sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A defesa de tese de Aloizio Mercadante

Nesta sexta-feira, o futuro ex-senador e futuro Ministro de Ciência e Tecnologia Aloysio Mercadante defendeu sua tese de doutorado no Instituto de Economia da Unicamp. Seu trabalho foi um balanço dos oito anos de governo Lula, classificado pelo senador como um período de "novo desenvolvimentismo".
Nunca na história desta República uma defesa de tese havia recebido um público tão elevado. Todas as cadeiras do auditório do Instituto do Economia da Unicamp foram ocupadas. Algumas pessoas se espremeram de pé nos corredores. Outras pessoas viram o evento no telão instalado no saguão do prédio do IE.
Quem atraiu um elevado público foi não apenas o candidato a doutor (que já tem o poder de sozinho atrair um grande número de pessoas para palestras), como também a composição prevista da banca, que incluia João Manuel Cardoso de Mello, Maria da Conceição Tavares, Luiz Carlos Bresser-Pereira e Antônio Delfim Netto. Isto é para os fãs de economia o mesmo que uma partida entre Gustavo Kuerten e Andre Agassi é para os fãs de tênis.
Maria da Conceição Tavares não pode comparecer por causa de uma gripe. Ricardo Abramovay a substituiu. Foi uma perda e um ganho. A banca perdeu o conhecimento, a sabedoria, o humor e os divertidos palavrões da Conceição, mas ganhou pluralidade. Os quatro membros originais tinham orientações partidárias diferentes e haviam participado de governos diferentes, mas todos eles eram desenvolvimentistas e seguiam alguma orientação keynesiana. Escalados para avaliar um trabalho de um desenvolvimentista com orientação keynesiana. Ricardo Abramovay, embora não seja um liberal puro, sai um pouco da linha dos outros três.
Em sua exposição de 45 minutos, Mercadante defendeu que o governo Lula se diferenciou tanto do velho nacional-desenvolvimentismo de 1930-1980 quanto do neoliberalismo de Collor e Fernando Henrique Cardoso. Os quatro eixos principais do governo Lula teriam sido o estabelecimento de um modelo de desenvolvimento econômico comandado pelo desenvolvimento social, em que a economia seria puxada por um mercado de consumo de massas; o fortalecimento da democracia; a inserção externa soberana, e a nova política energética (principalmente com a descoberta do pré-sal). Mercadante também discutiu as políticas macroeconômica, científica, ambiental e educacional do governo Lula e ainda falou de prioridades a serem tratadas pelo próximo governo.
Os quatro avaliadores avaliaram positivamente a tese, assim como avaliam positivamente o governo Lula. Apesar disso, os quatro observaram discretamente que o trabalho procurou evidenciar muito mais os aspectos positivos do que os negativos do governo Lula e que exagerou ao ver 2002 como um ano de ruptura, negligenciando o que havia sido feito de continuidade a governos anteriores. Também foi destacada a conjuntura internacional favorável que vigorou até 2008, principalmente por causa do crescimento da China. Mas como a banca era composta por pessoas qualificadas, ninguém falou que tudo de bom que ocorreu no governo Lula foi resultado do governo FHC.
O próprio Mercadante reconheceu que é impossível separar totalmente o histórico militante do PT que ajudou a escrever o programa de governo do Lula desde 1989 e que foi um grande líder do governo no Senado e o acadêmico que vai fazer um trabalho de análise do governo de seu partido.
Como afirmou Delfim Netto, economistas entendem de diferenciar o produto para vendê-lo mais caro. Quase todos fazem isso. Ao comentar a avaliação de Mercadante da política científica e tecnológica do governo Lula, Delfim Netto afirmou que a Embrapa já existia desde 1970 e a Embraer desde 1967. Também afirmou que a despeito do crescimento absoluto das exportações no atual governo, as exportações brasileiras hoje equivalem a 1,3% das exportações mundiais e que isto já ocorria em 1980-1984. Bresser-Pereira lamentou a não continuidade da sua reforma de 1995.
A principal crítica de Delfim Netto à tese de Mercadante foi a de considerar que o desenvolvimento alicerçado no social teria iniciado no governo Lula. Para o ex-ministro, o modelo social teria iniciado com a Constituição de 1988. Bresser-Pereira falou da falta de abordagem teórica da tese. Abramovay reclamou que a tese foi muito pessimista (e às vezes contraditória) em relação às privatizações de FHC e observou que foi negligenciado que não só a esquerda, mas as forças políticas chamadas de neoliberais, também lutaram pela redemocratização do Brasil. João Manuel Cardoso de Mello sugeriu um texto mais curto, abordando menos temas, porém, de uma forma mais aprofundada.
No geral, a apresentação de Mercadante foi muito boa, os comentários da banca também, e o mesmo vale para as réplicas. O único problema a ser mencionado foi o clima de chá de comadres. Discussão com civilidade é muito importante para elevar a qualidade intelectual do país. Porém, fazer enormes elogios ao candidato ou a outros integrantes da banca antes de cada crítica ou manifestação de discordância já vira puxa-saquismo.

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