domingo, 25 de janeiro de 2015

Por que eu bloqueio no meu Facebook quem posta texto do Reinaldo Azevedo

Em primeiro lugar, quem é Reinaldo Azevedo?
Alguns, que só conhecem-no recentemente, desde quando virou colunista da Veja, diriam que ele é um ultraconservador olavete que faz campanha para o Partido da Social Democracia (hahaha) Brasileira apenas porque não existe um partido mais conservador com chance de ganhar uma eleição majoritária. Certo ou errado?
Errado. Reinaldo Azevedo faz trabalho de public relations para o PSDB bem antes de ter virado olavete. Reinaldo Azevedo começou a despontar no jornalismo em 1996, quando Mendonça de Barros criou a revista República, uma publicação paraoficial do PSDB. Para não pregar apenas para os fiéis já convertidos, o time de colunistas da revista era variado, tinha até Franklin Martins. A revista entrevistava políticos de diferentes partidos, até mesmo do PT. Mas a linha editorial da revista era pró-PSDB. E Reinaldo Azevedo era o colunista puxa-saco de FHC, e logo virou redator chefe.
Durante o segundo mandato de FHC, quando ocorria a crise econômica e a crise energética, e a eleição de 2002 se aproximava, a revista, principalmente através de Reinaldo Azevedo, passou a defender a ideia de que existia um PSDB ruim, dos economistas monetaristas da PUC-Rio, que tinham forte influência sobre FHC, e o PSDB bom, dos economistas desenvolvimentistas da Unicamp e da FGV-SP, que teriam influência na candidatura de José Serra. Sim, isso mesmo, Reinaldo Azevedo, antes de ter virado olavete, defendia a "esquerda" do PSDB. Em 2002, a revista República mudou o nome para Primeira Leitura, e fez forte campanha para José Serra, não com o argumento de que Lula era comunista mau comedor de criancinha, e sim com o argumento de que José Serra era o candidato de centro-esquerda "mais preparado" do que Lula.
Bom, aí depois que Lula assumiu o governo, a revista Primeira Leitura deu uma súbita guinada ideológica, passando de tucana desenvolvimentista para ultraconservadora olavete. Depois da polêmica sobre o patrocínio da Nossa Caixa (sim, Reinaldo Azevedo, que tanto fala mal da Carta Capital, recebia patrocínio público), em 2006, a revista Primeira Leitura deixou de existir. E Reinaldo Azevedo tornou-se colunista da Veja. Daí pra frente, todos conhecem sua grande "obra".
E por que ele é nocivo?
Mesmo tendo virado olavete, ele nunca deixou de ser tucano. Até porque o PSDB está defendendo posições cada vez mais olavetes. O problema de Reinaldo Azevedo não é esse, nada há de errado em alguém defender um partido político. Abjeta é a maneira através da qual ele faz isso.
Todos nós sabemos que liberalismo econômico não ganha eleição. Pesquisas de opinião, como esta, mostram que a maioria dos brasileiros defende um Estado que intervenha na ordem econômica e social. Porém, estas mesmas pesquisas demonstram que em matéria de valores morais, os brasileiros são fortemente conservadores. As pesquisas não alcançam maior profundidade, mas sabemos que junto com conservadorismo veem muitos preconceitos. E o método Reinaldo Azevedo de propaganda política consiste em utilizar os preconceitos que muitos brasileiros têm como uma força anti-PT e consequentemente pró-PSDB. Como críticas ao estado inchado não mexem com muitas pessoas, apela-se a críticas a ONGs, movimentos sociais, movimentos favoráveis a minorias, feministas, ambientalistas, politicamente corretos e professores de universidades nas quais alguns leitores do colunista não conseguiram ingressar.
Muitas pessoas são preconceituosas, mas muitas pessoas rejeitam preconceitos. Por isso, expressar preconceitos abertamente é feio. Às vezes, causa problemas com a lei. Por isso, Reinaldo Azevedo utiliza a técnica do dog-whistle, que consiste passar mensagem implícita para determinados grupos. Ele não escreve textos abertamente racistas, machistas, homofóbicos, xenofóbicos e elitistas, mas agrada quem tem essas características.
Um exemplo disso pudemos perceber em sua coluna sobre o beijo gay da novela. Ele não escreveu "que horror, os gays vão destruir a família brasileira". Mas escreveu um textão desqualificando quem vê a exibição do beijo gay como um progresso social e falando como a novela foi ruim. Não há nada de errado em falar mal de uma novela, mesmo com o beijo gay, a novela pode ter sido ruim. Mas acontece que o tema das colunas de Reinaldo Azevedo não é novela, ele habitualmente não escreve sobre novela, aquele texto sobre novela foi uma exceção. A mensagem passada não foi explicitamente homofóbica. Mas quem é homofóbico adoraria ler um texto dizendo que a novela que teve um beijo gay foi muito ruim, um texto atacando o diretor. Adoraria divulgar este texto no Facebook. Escrevendo essas coisas, Reinaldo Azevedo passa a seguinte mensagem oculta aos homofóbicos: olhem, eu não ataco essas bichas diretamente porque pode pegar mal pra mim, mas eu sou alguém que olha por vocês, cidadãos de bem de família que odeiam viado. Pensem bem, Reinaldo Azevedo habitualmente não escreve sobre novela, mas um dia resolveu malhar pesado uma. Mesmo existindo tantas novelas, resolveu fazer isso sobre uma que teve beijo gay. Mais especificamente, no dia seguinte ao capítulo do beijo gay. Por que será?
Reinaldo Azevedo já chamou índios de pele vermelhas, uma expressão altamente pejorativa.
Há também insultos sobre a origem social das pessoas das quais o colunista não gosta. Ele já chamou a líder do Passe Livre de garçonete em tom depreciativo. Dá a entender que Reinaldo não gosta de pessoas que fazem trabalho braçal se metendo em política.
Ah, e óbvio, como não poderia faltar, Reinaldo Azevedo imita a mais retrógada direita norte-americana ao chamar o presidente dos Estados Unidos de Barack Hussein Obama, falando o nome do meio por extenso. Ninguém fala Franklin Delano Roosevelt, nem John Fitzgerald Kennedy, nem George Walker Bush. A intenção de falar Hussein é obviamente querer dizer que o fato de ter esse sobrenome torna o presidente dos Estados Unidos uma pessoa pior. Ou seja, xenofobia. Até mesmo o candidato republicano John McCain, em 2008, repudiou o uso dessa forma de falar.
Para ter uma base de leitores mais ampla, Reinaldo Azevedo usa escapatórias como defender a adoção de crianças por casais homossexuais ou participar da campanha somos todos macacos. Mas não há como negar que Reinaldo Azevedo, mesmo sem explicitar racismo, machismo, elitismo, homofobia e xenofobia, ele corteja pessoas que tem esses sentimentos.
Reinaldo Azevedo também quer ser aplaudido por quem pensa que sexo só deve ser utilizado para reprodução, ao tentar gerar ódio contra cartilhas de orientação sexual distribuídas em escolas. Provavelmente deve adorar a filha grávida de Sarah Palin.
Tudo isso fica muito evidente quando ele diz que o brasileiro mais oprimido é o homem, branco, cristão e heterossexual. É óbvio que não há qualquer dado para sustentar esta afirmativa. Estes grupos não são os que têm renda menor, não são os que sofrem mais homicídios. Eu sou homem, branco, heterossexual e filho de cristãos e não sinto qualquer opressão por causa disso. A única motivação para alguém a pensar assim é não se conformar em ver mulheres, negros e índios, homossexuais, seguidores de outras religiões e seguidores de religião nenhuma sendo cada vez menos oprimidos, ganhando espaço na sociedade. Um artifício muito utilizado por quem quer manter o grupo B oprimido é dizer que o grupo A, que é diferente do B, é o oprimido. É por isso que frequentemente Reinaldo Azevedo diz coisas como "nós, conservadores, não temos o direito de dizer isso, de dizer aquilo". Não Reinaldo, vocês, conservadores, têm o direito sim, assim como nós, que repudiamos os conservadores, temos o direito de refutar. Talvez este nosso direito o incomode.
O que Reinaldo Azevedo parece querer é fazer alguns brancos, cristãos, heterossexuais, que não ligam muito para os debates de economia entre PT e PSDB, mas são ressentidos com o aumento de visibilidade das minorias, pensarem que estão sendo vítimas de uma opressão a cidadãos de bem patrocinada por defensores de minorias e de direitos humanos. A intenção seria utilizar essa auto-vitimização dos grupos dominantes como uma corrente de ódio ao PT e, consequentemente, de apoio ao PSDB.
E esse costume de usar o preconceito dos outros tem intenção não apenas político-partidária, mas também de marketing pessoal. Isto ajuda o colunista ser bastante odiado por algumas pessoas, e Reinaldo Azevedo é o tipo de colunista que ama ser odiado.
Além de explorar ódio e preconceito alheio, Reinaldo Azevedo estimula a ignorância no debate de ideias. Habitualmente insinua que defensores da legalização da maconha consomem a droga mesmo quando ela não é legalizada. Ignora que isto é um debate sério, que há boas experiências no mundo a este respeito, como Holanda, Portugal, Colorado. Eu não consumo quiabo, mas se este alimento fosse ilegal, eu seria a favor da legalização. Reinaldo Azevedo é tão favorável à liberdade de expressão que defende a proibição das marchas da maconha.  Em outros momentos, ele sugere disfarçadamente que colunistas de esquerda deveriam ser demitidos. Defender liberdade de expressão para suas próprias ideias é moleza. O verdadeiro defensor da liberdade de expressão é quem defende este direito para quem tem ideias diferentes.
Para piorar, Reinaldo Azevedo parece, em alguns assuntos, ser intelectualmente limitado. Isto foi demonstrado no momento em que discutiu com a Professora Camila Jourdan, em que ele pareceu não saber a diferença entre exemplo e conteúdo.
Alguns semi-defensores do colunista poderiam dizer "tá, ele exagera em algumas coisas, não concordo com tudo que ele escreve, mas o país está com tanta corrupção que é bom ter alguém que bate pesado no PT". Sim, há muitos políticos do PT envolvidos em escândalos do PT, isto deve ser criticado, até eu, alguns dias atrás, critiquei o costume de blogueiros pró-PT relativizarem escândalos de corrupção. Mas mesmo em relação ao debate sobre ética na política, Reinaldo Azevedo não tem muito o que contribuir. Sua indignação é seletiva. Diz que todos devem ser investigados, e se comprovada culpa, punidos, independentemente de partido e ideologia. Dããã... Ninguém vai dizer abertamente o contrário. Ele diz que todos devem ser investigados e quem sabe, punidos. Isso fica apenas no abstrato. Quando, no concreto, algum agente público tenta realmente fazer algo contra alguém próximo a pessoas de quem ele tem simpatia política, já há logo a tentativa de desqualificar este agente. Basta ver suas posições em relação à Operação Satiagraha. O caso mais emblemático do comportamento hipócrita de Reinaldo Azevedo sobre corrupção foi mais recente. Haddad quis que houvesse investigação sobre os auditores fiscais corruptos que agiram no tempo de Kassab. Lula não quis que a investigação ocorresse porque poderia prejudicar um neo-aliado. Reinaldo Azevedo tinha tudo para defender a investigação, se realmente fosse indignado com a corrupção, e ainda teria mais um motivo para atacar Lula, algo que adora fazer. Mas não. Neste episódio, ficou do lado de Lula. E consequentemente e coincidentemente, do lado de Kassab, prefeito para o qual já fez campanha em suas colunas na Veja. Deu a entender que considera que teria sido mais correta a atitude de colocar um escândalo debaixo do tapete em nome da conveniência política.
E o pior de tudo: não viu problema algum em deixar passar um comentário em seu blog defendendo as milícias. Sim, um colunista tem responsabilidade sobre os comentários.
Reinaldo Azevedo culpa pela preservação da corrupção no Brasil quem, entre PT e PSDB, escolhe o PT. Já é absurda a ideia de que com PSDB não haveria corrupção. E também é absurda a ideia de que o único critério que deve existir na cabeça do eleitor é a corrupção. Mas esta regra que o colunista quer impor é quebrada por ele mesmo quando, no Rio de Janeiro, na disputa entre PMDB e PSOL, ele defende o PMDB. Afinal, até a tecla 5 da urna eletrônica sabe que PMDB tem muito mais envolvimento em escândalos de corrupção do que o PSOL, inclusive em parceria com o PT.
Em resumo, nós pudemos ver como Reinaldo Azevedo tem belos valores. Ele defende a liberdade de expressão... para quem concorda com ele. Ele defende o combate implacável à corrupção... de adversários políticos dele. E pelo PSDB vale tudo, até mesmo fomentar e explorar preconceito alheio. Aí eu penso: se o PSDB realmente fosse tão bom, não haveria ótimos argumentos para convencer as pessoas a teclar 45? Se o PSDB é tão bom, por que apelar para preconceitos para criar ódio antí-PT?
Ódios de cor, religião, sexo e origem devem ser repudiados e ponto final. Devem ser vistos como uma praga a ser extinta. Quem, mesmo não expressando esses ódios abertamente, utiliza-os para propósitos políticos, não tem o que contribuir no debate sobre como melhorar a política do Brasil. Quem utiliza indignação contra corrupção apenas como um mero instrumento para atacar adversários também não tem o que contribuir no debate sobre como melhorar a política do Brasil.
É por tudo isso que minha tolerância contra textos de Reinaldo Azevedo postados no Facebook é muito baixa. Eu paro de seguir quem posta mais de três textos do Reinado Azevedo. Quem acha que esse colunista tem muito a dizer muito provavelmente tem pouquíssimo a dizer. Não vale a pena que postadores de textos do Reinaldo Azevedo façam parte da minha timeline virtual. Nem mesmo da minha timeline real. Se algumas dessas pessoas já fizeram parte da minha vida, mesmo em algum momento do passado e sem muita importância, já não fazem mais. E nem vão voltar a fazer.

Um comentário:

sanctusviana disse...

Excelente texto, companheiro!
Eu também teci algumas linhas sobre o caso Petrobras no fim do ano passado, justamente com esse mesmo tom que você escreveu. É evidente que toda denúncia deve ser INVESTIGADA, mas infelizmente salafrários como Uncle King se utilizam de meios espúrios para propagar ódio em vez de convidar leitores à reflexão, ainda que as pessoas chegassem à conclusão de que ele estava errado. Afinal, um jornalista de verdade age dessa forma: convive com os prós e os contras em relação às suas ideias, podendo mesmo mudar de opinião se for o caso, o que não é nada vergonhoso.
Mas diferentemente de você, minha tolerância é ZERO com quem compartilha textos desse infeliz. Tenho horror a nazicoxices e não posso me permitir ser condescendente com gente que prefere a desonestidade intelectual e faz o jogo deles, achando que sabem o que estão fazendo quando repercutem mentiras, falácias e bobagens nas redes sociais.
Aquele abraço meu chapa!