poderia levar a pensar que Lula foi bem melhor no sul do que no norte do Brasil. Não foi. Em 2002, Lula teve votação parecida nas cinco regiões. A diferença é que no Norte e no Nordeste, a votação de Lula se concentrou nas capitais, mais de 80% votos em algumas delas, e algumas áreas do interior ficaram azuis. Nas Regiões Sul e Sudeste, a votação de Lula não se diferenciou muito entre as capitais e o interior.
Em 1989, Collor superou Lula por apenas seis pontos percentuais, mas o mapa eleitoral por microrregião ficou quase tudo azul. Isto porque a votação de Lula se concentrou nos Estados do Rio Grande do Sul, do Rio de Janeiro, e nas regiões metropolitanas. Em quase todo o interior do Brasil, Collor ganhou de lavada.
Apesar de Lula ter tido, entre 1989 e 2002, melhor votação nos grandes centros urbanos e nos estados mais ricos do que no interior e nos estados mais pobres, ele não teve votação melhor entre as pessoas mais ricas. Mesmo nesse período, ele teve votação melhor no ABCD, em Guarulhos e Osasco do que no município de São Paulo, e teve votação melhor em Sumaré e Hortolândia do que em Valinhos e Vinhedo. Ainda não está disponível neste atlas a votação dentro do município de São Paulo, mas se for consultar este resultado, é possível perceber que Lula sempre foi mais votado nas bordas da Zona Sul e da Zona Leste do que nos Jardins e em Pinheiros.
De 1989 a 2002, a votação em Lula seguiu o padrão da votação atual dos candidatos democratas a presidente dos EUA: forte entre a classe trabalhadora dos grandes centros urbanos dos estados mais ricos, fraca no interior.
De 2006 a 2010, Lula teve sua votação mais forte no Nordeste, e isto pode ser comparado com a elevada votação que Franklin Roosevelt tinha no Sul dos EUA.
Em 2010, o dilmismo se separou do petismo. Nos cinco estados que elegeram um governador do PT, Dilma perdeu em dois (Rio Grande do Sul e Acre), ganhou por uma votação muito apertada em dois (Distrito Federal e Sergipe) e ganhou por uma larga diferença apenas em um (Bahia). Por outro lado, em alguns estados onde Dilma ganhou com uma grande vantagem, o PT sequer lançou candidato próprio para governador.
Em 2010, o Brasil vermelho esteve quase todo ele a leste da linha do Tratado de Tordesilhas e o Brasil azul esteve quase todo a oeste desta linha.
Os candidatos democratas a presidente dos EUA têm votação muito maior em Nova York do que no país como um todo. O mesmo ocorre com os trabalhistas em Londres e com os social-democratas, os verdes e os esquerdistas em Berlim. Isto não ocorre em São Paulo. A votação de Lula de 1989 a 2006 e de Dilma em 2010 foi menor na maior cidade do Brasil do que no país como um todo.
No Rio de Janeiro, a situação é diferente. Em todos os segundos turnos, Lula ou Dilma tiveram maior votação na capital fluminense do que no Brasil como um todo. Ironicamente, o Rio de Janeiro foi uma das poucas capitais do Brasil que nunca elegeram um prefeito do PT.
Não vou escrever sobre as curiosidades das eleições municipais brasileiras, que são tantas, e, portanto, não saberia nem por onde começar.
domingo, 26 de agosto de 2012
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