É não apenas saudável, como também
necessário, que exista uma mídia que ofereça um ponto de vista diferente do da
mídia das cinco grandes famílias - Marinho, Abravanel, Civita, Mesquita e
Frias. É muito saudável que a Internet ofereça uma possibilidade de mídia a
baixo custo e quebre a necessidade de elevados custos para emitir uma opinião.
Sabemos que a grande mídia é oligopolizada e que algumas empresas têm propriedade
cruzada. Estão nas Organizações Globo o canal aberto, a Globonews, o jornal O
Globo, o Portal G1, a rádio CBN e a Revista Época.
Sabemos que essas mencionadas cinco
famílias são de ideologia política conservadora. Mas nem sempre forneceram
pensamento único. Nos anos 90 e início dos anos 2000, havia diversidade de
opinião entre colunistas. José Arbex já foi da Folha, Franklin Martins já foi
da Globo, Maria Kehl, Maria Aquino, Wanderley Guilherme dos Santos e Paulo
Moreira Leite já foram colunistas da Época. Luís Felipe de Alencastro já foi
colunista da Veja. Isto mudou. A partir de 2005, a esquerda foi expulsa da
grande mídia, que passou a ser emissora de pensamento único. Apenas a Folha
fornece variedade de opinião, pois tem Pondé, Reinaldo Azevedo e João Pereira
Coutinho, mas também tem Jânio de Freitas, Vladimir Safatle e Guilherme Boulos.
As outras quatro grandes empresas só oferecem opinião de direita. Colunistas
raivosos de direita escrevem em veículos de mais de uma dessas grandes empresas
e têm seus livros amplamente divulgados. É comum colunistas dessas empresas
trocarem elogios. Outro fenômeno dessa ultradireitização da mídia é o dos AdeS
(Acadêmicos de Sempre). São aqueles poucos acadêmicos que aparecem quase sempre
porque têm ideologia igual à das grandes empresas de mídia e que esta mídia
exibe-os para parecer que seus pontos de vista contam com amplo respaldo na
academia. Por isso que quem só conhece o mundo por essa mídia pensa que o único
geógrafo do Brasil é o Demétrio Magnolli, o único historiador é Marco Antônio
Villa, os únicos economistas do trabalho são Amadeo e Pastore, o único
economista do setor público é Raul Velloso, o único economista de Previdência é
Giambiagi, os únicos educadores são Cláudio Moura de Castro e Gustavo Ioschpe e
o únicos filósofos são Pondé e Roberto Romano. Mesmo com o governo federal
sendo do PT, esta mídia recebe generosas verbas de publicidade.
É por isso que uma mídia alternativa é
necessária. Porém, entre grande parte do que se define como mídia alternativa e
crítica à grande mídia há um grave defeito: há um conjunto de sites (muitos
deles conhecidos como os “blogs progressistas”) que dedicam grande espaço a
relativizar e minimizar importância de escândalos de corrupção cometidos por
figuras importantes do PT. Isto não é bom. Corrupto é corrupto, não importa o
partido e a ideologia. Alguns desses sites gostam de propagar a ideia de que
"sempre foi assim, os outros também fazem". Não é mentira, mas o
problema é a mentalidade que se gera com isso. Se "sempre foi assim",
sempre foi errado, se "os outros também fazem", os outros também estão
errados. Isto nunca deveria ser dito para tentar criar a ideia de que não é
errado que lideranças do PT também façam.
Da mesma forma que quem verdadeiramente
luta pela liberdade de expressão é apenas quem luta pela liberdade de expressão
de opositores, porque não precisa ser a favor da liberdade de expressão para
defender liberdade de expressão para quem pensa como nós; quem verdadeiramente
luta contra a corrupção é apenas quem se luta contra a corrupção de aliados,
porque não precisa ser contra a corrupção para lutar contra a corrupção de
adversários.
É assustador como alguns sites petistas
não demonstram um mínimo de indignação com a corrupção praticada por seus
partidários. A indignação se volta apenas contra a forma através da qual a
grande mídia cobre esses casos. Sim, a mídia dá mais destaque para escândalos
do PT do que escândalos do PSDB. Porém, a mídia deve ser criticada por dar
pouco destaque aos escândalos do PSDB e não por dar muito destaque aos
escândalos do PT. Temos que ser contra a grande mídia quando esta ataca as
"recaídas" de esquerda dos governos do PT, quando esta mídia se
coloca contra o plano nacional de direitos humanos, contra a participação de
movimentos sociais, contra o aumento do IPTU para os mais ricos. Porém, quando
esta mídia faz denúncias verdadeiras de corrupção, não faz mais do que a
obrigação em uma sociedade livre. Temos que repudiar apenas quando faz
denúncias falsas.
Claro que assim como a mídia
"alternativa" petista, a grande mídia conservadora também faz vista
grossa com a corrupção de seus aliados. Exemplos disso foram a operação de
blindagem de Daniel Dantas, que contou com parceria de um ministro do STF, a
tentativa de Merval Pereira de dizer que nada havia de errado nos aeroportos de
Aécio, na definição que a Veja fez a CPI do Cachoeira como "uma cortina de
fumaça para esconder o mensalão" (a Veja que gosta tanto do Demóstenes).
Mas é por essas coisas que a grande mídia tem que ser criticada, e não porque
denuncia malfeitos de algumas lideranças do PT, que é nada mais do que a
obrigação.
Devemos ser contra vazamentos seletivos e
partidarização de delegados da Polícia Federal, mas não contra a delação
premiada. É por causa desta que o mega escândalo da Petrobrás foi descoberto.
Em geral, a revista Carta Capital não tem tanto esses mencionados defeitos,
apresenta matérias de grande qualidade. Mas já caiu nessas práticas quando
publicou uma coluna que falava que "a grande mídia chama o escândalo da
Petrobrás de petrolão porque a palavra se parece com mensalão e assim
fomenta-se o antipetismo". Ora, não há inverdade nisso. O problema é a
relevância. Diante da gravidade do escândalo, qual a relevância do nome que a
grande mídia dá a ele?
O julgamento da AP 470 pode ser criticado
sim, porque como disse aquela policial de trânsito, juiz não é Deus. Porém,
essa crítica conta com mais credibilidade quando é feita por alguém que
realmente entende de Direito Penal. Quando esta crítica é feita por meros
militantes partidários, que até antes de ontem não estavam ligando para rigor
com provas e razoabilidade na definição de penas, passa-se a impressão de que
alguns militantes partidários consideram que malfeitos de correligionários não
devem ser punidos. Chegou-se ao absurdo de atacar Joaquim Barbosa por pura
birra. Um desses sites postou uma crítica ao ex-presidente do STF por ele ter
uma esposa branca.
Esta forma de pensar contaminou algumas pessoas
simpatizantes do PT. Já vi conhecidos meus postarem no Facebook a foto da casa
simples do José Genoíno para argumentar que a condenação dele foi injusta. O
problema é que isto não é argumento. O ex-presidente do PT foi condenado porque
ele teria cometido crimes a favor de seu partido, e não de seu patrimônio
pessoal. Em nenhum trecho do código penal brasileiro está escrito que somente
delitos a favor do patrimônio pessoal próprio devem ser punidos. Se alguém
quiser defender que a condenação do Genoíno foi injusta, que utilize outros
argumentos, como alguns juristas fazem, e alguns desses argumentos podem ser
levados a sério.
A própria direção do PT se sabotou em ter
aceitado o Delúbio de volta e em ter escrito a nota contra o STF. Os
adversários do PT vinculavam o mensalão ao partido e em defesa do PT, era
possível dizer que quem praticou o mensalão foram integrantes do partido, e não
o partido. Era possível dizer também que durante o governo Lula, a Polícia
Federal teve autonomia para investigar, que Lula e Dilma foram decentes em não
ter nomeado aliados políticos para o STF. Porém, a própria direção do PT jogou
todos esses argumentos fora com as mencionadas atitudes. Não é a toa que mesmo
depois da crise do mensalão, ocorrida em 2005, o PT manteve razoavelmente
intacta em 2006 e 2010 a bancada conquistada em 2002. Em 2014, depois da
reabilitação de Delúbio e da nota contra o STF, a bancada do PT despencou.
Este comportamento do PT e de alguns sites
petistas pode acabar fomentando ainda mais o anti-petismo. Se notórios
simpatizantes do PT falam de corrupção cometida por integrantes do partido como
algo banal, a impressão que estão passando é a de que petistas não veem problemas
na corrupção. Quem fala a favor de um partido logo é identificado com um
partido. É por isso que as colunas no Reinaldo Azevedo facilita a definição do
PSDB como um partido que se tornou elitista e autoritário.
Claro que a grande mídia conservadora e a
mídia “alternativa progressista” também tem pontos positivos. Mesmo sendo muito
conservadores, os órgãos da grande mídia são ferramentas necessárias de
informação, pois blogs alternativos não têm estrutura para transmitir notícias
e fazer reportagens. Mesmo discordando da opinião dos comentaristas da Globo,
há que se reconhecer que Portal G1 e Jornal Nacional são meios importantes de
informação. E os sites e “blogs progressistas” têm todos esses defeitos quando
falam de corrupção na política partidária brasileira, mas têm boas entrevistas
e colunas de acadêmicos de esquerda. Além disso tratam de assuntos que a grande
mídia não trata. Mas ainda assim, a formação de opinião no Brasil não pode
estar restrita a estes dois grupos.
Nem tudo está perdido. Existem caminhos
alternativos que não passam nem pelo tucanismo/conservadorismo/elitismo da
grande mídia, nem pelo petismo cego leniente com corrupção dos “blogs
progressistas”. O Yahoo está tendo ótimos colunistas, que são de esquerda e não
exercem o papel de relativizadores de escândalos do PT. Entre estes colunistas
estão Matheus Piconelli, Laura Capriglione, Alex Antunes e Jornalismo Wando.
Outra boa fonte de opinião é o blog do Leonardo Sakamoto. E mesmo sendo um
grande caça-like e caça-share de Facebook, o André Forastieri faz bons textos
de vez em quando. Outro bom colunista é o Renato Janine do Valor Econômico.
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