97% dos pesquisadores do tema aquecimento global que publicam artigos em revistas científicas consideram que há influência da atividade humana no aquecimento global https://en.wikipedia.org/wiki/Scientific_opinion_on_climate_change
A negação do aquecimento global costuma ser feita nos meios políticos. Os primeiros negadores políticos do aquecimento global foram os integrantes da extrema-direita norte americana, uns porque eram aliados da indústria petrolífera, outros porque simplesmente queriam que o PIB continuasse crescendo, sem ninguém para atrapalhar.
O primeiro brasileiro famoso a pregar o negacionismo do aquecimento global foi ..., ele mesmo, Olavo de Carvalho, o grande difusor para o Brasil de "conteúdo" produzido pela extrema-direita norte americana. E óbvio, o rebanho do Olavo acompanhou.
Mas negar a influência do ser humano no aquecimento global é coisa só de reacionário? Não, pasmem, um novo grupo político se juntou ao time dos negadores: parte da esquerda nacionalista terceiro mundista. Este grupo alega que a alerta sobre o aquecimento global parte de uma estratégia neocolonialista cos países desenvolvidos para impedir que os países em desenvolvimento os alcancem em poder econômico.
Isto parece estranho, porque há maneiras melhores de defender os países em desenvolvimento. É possível reconhecer a influência humana no aquecimento global e cobrar que os países desenvolvidos assumam responsabilidade maior na redução da emissão de CO2, pois são estes os que mais poluem.
Mas a questão principal não é essa. O fato é: se a influência humana no aquecimento global existe, ela existe e ponto final, independentemente da consequência política que isso acarretaria para o mundo.
Não estou afirmando que a influência da atividade humana no aquecimento global existe e acabou a discussão. Aceito com muita parcimônia o argumento de autoridade. Não é só porque 97% dos cientistas dizem que é assim que tem que ser assim. Às vezes, a maioria erra. O que eu quero dizer é: sim, a maioria esmagadora dos cientistas pode estar errada sobre o aquecimento global, mas a relevância da implicação política do aquecimento global é zero para concluir se o ser humano está aquecendo o planeta ou não.
Deus pode não existir, mesmo que a religião faça bem para as pessoas. A influência humana no aquecimento global pode existir, mesmo se as consequências políticas não forem boas para os países em desenvolvimento.
quinta-feira, 30 de julho de 2015
terça-feira, 28 de julho de 2015
Mais um sobre o conflito defender a verdade vs. defender uma causa
Outro clássico exemplo de como se colocam causas acima da verdade é a forma como o Ocidente difunde a história da Segunda Guerra Mundial para um público mais leigo e menos acadêmico.
Sabemos que embora os aliados ocidentais também tenham sido muito importantes, quem teve o papel principal na derrota da Alemanha Nazista foi a União Soviética.
Porém, em todo junho de ano terminado em 4, a mídia ocidental faz zilhares de especiais sobre o aniversário redondo do desembarque à Normandia. Muitas vezes estes especiais recebem o título de "o momento decisivo da guerra". Quando este evento ocorreu, a Alemanha já tinha perdido imensas quantidades de homens e equipamentos no front da Europa Oriental. A União Soviética já estava na ofensiva e a Alemanha já estava na defensiva. Em junho de 1944, a pergunta já não era mais se a Alemanha seria derrotada e sim quando isto ocorreria. Muito mais decisivas para o rumo da guerra foram as batalhas de Moscou (1941), Stalingrado (1942) e Kursk (1943). Os aniversários redondos destas batalhas recebem pouco destaque.
Por que isto ocorre? É possível até dizer que talvez seja por boa intenção. Pretende-se evitar comemorar a derrota de uma tirania exaltando outra. Mas há um problema nisso, já mencionado em post anterior: defender causas com mentiras é muito feio. Causas boas não precisam de mentiras. Que os responsáveis por contar a história falem quem foi Stálin, seus horrores, mas não neguem que foi o país do bigode grande o mais decisivo para vencer o país do bigode pequeno.
Reescrever a história por causa de conveniência política é uma prática muito comum na... União Soviética. Como é que alguém vai querer criticar a União Soviética igualando suas práticas? Para criticar, é necessário ser superior.
Minha crítica só é direcionada à mídia de massas. Não critico a indústria cinematográfica norte-americana por fazer filmes predominantemente sobre os combatentes norte-americanos. Normal que um país faça filmes sobre seus compatriotas. Que a indústria cinematográfica russa tenha competência para divulgar suas produções no exterior, como essa https://www.youtube.com/watch?v=V9tO7GF8pnY
Sabemos que embora os aliados ocidentais também tenham sido muito importantes, quem teve o papel principal na derrota da Alemanha Nazista foi a União Soviética.
Porém, em todo junho de ano terminado em 4, a mídia ocidental faz zilhares de especiais sobre o aniversário redondo do desembarque à Normandia. Muitas vezes estes especiais recebem o título de "o momento decisivo da guerra". Quando este evento ocorreu, a Alemanha já tinha perdido imensas quantidades de homens e equipamentos no front da Europa Oriental. A União Soviética já estava na ofensiva e a Alemanha já estava na defensiva. Em junho de 1944, a pergunta já não era mais se a Alemanha seria derrotada e sim quando isto ocorreria. Muito mais decisivas para o rumo da guerra foram as batalhas de Moscou (1941), Stalingrado (1942) e Kursk (1943). Os aniversários redondos destas batalhas recebem pouco destaque.
Por que isto ocorre? É possível até dizer que talvez seja por boa intenção. Pretende-se evitar comemorar a derrota de uma tirania exaltando outra. Mas há um problema nisso, já mencionado em post anterior: defender causas com mentiras é muito feio. Causas boas não precisam de mentiras. Que os responsáveis por contar a história falem quem foi Stálin, seus horrores, mas não neguem que foi o país do bigode grande o mais decisivo para vencer o país do bigode pequeno.
Reescrever a história por causa de conveniência política é uma prática muito comum na... União Soviética. Como é que alguém vai querer criticar a União Soviética igualando suas práticas? Para criticar, é necessário ser superior.
Minha crítica só é direcionada à mídia de massas. Não critico a indústria cinematográfica norte-americana por fazer filmes predominantemente sobre os combatentes norte-americanos. Normal que um país faça filmes sobre seus compatriotas. Que a indústria cinematográfica russa tenha competência para divulgar suas produções no exterior, como essa https://www.youtube.com/watch?v=V9tO7GF8pnY
domingo, 26 de julho de 2015
A credibilidade de alguns vegans
Comer carne pode ter efeitos benéficos e ter efeitos prejudiciais à saúde. Mas quem é menos isento para defender a posição de que comer carne é prejudicial à saúde? Quem milita contra o consumo de carne por achar antiético criar e abater animais. Ou seja, quem é contra o consumo de carne independente se faz bem ou se faz mal. É parte interessada assim como dono de frigorífico é o menos isento para defender a posição de que comer carne é benéfico para a saúde. Não concordo com a causa vegan, mas respeito quem a defende. Só deve ter cuidado com quem usa mentiras pra defender essa, assim como quem usa mentiras para defender qualquer outra causa.
É por isso que recomendo ver essa crítica que Pirula fez ao militante vegan Gary Yourofsky. Alguns fãs desse militante são contra o consumo de carne por considerar antiético o confinamento e o abate de animais. Mas acham que isso não vai convencer os outros a serem vegetarianos. Aí resolvem usar argumentos sobre malefícios do consumo de carne à saúde humana, porque esses argumentos sensibilizariam mais as pessoas. O problema é que alguns desses argumentos são falsos. Dessa forma, fica difícil para quem faz isso falar sobre ética.
https://www.youtube.com/watch?v=SOhXPRhHEWY
É por isso que recomendo ver essa crítica que Pirula fez ao militante vegan Gary Yourofsky. Alguns fãs desse militante são contra o consumo de carne por considerar antiético o confinamento e o abate de animais. Mas acham que isso não vai convencer os outros a serem vegetarianos. Aí resolvem usar argumentos sobre malefícios do consumo de carne à saúde humana, porque esses argumentos sensibilizariam mais as pessoas. O problema é que alguns desses argumentos são falsos. Dessa forma, fica difícil para quem faz isso falar sobre ética.
https://www.youtube.com/watch?v=SOhXPRhHEWY
sexta-feira, 24 de julho de 2015
Miséria e criminalidade
Qual é o maior causador da criminalidade? É miséria, é desigualdade, é exclusão?
Quem achar que é só isso poderia tentar responder a algumas questões: Por que o pior da criminalidade do mundo está na América Latina? Por que muitos países da Ásia que têm percentual maior de miseráveis não têm indicadores de criminalidade iguais aos da América Latina? Por que até a década de 1990 o pior da criminalidade no Brasil estava na Região Sudeste? Por que a criminalidade na Região Nordeste cresceu tanto na década de 2000 mesmo tendo caído tanto o número de miseráveis naquela região? Por que a criminalidade cresceu tanto nos Estados Unidos durante a década de 1960, se esta foi uma década de grande crescimento econômico?
Óbvio que quem quer argumentar a favor das questões sociais como principal causa da criminalidade também tem exemplos para mostrar. Pode falar que uma cidade mais igualitária como Estocolmo tem muito menos criminalidade do que o Rio de Janeiro, onde tem Gávea ao lado da Rocinha.
Isto quer dizer que não tem resposta fácil para a questão dos determinantes da criminalidade. Quem diz que pode ser a exclusão social o principal causador não está mentindo. Mas quem diz que é óbvio que é a exclusão social o principal causador está mentindo sim. Porque não é óbvio. A questão da criminalidade é uma questão sem óbvio.
Eu quero viver em uma sociedade segura. Mas para mim, não basta que a sociedade seja segura. Tem que ser justa também. Uma sociedade, mesmo sem crime, em que os ricos são muito ricos e os pobres são muito pobres não é uma sociedade boa. Por isso, o poder público deve combater tanto a criminalidade, quanto a exclusão social.
Agora, defender causas com mentiras não é coisa que se faça. Mesmo que as causas sejam muito boas. Ou melhor, principalmente se as causas forem muito boas. Se uma causa é boa, há argumentos bons para defende-la, usar mentiras como forma de argumentação é enfraquecer a causa. Quando descobrem que uma causa foi defendida com mentiras, as pessoas que defendem essa causa perdem credibilidade, e, talvez, até mesmo a própria causa perde credibilidade.
Em poucas palavras: devemos defender que o governo corrija os elevados níveis de concentração de renda. Mas não usar a criminalidade como argumento. Porque nem sabemos direito o quanto ela é causada pela concentração de renda.
Quem achar que é só isso poderia tentar responder a algumas questões: Por que o pior da criminalidade do mundo está na América Latina? Por que muitos países da Ásia que têm percentual maior de miseráveis não têm indicadores de criminalidade iguais aos da América Latina? Por que até a década de 1990 o pior da criminalidade no Brasil estava na Região Sudeste? Por que a criminalidade na Região Nordeste cresceu tanto na década de 2000 mesmo tendo caído tanto o número de miseráveis naquela região? Por que a criminalidade cresceu tanto nos Estados Unidos durante a década de 1960, se esta foi uma década de grande crescimento econômico?
Óbvio que quem quer argumentar a favor das questões sociais como principal causa da criminalidade também tem exemplos para mostrar. Pode falar que uma cidade mais igualitária como Estocolmo tem muito menos criminalidade do que o Rio de Janeiro, onde tem Gávea ao lado da Rocinha.
Isto quer dizer que não tem resposta fácil para a questão dos determinantes da criminalidade. Quem diz que pode ser a exclusão social o principal causador não está mentindo. Mas quem diz que é óbvio que é a exclusão social o principal causador está mentindo sim. Porque não é óbvio. A questão da criminalidade é uma questão sem óbvio.
Eu quero viver em uma sociedade segura. Mas para mim, não basta que a sociedade seja segura. Tem que ser justa também. Uma sociedade, mesmo sem crime, em que os ricos são muito ricos e os pobres são muito pobres não é uma sociedade boa. Por isso, o poder público deve combater tanto a criminalidade, quanto a exclusão social.
Agora, defender causas com mentiras não é coisa que se faça. Mesmo que as causas sejam muito boas. Ou melhor, principalmente se as causas forem muito boas. Se uma causa é boa, há argumentos bons para defende-la, usar mentiras como forma de argumentação é enfraquecer a causa. Quando descobrem que uma causa foi defendida com mentiras, as pessoas que defendem essa causa perdem credibilidade, e, talvez, até mesmo a própria causa perde credibilidade.
Em poucas palavras: devemos defender que o governo corrija os elevados níveis de concentração de renda. Mas não usar a criminalidade como argumento. Porque nem sabemos direito o quanto ela é causada pela concentração de renda.
quarta-feira, 22 de julho de 2015
Escola Sem Partido (hahaha) e a censura à atividade docente
O Escola do Meu Partido 45, conhecido pelo eufemismo de Escola Sem Partido, é um movimento conservador que faz lobby para aprovar um projeto de lei que estabelece a censura à atividade docente no Brasil, conhecida pelo eufemismo de rejeição à doutrinação ideológica nas escolas. O projeto de lei é de autoria de um deputado do PSDB do Rio Grande do Norte.
Se fosse a favor da censura generalizada, o movimento já seria ruim. Mas este "Escola Sem Partido" não esconde sua hipocrisia, e pretende calar apenas docentes de esquerda. Evidência de que este movimento não defende neutralidade ideológica do ensino, e sim propaganda ideológica de direita é que seu site faz propaganda do Guia Politicamente Incorreto de História do Leandro Narloch, livro que tem como fonte de altíssima credibilidade um panfleto oficial do regime Pinochet. Os textos do site vem carregados de linguagem carregada, repleta de chavões típicos de colunistas de direita de jornais e revistas.
Uma boa estratégia para lutar contra a aprovação da lei da censura à atividade docente seria intelectuais, advogados, líderes estudantis e sindicalistas de esquerda ameaçarem a usar esta lei contra professores de colégios militares, de colégios religiosos e de faculdades de Economia onde predomina o pensamento conservador, como a da PUC-RJ, da FGV-RJ, da UERJ e da USP. Alguns poderiam achar que seria contradição criticar a lei e prometer fazer uso dela, mas eu acho que seria a melhor alternativa para mostrar como o rei está nu, ou seja, como os autores do projeto são hipócritas. Eu sou a favor do direito de professores de direita expressarem suas opiniões. Mas este direito também deve valer para professores de esquerda.
Se ser professor no Brasil já é sinônimo de receber baixos salários, ter trabalho estressante, levar porrada da polícia na rua, e, se essa lei for aprovada, receber visita da polícia na sala de aula, quem é que vai querer fazer licenciatura?
Se fosse a favor da censura generalizada, o movimento já seria ruim. Mas este "Escola Sem Partido" não esconde sua hipocrisia, e pretende calar apenas docentes de esquerda. Evidência de que este movimento não defende neutralidade ideológica do ensino, e sim propaganda ideológica de direita é que seu site faz propaganda do Guia Politicamente Incorreto de História do Leandro Narloch, livro que tem como fonte de altíssima credibilidade um panfleto oficial do regime Pinochet. Os textos do site vem carregados de linguagem carregada, repleta de chavões típicos de colunistas de direita de jornais e revistas.
Uma boa estratégia para lutar contra a aprovação da lei da censura à atividade docente seria intelectuais, advogados, líderes estudantis e sindicalistas de esquerda ameaçarem a usar esta lei contra professores de colégios militares, de colégios religiosos e de faculdades de Economia onde predomina o pensamento conservador, como a da PUC-RJ, da FGV-RJ, da UERJ e da USP. Alguns poderiam achar que seria contradição criticar a lei e prometer fazer uso dela, mas eu acho que seria a melhor alternativa para mostrar como o rei está nu, ou seja, como os autores do projeto são hipócritas. Eu sou a favor do direito de professores de direita expressarem suas opiniões. Mas este direito também deve valer para professores de esquerda.
Se ser professor no Brasil já é sinônimo de receber baixos salários, ter trabalho estressante, levar porrada da polícia na rua, e, se essa lei for aprovada, receber visita da polícia na sala de aula, quem é que vai querer fazer licenciatura?
sexta-feira, 17 de julho de 2015
É golpista e antidemocrático gritar "Fora Dilma"?
Li textos de pessoas de esquerda dizendo que gritar "Fora Dilma" era ser golpista e antidemocrático. Como assim? Pessoas de esquerda já gritaram Fora Sarney, Fora Collor, Fora Itamar, Fora FHC. O PT oficialmente só apoiou o Fora Collor mas esquerda não se resume a PT. Dissidência do PT gritou Fora Itamar (foi o motivo da dissidência) e satélites do PT gritaram Fora FHC.
Esquerdistas já gritaram Fora para muitos governadores e prefeitos conservadores, e há não muito tempo. Teve Fora Alckmin e Fora Cabral em 2013, Fora Beto Richa em 2015. A esquerda já comemorou a queda mais ou menos recente de muitos presidentes latino-americanos eleitos, como os da Argentina, Equador e Bolívia. Lembro-me de que em 2001 e 2002, revistas de esquerda falavam do "bravo povo argentino", que tinha derrubado De la Rua e seu vice. O presidente do Equador, que em 2005 teve sua queda comemorada pela esquerda, tinha sido eleito em 2002 como um candidato de esquerda. Também teve Fora Feliciano e Fora Cunha.
Aí eu pergunto: desde quando a esquerda considera que a vontade popular só pode ser expressa uma vez a cada quatro anos?
Expressar o desejo de que um mandato seja abreviado não é antidemocrático, isso faz parte da democracia. Se um governante vê que o povo inteiro quer que ele peça pra ir pro banheiro, fazer isso de fato é uma reação natural. Pedir renúncia é um ato bastante democrático.
Alguém poderia contra-argumentar dizendo "larga de frescura, política é assim mesmo, é dois pesos duas medidas mesmo". Já vi uma pessoa dizendo isso em um fórum de discussão virtual, em que ele explicava porque ele defendia os palestinos, mas não os kossovares nem os tibetanos. Aí eu respondo dizendo que quem entra muito no dois pesos duas medidas vai ser visto tanto como ridículo que não vai ser mais nem mesmo ser ouvido por pessoas não comprometidas com panelinhas políticas, ou seja, as pessoas que estamos disputando para formar opinião.
Agora, quando não se trata do povo comum, mas sim de políticos profissionais e juristas encontrando pelo em casca de ovo para tentar conseguir um impeachment, aí já é possível ver golpismo nisso aí. O impeachment é um instrumento previsto pela Constituição para afastar e julgar políticos que cometem crimes de responsabilidade durante a vigência de seu mandato. Como houve mobilização por impeachment antes do mandato ter começado, já se demonstra um mal uso do instrumento. Às vezes isso é descarado. Alberto Goldman, um quadro do PSDB, chegou a escrever implicitamente que a eleição de Dilma valia menos porque seus eleitores eram piores, ou seja, mais pobres. Outros defensores do impeachment usam a situação ruim da economia como argumento, ou seja, defendem abertamente que o impeachment seja usado como um voto de desconfiança do parlamentarismo, algo que nossa constituição presidencialista não permite. Ter perdido de forma esmagadora entre eleitores de classe média, ter feito decisões equivocadas na condução da política econômica e pertencer ao mesmo partido que envolvidos em escândalo de corrupção não são motivos para impeachment. Usar o instrumento para esses motivos é golpismo sim.
As pedaladas fiscais poderiam ser um pretexto legal. Mas é mais ou menos como se na vizinhança houvesse um cara que mesmo tendo amigos bem tranqueiras, nunca participou dos malfeitos junto com os amigos, embora alguns vizinhos tenham raiva desse cara por causa dos amigos safados. Aí um dia alguém filma esse cara dando um cálice de vinho para seu filho de 15 anos de idade, algo que muitos pais honestos fazem. Os vizinhos usam isso como pretexto, mas não como o verdadeiro motivo, para mandar o cara para a prisão.
A insatisfação contra a administração Dilma atinge todas as classes sociais, quem não votou e até quem votou nela. Mas os atos dos dias 15/03 e 12/04, embora numerosos em muitas cidades, só tinham gente que não votou nela. Tirando o de São Paulo, quase que só tinha gente da classe média pra cima. Aí não dá para falar que esses atos eram representativos da sociedade brasileira como um todo. Mesmo numerosos, eram representativos apenas de um determinado setor da sociedade brasileira, que ficou indignado com o resultado da eleição. A partir do dia em que até quem votou nela manifestar abertamente o desejo de que a Dilma vá embora, ela provavelmente considerará a possibilidade de renunciar.
Eu votei nela no segundo turno, que é o momento do veto, e não do voto. Se eu for pesquisado sobre se o governo dela é ótimo, bom, regular, ruim ou péssimo, eu responderei ruim. Mas sou a favor de que ela continue até 31 de dezembro de 2018.
Agora, mesmo discordando de quem grita "Fora Dilma", eu acho completamente equivocado achar que isso é ser golpista ou antidemocrático.
Uma opção mais legalista do que impeachment para quem quer abreviar o mandato da Dilma seria fazer uma emenda constitucional permitindo um plebiscito popular para recall do mandato presidencial, convocado em caso de coleta de um determinado número de assinaturas.
Esquerdistas já gritaram Fora para muitos governadores e prefeitos conservadores, e há não muito tempo. Teve Fora Alckmin e Fora Cabral em 2013, Fora Beto Richa em 2015. A esquerda já comemorou a queda mais ou menos recente de muitos presidentes latino-americanos eleitos, como os da Argentina, Equador e Bolívia. Lembro-me de que em 2001 e 2002, revistas de esquerda falavam do "bravo povo argentino", que tinha derrubado De la Rua e seu vice. O presidente do Equador, que em 2005 teve sua queda comemorada pela esquerda, tinha sido eleito em 2002 como um candidato de esquerda. Também teve Fora Feliciano e Fora Cunha.
Aí eu pergunto: desde quando a esquerda considera que a vontade popular só pode ser expressa uma vez a cada quatro anos?
Expressar o desejo de que um mandato seja abreviado não é antidemocrático, isso faz parte da democracia. Se um governante vê que o povo inteiro quer que ele peça pra ir pro banheiro, fazer isso de fato é uma reação natural. Pedir renúncia é um ato bastante democrático.
Alguém poderia contra-argumentar dizendo "larga de frescura, política é assim mesmo, é dois pesos duas medidas mesmo". Já vi uma pessoa dizendo isso em um fórum de discussão virtual, em que ele explicava porque ele defendia os palestinos, mas não os kossovares nem os tibetanos. Aí eu respondo dizendo que quem entra muito no dois pesos duas medidas vai ser visto tanto como ridículo que não vai ser mais nem mesmo ser ouvido por pessoas não comprometidas com panelinhas políticas, ou seja, as pessoas que estamos disputando para formar opinião.
Agora, quando não se trata do povo comum, mas sim de políticos profissionais e juristas encontrando pelo em casca de ovo para tentar conseguir um impeachment, aí já é possível ver golpismo nisso aí. O impeachment é um instrumento previsto pela Constituição para afastar e julgar políticos que cometem crimes de responsabilidade durante a vigência de seu mandato. Como houve mobilização por impeachment antes do mandato ter começado, já se demonstra um mal uso do instrumento. Às vezes isso é descarado. Alberto Goldman, um quadro do PSDB, chegou a escrever implicitamente que a eleição de Dilma valia menos porque seus eleitores eram piores, ou seja, mais pobres. Outros defensores do impeachment usam a situação ruim da economia como argumento, ou seja, defendem abertamente que o impeachment seja usado como um voto de desconfiança do parlamentarismo, algo que nossa constituição presidencialista não permite. Ter perdido de forma esmagadora entre eleitores de classe média, ter feito decisões equivocadas na condução da política econômica e pertencer ao mesmo partido que envolvidos em escândalo de corrupção não são motivos para impeachment. Usar o instrumento para esses motivos é golpismo sim.
As pedaladas fiscais poderiam ser um pretexto legal. Mas é mais ou menos como se na vizinhança houvesse um cara que mesmo tendo amigos bem tranqueiras, nunca participou dos malfeitos junto com os amigos, embora alguns vizinhos tenham raiva desse cara por causa dos amigos safados. Aí um dia alguém filma esse cara dando um cálice de vinho para seu filho de 15 anos de idade, algo que muitos pais honestos fazem. Os vizinhos usam isso como pretexto, mas não como o verdadeiro motivo, para mandar o cara para a prisão.
A insatisfação contra a administração Dilma atinge todas as classes sociais, quem não votou e até quem votou nela. Mas os atos dos dias 15/03 e 12/04, embora numerosos em muitas cidades, só tinham gente que não votou nela. Tirando o de São Paulo, quase que só tinha gente da classe média pra cima. Aí não dá para falar que esses atos eram representativos da sociedade brasileira como um todo. Mesmo numerosos, eram representativos apenas de um determinado setor da sociedade brasileira, que ficou indignado com o resultado da eleição. A partir do dia em que até quem votou nela manifestar abertamente o desejo de que a Dilma vá embora, ela provavelmente considerará a possibilidade de renunciar.
Eu votei nela no segundo turno, que é o momento do veto, e não do voto. Se eu for pesquisado sobre se o governo dela é ótimo, bom, regular, ruim ou péssimo, eu responderei ruim. Mas sou a favor de que ela continue até 31 de dezembro de 2018.
Agora, mesmo discordando de quem grita "Fora Dilma", eu acho completamente equivocado achar que isso é ser golpista ou antidemocrático.
Uma opção mais legalista do que impeachment para quem quer abreviar o mandato da Dilma seria fazer uma emenda constitucional permitindo um plebiscito popular para recall do mandato presidencial, convocado em caso de coleta de um determinado número de assinaturas.
quarta-feira, 8 de julho de 2015
Provavelmente, Aécio, PSDB e direita perderam a eleição presidencial de 2014 porque quiseram
Bill Clinton resumiu muito bem o fator mais determinante de uma eleição: "é a economia, estúpido". São raros os casos em que o resultado de uma eleição não é compatível com a economia. Em geral, quando a economia está bem, a maioria vota na situação. Quando a economia está mal, a maioria vota na oposição.
Em 2014, a economia já não estava bem. Além do mais, havia a imagem ruim ao governo causada pelo escândalo de corrupção da Petrobras. Não era muito difícil uma candidatura de oposição sair vitoriosa do pleito presidencial. Mas também não era uma tarefa elementar. Para sair vitoriosa, a campanha de oposição teria necessariamente de dizer algo para aqueles que só deixariam de votar na situação por causa da situação do país, mas não por alinhamento ideológico com a candidatura de oposição.
Não foi isso que ocorreu. Aécio Neves fez uma campanha voltada exclusivamente para quem já iria votar nele de qualquer maneira. E sinalizou dessa forma que faria um governo voltado exclusivamente para quem já iria votar nele de qualquer maneira. Seus programas de televisão foram completamente inúteis, pois quem votou nele não precisaria tê-los visto para decidir o voto.
Bem diferente do que fez Lula em 2002. O segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso teve duas crises cambiais, crise energética, baixo crescimento do PIB, aumento explosivo da criminalidade e escândalo da privatização do sistema Telebrás, revelado por gravações. Ainda assim, a vitória de uma candidatura de oposição não seria automática. Muitos, mesmo insatisfeitos com Fernando Henrique, ainda pensavam que o PT era radical e tinham objeções à falta de formação acadêmica de Lula. O PT contratou Duda Mendonça para fazer uma campanha voltada especialmente para quem nunca havia votado no Lula. E os resultado, nós conhecemos: 61,3% dos votos válidos no segundo turno.
Aécio, por sua vez, apenas reforçou as convicções de quem já fazia parte de sua base de apoio. Isso foi útil para que sua base ficasse cada vez mais raivosa com inimigos, chegando até mesmo a agressões físicas contra militantes do PT. Mas não foi útil para ganhar a eleição.
A campanha de Aécio falou exaustivamente sobre corrupção. Falou que tinha que "libertar o Brasil do PT", como se o PT tivesse no Planalto na base da força. Falou que a solução para a corrupção era "tirar o PT da presidência", como se seu partido também não tivesse escândalos. O fato é que embora o escândalo da Petrobrás tenha contribuído para aumentar ainda mais o desgaste do PT, somente quem já tem convicção em votar contra o PT considera corrupção um problema exclusivo do PT. O eleitor indeciso considera a corrupção como um problema generalizado da política brasileira. Conquistar esse indeciso envolve necessariamente falar de outros assuntos. Para piorar, Fernando Henrique Cardoso e Alberto Goldman atacaram os eleitores pobres e "desinformados" do PT, dificultando ainda mais a tarefa de conquista-los.
A matemática é muito simples. Lula teve 60,8% dos votos válidos em 2006. Dilma teve 56% dos votos válidos em 2010. Ou seja, qualquer um que quisesse ter no mínimo 50,1% dos votos válidos teria necessariamente de ter votos de quem votou no Lula em 2006 e na Dilma em 2010. Ter votos de quem votou no Lula em 2002 é moleza, Aécio teve muitos deles. Mas, conforme demonstrado, para vencer, era necessário também ter votos de quem votou no Lula em 2006 e na Dilma em 2010. E 2006 e 2010 já fazem parte do período pós-mensalão. Em poucas palavras: qualquer um que quiser ocupar o Palácio do Planalto tem que ter votos de quem já votou no Lula e na Dilma mesmo depois do mensalão. Gostando ou não, ter algo a dizer para essas pessoas é necessário. Falar que "tem que libertar o Brasil do PT", que "é necessário tirar o PT" e que "os eleitores do PT são uns pobres desinformados" não ajuda.
A campanha de Aécio, assim como a campanha de qualquer candidato competitivo, tinha profissionais do marketing político. Não é possível que ninguém tenha prestado atenção ao óbvio uLULAnte.
Por isso, acredito que o Aécio e seu partido não quiseram ganhar a eleição presidencial. Muito provavelmente porque eles não quiseram ter o desgaste de dar o pontapé inicial no ajuste. A economia em 2014 já estava ruim, mas inflação estava abaixo do teto da meta e o crescimento do PIB estava em zero. A inflação só disparou em 2015, quando foram descomprimidos o câmbio, o preço interno dos combustíveis e o preço da energia elétrica (medidas necessárias). O crescimento do PIB só se tornou negativo em 2015, quando começaram as políticas fiscal e monetária contracionistas para segurar essa inflação, que foi resultado da descompressão dos preços. Aécio provavelmente não quis ter o ônus de fazer isso.
Se o PSDB não quis ganhar em 2014, parece que também não quer esperar 2018. Até lá, serão inauguradas a usina de Jirau, a ferrovia Norte-Sul, a ferrovia Transnordestina e a transposição do São Francisco. Depois dos ajustes, a economia pode voltar a crescer em 2018 (vai demorar muito para o Brasil entrar de novo em rota de crescimento acelerado, mas como o Brasil tem potencial para crescer em média 2,5% ao ano e depois de alguns anos de zero, é possível dar um repique de 5% em 2018). Sendo assim, vencer em 2018 não seria uma tarefa tão elementar quanto atualmente se espera. Portanto, é possível que o PSDB já tenha contado com a possibilidade de perder em outubro de 2014, contar uma cassação dupla de Dilma Rousseff e Michel Temer e ganhar a eleição tapa buraco, que seria bem mais fácil (só tomar cuidado porque quem assumiria de forma interina seria Eduardo Cunha e vai que ele resolve mudar a Constituição para permanecer até o fim?).
E um comentário adicional precisa ser feito em relação não apenas ao Aécio e ao PSDB, mas aos setores da sociedade que os apoia. Se Marina Silva tivesse ido ao segundo turno, quase que certamente ela teria vencido a Dilma. Ou seja, acabar com o período de domínio do PT do Palácio do Planalto estava fácil. Mas parece que os setores conservadores da sociedade consideraram que tinha que ser o Aécio mesmo, ou caso contrário, perder.
Resumindo: como dá muito trabalho entrar no Palácio do Planalto pela porta da frente, o PSDB preferiu tentar forçar a entrada no Palácio do Planalto pela porta dos fundos. Peço desculpas ao excelente Gregório Duvivier por usar indevidamente o nome do seu programa.
Em 2014, a economia já não estava bem. Além do mais, havia a imagem ruim ao governo causada pelo escândalo de corrupção da Petrobras. Não era muito difícil uma candidatura de oposição sair vitoriosa do pleito presidencial. Mas também não era uma tarefa elementar. Para sair vitoriosa, a campanha de oposição teria necessariamente de dizer algo para aqueles que só deixariam de votar na situação por causa da situação do país, mas não por alinhamento ideológico com a candidatura de oposição.
Não foi isso que ocorreu. Aécio Neves fez uma campanha voltada exclusivamente para quem já iria votar nele de qualquer maneira. E sinalizou dessa forma que faria um governo voltado exclusivamente para quem já iria votar nele de qualquer maneira. Seus programas de televisão foram completamente inúteis, pois quem votou nele não precisaria tê-los visto para decidir o voto.
Bem diferente do que fez Lula em 2002. O segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso teve duas crises cambiais, crise energética, baixo crescimento do PIB, aumento explosivo da criminalidade e escândalo da privatização do sistema Telebrás, revelado por gravações. Ainda assim, a vitória de uma candidatura de oposição não seria automática. Muitos, mesmo insatisfeitos com Fernando Henrique, ainda pensavam que o PT era radical e tinham objeções à falta de formação acadêmica de Lula. O PT contratou Duda Mendonça para fazer uma campanha voltada especialmente para quem nunca havia votado no Lula. E os resultado, nós conhecemos: 61,3% dos votos válidos no segundo turno.
Aécio, por sua vez, apenas reforçou as convicções de quem já fazia parte de sua base de apoio. Isso foi útil para que sua base ficasse cada vez mais raivosa com inimigos, chegando até mesmo a agressões físicas contra militantes do PT. Mas não foi útil para ganhar a eleição.
A campanha de Aécio falou exaustivamente sobre corrupção. Falou que tinha que "libertar o Brasil do PT", como se o PT tivesse no Planalto na base da força. Falou que a solução para a corrupção era "tirar o PT da presidência", como se seu partido também não tivesse escândalos. O fato é que embora o escândalo da Petrobrás tenha contribuído para aumentar ainda mais o desgaste do PT, somente quem já tem convicção em votar contra o PT considera corrupção um problema exclusivo do PT. O eleitor indeciso considera a corrupção como um problema generalizado da política brasileira. Conquistar esse indeciso envolve necessariamente falar de outros assuntos. Para piorar, Fernando Henrique Cardoso e Alberto Goldman atacaram os eleitores pobres e "desinformados" do PT, dificultando ainda mais a tarefa de conquista-los.
A matemática é muito simples. Lula teve 60,8% dos votos válidos em 2006. Dilma teve 56% dos votos válidos em 2010. Ou seja, qualquer um que quisesse ter no mínimo 50,1% dos votos válidos teria necessariamente de ter votos de quem votou no Lula em 2006 e na Dilma em 2010. Ter votos de quem votou no Lula em 2002 é moleza, Aécio teve muitos deles. Mas, conforme demonstrado, para vencer, era necessário também ter votos de quem votou no Lula em 2006 e na Dilma em 2010. E 2006 e 2010 já fazem parte do período pós-mensalão. Em poucas palavras: qualquer um que quiser ocupar o Palácio do Planalto tem que ter votos de quem já votou no Lula e na Dilma mesmo depois do mensalão. Gostando ou não, ter algo a dizer para essas pessoas é necessário. Falar que "tem que libertar o Brasil do PT", que "é necessário tirar o PT" e que "os eleitores do PT são uns pobres desinformados" não ajuda.
A campanha de Aécio, assim como a campanha de qualquer candidato competitivo, tinha profissionais do marketing político. Não é possível que ninguém tenha prestado atenção ao óbvio uLULAnte.
Por isso, acredito que o Aécio e seu partido não quiseram ganhar a eleição presidencial. Muito provavelmente porque eles não quiseram ter o desgaste de dar o pontapé inicial no ajuste. A economia em 2014 já estava ruim, mas inflação estava abaixo do teto da meta e o crescimento do PIB estava em zero. A inflação só disparou em 2015, quando foram descomprimidos o câmbio, o preço interno dos combustíveis e o preço da energia elétrica (medidas necessárias). O crescimento do PIB só se tornou negativo em 2015, quando começaram as políticas fiscal e monetária contracionistas para segurar essa inflação, que foi resultado da descompressão dos preços. Aécio provavelmente não quis ter o ônus de fazer isso.
Se o PSDB não quis ganhar em 2014, parece que também não quer esperar 2018. Até lá, serão inauguradas a usina de Jirau, a ferrovia Norte-Sul, a ferrovia Transnordestina e a transposição do São Francisco. Depois dos ajustes, a economia pode voltar a crescer em 2018 (vai demorar muito para o Brasil entrar de novo em rota de crescimento acelerado, mas como o Brasil tem potencial para crescer em média 2,5% ao ano e depois de alguns anos de zero, é possível dar um repique de 5% em 2018). Sendo assim, vencer em 2018 não seria uma tarefa tão elementar quanto atualmente se espera. Portanto, é possível que o PSDB já tenha contado com a possibilidade de perder em outubro de 2014, contar uma cassação dupla de Dilma Rousseff e Michel Temer e ganhar a eleição tapa buraco, que seria bem mais fácil (só tomar cuidado porque quem assumiria de forma interina seria Eduardo Cunha e vai que ele resolve mudar a Constituição para permanecer até o fim?).
E um comentário adicional precisa ser feito em relação não apenas ao Aécio e ao PSDB, mas aos setores da sociedade que os apoia. Se Marina Silva tivesse ido ao segundo turno, quase que certamente ela teria vencido a Dilma. Ou seja, acabar com o período de domínio do PT do Palácio do Planalto estava fácil. Mas parece que os setores conservadores da sociedade consideraram que tinha que ser o Aécio mesmo, ou caso contrário, perder.
Resumindo: como dá muito trabalho entrar no Palácio do Planalto pela porta da frente, o PSDB preferiu tentar forçar a entrada no Palácio do Planalto pela porta dos fundos. Peço desculpas ao excelente Gregório Duvivier por usar indevidamente o nome do seu programa.
sábado, 4 de julho de 2015
Sobre a falácia de que "é bom pra democracia existir uma direita"
Provavelmente, muitos já ouviram a seguinte afirmação
"Podemos não concordar com as ideias de Jair Bolsonaro, Eduardo Cunha, Marco Feliciano, Álvaro Dias e Coronel Telhada, mas é bom para a democracia que eles existam. Da mesma forma que uma democracia forte deve ter uma esquerda, também deve ter uma direita".
Ou então
"O Brasil não tem direita. O máximo de direita que o Brasil tem é o PSDB, que não é exatamente de direita. É importante para a democracia que exista uma direita".
Quem fala essas coisas certamente está falando merda. É óbvio que uma democracia exige liberdade de opinião, liberdade de organização e pluralismo ideológico. Portanto, deve haver a possibilidade de existir diferentes partidos políticos, uns mais à esquerda que os outros, outros mais à direita que os uns.
Porém, esquerda e direita são termos relativos. Não existe uma régua absoluta para medir o que é esquerda e o que é direita. Não existe um Political Compass absoluto. Isto vale tanto para indivíduos diferentes, quanto para lugares diferentes, quanto para épocas diferentes. Em relação a indivíduos, sabemos que um esquerdista pode considerar que um centrista é direitista, e que um direitista pode considerar que um centrista é esquerdista. Em relação a lugares, sabemos que por muito tempo, a política da França esteve mais à esquerda do que o espectro político dos Estados Unidos. Um gaullista, que é a direita no espectro político francês, não era muito diferente de um democrata, que é a esquerda no espectro político norte-americano. Equivalentes aos republicanos norte americanos não são muito fortes na França e equivalentes aos socialistas franceses não são muito fortes nos Estados Unidos. Em relação a tempo, sabemos que o mundo atual está à direita do que era no imediato pós Segunda Guerra Mundial e à esquerda do que era no século XIX. Defender sufrágio universal nos dias de hoje é apenas um pré-requisito para não ser dodói (a Veja é dodói e por isso não defende). Defender sufrágio universal era uma posição de extrema-esquerda no século XIX. Ser keynesiano era ser centrista no imediato pós Segunda Guerra Mundial. Ser keynesiano nos dias de hoje é ser de esquerda.
Portanto, não adianta um simples indivíduo tirar da bunda uma régua própria sobre o que é esquerda e o que é direita e decidir que o espectro político do Brasil tem que se distribuir de forma equilibrada nesta régua. Se Fernando Henrique Cardoso, José Serra, Geraldo Alckmin e Aécio Neves foram os mais direitistas entre os candidatos competitivos a presidente do Brasil, eles são a direita no espectro político brasileiro e ponto final. Os brasileiros tiveram a opção de eleger políticos ainda mais à direita e não fizeram porque não quiseram. Isto é democracia. Esperidião Amim e Enéas Carneiro concorreram em 1994. Perderam feio. Enéas concorreu de novo em 1998. Perdeu de novo. Levy Fidelix e Eymael concorreram em 2010 e 2014. Tiveram votação ridícula em ambas as oportunidades. Pastor Everaldo concorreu em 2014 e perdeu feio também. . Ainda assim, Fernando Henrique Cardoso, José Serra, Geraldo Alckmin e Aécio Neves não são totalmente "a direita" no Brasil, pois há deputados muito mais conservadores do PSDB, PMDB, DEM e PP em plena atividade. E mesmo se não houvessem políticos ainda mais conservadores, seria perfeitamente democrático que a direita no Brasil fosse os quatro tucanos citados, desde que esta opção não fosse imposta pela força. Se no Brasil a esquerda fosse o PSDB e a direita fosse o DEM, por vontade popular e não pela força, o sistema político não deixaria de ser democrático. Se no Brasil a esquerda fosse o PSOL e a direita fosse o PT, por vontade popular e não pela força, o sistema político não deixaria de ser democrático.
(Se no Brasil, a esquerda fosse o PSDB e a direita fosse o DEM por causa da possibilidade do poder econômico remover outras opções, aí não seria tão democracia assim)
Se o povo decidir rejeitar fundamentalistas, machistas, racistas, homofóbicos, pobrefóbicos e saudosistas da ditadura, e eles não tiverem boas perspectivas eleitorais, isto é manifestação da democracia e não negação da mesma. Eles não precisam existir só porque na régua de um ou outro reaça, ser neoliberal é apenas ser de centro, e que pra ser de direita é necessário ser machista, racista, homofóbico e pobrefóbico, e que o Brasil ser uma "boa democracia", é necessário que alguém se encaixe como direita nesta régua. Pior: os brasileiros já vem elegendo machistas, racistas, homofóbicos, pobrefóbicos e saudosistas da ditadura.
É legítimo que a esquerda, desde que não seja pela força e sim pelo poder de governar bem e convencer bem, tente tornar inviável alguma força política que se pareça com a direita em outros países. E que a direita tente tornar inviável alguma força política que se pareça com esquerda em outros países. Exemplo disso é o Reino Unido. Depois que Clement Atlee deixou o poder em 1951, Winston Churcill e os conservadores subsequentes não destruíram o que Atlee fez. Depois que Tony Blair assumiu o poder em 1997, ele não destruiu o que Margaret Thatcher e John Major fizeram.
Portanto, quem diz
"Podemos não concordar com as ideias de Jair Bolsonaro, Eduardo Cunha, Marco Feliciano, Álvaro Dias e Coronel Telhada, mas é bom para a democracia que eles existam. Da mesma forma que uma democracia forte deve ter uma esquerda, também deve ter uma direita"
na verdade concorda com as ideias dos nomes mencionados, mas decidiu ainda não sair do armário.
"Podemos não concordar com as ideias de Jair Bolsonaro, Eduardo Cunha, Marco Feliciano, Álvaro Dias e Coronel Telhada, mas é bom para a democracia que eles existam. Da mesma forma que uma democracia forte deve ter uma esquerda, também deve ter uma direita".
Ou então
"O Brasil não tem direita. O máximo de direita que o Brasil tem é o PSDB, que não é exatamente de direita. É importante para a democracia que exista uma direita".
Quem fala essas coisas certamente está falando merda. É óbvio que uma democracia exige liberdade de opinião, liberdade de organização e pluralismo ideológico. Portanto, deve haver a possibilidade de existir diferentes partidos políticos, uns mais à esquerda que os outros, outros mais à direita que os uns.
Porém, esquerda e direita são termos relativos. Não existe uma régua absoluta para medir o que é esquerda e o que é direita. Não existe um Political Compass absoluto. Isto vale tanto para indivíduos diferentes, quanto para lugares diferentes, quanto para épocas diferentes. Em relação a indivíduos, sabemos que um esquerdista pode considerar que um centrista é direitista, e que um direitista pode considerar que um centrista é esquerdista. Em relação a lugares, sabemos que por muito tempo, a política da França esteve mais à esquerda do que o espectro político dos Estados Unidos. Um gaullista, que é a direita no espectro político francês, não era muito diferente de um democrata, que é a esquerda no espectro político norte-americano. Equivalentes aos republicanos norte americanos não são muito fortes na França e equivalentes aos socialistas franceses não são muito fortes nos Estados Unidos. Em relação a tempo, sabemos que o mundo atual está à direita do que era no imediato pós Segunda Guerra Mundial e à esquerda do que era no século XIX. Defender sufrágio universal nos dias de hoje é apenas um pré-requisito para não ser dodói (a Veja é dodói e por isso não defende). Defender sufrágio universal era uma posição de extrema-esquerda no século XIX. Ser keynesiano era ser centrista no imediato pós Segunda Guerra Mundial. Ser keynesiano nos dias de hoje é ser de esquerda.
Portanto, não adianta um simples indivíduo tirar da bunda uma régua própria sobre o que é esquerda e o que é direita e decidir que o espectro político do Brasil tem que se distribuir de forma equilibrada nesta régua. Se Fernando Henrique Cardoso, José Serra, Geraldo Alckmin e Aécio Neves foram os mais direitistas entre os candidatos competitivos a presidente do Brasil, eles são a direita no espectro político brasileiro e ponto final. Os brasileiros tiveram a opção de eleger políticos ainda mais à direita e não fizeram porque não quiseram. Isto é democracia. Esperidião Amim e Enéas Carneiro concorreram em 1994. Perderam feio. Enéas concorreu de novo em 1998. Perdeu de novo. Levy Fidelix e Eymael concorreram em 2010 e 2014. Tiveram votação ridícula em ambas as oportunidades. Pastor Everaldo concorreu em 2014 e perdeu feio também. . Ainda assim, Fernando Henrique Cardoso, José Serra, Geraldo Alckmin e Aécio Neves não são totalmente "a direita" no Brasil, pois há deputados muito mais conservadores do PSDB, PMDB, DEM e PP em plena atividade. E mesmo se não houvessem políticos ainda mais conservadores, seria perfeitamente democrático que a direita no Brasil fosse os quatro tucanos citados, desde que esta opção não fosse imposta pela força. Se no Brasil a esquerda fosse o PSDB e a direita fosse o DEM, por vontade popular e não pela força, o sistema político não deixaria de ser democrático. Se no Brasil a esquerda fosse o PSOL e a direita fosse o PT, por vontade popular e não pela força, o sistema político não deixaria de ser democrático.
(Se no Brasil, a esquerda fosse o PSDB e a direita fosse o DEM por causa da possibilidade do poder econômico remover outras opções, aí não seria tão democracia assim)
Se o povo decidir rejeitar fundamentalistas, machistas, racistas, homofóbicos, pobrefóbicos e saudosistas da ditadura, e eles não tiverem boas perspectivas eleitorais, isto é manifestação da democracia e não negação da mesma. Eles não precisam existir só porque na régua de um ou outro reaça, ser neoliberal é apenas ser de centro, e que pra ser de direita é necessário ser machista, racista, homofóbico e pobrefóbico, e que o Brasil ser uma "boa democracia", é necessário que alguém se encaixe como direita nesta régua. Pior: os brasileiros já vem elegendo machistas, racistas, homofóbicos, pobrefóbicos e saudosistas da ditadura.
É legítimo que a esquerda, desde que não seja pela força e sim pelo poder de governar bem e convencer bem, tente tornar inviável alguma força política que se pareça com a direita em outros países. E que a direita tente tornar inviável alguma força política que se pareça com esquerda em outros países. Exemplo disso é o Reino Unido. Depois que Clement Atlee deixou o poder em 1951, Winston Churcill e os conservadores subsequentes não destruíram o que Atlee fez. Depois que Tony Blair assumiu o poder em 1997, ele não destruiu o que Margaret Thatcher e John Major fizeram.
Portanto, quem diz
"Podemos não concordar com as ideias de Jair Bolsonaro, Eduardo Cunha, Marco Feliciano, Álvaro Dias e Coronel Telhada, mas é bom para a democracia que eles existam. Da mesma forma que uma democracia forte deve ter uma esquerda, também deve ter uma direita"
na verdade concorda com as ideias dos nomes mencionados, mas decidiu ainda não sair do armário.
quarta-feira, 1 de julho de 2015
Regimes comunistas vs. Governos de centro esquerda em países capitalistas
Achava que tudo o que vou escrever aqui era óbvio, mas depois de ter visto neste ano tantas pessoas de capacidade intelectual limitada protestando "contra o comunismo no Brasil", nas ruas e na Internet, considerei adequado tocar no tema.
Falar que tem comunismo no Brasil é uma imbecilidade gigantesca porque regimes comunistas são tão diferentes de governos de centro esquerda de países capitalistas quanto a água é do vinho.
Por regime comunista, entende-se hoje apenas o de Cuba e da Coreia do Norte (há controvérsias quanto este), e até 1989, o da União Soviética, o dos países da Europa Central e Oriental, o da China (até 1978) e alguns outros.
Por governo de centro esquerda de países capitalistas, entende-se existem quando estão no poder o Partido Social Democrata (SPD) da Alemanha, o Partido Democrático da Itália, o Partido Socialista da França, o Partido Trabalhista britânico, o Partido Socialista Operário Espanhol, o Partido Democrata dos Estados Unidos (esse um pouco questionável) e o Partido dos Trabalhadores (PT) no Brasil.
Diferença mais básica: como nos países comunistas quem controla a economia é o Estado, que se confunde com o governo e com o partido, quem tem poder político também tem poder econômico. No caso dos governos de centro esquerda de países capitalistas, os partidos líderes, normalmente, têm relação pacífica com quem tem o poder econômico, que é privado, mas ainda assim não são os partidos favoritos do poder econômico. Enfrentam uma pequena oposição de extrema-esquerda, totalmente desvinculada do poder econômico, mas enfrentam também uma grande oposição de centro-direita, esta sim, o grupo político mais aliado do poder econômico. O regime comunista é o establishment do país comunista. Poder político e econômico estão unidos, polícias e forças armadas reprimem quem é contra o regime. Nos países capitalistas com governo de centro esquerda, não é bem definido quem é o establishment, uma vez que quem tem o poder econômico é aliado de quem faz oposição a quem tem temporariamente o poder político. Simpatizantes do partido do governo correm o risco de levar porrada da polícia em uma greve contra empregador privado, em uma passeata contra líderes direitistas nos poderes legislativo e judiciário e em uma passeata contra governos subnacionais de direita. Polícias e forças armadas estão mais identificadas com quem tem o poder econômico do que com quem tem temporariamente o poder político.
Por causa disso, há algumas semelhanças entre regimes comunistas e governos de direita de países capitalistas, estes sim, que unem poder político e econômico. Entre essas semelhanças, podem ser listados o ódio contra sindicatos livres e contra greves, a defesa de uma política linha dura de segurança pública, a exaltação do patriotismo e a manutenção de um sistema educacional careta. Há algumas semelhanças entre regimes comunistas e governos de centro esquerda de países capitalistas. Ambos defendem grande investimento em educação, saúde pública, previdência, e a tentativa de fazer uma sociedade com pouco desnível da distribuição pessoal de renda. Mas as diferenças são maiores.
Em regimes comunistas, o Estado detém a grande maioria dos meios de produção e planifica centralmente a economia. Não vê problemas em comprimir os salários ao máximo, para aumentar mais a produção de bens de investimento do que de bens de consumo. O papel do Estado nos países capitalistas com governo de centro esquerda é redistribuir renda e manter uma grande rede de proteção social, mas não é deter os meios de produção nem planejar centralmente a economia. Há planejamento estatal em países capitalistas, mas isto ocorreu principalmente em ditaduras militares de direita, como no Brasil e na Coreia do Sul. Há uma propensão levemente maior de partidos de centro esquerda do que de partidos de centro direita em manter empresas públicas. Mas isto depende mais de ondas do que de ideologia de governos. Houve uma onda de estatização em países capitalistas no imediato pós segunda guerra mundial, e até os partidos de centro-direita aceitaram. Houve uma onda de privatização nas décadas de 1980 e 1990, e até os partidos de centro-esquerda aceitaram.
Em países com regimes comunistas, há inicialmente um elevado crescimento do produto. Isto ocorre como resultado do esforço de comprimir os salários, e consequentemente, a produção de bens de consumo, e aumentar a produção de bens de investimento, aumentando o estoque de capital. Este crescimento tem limite quando o simples aumento do estoque de capital perde o poder de aumentar o produto, cujo crescimento passa a depender apenas do progresso técnico. E as economias centralmente planificadas geram pouco incentivo para o progresso técnico (com exceção do militar e alguns notáveis exemplos, como o da medicina em Cuba). Já os países capitalistas com governos de centro esquerda não têm elevadas taxas de crescimento do produto por outro motivo: o estoque de capital não aumenta com facilidade, porque a prioridade desses governos não é o puro e simples crescimento. Esses governos muitas vezes atuam para aumentar a participação dos salários na renda nacional, e isto acaba incentivando maior produção de bens de consumo e menos de bens de investimento.
O Chile de 1970-1973 e a Venezuela desde 1999 são os poucos exemplos de híbrido entre o regime comunista e o governo de centro esquerda de país capitalista.
Falar que tem comunismo no Brasil é uma imbecilidade gigantesca porque regimes comunistas são tão diferentes de governos de centro esquerda de países capitalistas quanto a água é do vinho.
Por regime comunista, entende-se hoje apenas o de Cuba e da Coreia do Norte (há controvérsias quanto este), e até 1989, o da União Soviética, o dos países da Europa Central e Oriental, o da China (até 1978) e alguns outros.
Por governo de centro esquerda de países capitalistas, entende-se existem quando estão no poder o Partido Social Democrata (SPD) da Alemanha, o Partido Democrático da Itália, o Partido Socialista da França, o Partido Trabalhista britânico, o Partido Socialista Operário Espanhol, o Partido Democrata dos Estados Unidos (esse um pouco questionável) e o Partido dos Trabalhadores (PT) no Brasil.
Diferença mais básica: como nos países comunistas quem controla a economia é o Estado, que se confunde com o governo e com o partido, quem tem poder político também tem poder econômico. No caso dos governos de centro esquerda de países capitalistas, os partidos líderes, normalmente, têm relação pacífica com quem tem o poder econômico, que é privado, mas ainda assim não são os partidos favoritos do poder econômico. Enfrentam uma pequena oposição de extrema-esquerda, totalmente desvinculada do poder econômico, mas enfrentam também uma grande oposição de centro-direita, esta sim, o grupo político mais aliado do poder econômico. O regime comunista é o establishment do país comunista. Poder político e econômico estão unidos, polícias e forças armadas reprimem quem é contra o regime. Nos países capitalistas com governo de centro esquerda, não é bem definido quem é o establishment, uma vez que quem tem o poder econômico é aliado de quem faz oposição a quem tem temporariamente o poder político. Simpatizantes do partido do governo correm o risco de levar porrada da polícia em uma greve contra empregador privado, em uma passeata contra líderes direitistas nos poderes legislativo e judiciário e em uma passeata contra governos subnacionais de direita. Polícias e forças armadas estão mais identificadas com quem tem o poder econômico do que com quem tem temporariamente o poder político.
Por causa disso, há algumas semelhanças entre regimes comunistas e governos de direita de países capitalistas, estes sim, que unem poder político e econômico. Entre essas semelhanças, podem ser listados o ódio contra sindicatos livres e contra greves, a defesa de uma política linha dura de segurança pública, a exaltação do patriotismo e a manutenção de um sistema educacional careta. Há algumas semelhanças entre regimes comunistas e governos de centro esquerda de países capitalistas. Ambos defendem grande investimento em educação, saúde pública, previdência, e a tentativa de fazer uma sociedade com pouco desnível da distribuição pessoal de renda. Mas as diferenças são maiores.
Em regimes comunistas, o Estado detém a grande maioria dos meios de produção e planifica centralmente a economia. Não vê problemas em comprimir os salários ao máximo, para aumentar mais a produção de bens de investimento do que de bens de consumo. O papel do Estado nos países capitalistas com governo de centro esquerda é redistribuir renda e manter uma grande rede de proteção social, mas não é deter os meios de produção nem planejar centralmente a economia. Há planejamento estatal em países capitalistas, mas isto ocorreu principalmente em ditaduras militares de direita, como no Brasil e na Coreia do Sul. Há uma propensão levemente maior de partidos de centro esquerda do que de partidos de centro direita em manter empresas públicas. Mas isto depende mais de ondas do que de ideologia de governos. Houve uma onda de estatização em países capitalistas no imediato pós segunda guerra mundial, e até os partidos de centro-direita aceitaram. Houve uma onda de privatização nas décadas de 1980 e 1990, e até os partidos de centro-esquerda aceitaram.
Em países com regimes comunistas, há inicialmente um elevado crescimento do produto. Isto ocorre como resultado do esforço de comprimir os salários, e consequentemente, a produção de bens de consumo, e aumentar a produção de bens de investimento, aumentando o estoque de capital. Este crescimento tem limite quando o simples aumento do estoque de capital perde o poder de aumentar o produto, cujo crescimento passa a depender apenas do progresso técnico. E as economias centralmente planificadas geram pouco incentivo para o progresso técnico (com exceção do militar e alguns notáveis exemplos, como o da medicina em Cuba). Já os países capitalistas com governos de centro esquerda não têm elevadas taxas de crescimento do produto por outro motivo: o estoque de capital não aumenta com facilidade, porque a prioridade desses governos não é o puro e simples crescimento. Esses governos muitas vezes atuam para aumentar a participação dos salários na renda nacional, e isto acaba incentivando maior produção de bens de consumo e menos de bens de investimento.
O Chile de 1970-1973 e a Venezuela desde 1999 são os poucos exemplos de híbrido entre o regime comunista e o governo de centro esquerda de país capitalista.
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