Cristovam Buarque, Marta Suplicy, Eduardo Jorge, Marina Silva, Alessandro Molon, Soninha. O que estes têm em comum?
1. Pertenceram ao PT, mas não pertencem mais
2. Foram para partidos que estão menos à esquerda do que o PT, e não para o PSOL (deste, o Chico Alencar poderia ser o único a ser acrescentado na lista)
3. Têm mais aceitação do que o Lula em grande parte da classe média
4. Perderam espaço dentro do PT antes de saírem do partido
Não estou defendendo-os. Gosto de alguns dos mencionados, de outros não. Apenas percebi estas características em comum.
E o Olívio Dutra, o Eduardo Suplicy e o Aloisio Mercadante?
1. Ainda pertencem ao PT, mas perderam espaço dentro do partido
2. Têm mais aceitação do que o Lula em grande parte da classe média
O Aloisio Mercadante estava sem relevância para o Lula até ser resgatado por Dilma. Neste caso, parecia que Lula estava certo, pois Mercadante não foi um primor de competência em qualquer ministério pelo qual ele circulou.
De qualquer maneira, verifica-se uma tendência de políticos do PT que começaram suas carreiras políticas com maior apoio da classe média do que da classe trabalhadora, e que têm mais aceitação do que o Lula em grande parte da classe média, perderem espaço dentro do partido. Não sei se é só coincidência ou não.
Por outro lado, a Dilma, que sempre teve todo o respaldo do Lula, sempre foi ainda menos popular do que ele dentro da classe média. Lula já teve votação razoavelmente baixa na classe média em 2006. Dilma teve votação menor ainda neste segmento em 2010, e menor ainda em 2014. Em apelo para as classes sociais, Dilma repete os defeitos, mas não as virtudes de Lula. Não tem o mesmo apelo popular que Lula tem (ou tinha), e ao mesmo tempo também gera repulsa na classe média, entre muitos motivos, por alguns discursos bobalhões, como o da criança e do cachorro. E olha que ao contrário de Lula, ela estudou em colégio de elite.
O Haddad é um dos petistas que tem mais aceito do que Lula dentro da classe média. Mas não corre o risco de ir para a geladeira, uma vez que o PT está urgentemente precisando de novos quadros.
sábado, 19 de dezembro de 2015
terça-feira, 15 de dezembro de 2015
Unicameralismo é furada
Acho que uma das muitas lições de ciência política oferecidas pelo ano de 2015 foi a de que o unicameralismo, que era defendido por alguns comentaristas de esquerda, é uma furada. Esses aí consideravam que o Senado tornava qualquer governo refém das oligarquias regionais. É certo que as duas casas do Congresso Nacional são e sempre foram muito conservadoras, mais conservadoras que a média dos candidatos competitivos a presidente da República. O Senado era tradicionalmente a c...asa mais conservadora porque é onde o norte do Brasil está mais super representado (embora na Câmara também esteja) e o norte era a parte mais conservadora do Brasil.
Mas algo diferente aconteceu em 2014. Houve uma grande onda conservadora na opinião pública, e por isso foi eleita uma Câmara ainda mais reacionária (palavra certa é essa) do que já era habitualmente. Como parte do Senado atual foi eleito em 2010, quando o momento político do Brasil era outro, esta casa está menos reacionária que a Câmara, e acabou se tornando um guardião de um mínimo de direitos sociais, políticos e individuais.
Portanto, é bom que o legislativo tenha duas casas, sendo uma delas com mandato longo, para evitar que ondas momentâneas de opinião tenham um efeito tão devastador. Além disso, outras federações, como EUA e Alemanha, também são bicameralistas.
Mas algo diferente aconteceu em 2014. Houve uma grande onda conservadora na opinião pública, e por isso foi eleita uma Câmara ainda mais reacionária (palavra certa é essa) do que já era habitualmente. Como parte do Senado atual foi eleito em 2010, quando o momento político do Brasil era outro, esta casa está menos reacionária que a Câmara, e acabou se tornando um guardião de um mínimo de direitos sociais, políticos e individuais.
Portanto, é bom que o legislativo tenha duas casas, sendo uma delas com mandato longo, para evitar que ondas momentâneas de opinião tenham um efeito tão devastador. Além disso, outras federações, como EUA e Alemanha, também são bicameralistas.
segunda-feira, 14 de dezembro de 2015
O que eu gosto de ler na Internet
http://www.trincheiras.com.br/2015/12/internet-o-que-gosto-de-ler/
Texto mais curto que os habituais. Apenas uma breve lista das minhas leituras favoritas na Internet sobre diversos assuntos.
Texto mais curto que os habituais. Apenas uma breve lista das minhas leituras favoritas na Internet sobre diversos assuntos.
quarta-feira, 9 de dezembro de 2015
A oposição de esquerda deve participar da campanha contra o impeachment?
Se for observar a questão MORAL, a resposta é SIM. O processo de impeachment está sendo conduzido com elevadas doses de mau caratismo. Normal que até pessoas que não apoiam o governo estejam de opondo ao impeachment. Isto ocorre na direita, e também pode ocorrer na esquerda. Não adianta dizer, como os defensores fazem, que "os autores do pedido são Miguel Reale e Hélio Bicudo e não o Eduardo Cunha, que está apenas cumprindo função burocrática". Quem tem o poder de garantir aos menos 100 votos na Câmara é Eduardo Cunha, e não os dois conceituados juristas. Então, a aprovação do impeachment passa por um entendimento com o presidente da Câmara e com muitos deputados do PMDB e do PP investigados pela Lava Jato. E como dizem os economistas, "não existe almoço grátis". O impeachment perderia o poder de ser moralizador da política brasileira. A tentativa de formar uma comissão através de voto secreto adicionou componentes ao mau caratismo. Quanto ao mérito do pedido de impeachment, eu concordo que alguns argumentos de seus opositores mais radicais são fracos. Dizer que "a presidenta nunca roubou" não basta, pois há outros crimes de responsabilidade além de enriquecimento pessoal. Porém, continuo considerando que o impeachment aplicado por causa de descumprimento de pormenores da lei orçamentária é uma reação desproporcional. É como prender um adulto que deu cerveja para seu filho de 15 anos. E, entre as lideranças da campanha pelo impeachment, estão políticos que disseram implicitamente que a eleição de Dilma teve menos legitimidade porque dependeu dos votos dos eleitores muito pobres (que valeriam menos...), que defenderam o voto impresso, ajudando a alimentar a estapafúrdia tese das urnas eletrônicas adulteradas. Por causa disso, motivos para desconfiar são muitos. Algumas vezes, estas lideranças diziam coisas como "vamos lutar pelo impeachment, nossos juristas estão procurando aí uma base legal". Se houvesse uma base legal clara, todos os defensores do impeachment teriam os motivos na ponta da língua desde o início da campanha. Não foi o que ocorreu. Então, se opor ao impeachment seria defender o bom senso e não o governo. A oposição de esquerda poderia pensar também que alguns do que defendem a interrupção do nada esquerdista mandato da Dilma através de um impeachment poderiam defender a interrupção de um governo bastante esquerdista através de tanques.
Mas...
Se for observar a questão POLÍTICA, a resposta é NÃO. Com a desmoralização do PT, as forças políticas de direita tentam ganhar popularidade para sua pauta aproveitando a ignorância de uma grande parte da população que acha que esquerda = PT. E a esquerda fora do PT acaba ajudando isso quando não parece estar suficientemente afastada do PT. Sem uma esquerda claramente desvinculada do PT, a crise do PT se transforma em crise da esquerda. Quem abraça no objeto que está afundando se afunda também. Parece ser uma tolice política não se mostrar completamente desvinculado de um governo com 10% de aprovação. Os motivos do impeachment são frágeis, mas 65% da população brasileira é a favor, porque povo não tem obrigação de ser jurista, e a indignação com corrupção e situação ruim da economia e dos serviços públicos é bastante justa. Quando a maioria da população está com raiva de um governo, quem se diz oposição e quer conseguir apoio popular tem que deixar bem evidente que é... oposição.
Só lembrar que a direita não moveu um dedo para tentar salvar o mandato de Collor, até mesmo aderiu a campanha do impeachment. Collor foi derrubado por uma margem esmagadora. Não impediu que pouco depois, Paulo Maluf fosse eleito prefeito de São Paulo e César Maia fosse eleito prefeito do Rio de Janeiro.
Se o problema do impeachment é falta de base legal, é melhor que o movimento anti-impeachment seja de juristas do que de militantes políticos de esquerda. Até porque a polarização esquerda/direita no momento seria falsa. Parece que vive em outro planeta quem coloca no Facebook a foto da guerrilheira (aí quem faz isso são os governistas). Isto porque a resistência do governo Dilma ao impeachment provavelmente será aumentar ainda mais as concessões aos fisiológicos e ao topo da pirâmide social brasileira. Uma analogia com João Goulart seria falsa, uma vez que quando o General Amaury Kruel propôs a permanência na Presidência em troca de remover a esquerda do governo, Goulart recusou. Embora governistas tentem negar, o governo tentou bajular Eduardo Cunha até o último minuto assim como Stalin tentou bajular Hitler até o último minuto.
Ninguém considera que se ocorrer o impeachment de Dilma e o de Temer logo depois, ou se Temer renunciar logo depois e ocorrer uma nova eleição o vencedor será Luciana Genro, Mauro Iasi ou José Maria. O vencedor muito provavelmente será o Aécio. A conveniência política da esquerda não tentar se opor ao impeachment não é por causa do presente, e sim do futuro. Sobre plantar a semente, construir uma nova base, principalmente entre os mais jovens. Quanto mais a Dilma permanece no Palácio do Planalto, mais a esquerda leva pedradas por um governo que não é seu.
Portanto, não há decisão perfeita e decisão absurda dos partidos de esquerda não governistas (PSOL, PSTU e PCB à esquerda, Rede não "à esquerda", mas ainda assim "de esquerda" se considerar os novos entrantes). A decisão de se engajar contra o impeachment seria justificável do ponto de vista moral. A decisão de não se engajar seria justificável do ponto de vista político.
terça-feira, 8 de dezembro de 2015
segunda-feira, 30 de novembro de 2015
sábado, 28 de novembro de 2015
Reflexões sobre o voto "50 no primeiro turno, 13 no segundo turno"
Sem o calor do clima de eleições, pois estamos quase equidistantes da de 2014 e da de 2016 (embora alguns insistam que a eleição de 2014 ainda não tenha acabado), posso fazer uma reflexão com mais calma sobre o que significa votar 50 no primeiro turno e 13 no segundo turno.
Durante muito tempo eu fui simpático a este tipo de voto, mas agora me veio à mente esta constatação: o voto "50 no primeiro turno, 13 no segundo turno" é um dos tipos de voto de esquerda mais quadrados que existem. Muitas vezes, a ideia que está por trás deste tipo de voto é a de que a única coisa que importa nos candidatos é o quanto eles são de esquerda. Que esquerdismo é a única coisa que conta (a versão mais extrema disso seria votar não 50, mas 16 no primeiro turno).
Quem vota 13 em qualquer turno considera que o esquerdismo do 50 está fora da realidade, que estar mais à esquerda não significa necessariamente ser melhor. Quem vota 50 no primeiro turno e anula no segundo turno considera que mesmo o 13 estando um pouquinho à esquerda do 45, endossar esse "um pouquinho à esquerda" pode não ser uma opção melhor do que trabalhar por um "bem mais à esquerda" para o futuro, ou que mesmo quem está "um pouquinho à esquerda" pode, por motivos diferentes do eixo esquerda/direita, não merecer o apoio.
Claro que há exceções. Em 2014, feministas votaram na Luciana Genro no primeiro turno e na Dilma Rousseff no segundo turno não apenas por causa de esquerdismo.
Votar 50 no primeiro turno, 13 no segundo turno foi uma prática muito comum entre muitos militantes de esquerda. Uma exceção foi Idelber Avelar. Ele nunca fez isso. De 1989 a 2006 ele apoiou o Lula no primeiro e no segundo turno (quando houve, óbvio). Em 2010, ele apoiou a Dilma no primeiro e no segundo turno. Em 2014, ele defendeu o voto em Mauro Iasi no primeiro turno e nulo no segundo turno. Teria defendido o voto em Marina no segundo turno se ela tivesse ido para o segundo turno, seja contra Dilma, seja contra Aécio. Antes eu não compreendia o Idelber Avelar direito, mas atualmente estou enxergando-o como um dos mais lúcidos pensadores brasileiros de esquerda. Mais adiante pretenderei escrever um post só sobre o que penso sobre ele.
Por fim, há um único voto de esquerda mais quadrado do que o "50 no primeiro turno, 13 no segundo turno". É o "13 no primeiro turno, 13 no segundo turno", mas não com a convicção de das limitações do 50 e sim por achar que tem que evitar o segundo turno.
É tão complicada a política no Brasil... Quem vota 13 é de esquerda moderada e quem vota 50 é de esquerda radical? Geralmente é assim, mas nem sempre. Tem gente de esquerda moderada que vota 50 porque não quer votar em um partido relacionado com escândalos de corrupção. Tem gente de esquerda radical que vota 13 porque acha que a esquerda não pode se dividir em diferentes partidos.
E eu em 2018? Entre Lula, Aécio Neves, Geraldo Alckmin, Eduardo Paes, Marina Silva e Luciana Genro, votaria 84 (meu ano de nascimento) em qualquer turno.
Durante muito tempo eu fui simpático a este tipo de voto, mas agora me veio à mente esta constatação: o voto "50 no primeiro turno, 13 no segundo turno" é um dos tipos de voto de esquerda mais quadrados que existem. Muitas vezes, a ideia que está por trás deste tipo de voto é a de que a única coisa que importa nos candidatos é o quanto eles são de esquerda. Que esquerdismo é a única coisa que conta (a versão mais extrema disso seria votar não 50, mas 16 no primeiro turno).
Quem vota 13 em qualquer turno considera que o esquerdismo do 50 está fora da realidade, que estar mais à esquerda não significa necessariamente ser melhor. Quem vota 50 no primeiro turno e anula no segundo turno considera que mesmo o 13 estando um pouquinho à esquerda do 45, endossar esse "um pouquinho à esquerda" pode não ser uma opção melhor do que trabalhar por um "bem mais à esquerda" para o futuro, ou que mesmo quem está "um pouquinho à esquerda" pode, por motivos diferentes do eixo esquerda/direita, não merecer o apoio.
Claro que há exceções. Em 2014, feministas votaram na Luciana Genro no primeiro turno e na Dilma Rousseff no segundo turno não apenas por causa de esquerdismo.
Votar 50 no primeiro turno, 13 no segundo turno foi uma prática muito comum entre muitos militantes de esquerda. Uma exceção foi Idelber Avelar. Ele nunca fez isso. De 1989 a 2006 ele apoiou o Lula no primeiro e no segundo turno (quando houve, óbvio). Em 2010, ele apoiou a Dilma no primeiro e no segundo turno. Em 2014, ele defendeu o voto em Mauro Iasi no primeiro turno e nulo no segundo turno. Teria defendido o voto em Marina no segundo turno se ela tivesse ido para o segundo turno, seja contra Dilma, seja contra Aécio. Antes eu não compreendia o Idelber Avelar direito, mas atualmente estou enxergando-o como um dos mais lúcidos pensadores brasileiros de esquerda. Mais adiante pretenderei escrever um post só sobre o que penso sobre ele.
Por fim, há um único voto de esquerda mais quadrado do que o "50 no primeiro turno, 13 no segundo turno". É o "13 no primeiro turno, 13 no segundo turno", mas não com a convicção de das limitações do 50 e sim por achar que tem que evitar o segundo turno.
É tão complicada a política no Brasil... Quem vota 13 é de esquerda moderada e quem vota 50 é de esquerda radical? Geralmente é assim, mas nem sempre. Tem gente de esquerda moderada que vota 50 porque não quer votar em um partido relacionado com escândalos de corrupção. Tem gente de esquerda radical que vota 13 porque acha que a esquerda não pode se dividir em diferentes partidos.
E eu em 2018? Entre Lula, Aécio Neves, Geraldo Alckmin, Eduardo Paes, Marina Silva e Luciana Genro, votaria 84 (meu ano de nascimento) em qualquer turno.
sexta-feira, 27 de novembro de 2015
Apesar do Trincheiras, este blog continua
Atualmente, estou me dedicando a escrever textos longos para o Trincheiras. Estou utilizando este blog para dar link para os textos meus no Trincheiras.
Mas eu não vou deixar de escrever textos exclusivamente para este blog. Para o Trincheiras, eu escreverei textos mais elaborados, mais relacionados as minhas áreas de conhecimento e experiência, mais cuidadosos para evitar chutões.
Aqui, serão textos mais informais, mais descuidados. Serão pensamentos que eu peido. Sem temor de dar uns chutões de vez em quando. Este blog será como um Facebook, com a diferença de que aqui eu coloco textos que eu não acho que meus parentes, ex-colegas de escola e faculdade, ex-colegas de trabalho e colegas de trabalho tenham que ler sem ter voluntariamente decidido ler.
Mas eu não vou deixar de escrever textos exclusivamente para este blog. Para o Trincheiras, eu escreverei textos mais elaborados, mais relacionados as minhas áreas de conhecimento e experiência, mais cuidadosos para evitar chutões.
Aqui, serão textos mais informais, mais descuidados. Serão pensamentos que eu peido. Sem temor de dar uns chutões de vez em quando. Este blog será como um Facebook, com a diferença de que aqui eu coloco textos que eu não acho que meus parentes, ex-colegas de escola e faculdade, ex-colegas de trabalho e colegas de trabalho tenham que ler sem ter voluntariamente decidido ler.
quarta-feira, 25 de novembro de 2015
segunda-feira, 16 de novembro de 2015
domingo, 15 de novembro de 2015
Os mit(c)os monarquistas
A maior praga dos grupos virtuais de discussão de História são os monarquistas. Eles adoram apresentar uns argumentos a favor do período que foi de 1822 a 1889. Argumentos furados.
1. O Brasil viveu um período de prosperidade naquele tempo
Hmmm, não. Foi justamente no século XIX que o Brasil ficou para trás. Em 1820, o PIB per capita no Brasil não era muito distante do PIB per capita dos países atualmente desenvolvidos. Em 1900, a diferença já era enorme, parecida com a atual. A economia do Brasil cresceu no século XIX. Mas a dos países atualmente desenvolvidos cresceu muito mais. Foi também ao longo do século XIX que a Argentina deixou o Brasil para trás.
2. Houve um grande desenvolvimento cultural no Brasil naquele tempo
Em 1889, 70% da população adulta do Brasil era analfabeta. A primeira universidade brasileira foi inaugurada em 1920, já na República. México e Peru já tinham universidades no século XVII.
3. O Imperador Dom Pedro II era contra a escravidão
Então ele era muito incompetente, porque a escravidão durou 48 dos 49 anos do governo dele.
4. Havia estabilidade política no tempo do Império, ao contrário do que houve na República, quando ocorreram muitos golpes de Estado
Decidam, das duas uma. Se for aceita a hipótese de que quem mandava era o Imperador, a tal "estabilidade política" foi na verdade uma ditadura, pois teria sido um único cara mandando por quase meio século. Se for aceita a hipótese de que quem mandava era o Presidente do Conselho de Ministros, não havia estabilidade política, pois os mandatos costumavam durar entre um e dois anos, parecendo mandato de Primeiro Ministro da Itália do século XX. E foi o Império o período da história em que o Brasil mais participou de guerras. Ah, e é engraçado ver simpatizante da monarquia falando mal da República porque houve muito golpe de Estado. Isto porque alguns monarquistas são bem simpáticos àquele que ocorreu em 1964.
5. O povão gostava do Imperador e viu de braços cruzados a Proclamação da República
Pode até ser verdade, mas não há como ter certeza, pois em 1889 não havia Ibope nem Datafolha. Em 1822, a monarquia foi implementada sem que o povo tivesse sido perguntado. A única vez em que o povo foi perguntado se queria a República ou a Monarquia foi no plebiscito de 1993. A República ganhou de lavada.
Depois de 126 anos de República, o Brasil continua não sendo um país que queríamos que fosse. Mas isto não quer dizer que o período do Império fosse melhor. Não era.
1. O Brasil viveu um período de prosperidade naquele tempo
Hmmm, não. Foi justamente no século XIX que o Brasil ficou para trás. Em 1820, o PIB per capita no Brasil não era muito distante do PIB per capita dos países atualmente desenvolvidos. Em 1900, a diferença já era enorme, parecida com a atual. A economia do Brasil cresceu no século XIX. Mas a dos países atualmente desenvolvidos cresceu muito mais. Foi também ao longo do século XIX que a Argentina deixou o Brasil para trás.
2. Houve um grande desenvolvimento cultural no Brasil naquele tempo
Em 1889, 70% da população adulta do Brasil era analfabeta. A primeira universidade brasileira foi inaugurada em 1920, já na República. México e Peru já tinham universidades no século XVII.
3. O Imperador Dom Pedro II era contra a escravidão
Então ele era muito incompetente, porque a escravidão durou 48 dos 49 anos do governo dele.
4. Havia estabilidade política no tempo do Império, ao contrário do que houve na República, quando ocorreram muitos golpes de Estado
Decidam, das duas uma. Se for aceita a hipótese de que quem mandava era o Imperador, a tal "estabilidade política" foi na verdade uma ditadura, pois teria sido um único cara mandando por quase meio século. Se for aceita a hipótese de que quem mandava era o Presidente do Conselho de Ministros, não havia estabilidade política, pois os mandatos costumavam durar entre um e dois anos, parecendo mandato de Primeiro Ministro da Itália do século XX. E foi o Império o período da história em que o Brasil mais participou de guerras. Ah, e é engraçado ver simpatizante da monarquia falando mal da República porque houve muito golpe de Estado. Isto porque alguns monarquistas são bem simpáticos àquele que ocorreu em 1964.
5. O povão gostava do Imperador e viu de braços cruzados a Proclamação da República
Pode até ser verdade, mas não há como ter certeza, pois em 1889 não havia Ibope nem Datafolha. Em 1822, a monarquia foi implementada sem que o povo tivesse sido perguntado. A única vez em que o povo foi perguntado se queria a República ou a Monarquia foi no plebiscito de 1993. A República ganhou de lavada.
Depois de 126 anos de República, o Brasil continua não sendo um país que queríamos que fosse. Mas isto não quer dizer que o período do Império fosse melhor. Não era.
terça-feira, 10 de novembro de 2015
sábado, 7 de novembro de 2015
Entrevistei o Maurício Santoro para o Trincheiras
Link para a entrevista que fiz com o professor de Relações Internacionais da UERJ Maurício Santoro. Os assuntos abordados foram direitos humanos, política nacional e política internacional.
http://www.trincheiras.com.br/2015/11/portal-trincheiras-entrevista-mauricio-santoro/
http://www.trincheiras.com.br/2015/11/portal-trincheiras-entrevista-mauricio-santoro/
quinta-feira, 5 de novembro de 2015
Como estou interpretando o segundo turno na Argentina
Lendo as notícias sobre o segundo turno da eleição presidencial da Argentina, entendi que os candidatos Daniel Scioli e Mauricio Macri têm propostas muito parecidas, e que só se diferenciam porque um apoiou e tem apoio da Cristina Kirshner e o outro não.
Eu penso que é como se a Dilma se mantivesse aos trancos e barrancos no cargo até 2018, e, percebendo que é impossível fazer um sucessor no PT, apoiar a candidatura de Eduardo Paes, do PMDB. Aí acontecer um segundo turno entre Eduardo Paes e Aécio Neves. Acredito que teria gente na esquerda pregando o "voto crítico" no Paes por ser o "mal menor".
Eu penso que é como se a Dilma se mantivesse aos trancos e barrancos no cargo até 2018, e, percebendo que é impossível fazer um sucessor no PT, apoiar a candidatura de Eduardo Paes, do PMDB. Aí acontecer um segundo turno entre Eduardo Paes e Aécio Neves. Acredito que teria gente na esquerda pregando o "voto crítico" no Paes por ser o "mal menor".
domingo, 1 de novembro de 2015
Por que escrever no Trincheiras
Escrevi este texto no Trincheiras sobre porque eu escrevo no Trincheiras
http://www.trincheiras.com.br/2015/10/por-que-escrever-no-trincheiras/
Cliquem e leiam
http://www.trincheiras.com.br/2015/10/por-que-escrever-no-trincheiras/
Cliquem e leiam
terça-feira, 27 de outubro de 2015
Por que a Carta Capital nunca decolou?
Que não decola agora não é difícil de entender. A Internet fez minguar os periódicos de papel. A pergunta é: por que não decolou antes da massificação da Internet? Por que não se consolidou no tempo em que se lia só no papel? Se tivesse se consolidado naquele tempo, ainda venderia muitos exemplares hoje (mesmo que se fosse decrescente com o tempo), e teria um site muito acessado.
Por que é um percentual tão pequeno da população brasileira que lê Carta Capital?
Uma possível explicação (não quer dizer que eu tenha certeza) é: revista semanal de variedades é um produto cujo consumidor típico é de direita e ponto final. Não adianta tentar fazer uma revista semanal de variedades de esquerda. Seria igual tentar fazer um sarau de direita.
A primeira revista semanal de variedades foi a norte-americana Time, que inspirou as demais. É de direita. A compatriota Newsweek também. As alemãs Spiegel e Focus também tendem mais para a direita (embora a Spiegel já tenha tido uma bem leve tendência de esquerda no passado). A britânica Economist é mais antiga que a Time, do século XIX, mas deixou de ser jornal e passou a ser revista bem depois. É mais intelectualmente sofisticada, mas continua sendo uma revista semanal de variedades. Pelo menos em economia, é de direita. Da Veja e da Época, nem precisa falar muito.
Por que o consumidor típico de revista semanal de variedade é de direita?
Luís Nassif, ao falar da Time, definiu assim este tipo de produto:
"O lançamento da revista Time foi um divisor de águas na imprensa mundial, conferindo um novo status às revistas semanais, uma influência política sobre a opinião pública equiparável à dos grandes diários e inspirando similares em todos os países, muitos deles tendo a própria Time-Life como sócia.
O estilo Time consistia em organizar o universo (já abundante) das notícias diárias em uma periodicidade mais cômoda para o leitor – a semanal -, selecionando um universo restrito de temas, mas embalando-os de forma agradável, com um texto eminentemente opinativo que fosse compreendido pelo leitor mediano.
Para obter esse alcance, havia uma simplificação de tal ordem, especialmente em cima de temas complexos."
http://jornalggn.com.br/noticia/uma-pequena-historia-da-midia-brasileira-nos-50-anos-da-globo
Ou seja, o típico leitor de revista semanal de variedades tem nível intelectual médio. Suficiente para ler textos não muito curtos, mas apreciador de abordagens mastigadas de temas. Isto é o perfil de quem tem a instrução necessária para ter bom poder aquisitivo, normalmente, curso superior completo, cultura necessária para a convivência social, mas não enxerga a instrução como um fim em si. Em geral, pessoas assim são de direita.
Já as pessoas de esquerda são os extremos em instrução. Há os trabalhadores sem curso superior, que podem ler jornais feitos para este público, mas não são o perfil típico de leitores de revista. E os esquerdistas de classe média são, em geral, pessoas mais letradas que, quando querem ler opinião, preferem livros e revistas especializadas. Nota-se que esquerdistas de classe média são, em geral, estudantes universitários, professores universitários ou funcionários públicos (lembrando que estes conseguem a ocupação respondendo a uma prova).
Não é apenas no Brasil que existe esta relação entre instrução e orientação política. Nos Estados Unidos, a maioria das pessoas que só tem o high school ou nem isso (pobres) vota nos democratas. Quem tem o graduate school (equivalente a pós) também. Quem mais vota nos republicanos é quem tem apenas o college.
E não é apenas revista semanal de variedades o meio de comunicação cujo consumidor típico é de direita. O rádio também. A CBN é de direita. Quem ouve um comentarista daquela rádio, ouve todos. Arnaldo Jabor, Merval Pereira, Carlos Sardenberg..., tudo igual. Porém, a CBN, comparada com a Jovem Pan, é até meio social democrata. Por que o típico ouvinte de rádio é de direita? Normalmente é quem tem alto poder aquisitivo, mora em casa, longe do trabalho, e vai de automóvel particular.
Por que é um percentual tão pequeno da população brasileira que lê Carta Capital?
Uma possível explicação (não quer dizer que eu tenha certeza) é: revista semanal de variedades é um produto cujo consumidor típico é de direita e ponto final. Não adianta tentar fazer uma revista semanal de variedades de esquerda. Seria igual tentar fazer um sarau de direita.
A primeira revista semanal de variedades foi a norte-americana Time, que inspirou as demais. É de direita. A compatriota Newsweek também. As alemãs Spiegel e Focus também tendem mais para a direita (embora a Spiegel já tenha tido uma bem leve tendência de esquerda no passado). A britânica Economist é mais antiga que a Time, do século XIX, mas deixou de ser jornal e passou a ser revista bem depois. É mais intelectualmente sofisticada, mas continua sendo uma revista semanal de variedades. Pelo menos em economia, é de direita. Da Veja e da Época, nem precisa falar muito.
Por que o consumidor típico de revista semanal de variedade é de direita?
Luís Nassif, ao falar da Time, definiu assim este tipo de produto:
"O lançamento da revista Time foi um divisor de águas na imprensa mundial, conferindo um novo status às revistas semanais, uma influência política sobre a opinião pública equiparável à dos grandes diários e inspirando similares em todos os países, muitos deles tendo a própria Time-Life como sócia.
O estilo Time consistia em organizar o universo (já abundante) das notícias diárias em uma periodicidade mais cômoda para o leitor – a semanal -, selecionando um universo restrito de temas, mas embalando-os de forma agradável, com um texto eminentemente opinativo que fosse compreendido pelo leitor mediano.
Para obter esse alcance, havia uma simplificação de tal ordem, especialmente em cima de temas complexos."
http://jornalggn.com.br/noticia/uma-pequena-historia-da-midia-brasileira-nos-50-anos-da-globo
Ou seja, o típico leitor de revista semanal de variedades tem nível intelectual médio. Suficiente para ler textos não muito curtos, mas apreciador de abordagens mastigadas de temas. Isto é o perfil de quem tem a instrução necessária para ter bom poder aquisitivo, normalmente, curso superior completo, cultura necessária para a convivência social, mas não enxerga a instrução como um fim em si. Em geral, pessoas assim são de direita.
Já as pessoas de esquerda são os extremos em instrução. Há os trabalhadores sem curso superior, que podem ler jornais feitos para este público, mas não são o perfil típico de leitores de revista. E os esquerdistas de classe média são, em geral, pessoas mais letradas que, quando querem ler opinião, preferem livros e revistas especializadas. Nota-se que esquerdistas de classe média são, em geral, estudantes universitários, professores universitários ou funcionários públicos (lembrando que estes conseguem a ocupação respondendo a uma prova).
Não é apenas no Brasil que existe esta relação entre instrução e orientação política. Nos Estados Unidos, a maioria das pessoas que só tem o high school ou nem isso (pobres) vota nos democratas. Quem tem o graduate school (equivalente a pós) também. Quem mais vota nos republicanos é quem tem apenas o college.
E não é apenas revista semanal de variedades o meio de comunicação cujo consumidor típico é de direita. O rádio também. A CBN é de direita. Quem ouve um comentarista daquela rádio, ouve todos. Arnaldo Jabor, Merval Pereira, Carlos Sardenberg..., tudo igual. Porém, a CBN, comparada com a Jovem Pan, é até meio social democrata. Por que o típico ouvinte de rádio é de direita? Normalmente é quem tem alto poder aquisitivo, mora em casa, longe do trabalho, e vai de automóvel particular.
sábado, 24 de outubro de 2015
Escreva para os deputados que votaram a favor do PL 5069/2013
Este link tem a lista dos deputados de merda que votaram a favor do PL 5069/2013. Entrem nas páginas deles no Facebook e escrevam mensagens de indignação. Alguns são tão covardes que nada postaram sobre o PL. Mas não tem problema: escrevam comentário em post sobre outros assuntos mesmo.
http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2015-10-22/dos-piores-retrocessos-diz-deputada-sobre-pl-que-dificulta-aborto-apos-estupro.html
http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2015-10-22/dos-piores-retrocessos-diz-deputada-sobre-pl-que-dificulta-aborto-apos-estupro.html
sábado, 17 de outubro de 2015
É necessário ser de direita para ser um bom economista?
Meu primeiro texto postado no www.trincheiras.com.br
Tanto economistas de direita quanto alguns sociólogos, antropólogos, historiadores, geógrafos, pedagogos e filósofos de esquerda concordam com uma afirmativa: a de que um bom economista precisa ser de direita. Os primeiros por desprezar esquerdistas. Os segundos por desprezar economistas. Para todos esses, falar “economista de esquerda” é motivo de risadinha. Então, este texto trata da seguinte questão: um bom economista precisa ou não ser de direita?
A resposta é: NÃO, mas … . Isso mesmo, há um “mas”. Um bom economista não precisa ser de direita, também pode ser de esquerda, de centro ou não ser de uma coisa, nem outra, nem outra. Mas há alguns motivos que fazem algumas pessoas pensarem que bom economista precisa ser de direita. Então, primeiro devem ser discutidos estes motivos, para depois mostrar que eles não são suficientes.
Algumas pessoas acreditam que bons economistas precisam ser de direita porque:
Qualquer economista que publica com frequência e que recebe um bom número de citações acredita que, em geral, o mercado é um bom mecanismo de alocar recursos
Modelos básicos de Microeconomia mostram que intervenção do Estado só atrapalha
Há, muitas vezes, relação negativa entre distribuição e crescimento, entre equidade e eficiência
Existem muitos textos ruins de esquerda sobre Economia
A percepção de que Economia é uma ciência de direita é equivocada mas existe e é influente, e, por causa disso, é mais comum jovens de 17 anos de direita quererem prestar vestibular para Economia do que jovens de 17 anos de esquerda. Quatro anos depois, pegam o canudo e saem por aí defendendo ideias de direita não porque o conhecimento acadêmico recebido influenciou, mas porque pescou no conhecimento acadêmico recebido aquilo que satisfazia a ideologia que já possuía antes de iniciar os estudos.
Mas não é verdade que um bom economista precisa ser de direita porque:
Não é necessário ser de direita nem mesmo pró capitalismo para entender que não é possível deixar de existir mercados
Economistas que publicam com frequência e que recebem um bom número de citações acreditam que, em geral, o mercado é um bom mecanismo de alocar recursos, e também que existem falhas de mercado
Pode haver relação positiva e pode haver relação negativa entre distribuição e crescimento, entre equidade e eficiência, mas não há qualquer lei científica que diz que crescimento deve prevalecer sobre distribuição, que eficiência deve prevalecer sobre equidade
Economistas não precisam necessariamente aderir a teorias ortodoxas, e mesmo as teorias ortodoxas em si não são de direita, os seus teóricos que normalmente são
Existem muitos textos ruins de esquerda sobre Economia, e também existem muitos textos ruins de direita sobre Economia
Em aulas introdutórias de Microeconomia, os alunos aprendem modelos básicos que dizem que controles de preço causam falta de bens, salário mínimo e piso sindical causam desemprego, e impostos progressivos causam desestímulo ao trabalho. Estes modelos são ortodoxos.
Em ciência econômica, existem os pensadores ortodoxos e os pensadores heterodoxos. Os primeiros procuram descrever as leis da economia através de modelos matemáticos feitos com base na premissa de que o sistema é composto por agentes racionais maximizadores. Os modelos são testados por econometria para ver se são adequados à realidade. Os segundos tentam tirar da própria observação da realidade as leis da economia. Embora ortodoxos sejam habitualmente relacionados com direita e heterodoxos com esquerda, a relação não é automática nem com um nem com o outro.
A realidade respalda o modelo mais básico sobre controles de preços. Políticas de teto de preço de alimentos geram prateleiras vazias e longas filas. Atualmente, nenhum economista defende este tipo de política, nem ortodoxo, nem heterodoxo, nem de direita, nem de centro, nem de esquerda.
É possível acreditar que o mercado aloca bens os recursos, mas não os distribui da maneira mais justa, e que por isso o Estado deveria ter papel na redistribuição. Também é possível defender um socialismo de cooperativas que concorrem entre si no mercado.
Sobre salário mínimo, piso sindical e impostos progressivos, os modelos básicos não descrevem o que realmente ocorre. Há inúmeros exemplos históricos de aumentos de salário mínimo e fortalecimento de sindicatos em que não houve aumento de desemprego, e de economias que funcionaram e funcionam muito bem mesmo com elevadas alíquotas de imposto de renda para pessoas físicas com altíssima renda. Tomem o caso dos Estados Unidos, por exemplo. Do final da Segunda Guerra Mundial até a chegada de Reagan ao poder em 1980, o país tinha políticas que atualmente seriam tidas como “de esquerda”: crescimento do salário mínimo real acompanhando o crescimento produtividade, sindicatos fortes, fluxos de capital regulados, elevada alíquota máxima de imposto de renda. De 1980 pra cá, as políticas passaram a ser fortemente de direita: salário mínimo real estagnado ou declinante, sindicatos fracos, fluxos de capital desregulados e modesta alíquota máxima de imposto de renda. Não houve diferença significativa de crescimento do PIB per capita entre os dois períodos. Já a renda da família mediana cresceu bem mais no primeiro do que no segundo período. Ou seja, as políticas de direita não fizeram a economia norte-americana funcionar melhor. Não precisa ser contra salário mínimo ou ser contra elevada alíquota máxima de imposto de renda para ser um bom economista.
Não precisa sequer ser heterodoxo para discordar das “verdades” demonstradas pelos modelos ortodoxos mais básicos de Microeconomia. Mesmo modelos ortodoxos mais sofisticados sobre mercado de capitais, mercado de trabalho, tributação e comércio internacional apresentam conclusões diferentes daquelas demonstradas por modelos básicos.
Assim como economistas de qualquer tribo reconhecem que não podemos abrir mão de mercados, também reconhecem que existem as falhas de mercado, que incluem poder de mercado (monopólio, oligopólio, monopsônio, oligopsônio), externalidades, informação assimétrica e bens públicos. Há divergências sobre o que é mais custoso para a sociedade: as falhas de mercado em si ou as tentativas de corrigi-las. No exato momento em que algum reaça está falando que esquerdistas não entendem porra nenhuma de economia porque são sabem como os mercados são tão bons e em que algum revoluça está falando que economistas são pessoas sem noção porque acham que mercado é igual a Deus, algum economista acadêmico está debruçado sobre seu próximo paper a publicar sobre falhas de mercados, elaborando modelos enormes repletos de letras gregas.
E sobre o conflito entre distribuição e crescimento? Equidade e eficiência? Alguns dizem que um bom economista deve saber que o que é melhor para diminuir a desigualdade da distribuição de renda não é o melhor para produzir crescimento, e que, portanto, quem domina a ciência econômica deveria se opor às políticas de redução de desigualdade, em nome de maior crescimento.
É verdade que esta relação negativa é válida, mas não é verdade que ela é sempre válida. Desigualdade muito alta não estimula, mas inibe o crescimento, porque gera tensões sociais, porque se os pobres são muito pobres a qualidade da força de trabalho é baixa e porque o subconsumo pode gerar recessão de demanda. Por outro lado, é verdade que desigualdade muito baixa também pode inibir o crescimento. Se a recompensa não é muito grande, menos pessoas podem se sentir estimuladas a se qualificar, empreender, inovar e poupar. E também, como mais dinheiro no bolso do pobre significa mais consumo e mais dinheiro no bolso do rico pode significar mais investimento (depois que cansar de consumir tanto iate e uísque). A relação entre distribuição e crescimento pode ser vista no gráfico a seguir.
Por que fala-se tanto sobre o impacto negativo das políticas que enfocam a distribuição (a zona rosa do gráfico) e tão pouco sobre o impacto positivo (a zona amarela do gráfico)? Porque muitas vezes a política consegue eliminar a possibilidade da zona amarela virar realidade. Se há uma sociedade em que a desigualdade é tão alta que inibe o crescimento, ao invés de estimular, ou o governo que tolera isso é derrotado na próxima eleição, e se não há democracia, é derrubado em uma revolução. Por isso as opções politicamente mais viáveis são as zonas laranja e rosa, e desta maneira, vem o imaginário de que preocupar-se com distribuição é ruim para o crescimento.
O fato de ser importante reconhecer que existe a zona rosa não implica que um bom economista tem que defender um nível de preocupação com a distribuição renda na zona laranja, compatível com um crescimento máximo. Nenhuma ciência faz julgamento de valor, portanto, nenhuma ciência diz que crescimento tem que ser a prioridade máxima. Tudo bem que um Índice de Gini igual a zero não é funcional para a economia, nem mesmo justo. Nem Thomas Piketty defende isso. Mas ainda assim é perfeitamente possível defender que o ponto ótimo para a sociedade se localize na zona rosa, e não na zona laranja.
Interessante observar a História. Como foi mencionado, a economia norte-americana entre 1950 e 1980, quando era mais igualitária, não teve desempenho pior do que teve a partir de 1980, quando passou a ser bem mais desigual. É verdade que os Estados Unidos e o Reino Unido, que tiveram grande crescimento da desigualdade a partir de 1980, tiveram crescimento do PIB per capita maior que a França, que continuou mais igualitária. Mas o PIB per capita da Suécia e da Noruega, países que também continuaram mais igualitários, tiveram desempenho neste período quase tão bom quanto o dos Estados Unidos e do Reino Unido.
Existem economistas ruins de esquerda? Sim. Existem textos ruins de esquerda sobre economia escritos por não economistas? Mais ainda. Existem economistas ruins de direita? Sim. Existem textos ruins de direita sobre economia escritos por não economistas? Mais ainda. Economistas ruins, não importa de que cor ideológica, misturam ciência com ideologia. Economia não é uma ciência exata, mas isto não quer dizer que vale tudo (em nenhuma outra ciência social vale tudo). Há algumas questões que são consenso para quase todos os economistas, outras em que existe muita discussão, mas não por questões de julgamento de valor e sim porque é difícil tirar conclusões quando não se pode fazer experimentos de laboratório em ciência social (exemplo: em até que ponto uma política redistributiva não prejudica o crescimento e quando passa a prejudicar?), e finalmente as questões de julgamento de valor, onde apenas nestas a ideologia entra (exemplo: vale a pena redistribuir renda mesmo além do ponto que prejudica o crescimento?). Quem mistura ciência com ideologia não tem discernimento para diferenciar essas coisas. Enxergam a ciência como uma feira, onde é possível escolher as frutas desejadas.
Não se estuda Economia apenas para aprender a discutir. O economista é um profissional. Espera-se que ele saiba estimar o impacto de uma política social sobre a redução da pobreza, estimar o impacto da queda do preço da manteiga na demanda por margarina. Atividades estas que não dependem de ideologia. Assim como se espera de um médico que ele saiba curar pacientes, e não apenas escrever belos textos sobre o corpo humano.
A gravidade da mistura de ciência com ideologia é visível nos debates sobre Macroeconomia, que é a mais quente ramificação da ciência econômica. Antes de apresentar as diferentes correntes de pensamento na Macroeconomia, é importante listas os principais papéis do Estado que são muito discutidos.
Fornecimento de bens e serviços públicos: Segurança, defesa nacional, justiça e bens e serviços relativos a Estado de Bem Estar Social, como educação, saúde, previdência, seguro desemprego
Redistribuição de renda através de impostos progressivos e programas de transferência
Regulação de monopólios ou oligopólios (ou realização direta de atividades monopolísticas/oligopolísticas através de empresas públicas)
Suavizar com políticas fiscal e monetária as flutuações de produto, emprego e preços
No 1, 2 e 3, há divergências porque há diferentes julgamentos de valor. No 4, há divergências porque é impossível fazer experimentos de laboratório em economia, porque neste caso, as cobaias seríamos nós. Mas se fosse possível fazer experimentos, algumas conclusões poderiam ser obtidas independente de julgamento de valor. São feitos muitos testes econométricos, que é o que de mais próximo de um laboratório um economista tem, mas estes testes são sempre imperfeitos. Há diversas correntes de pensamento em Macroeconomia que brigam muito entre si porque cada uma lê de uma maneira diferente os resultados dos testes.
As principais correntes, com o nome de seus principais expoentes entre parênteses são estas: paleokeynesiana (Paul Samuelson, Robert Solow, James Tobin, Franco Modigliani, Paul Krugman velho), monetarista (Milton Friedman), novo clássica (Robert Lucas, Thomas Sargent, Robert Barro, Edward Prescott), novo keynesiana (Greg Mankiw, Olivier Blanchard, Stanley Fischer, David Romer, Joseph Stiglitz, Paul Krugman jovem), austríaca (Ludwig Von Mises, Friedrich Hayek) e pós keynesiana (Nicholas Kaldor, Hyman Minsky, Paul Davidson). Os paleokeynesianos, os monetaristas e os novos keynesianos consideram que as políticas fiscal e/ou monetária têm efeito sobre o produto no curto prazo, mas não no longo prazo. Os monetaristas acham que mesmo tendo efeito, essas políticas não devem ser feitas. Os paleokeynesianos e os novos keynesianos defendem estas políticas, os novos com menos entusiasmo. Os pós keynesianos consideram que essas políticas têm efeito até no longo prazo. Os novos clássicos e os austríacos acham que essas políticas não têm efeito em momento algum. Os paleokeynesianos, os monetaristas, os novos clássicos e os novos keynesianos são ortodoxos, os austríacos e os pós keynesianos são heterodoxos. Os paleokeynesianos e os monetaristas foram mainstream no passado (não é porque deixaram de ser mainstream que estão necessariamente errados), os novos clássicos e os novos keynesianos são o mainstream no presente, e os austríacos e os pós keynesianos nunca foram mainstream.
Como se vê, essas correntes de pensamento se diferenciam entre si por causa da divergência de visão delas sobre o papel do Estado no item 4. Defender um papel forte do Estado no 4 não implica necessariamente defender no 1, 2 e 3, e vice versa. Economistas dentro da mesma corrente podem ter grandes divergências sobre o que pensam sobre o 1, o 2 e o 3. Dentro da corrente novo keynesiana, por exemplo, tem Greg Mankiw, mais à direita, que não é muito entusiasta de redistribuição e renda, e Joseph Stiglitz, mais à esquerda, que defende fortemente redistribuição de renda.
O problema é que há muitos amadores em Economia que consideram que se eles defendem que o Estado de Bem Estar Social tem que ser grande, eles têm que ser necessariamente pós keynesianos, e que se defendem que o Estado de Bem Estar Social tem que ser pequeno, eles têm que ser necessariamente novos clássicos ou austríacos. Escolhem a corrente de pensamento favorita igual se escolhe um time de futebol ou uma banda de rock. Estudam as demais com má vontade, pensando apenas “o que eu tenho que aprender para poder falar mal delas?”. Não percebem que é perfeitamente possível um estado mais ou menos pequeno (Estados Unidos) fazer muitas políticas fiscal e monetária anticíclicas, e um estado grande (países europeus) fazer poucas políticas fiscal e monetária anticíclicas.
Delfim Netto, José Serra e Bresser Pereira são pós keynesianos, mas não são esquerdistas. Defendem políticas monetárias ativistas, mas fora isso, defendem privatizações e outras reformas para deixar o estado mais enxuto. Economistas de partidos social democratas europeus raramente são pós keynesianos.
Outro defeito que se vê em alguns autores de textos de Economia tanto de esquerda quanto de direita é o culto à personalidade. Consideram que existem “os caras” e “os bostas” na Economia, que as respostas para os problemas atuais têm necessariamente que estar nos livros dos “caras”, mesmo que sejam bem antigos, e que nenhuma contribuição dos “bostas” tem valor. Há os esquerdistas que acham que o Marx, o Keynes (???) ou o Celso Furtado são os caras. Há os direitistas que acham que Von Mises, Hayek e Friedman são os caras. Para eles, não precisa ter lido uma linha de Marx para falar que ele era um bosta. Basta falar de Stalin, como se a ligação entre eles fosse muito grande. Como para eles Keynes também era um bosta, os novos keynesianos precisam estar errados porque têm Keynes no nome, mesmo que os novos keynesianos sejam quase novos clássicos, divergindo apenas sobre rigidez de preços. Mas Keynes era socialista, então o que leva o nome dele tem que estar errado, então não existe rigidez de preços. Esses direitistas ainda devem pensar que além de tudo, Keynes era boiola, e não é à toa que o centro de pensamento econômico mais keynesiano do Brasil se localiza em uma cidade conhecida por ter muita gente boiola.
Em Economia (ou melhor, em ciências em geral), não há espaço para achar que “meu ídolo do passado resolvem todos os problemas de hoje”. No pensamento econômico há idas e vindas, mas também há um grande acúmulo de conhecimento que ocorre ao longo do tempo.
Os austríacos Von Mises e Hayek não são considerados muito relevantes nem mesmo para o mainstream. Friedman é muito relevante para o mainstream, mas não por causa de sua atividade política de direita. Friedman é relevante por causa de sua teoria que diz que não há relação de longo prazo entre desemprego e inflação, teoria que não é nem de esquerda, nem de centro, nem de direita. Não precisa concordar com as ideias direitistas de Friedman e gostar de seu ativismo para aceitar sua teoria de inflação e desemprego. Joseph Stiglitz e Paul Krugman são economistas muito citados e tiveram muita importância até mesmo para o pensamento econômico mainstream. A importância deles no meio acadêmico não decorre da atividade política de esquerda deles, que é razoavelmente recente. Joseph Stiglitz ficou famoso por seu trabalho sobre informação assimétrica. Paul Krugman ficou famoso por causa de sua teoria sobre comércio internacional. Aceitar as teorias deles não implica concordar com o ativismo político deles. Mas eles são dois bons exemplos de como dois ótimos economistas profissionais podem ser importantes vozes da esquerda mundial sem prejuízo para a atividade acadêmica em ciência econômica.
Como foi dito no início, textos ruins sobre Economia existem, de esquerda ou de direita. Os textos ruins de esquerda adotam um keynesianismo vulgar e falam como se políticas fiscal e monetária expansionistas fossem capaz de produzir riqueza ilimitada, ideia que nenhuma das três correntes keynesianas sérias defende. Esse pensamento vulgar coloca como se fosse sempre bom fazer política expansionista. Ao invés de gerar riqueza ilimitada, isto geraria inflação ilimitada. Também é comum ver textos ruins de esquerda pedindo mais gastos públicos, maiores salários, mais direitos trabalhistas e ainda reclamações sobre a desindustrialização do Brasil, sendo que a desindustrialização do Brasil ocorreu justamente porque os custos do trabalho aqui não podem concorrer com os da Ásia. É frequente também lermos textos ruins de esquerda falando dos “45% do nosso dinheiro que é utilizado para pagar juros, sei lá quantas vezes mais que a educação e a saúde”. Isto é confuso porque passa a impressão de que 45% dos nossos impostos vai para o pagamento de juros, o que não é verdade. O que vai para o pagamento de juros é 45% da soma do que o governo arrecada de impostos com a emissão de novos títulos (ou seja, empréstimos novos que contrai). E ninguém emprestaria dinheiro para governo que não paga dívida. O desconhecimento sobre rolagem de dívida é um bom gancho para falar dos textos ruins de direita sobre Economia. É comum lermos sobre o crescimento do valor absoluto da dívida pública durante o governo Lula, o que se trata de uma informação irrelevante, pois o que interessa é a capacidade do governo pagar a dívida, ou seja, a relação dívida/PIB. Caso contrário, os Estados Unidos seriam o país mais fodido do mundo, pois são o país que têm a maior dívida absoluta do mundo. Ou aquela comparação imbecil do Estado com a dona de casa, que não pode gastar mais do que arrecada. Não precisa ser keynesiano para saber que em algumas situações, déficits moderados são aceitáveis. Se a taxa real de crescimento do PIB for maior do que a taxa real de juros (o que certamente não está acontecendo no Brasil atualmente), um pequeno déficit mantém a relação dívida / PIB constante. Ah, e donas de casa também se endividam. Mas o pior mesmo da argumentação direitista sobre Economia é o Argumentum ad Stalum. Se há uma discussão entre capitalismo regulado e capitalismo desregulado, e se os defensores do capitalismo desregulado estão com preguiça de arrumar argumentos contra o capitalismo regulado, a prática mais habitual é fazer de conta que estão em uma discussão entre capitalismo e comunismo, e falar do Stálin, dos gulags, do Mao, do Pol Pot, do Muro de Berlim, de Cuba e da Coreia do Norte. Outra prática habitual estúpida da direita é relacionar atraso do Brasil com esquerda, um país de 515 anos que teve no máximo 15 de governo de esquerda (dois do João Goulart, treze do PT). Como se nos outros 500 anos só tivesse existido prosperidade. E não pode faltar menção àqueles que dizem com arzinho de superioridade intelectual que “não existe almoço grátis”. Na verdade, a economia fornece sim alguns “almoços grátis”: subutilização de fatores de produção, bens públicos, externalidades positivas.
E a figura a seguir mostra o que ocorre quando alguns direitistas falam das ciências econômicas na academia brasileira.
São apenas não economistas que escrevem textos ruins sobre Economia, à esquerda e à direita? Não, há também militantes com diploma. Alguns, nem mesmo acreditam plenamente no que escrevem, mas acham conveniente colocar o bode na sala: criam um extremo artificial para que aquilo que realmente defendem pareça a posição intermediária. O problema disso é que existe o risco de criar o efeito espantalho, que é o oposto do efeito bode na sala. Pessoas acharem que quem tem o seu posicionamento político tem mais propensão a escrever groselhas, e a má fama afetar até quem é mais sério. Ser militante é muito bom, mas usar pseudociência para isso não é.
Por fim, já vimos que um bom economista não tem necessariamente que ser de direita, pode ser, mas também pode não ser. Para adicionar, vamos nos lembrar dos pioneiros das ciências econômicas. Adam Smith defendia o liberalismo em um tempo em que Estado significava privilégio para a nobreza. Não pode ser considerado um direitista. Karl Marx, este é óbvio que era de esquerda. Alguns dizem que ele não era economista, mas entre muitas outras coisas, ele era economista sim. Leon Walras e Alfred Marshall, fundadores da Microeconomia moderna, poderiam ser considerados social democratas. John Maynard Keynes, fundador da Macroeconomia, também. O Douglas, da famosa função Cobb-Douglas, foi um senador da ala de esquerda do Partido Democrata.
Por falar nisso, na American Economic Association, há mais membros auto declarados democratas do que auto declarados republicanos. O Partido Democrata dos Estados Unidos não é exatamente um partido de esquerda, mas ainda assim, se verifica que economistas norte americanos não estão à direita da média da população do país em que vivem.
No Brasil, a existência de dois centros de pensamento não mainstream, os Institutos de Economia da Unicamp e da UFRJ, gera um efeito muito positivo e um efeito colateral levemente negativo. Por um lado, contribuem para a diversidade de ideias. Por outro, atraem jovens de esquerda que querem estudar Economia, sobrando maioria direitista em outras faculdades. Como consequência, os graduados com maior especialização em teorias maintream tendem a ser muito conservadores politicamente.
sexta-feira, 16 de outubro de 2015
Nova revista virtual: Trincheiras
Foi inaugurada no dia 16 de outubro de 2015 a revista virtual Trincheiras. Sou colaborador e colunista. Esta revista virtual foi criada por pessoas que se conheceram na Olavo de Carvalho nos Odeia.
Tem textos sobre Cotidiano, Cultura, Educação, Política, Economia, Sociedade. Uma publicação plural dentro da esquerda.
O link está aqui
http://www.trincheiras.com.br/
Tem textos sobre Cotidiano, Cultura, Educação, Política, Economia, Sociedade. Uma publicação plural dentro da esquerda.
O link está aqui
http://www.trincheiras.com.br/
terça-feira, 13 de outubro de 2015
Não confundir "ortodoxos e heterodoxos" com "conservadores e progressistas"
Interessante este texto.
http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2015/10/01/o-que-significa-ortodoxo-em-economia/?cmpid=compfb
Não concordo com tudo. Não acho um demérito publicar em journal com ranking baixo. Demérito é não publicar. Ser minoria não é ruim. Às vezes, algumas teorias científicas hoje amplamente aceitas começaram com um grupinho de cientistas que eram considerados malucos em seu tempo. Um músico que vende poucos discos não é necessariamente ruim.
Agora, o que o texto mencionou que é muito importante é que há economistas do campo político progressista que não são heterodoxos, como Thomas Piketty, Joseph Stiglitz e Paul Krugman. Como eles estão bastante em evidência atualmente, os brasileiros podem começar a perceber que o ~confronto entre os ortodoxos e os heterodoxos~ não é tão importante assim, que politizar demais este confronto não é bom.
http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2015/10/01/o-que-significa-ortodoxo-em-economia/?cmpid=compfb
Não concordo com tudo. Não acho um demérito publicar em journal com ranking baixo. Demérito é não publicar. Ser minoria não é ruim. Às vezes, algumas teorias científicas hoje amplamente aceitas começaram com um grupinho de cientistas que eram considerados malucos em seu tempo. Um músico que vende poucos discos não é necessariamente ruim.
Agora, o que o texto mencionou que é muito importante é que há economistas do campo político progressista que não são heterodoxos, como Thomas Piketty, Joseph Stiglitz e Paul Krugman. Como eles estão bastante em evidência atualmente, os brasileiros podem começar a perceber que o ~confronto entre os ortodoxos e os heterodoxos~ não é tão importante assim, que politizar demais este confronto não é bom.
segunda-feira, 12 de outubro de 2015
Mais uma vez, a minha posição progressista a favor do direito à arma de fogo
Como o assunto porte de arma de fogo por cidadão comum voltou a estar em evidência depois de mais um de muitos ataques que ocorrem nos Estados Unidos, reafirmo minha posição progressista a favor do cidadão comum ter direito a portar arma de fogo.
O que eu mais gosto de enfatizar é a contradição dos mais fervorosos defensores do desarmamento. Eles, em geral, são as mesmas pessoas que denunciam com razão os inúmeros casos de violação de direitos humanos praticada por policiais. Aí a pergunta é inevitável: se você mesmo diz que as polícias não são confiáveis, por que você acha que somente policiais devem ter direito a portar a armas de fogo? A resposta que provavelmente ouviremos será: eu não confio nas polícias do jeito que elas são, mas para mim, a solução não deve ser armar o cidadão comum, e sim reformar as polícias. Raciocínio idêntico ao: sou contra as cotas, porque o ensino básico público deveria ter qualidade.
Não, eu não estou pregando que trabalhadores usem armas contra policiais para fazer uma insurreição. Mas sim que tenham possibilidade de se defender de delinquentes. Quanto mais as pessoas pensam que só a polícia pode defende-las, mais elas tendem a aceitar que polícia cometa arbitrariedades.
E como eu disse que minha posição era progressista, não posso deixar de mencionar a possível necessidade que militantes de movimentos sociais e integrantes de minorias ter de se defender de possíveis ataques de grupos de extrema direita.
As polícias brasileiras são incompetentes e, com uma reforma e depois de muito tempo, podem se tornar competentes. Mas é inevitável que, mesmo havendo exceções individuais, essas corporações tenham uma ideologia de direita sempre. Isso é assim no mundo inteiro. Da mesma forma que institutos de humanidades em universidades públicas tendem a se inclinar para a esquerda, corporações policiais e militares tendem a se inclinar para a direita. Isto é decorrente do perfil típico das pessoas que desejam entrar nesses grupos. Há policiais que são profissionais bem dedicados, e mesmo tendo ideologia de direita, trabalhariam com afinco para combater fascistas, caso recebam uma denúncia de ataque. Mas não é possível confiar que todos os policiais sejam assim.
E mais uma vez: NÃO defendo que movimentos sociais façam política com armas. O uso de armas deveria ser exclusivamente para fins defensivos.
O mesmo vale para minorias. Acredito, por exemplo, que se um casal de lésbicas trabalhe de noite, elas deveriam ter autorização não apenas para ter uma pistola em casa, como também carregar esta pistola na bolsa para ir e voltar do trabalho.
Eu não acho que a legislação brasileira de armas deve continuar do jeito que está. Defendo que a compra de armas seja facilitada. Atualmente, é necessária uma autorização da Polícia Federal para ter o porte de arma, e dificilmente esta autorização é concedida. Defendo o fim deste poder discricionário para a Polícia Federal. Sou a favor de que qualquer adulto sem antecedentes criminais e com condições físicas e mentais possa comprar uma arma. A Polícia Federal deveria ter um cadastro das armas e de seus proprietários.
Alguns falam: mas lá nos Estados Unidos é fácil comprar uma arma de fogo e tem muitos assassinatos com este tipo de arma. Gente, antes de olhar para o rabo comprido dos outros, vamos olhar para o nosso. O Brasil tem uma política muito rigorosa sobre porte de armas de fogo por cidadão comum e mesmo assim tem 60 mil homicídios por ano, a esmagadora maioria deles cometida por arma de fogo. Em alguns países da Europa Ocidental é fácil o cidadão comum ter arma de fogo, em outros é muito difícil. E em todos esses países o número de homicídios é muito baixo. Facilidade/dificuldade de cidadão comum ter arma de fogo não parece aumentar nem diminuir homicídios. Uma coisa não parece estar relacionada com a outra.
Sim, os Estados Unidos são entre os países desenvolvidos aquele que têm a maior relação homicídios por arma de fogo / 100 mil habitantes. E também são o país onde é mais fácil comprar uma arma de fogo. E também são o país com a maior concentração de renda entre os países desenvolvidos. Eu escrevi há algumas semanas que não dá para reduzir a criminalidade à concentração de renda, mas que ela possivelmente tem um peso relevante.
E lembrem-se daquele referendo de 2005 para decidir entre o Brasil continuar tendo uma legislação bem rigorosa de armas (não) ou passar a ter a legislação de armas mais rigorosa do mundo (sim)? Votei com a minoria no sim e mudei de ideia.
Desde aquele tempo, não era possível reduzir armamentismo à direita e desarmamento à esquerda. Latifundiários, Veja e extremistas de direita pregaram o não. Mas o PSTU também pregou o não, alegando que trabalhadores tinham que se ter possibilidade de se defender de outras pessoas que também votaram não. O PT e muitos formadores de opinião de esquerda pregaram o sim. Mas o PSDB também pregou o sim, a Rede Globo também pregou o sim.
Nos Estados Unidos, onde o Welfare State é o menor dos países desenvolvidos, é fácil comprar uma arma de fogo. Nos países escandinavos, terra do Estado Social, não é tão fácil, mas mesmo assim cidadãos comuns podem comprar e guardar armas de fogo. No Reino Unido, que em muitas questões é o mais norte-americano país da Europa, a política de armas de fogo é rigorosíssima.
O que eu mais gosto de enfatizar é a contradição dos mais fervorosos defensores do desarmamento. Eles, em geral, são as mesmas pessoas que denunciam com razão os inúmeros casos de violação de direitos humanos praticada por policiais. Aí a pergunta é inevitável: se você mesmo diz que as polícias não são confiáveis, por que você acha que somente policiais devem ter direito a portar a armas de fogo? A resposta que provavelmente ouviremos será: eu não confio nas polícias do jeito que elas são, mas para mim, a solução não deve ser armar o cidadão comum, e sim reformar as polícias. Raciocínio idêntico ao: sou contra as cotas, porque o ensino básico público deveria ter qualidade.
Não, eu não estou pregando que trabalhadores usem armas contra policiais para fazer uma insurreição. Mas sim que tenham possibilidade de se defender de delinquentes. Quanto mais as pessoas pensam que só a polícia pode defende-las, mais elas tendem a aceitar que polícia cometa arbitrariedades.
E como eu disse que minha posição era progressista, não posso deixar de mencionar a possível necessidade que militantes de movimentos sociais e integrantes de minorias ter de se defender de possíveis ataques de grupos de extrema direita.
As polícias brasileiras são incompetentes e, com uma reforma e depois de muito tempo, podem se tornar competentes. Mas é inevitável que, mesmo havendo exceções individuais, essas corporações tenham uma ideologia de direita sempre. Isso é assim no mundo inteiro. Da mesma forma que institutos de humanidades em universidades públicas tendem a se inclinar para a esquerda, corporações policiais e militares tendem a se inclinar para a direita. Isto é decorrente do perfil típico das pessoas que desejam entrar nesses grupos. Há policiais que são profissionais bem dedicados, e mesmo tendo ideologia de direita, trabalhariam com afinco para combater fascistas, caso recebam uma denúncia de ataque. Mas não é possível confiar que todos os policiais sejam assim.
E mais uma vez: NÃO defendo que movimentos sociais façam política com armas. O uso de armas deveria ser exclusivamente para fins defensivos.
O mesmo vale para minorias. Acredito, por exemplo, que se um casal de lésbicas trabalhe de noite, elas deveriam ter autorização não apenas para ter uma pistola em casa, como também carregar esta pistola na bolsa para ir e voltar do trabalho.
Eu não acho que a legislação brasileira de armas deve continuar do jeito que está. Defendo que a compra de armas seja facilitada. Atualmente, é necessária uma autorização da Polícia Federal para ter o porte de arma, e dificilmente esta autorização é concedida. Defendo o fim deste poder discricionário para a Polícia Federal. Sou a favor de que qualquer adulto sem antecedentes criminais e com condições físicas e mentais possa comprar uma arma. A Polícia Federal deveria ter um cadastro das armas e de seus proprietários.
Alguns falam: mas lá nos Estados Unidos é fácil comprar uma arma de fogo e tem muitos assassinatos com este tipo de arma. Gente, antes de olhar para o rabo comprido dos outros, vamos olhar para o nosso. O Brasil tem uma política muito rigorosa sobre porte de armas de fogo por cidadão comum e mesmo assim tem 60 mil homicídios por ano, a esmagadora maioria deles cometida por arma de fogo. Em alguns países da Europa Ocidental é fácil o cidadão comum ter arma de fogo, em outros é muito difícil. E em todos esses países o número de homicídios é muito baixo. Facilidade/dificuldade de cidadão comum ter arma de fogo não parece aumentar nem diminuir homicídios. Uma coisa não parece estar relacionada com a outra.
Sim, os Estados Unidos são entre os países desenvolvidos aquele que têm a maior relação homicídios por arma de fogo / 100 mil habitantes. E também são o país onde é mais fácil comprar uma arma de fogo. E também são o país com a maior concentração de renda entre os países desenvolvidos. Eu escrevi há algumas semanas que não dá para reduzir a criminalidade à concentração de renda, mas que ela possivelmente tem um peso relevante.
E lembrem-se daquele referendo de 2005 para decidir entre o Brasil continuar tendo uma legislação bem rigorosa de armas (não) ou passar a ter a legislação de armas mais rigorosa do mundo (sim)? Votei com a minoria no sim e mudei de ideia.
Desde aquele tempo, não era possível reduzir armamentismo à direita e desarmamento à esquerda. Latifundiários, Veja e extremistas de direita pregaram o não. Mas o PSTU também pregou o não, alegando que trabalhadores tinham que se ter possibilidade de se defender de outras pessoas que também votaram não. O PT e muitos formadores de opinião de esquerda pregaram o sim. Mas o PSDB também pregou o sim, a Rede Globo também pregou o sim.
Nos Estados Unidos, onde o Welfare State é o menor dos países desenvolvidos, é fácil comprar uma arma de fogo. Nos países escandinavos, terra do Estado Social, não é tão fácil, mas mesmo assim cidadãos comuns podem comprar e guardar armas de fogo. No Reino Unido, que em muitas questões é o mais norte-americano país da Europa, a política de armas de fogo é rigorosíssima.
domingo, 11 de outubro de 2015
Paradoxo no debate sobre educação básica no Brasil
No debate brasileiro atual sobre educação básica, há dois grupos claramente delimitados, que pregam políticas bem diferentes. O primeiro grupo tem empresários, economistas, administradores, fundações empresariais e organizações internacionais para promoção de desenvolvimento, como o Banco Mundial. O segundo grupo tem docentes sindicalizados e acadêmicos na área de pedagogia. Se dependesse apenas do primeiro grupo, teríamos um dirigismo bem soviético. Se dependesse apenas do segundo grupo, teríamos um laissez-faire total. Não, eu não me confundi, é isso mesmo. Atores políticos que normalmente pregam economia livre de intervenção do Estado são extremamente top-down na hora de falar de educação. E atores políticos que defendem maior intervenção do Estado na economia são bem anti-intervenção na hora de falar de educação.
Empresários, economistas, administradores, fundações empresariais e Banco Mundial defendem um currículo nacional que todas as escolas, todos os professores devem seguir, uma avaliação padronizada nacional baseada neste currículo para medir o desempenho de redes educacionais e de escolas, uma política de consequências relacionada com o resultado dessa avaliação, que pode incluir tanto remuneração extra por bons resultados, quanto afastamento de diretores, um material didático padronizado que pode ser apostilado. Docentes sindicalizados e acadêmicos na área de pedagogia defendem maior autonomia para o professor. Maior autonomia para escolher o que ensinar, como ensinar, que material didático utilizar, como avaliar.
Eu não sou moderate hero por regra, mas neste debate eu fico com a opinião do meio. Sou a favor de um currículo nacional, mas desde que este currículo ocupe metade do tempo das aulas. A outra metade, o professor teria que ter autonomia para preencher. Sou a favor de autonomia para cima deste currículo, mas não para baixo. Diferenças sociais e regionais no Brasil não justificam a ausência de qualquer padronização. Equação é a mesma coisa no norte e no sul do Brasil. Leis da ciência também. Sou a favor de uma avaliação padronizada nacional, mas não de política de remuneração variável vinculada a este avaliação. Esta política foi implementada primeiro nos Estados Unidos, que já estão revendo, por não terem verificado êxito. Por outro lado, a avaliação, em si, é importante, porque dá mais transparência para o sistema educacional e auxilia até mesmo a escola e o professor no seu planejamento de aulas. Sem a política de remuneração variável, seria mais fácil o professor perceber que a avaliação padronizada é aliada dele, e não inimiga. Quanto ao material apostilado, não sou muito favorável. Isto seria assumir que os professores serão sempre incompetentes para elaborar a própria aula.
Os entusiastas da autonomia, autonomia e autonomia perguntarão: mas e a Finlândia, que não tem currículo nacional, que dá muita autonomia para o professor, e tem o melhor sistema educacional do Ocidente? Resposta simples: a Finlândia só aboliu o currículo nacional e introduziu a autonomia na metade dos anos 1990, depois do país já ter atingido um elevado patamar. Antes disso, a Finlândia tinha um rígido currículo nacional e uma rígida formação de professores. Manteve a rígida formação de professores. Este texto explica bem http://edexcellence.net/commentary/education-gadfly-weekly/2013/january-3/real-lessons-from-finland.html
Autonomia pode ser uma política adequada para passar do bom para o excelente, mas não do ruim para o bom.
Empresários, economistas, administradores, fundações empresariais e Banco Mundial defendem um currículo nacional que todas as escolas, todos os professores devem seguir, uma avaliação padronizada nacional baseada neste currículo para medir o desempenho de redes educacionais e de escolas, uma política de consequências relacionada com o resultado dessa avaliação, que pode incluir tanto remuneração extra por bons resultados, quanto afastamento de diretores, um material didático padronizado que pode ser apostilado. Docentes sindicalizados e acadêmicos na área de pedagogia defendem maior autonomia para o professor. Maior autonomia para escolher o que ensinar, como ensinar, que material didático utilizar, como avaliar.
Eu não sou moderate hero por regra, mas neste debate eu fico com a opinião do meio. Sou a favor de um currículo nacional, mas desde que este currículo ocupe metade do tempo das aulas. A outra metade, o professor teria que ter autonomia para preencher. Sou a favor de autonomia para cima deste currículo, mas não para baixo. Diferenças sociais e regionais no Brasil não justificam a ausência de qualquer padronização. Equação é a mesma coisa no norte e no sul do Brasil. Leis da ciência também. Sou a favor de uma avaliação padronizada nacional, mas não de política de remuneração variável vinculada a este avaliação. Esta política foi implementada primeiro nos Estados Unidos, que já estão revendo, por não terem verificado êxito. Por outro lado, a avaliação, em si, é importante, porque dá mais transparência para o sistema educacional e auxilia até mesmo a escola e o professor no seu planejamento de aulas. Sem a política de remuneração variável, seria mais fácil o professor perceber que a avaliação padronizada é aliada dele, e não inimiga. Quanto ao material apostilado, não sou muito favorável. Isto seria assumir que os professores serão sempre incompetentes para elaborar a própria aula.
Os entusiastas da autonomia, autonomia e autonomia perguntarão: mas e a Finlândia, que não tem currículo nacional, que dá muita autonomia para o professor, e tem o melhor sistema educacional do Ocidente? Resposta simples: a Finlândia só aboliu o currículo nacional e introduziu a autonomia na metade dos anos 1990, depois do país já ter atingido um elevado patamar. Antes disso, a Finlândia tinha um rígido currículo nacional e uma rígida formação de professores. Manteve a rígida formação de professores. Este texto explica bem http://edexcellence.net/commentary/education-gadfly-weekly/2013/january-3/real-lessons-from-finland.html
Autonomia pode ser uma política adequada para passar do bom para o excelente, mas não do ruim para o bom.
sábado, 10 de outubro de 2015
Excesso de boatos sobre o Lula e o PT e partidarização da mídia criaram má vontade para perceber as verdades
Acho que todos, durante a infância, já ouviram a professora contando a fábula do mentiroso. Havia um menino que adorava pregar peça nos seus colegas. Sempre inventava histórias. Os outros eram enganados. Um dia, ele foi com seus colegas para um bosque, que tinha um rio. Ele pulou no rio e gritou falando que estava se afogando. Seus colegas pensaram que era mais uma de suas muitas mentiras e, por isso, não foram ajudar. Mas aquilo não era mentira. Ele estava se afogando mesmo. E morreu afogado.
Esta história não é estranha para eu e muitos outros que por muito tempo votamos no PT. Depois que foi descoberto em detalhes o escândalo da Petrobras, não há mais muito o que justificar. Como foi revelado que não apenas o PMDB e o PP, mas o próprio PT, receberam dinheiro da propina, a desculpa da governabilidade do tempo do mensalão, que já era ruim, foi pro saco. Não é mais possível dizer que "precisava formar uma maioria no Congresso para poder governar" porque seria estranho achar que PMDB e PP, para votar com o governo, exigiriam que o PT também ficasse com parte do dinheiro. O "sempre foi assim, todo mundo fez, é que agora está sendo mais investigado" perdeu o prazo de validade. Temos que nos revoltar mais quando o partido que um dia já foi nosso fez merda do que quando os outros fizeram. Além disso, o PT até 2002 tinha uma fama de partido honesto, na qual até quem não gostava deste partido acreditava. Natural que a revolta de parte da população com o PT seja maior, mesmo tendo outros partidos participado de escândalos de corrupção. E não é só isso. É verdade que logo depois que o mensalão foi revelado em 2005, Lula e o PT tiveram atitudes corretas. Delúbio foi afastado do partido. Lula demitiu os ministros envolvidos. O deputado Delcídio, do PT-MS, quando foi presidente da CPI dos Correios, não impediu os trabalhos. Porém, depois de 2010, o PT teve atitudes injustificáveis. Readmitiu Delúbio, não afastou os condenados pelo STF, continuou defendendo Vaccari. E o problema do PT não é só corrupção. Quem votava no PT dava muito valor à educação e saúde públicas. De 2002 para cá, a renda dos pobres melhorou, mas a educação e a saúde públicas continuaram deixando a desejar. E não adianta falar que isto é responsabilidade dos governos locais, porque se em todos os estados estes serviços são precários, isto é sinal de que o governo federal também não fez sua parte.
Mas o que fez tanta gente que por muito tempo votou no PT desconfiar tanto do discurso anti-PT? Porque muita boataria contra o PT foi espalhada na Internet, porque a forte partidarização da grande mídia gera desconfiança, porque tem muito mau caratismo escondido por trás do discurso anti-PT.
Em 2014, circulou na Internet que as urnas eletrônicas estavam viciadas, que Youssef havia sido envenenado na véspera do segundo turno, que Dilma tinha mandado derrubar o avião do Eduardo Campos. Em 2010, circulou na Internet que o PT iria censurar a imprensa, que José Dirceu teria algum cargo em um eventual governo Dilma, que o auxílio reclusão tinha sido inventado pelo governo Lula, que todas as famílias de presos recebiam auxílio reclusão. Também circulou na Internet que Dilma seria ateia e favorável à legalização do aborto, o que pode ser verdade, mas o que também revela quem são alguns dos ferrenhos opositores de Dilma. E que pena que ela não assume essas coisas. Seria tão bom se fosse verdade! Outro tema muito defendido pelos boateiros foi a suposta "ligação do PT com as Farc". A verdade é que as Farc já não fazem mais parte do Foro de São Paulo desde 2002. Também já se insinuou que pessoas importantes do PT teriam mandado matar o prefeito de Campinas, o Toninho, em 2001. Fato: a Polícia Civil de São Paulo, um estado que nunca foi governado pelo PT, matou todos os suspeitos logo depois do crime, e isto ajudou a melar a investigação. E mereceria um capítulo a parte todo o besteirol difundido sobre o Bolsa Família.
Estes boatos mencionados no parágrafo anterior não dependem da grande mídia. Há pessoas que difundem espontaneamente pela Internet. Não apenas aqueles que acreditam fazem isso, mas também aqueles que querem acreditar, que querem que os outros acreditem. Aliás, não dependem nem da Internet. Em 1989, quando ainda não havia uso residencial de Internet no Brasil, circulou o boato de que se Lula fosse eleito, ele obrigaria as famílias com casa a abrigar um morador de rua.
Além dos boateiros amadores, a mídia profissional também exerce o seu papel de fazer apenas quem já odeia o PT odiar mais ainda, mas fazer com que pessoas que já tiveram simpatia pelo PT, estão na dúvida, desconfiem do antipetismo. A partidarização é explícita. Como eu disse em um post anterior, não é a grande mídia que é a favor do PSDB, mas o PSDB que é a favor do partido da grande mídia. Quando na parte de editorial e na parte de opinião dos jornalões só se encontram opiniões semelhantes àquelas proferidas por lideranças do PSDB, é natural que se desconfie do conteúdo da parte de notícias destes jornais.
Um exemplo foi visto durante e logo após à campanha eleitoral, quando tanto colunistas de jornal, quanto políticos do PSDB reclamaram que a campanha do PT fazia o uso do "nós e eles". Trata-se de uma grande hipocrisia porque a campanha do PSDB também utiliza o "nós e eles". Dentre os muitos defeitos do PT, o "nós e eles" não faz parte, uma vez que o "nós e eles" é uma prática necessária na democracia. A repetição da crítica ao "nós e eles" nos jornais e nos programas do PSDB mostra o claro alinhamento partidário dos meios de comunicação. Outro evidência de claro alinhamento partidário ocorreu quando jornais e revistas mostraram indignação contra a campanha porca da Dilma contra Marina e Aécio, que foi porca mesmo, mas em 2010 esta indignação não apareceu quando Serra fez uma campanha porca contra Dilma, recorrendo até à ateufobia. Pelo menos, fora isso, em 2014, a grande mídia, com exceção das revistas semanais, não fez boca de urna para o candidato do PSDB igual fez em 2006 e em 2010. Talvez porque considerou que não fosse conveniente o Aécio ganhar, dadas as medidas que teriam que ser tomadas em 2015 por qualquer governo.
Em 2010, ficou muito evidente o lado que a grande mídia escolheu. Isto se viu na maneira através da qual foi abordado o dossiê que petistas tinham contra pessoas próximas do José Serra. Houve superexploração de apenas um dos lados da história: o de como o dossiê foi feito. E silêncio sobre o outro lado: o que tinha no dossiê. Foi alimentada paranoia do tipo "the big brother is watching you". Alguns colunistas tentaram insinuar que o governo estaria mandando a Receita Federal vazar os dados do imposto de renda das pessoas citadas no dossiê. Isto seria completamente desnecessário, porque seria perfeitamente possível algum concursado da Receita ter vazado. Como o povo não é bobo, durante o período em que o assunto dossiê dominou a mídia, a intenção de voto de José Serra oscilou para baixo, e não para cima. Sinal de que pessoas comuns já estavam percebendo que algo havia de estranho. No ano seguinte, foi revelado que o então ministro da Casa Civil Antônio Palocci tinha uma fortuna não explicada. Essa revelação foi feita coincidentemente logo depois do prazo de entrega das declarações do Imposto de Renda. E ninguém da grande mídia manifestou desconfiança sobre possível vazamento.
Toda a campanha olavística pró-Serra na Internet e na imprensa em 2010 encobriu uma coisa que eu inclusive não percebi naquele tempo: Dilma Rousseff era inexperiente na política, sua capacidade de liderança era fraca, como foi demonstrado posteriormente, e José Serra, com sua biografia, sua passagem pelo Ministério da Saúde, e se não fosse a forte guinada para a direita que deu quando foi prefeito e governador e principalmente quando foi candidato a presidente, poderia perfeitamente ser um bom sucessor do Lula, mais continuador do que rompedor.
Uma prática canalha do antipetismo, presente principalmente na Veja, é considerar que todos os adversários do PT quando são acusados são vítimas de perseguição ou que só por ser adversário do PT, um político que fez coisa errada deve ser perdoado. A Veja, que elogiava o ex-senador DEMóstenes, já chegou a dizer na capa que a CPI do Cachoeira era cortina de fumaça para acobertar o julgamento do mensalão. A mesma revista também teve textos elogiosos ao Eduardo Cunha.
O caso do Daniel Dantas mostrou muito bem o jogo político da grande mídia, que conta ainda com aliados no meio político e no judiciário. Daniel Dantas provavelmente colocou dinheiro no mensalão do PT. Mas o banqueiro baiano começou sua carreira sendo muito próximo de Antônio Carlos Magalhães, do PFL, atual DEM. Foi favorecido na privatização das empresas de telefonia durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Sua irmã já teve empresa junto com a filha de José Serra. Coincidentemente, foi Gilmar Mendes, o ministro do STF indicado pelo FHC e que atua de forma partidária, que quis melar a operação da Política Federal contra Daniel Dantas. Colunistas pró PSDB demonizaram o delegado Protógenes e a Satiagraha. Tinha muitos defeitos na Satiagraha? Sim. Protógenes fez merda? Sim. Mas Daniel Dantas tem condições de pagar bons advogados. E juristas são melhores para fazer críticas a Satiagraha do que colunistas partidários. Principalmente quando estes colunistas são simpatizantes aos partidos dos quais Dantas era mais próximo. O comportamento da grande mídia, naquele momento, foi atípico. O costume foi sempre o de se posicionar do lado do acusador, de tratar delegados como heróis e políticos como safados. Este costume foi quebrado na Satiagraha. Paralelo pode ser feito com alguns blogueiros petistas, que antes de 2012 nunca tinham escrito sobre Direito Penal, e depois da AP 470, passaram a ser os maiores especialistas no assunto.
O dois pesos duas medidas da grande mídia é muito marcante. Quando Fernando Henrique Cardoso colocou dois aliados políticos no STF como Nelson Jobim e Gilmar Mendes, isto passou batido. Quando Lula fazia isso...
Dois acontecimentos próximos um do outro em 2007 mostram como uma mentira pode desacreditar uma verdade. Em julho daquele ano, um Airbus da TAM não conseguiu frear na pista de Congonhas, bateu em um prédio, e morreram todos os passageiros e mais algumas pessoas da rua. As televisões, os jornais e as revistas imediatamente falaram que o acidente ocorreu porque a pista estava escorregadia. Desta forma, essa possível culpar a Infraero, e por extensão, o governo Lula. Depois, verificou-se que não foi a pista escorregadia que causou o acidente. Poucos dias depois do acidente, boxeadores cubanos do Pan sumiram por um tempo, passaram pela delegacia, e depois voltaram para Cuba. Foi insinuado que eles teriam sido deportados. No momento, eu pensei que fosse mais uma mentira. Mas parece que eles foram deportados mesmo.
E por fim, mais um motivo que faz algumas pessoas que por muito tempo se simpatizaram com o PT terem desconfiança com o antipetismo. Nem todos os que odeiam o PT são elitistas, racistas, machistas e homofóbicos. Principalmente agora, quando há muitos motivos justos para odiar o PT. Mas mesmo antes de 2002, também havia pessoas boas que odiavam o PT. Agora, é fato que todos os que são elitistas, racistas, machistas e homofóbicos odeiam e sempre odiaram o PT. E a rejeição ao PT virou pretexto para colunistas/comediantes mau caráter ganharem aplausos de elitistas, racistas, machistas e homofóbicos.
E antes de terminar, eu apresentei um lado neste texto, mas o outro também é válido. É possível, como argumentei até aqui, que mau caratismos que se aproveitam do antipetismo façam algumas pessoas a desconfiarem do discurso anti-PT mesmo quando este discurso é justo. Por outro lado, as tantas merdas que o PT fez pode ter feito com que outras pessoas tenham dificuldade de perceber que tem muito pilantra se aproveitando do discurso anti-PT.
Esta história não é estranha para eu e muitos outros que por muito tempo votamos no PT. Depois que foi descoberto em detalhes o escândalo da Petrobras, não há mais muito o que justificar. Como foi revelado que não apenas o PMDB e o PP, mas o próprio PT, receberam dinheiro da propina, a desculpa da governabilidade do tempo do mensalão, que já era ruim, foi pro saco. Não é mais possível dizer que "precisava formar uma maioria no Congresso para poder governar" porque seria estranho achar que PMDB e PP, para votar com o governo, exigiriam que o PT também ficasse com parte do dinheiro. O "sempre foi assim, todo mundo fez, é que agora está sendo mais investigado" perdeu o prazo de validade. Temos que nos revoltar mais quando o partido que um dia já foi nosso fez merda do que quando os outros fizeram. Além disso, o PT até 2002 tinha uma fama de partido honesto, na qual até quem não gostava deste partido acreditava. Natural que a revolta de parte da população com o PT seja maior, mesmo tendo outros partidos participado de escândalos de corrupção. E não é só isso. É verdade que logo depois que o mensalão foi revelado em 2005, Lula e o PT tiveram atitudes corretas. Delúbio foi afastado do partido. Lula demitiu os ministros envolvidos. O deputado Delcídio, do PT-MS, quando foi presidente da CPI dos Correios, não impediu os trabalhos. Porém, depois de 2010, o PT teve atitudes injustificáveis. Readmitiu Delúbio, não afastou os condenados pelo STF, continuou defendendo Vaccari. E o problema do PT não é só corrupção. Quem votava no PT dava muito valor à educação e saúde públicas. De 2002 para cá, a renda dos pobres melhorou, mas a educação e a saúde públicas continuaram deixando a desejar. E não adianta falar que isto é responsabilidade dos governos locais, porque se em todos os estados estes serviços são precários, isto é sinal de que o governo federal também não fez sua parte.
Mas o que fez tanta gente que por muito tempo votou no PT desconfiar tanto do discurso anti-PT? Porque muita boataria contra o PT foi espalhada na Internet, porque a forte partidarização da grande mídia gera desconfiança, porque tem muito mau caratismo escondido por trás do discurso anti-PT.
Em 2014, circulou na Internet que as urnas eletrônicas estavam viciadas, que Youssef havia sido envenenado na véspera do segundo turno, que Dilma tinha mandado derrubar o avião do Eduardo Campos. Em 2010, circulou na Internet que o PT iria censurar a imprensa, que José Dirceu teria algum cargo em um eventual governo Dilma, que o auxílio reclusão tinha sido inventado pelo governo Lula, que todas as famílias de presos recebiam auxílio reclusão. Também circulou na Internet que Dilma seria ateia e favorável à legalização do aborto, o que pode ser verdade, mas o que também revela quem são alguns dos ferrenhos opositores de Dilma. E que pena que ela não assume essas coisas. Seria tão bom se fosse verdade! Outro tema muito defendido pelos boateiros foi a suposta "ligação do PT com as Farc". A verdade é que as Farc já não fazem mais parte do Foro de São Paulo desde 2002. Também já se insinuou que pessoas importantes do PT teriam mandado matar o prefeito de Campinas, o Toninho, em 2001. Fato: a Polícia Civil de São Paulo, um estado que nunca foi governado pelo PT, matou todos os suspeitos logo depois do crime, e isto ajudou a melar a investigação. E mereceria um capítulo a parte todo o besteirol difundido sobre o Bolsa Família.
Estes boatos mencionados no parágrafo anterior não dependem da grande mídia. Há pessoas que difundem espontaneamente pela Internet. Não apenas aqueles que acreditam fazem isso, mas também aqueles que querem acreditar, que querem que os outros acreditem. Aliás, não dependem nem da Internet. Em 1989, quando ainda não havia uso residencial de Internet no Brasil, circulou o boato de que se Lula fosse eleito, ele obrigaria as famílias com casa a abrigar um morador de rua.
Além dos boateiros amadores, a mídia profissional também exerce o seu papel de fazer apenas quem já odeia o PT odiar mais ainda, mas fazer com que pessoas que já tiveram simpatia pelo PT, estão na dúvida, desconfiem do antipetismo. A partidarização é explícita. Como eu disse em um post anterior, não é a grande mídia que é a favor do PSDB, mas o PSDB que é a favor do partido da grande mídia. Quando na parte de editorial e na parte de opinião dos jornalões só se encontram opiniões semelhantes àquelas proferidas por lideranças do PSDB, é natural que se desconfie do conteúdo da parte de notícias destes jornais.
Um exemplo foi visto durante e logo após à campanha eleitoral, quando tanto colunistas de jornal, quanto políticos do PSDB reclamaram que a campanha do PT fazia o uso do "nós e eles". Trata-se de uma grande hipocrisia porque a campanha do PSDB também utiliza o "nós e eles". Dentre os muitos defeitos do PT, o "nós e eles" não faz parte, uma vez que o "nós e eles" é uma prática necessária na democracia. A repetição da crítica ao "nós e eles" nos jornais e nos programas do PSDB mostra o claro alinhamento partidário dos meios de comunicação. Outro evidência de claro alinhamento partidário ocorreu quando jornais e revistas mostraram indignação contra a campanha porca da Dilma contra Marina e Aécio, que foi porca mesmo, mas em 2010 esta indignação não apareceu quando Serra fez uma campanha porca contra Dilma, recorrendo até à ateufobia. Pelo menos, fora isso, em 2014, a grande mídia, com exceção das revistas semanais, não fez boca de urna para o candidato do PSDB igual fez em 2006 e em 2010. Talvez porque considerou que não fosse conveniente o Aécio ganhar, dadas as medidas que teriam que ser tomadas em 2015 por qualquer governo.
Em 2010, ficou muito evidente o lado que a grande mídia escolheu. Isto se viu na maneira através da qual foi abordado o dossiê que petistas tinham contra pessoas próximas do José Serra. Houve superexploração de apenas um dos lados da história: o de como o dossiê foi feito. E silêncio sobre o outro lado: o que tinha no dossiê. Foi alimentada paranoia do tipo "the big brother is watching you". Alguns colunistas tentaram insinuar que o governo estaria mandando a Receita Federal vazar os dados do imposto de renda das pessoas citadas no dossiê. Isto seria completamente desnecessário, porque seria perfeitamente possível algum concursado da Receita ter vazado. Como o povo não é bobo, durante o período em que o assunto dossiê dominou a mídia, a intenção de voto de José Serra oscilou para baixo, e não para cima. Sinal de que pessoas comuns já estavam percebendo que algo havia de estranho. No ano seguinte, foi revelado que o então ministro da Casa Civil Antônio Palocci tinha uma fortuna não explicada. Essa revelação foi feita coincidentemente logo depois do prazo de entrega das declarações do Imposto de Renda. E ninguém da grande mídia manifestou desconfiança sobre possível vazamento.
Toda a campanha olavística pró-Serra na Internet e na imprensa em 2010 encobriu uma coisa que eu inclusive não percebi naquele tempo: Dilma Rousseff era inexperiente na política, sua capacidade de liderança era fraca, como foi demonstrado posteriormente, e José Serra, com sua biografia, sua passagem pelo Ministério da Saúde, e se não fosse a forte guinada para a direita que deu quando foi prefeito e governador e principalmente quando foi candidato a presidente, poderia perfeitamente ser um bom sucessor do Lula, mais continuador do que rompedor.
Uma prática canalha do antipetismo, presente principalmente na Veja, é considerar que todos os adversários do PT quando são acusados são vítimas de perseguição ou que só por ser adversário do PT, um político que fez coisa errada deve ser perdoado. A Veja, que elogiava o ex-senador DEMóstenes, já chegou a dizer na capa que a CPI do Cachoeira era cortina de fumaça para acobertar o julgamento do mensalão. A mesma revista também teve textos elogiosos ao Eduardo Cunha.
O caso do Daniel Dantas mostrou muito bem o jogo político da grande mídia, que conta ainda com aliados no meio político e no judiciário. Daniel Dantas provavelmente colocou dinheiro no mensalão do PT. Mas o banqueiro baiano começou sua carreira sendo muito próximo de Antônio Carlos Magalhães, do PFL, atual DEM. Foi favorecido na privatização das empresas de telefonia durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. Sua irmã já teve empresa junto com a filha de José Serra. Coincidentemente, foi Gilmar Mendes, o ministro do STF indicado pelo FHC e que atua de forma partidária, que quis melar a operação da Política Federal contra Daniel Dantas. Colunistas pró PSDB demonizaram o delegado Protógenes e a Satiagraha. Tinha muitos defeitos na Satiagraha? Sim. Protógenes fez merda? Sim. Mas Daniel Dantas tem condições de pagar bons advogados. E juristas são melhores para fazer críticas a Satiagraha do que colunistas partidários. Principalmente quando estes colunistas são simpatizantes aos partidos dos quais Dantas era mais próximo. O comportamento da grande mídia, naquele momento, foi atípico. O costume foi sempre o de se posicionar do lado do acusador, de tratar delegados como heróis e políticos como safados. Este costume foi quebrado na Satiagraha. Paralelo pode ser feito com alguns blogueiros petistas, que antes de 2012 nunca tinham escrito sobre Direito Penal, e depois da AP 470, passaram a ser os maiores especialistas no assunto.
O dois pesos duas medidas da grande mídia é muito marcante. Quando Fernando Henrique Cardoso colocou dois aliados políticos no STF como Nelson Jobim e Gilmar Mendes, isto passou batido. Quando Lula fazia isso...
Dois acontecimentos próximos um do outro em 2007 mostram como uma mentira pode desacreditar uma verdade. Em julho daquele ano, um Airbus da TAM não conseguiu frear na pista de Congonhas, bateu em um prédio, e morreram todos os passageiros e mais algumas pessoas da rua. As televisões, os jornais e as revistas imediatamente falaram que o acidente ocorreu porque a pista estava escorregadia. Desta forma, essa possível culpar a Infraero, e por extensão, o governo Lula. Depois, verificou-se que não foi a pista escorregadia que causou o acidente. Poucos dias depois do acidente, boxeadores cubanos do Pan sumiram por um tempo, passaram pela delegacia, e depois voltaram para Cuba. Foi insinuado que eles teriam sido deportados. No momento, eu pensei que fosse mais uma mentira. Mas parece que eles foram deportados mesmo.
E por fim, mais um motivo que faz algumas pessoas que por muito tempo se simpatizaram com o PT terem desconfiança com o antipetismo. Nem todos os que odeiam o PT são elitistas, racistas, machistas e homofóbicos. Principalmente agora, quando há muitos motivos justos para odiar o PT. Mas mesmo antes de 2002, também havia pessoas boas que odiavam o PT. Agora, é fato que todos os que são elitistas, racistas, machistas e homofóbicos odeiam e sempre odiaram o PT. E a rejeição ao PT virou pretexto para colunistas/comediantes mau caráter ganharem aplausos de elitistas, racistas, machistas e homofóbicos.
E antes de terminar, eu apresentei um lado neste texto, mas o outro também é válido. É possível, como argumentei até aqui, que mau caratismos que se aproveitam do antipetismo façam algumas pessoas a desconfiarem do discurso anti-PT mesmo quando este discurso é justo. Por outro lado, as tantas merdas que o PT fez pode ter feito com que outras pessoas tenham dificuldade de perceber que tem muito pilantra se aproveitando do discurso anti-PT.
quarta-feira, 7 de outubro de 2015
Curiosidades cronológicas
Coisas estranhas nas quais paramos para pensar quando olhamos a linha do tempo da história da humanidade
Nelson Piquet e
Michael Schumacher já correram juntos. Foram companheiros na Benetton no Mundial de Fórmula Um
de 1991. O brasileiro teve desempenho em pontos levemente melhor do que o
alemão no período. Michael Schumacher já dividiu a pista com Fernando Alonso. Nelson
Piquet já dividiu a pista com Emerson Fittipaldi. Então, entre Fernando Alonso
e Emerson Fittipaldi, há apenas três ligações.
Já houve um pequeno
período em que tanto Zico, quanto Ronaldo Fenômeno, eram simultaneamente
jogadores profissionais. Foi em 1993. Zico jogava no Kashima Antlers, Ronaldo
jogava no Cruzeiro.
O Galvão Bueno narrou
todos os jogos do Brasil entre as Copas do Mundo de 1990 e 2014. O tempo entre
1990 e 2014 é equivalente ao tempo entre 1966 e 1990. A Copa de 1966 foi a
última sem transmissão de televisão ao vivo no Brasil.
A primeira Copa da
qual tenho vaga lembrança é a de 1990. A primeira que acompanhei de verdade foi
a de 1994. A de 1998 foi a última em que todos os jogadores eram mais velhos do
que eu. Em 2002, já tinha um ou outro jogador mais novo do que eu. Em 2006,
ainda os jogadores mais velhos do que eu eram maioria. Em 2010, muito provavelmente
era meio a meio os mais velhos e os mais novos. Em 2014, os jogadores mais
novos do que eu foram a maioria. Em 2018, vai haver apenas um ou outro jogador
mais velho do que eu. A de 2022 será a primeira Copa em que todos os jogadores
serão mais novos do que eu.
Desde quando foi
fundada a Quinta República Francesa, foram eleitos presidentes socialistas
apenas três vezes: em 1981, em 1988 e em 2012. Nestes três anos, o Guarani
chegou a final de alguma coisa. Em 1981 na Taça de Prata, e em 1988 e 2012 no
Campeonato Paulista.
U2 é conhecida como
banda dos anos 80. Pearl Jam é conhecida como banda dos anos 90. Apesar de
décadas diferentes, Bono Vox é apenas quatro anos mais velho do que Eddie
Vedder.
O show mais
importante realizado no Morumbi em 1993 foi do Nirvana. O show mais importante
realizado no Morumbi em 2007 foi do Roger Waters. O show mais importante
realizado no Morumbi em 2010 foi do Paul McCartney. Em 1993, Paul McCartney e
Roger Waters já eram vistos como tiozões.
Já houve um pequeno
período em que simultaneamente os generais Franco e Pinochet eram ditadores em
seus respectivos países. Foi entre 11 de setembro de 1973, quando ocorreu o
golpe no Chile, e 20 de novembro de 1975, quando Franco faleceu. Pinochet foi
um dos poucos governantes a comparecer ao enterro de Franco. Em poucas
palavras: por dois anos, o general ditador amigo de Adolf Hitler foi
contemporâneo do general ditador amigo de Margaret Thatcher.
O pintor espanhol
Pablo Picasso foi citado no filme Titanic, que contava uma história ocorrida em
1912. A elite preconceituosa da primeira classe do navio desprezava suas obras.
Picasso faleceu em 1973.
Adolf Hitler foi
chanceler da Alemanha entre 1933 e 1945. Konrad Adenauer foi chanceler da
Alemanha entre 1949 e 1963. Apesar de ter sido sucessor, Konrad Adenauer (nascido
em 1876) era mais velho do que Adolf Hitler (nascido em 1889). Adenauer já era
político importante antes de 1933. Foi prefeito de Colônia e teve de deixar o
cargo nessa data.
Em 6 de novembro de
1933, ocorreu a última eleição parlamentar da Alemanha da República de Weimar.
O Partido Nacional Socialista obteve mais de 30% do Parlamento. Dois dias
depois, houve eleição presidencial nos EUA e Franklin Roosevelt foi eleito pela
primeira vez. Estas eleições que ocorreram em um intervalo de apenas dois dias
(há muito tempo eleição na Alemanha ocorre em um domingo e nos EUA em uma
terça-feira) mudaram o mundo nos 12 anos seguintes. Em 1 de dezembro, o governo
alemão do chanceler Von Pappen terminou, e foi formado um novo governo liderado
por Schleicher. Em 30 de janeiro de 1933, terminou o breve governo Schleicher,
e Adolf Hitler assumiu o poder. Em 4 de março, Franklin Roosevelt tomou posse
como presidente dos EUA (naquele tempo, a posse era mais tarde). Ou seja, na
Alemanha teve um governo mais curto do que o período de pato manco do
presidente norte-americano Herbert Hoover.
Ronald Reagan nasceu
em 1911. Richard Nixon nasceu em 1913. John Kennnedy nasceu em 1917. A ordem em
que foram presidentes dos EUA foi ao contrário. Kennedy foi eleito em 1960,
Nixon em 1968 e Reagan em 1980.
Quando o PT tomou
posse pela primeira vez na prefeitura de São Paulo, com Luiza Erundina, em 1 de
janeiro de 1989, ainda existia bloco comunista. Mas, óbvio, São Paulo não
entrou neste bloco.
Atualmente, alguns que
comentam a eleição presidencial brasileira de 1989, dizem que o PT era
inexperiente, que o PT era radical, que o PT era como se fosse o PSOL de hoje.
Estes alguns talvez não se lembrem que durante aquela campanha eleitoral, o PT
já governava a maior cidade do Brasil.
Dilma Rousseff e
Fernando Haddad são conhecidos como "postes do Lula". Ambos nunca
disputaram eleição antes de virarem ministros de Lula (Casa Civil, Educação
respectivamente), aí com apoio de Lula, uma o sucedeu, o outro foi eleito
prefeito de São Paulo. O que talvez não muitos lembram é que Haddad já foi
ministro da Dilma. Ele permaneceu no Ministério da Educação em 2011, e só saiu
em janeiro de 2012 para disputar a Prefeitura de São Paulo.
Durante a campanha
presidencial brasileira de 1989, Luís Carlos Prestes, que fez aquela coluna na
década de 1920, ainda estava vivo. Apoiou Brizola no primeiro turno e Lula no
segundo.
O bebê que a Olga
Benario teve em uma prisão na Alemanha em 1936 viu a pré-estreia do filme
biografia de sua mãe em 2004.
John Maynard Keynes
nasceu no ano em que Karl Marx morreu, 1883. Essa é manjada. O que menos gente
sabe é que John Maynard Keynes faleceu antes de seu pai e sua mãe, em 1946.
Muita gente na
esquerda pergunta o que Karl Marx pensaria do regime soviético. Marx morreu 34
anos antes da Revolução Russa. O socialista alemão Karl Kautsky, que chegou a
conviver com Marx, morreu em 1938. Ele não tinha visão favorável ao regime do
Stálin.
Temos o hábito de
associar pirâmides e Cleópatra com Egito Antigo. Porém, o intervalo entre o
Egito das pirâmides e o Egito da Cleópatra é mais longo do que o intervalo
entre o Egito da Cleópatra e o Egito da Primavera Árabe.
Já se passaram mais
anos entre o atentado de 11 de setembro de 2001 ao World Trade Center e ao
Pentágono do que entre a queda do muro de Berlim e o atentado.
Menos anos se
passaram entre o 14 bis do Santos Dummont (1906) e o lançamento do Boeing 707
(1958), que já é muito parecido com os aviões comerciais atuais, do que entre o
lançamento do Boeing 707 e a atualidade.
Em 1995, foi lançado
o Windows 95 (dããã). Vinte anos atrás. Não é muito diferente dos Windows usados
atualmente. Vinte anos antes de 1995, ou seja, 1975, foi lançado o primeiro Apple.
Era a Idade da Pedra da microinformática.
O homem chegou à lua
pela primeira vez em 1969. No mesmo ano em que surgiu a Arpanet, ancestral da
Internet. Naquele tempo, viagens espaciais eram sinônimo de futuro, e pouca
gente ligava para o que iria ocorrer com a informática.
Em 1994 foi lançado o
segundo modelo do Gol, vulgarmente conhecido como o Gol Bola. Os carros
populares atuais têm design parecido. Vinte e um ano antes de 1994, ou seja,
1973, os carros populares eram bem diferentes.
As opções de
vestuário que homens e mulheres têm em 2015 não são muito diferentes das de 40
anos atrás, ou seja, de 1975. Em 1935, as roupas masculinas e femininas eram
bem diferentes das de 1975 e muito mais padronizadas.
O 2001: Uma Odisseia
no Espaço é de 1968. 47 anos antes da atualidade. 47 anos antes de 1968 foi
1921. Quando só tinha filme preto e branco, e mudo.
Quando (nós homens)
começamos a reparar nas atrizes gostosas dos filmes, na nossa pré-adolescência,
algumas dessas atrizes têm quase a idade de nossas mães. Depois, passam a ter a
nossa idade. Depois, passam a ter a idade de nossas filhas. Depois, passam a
ter a idade de nossas netas. E se nós cuidarmos bem da nossa saúde, passam a
ter a idade de nossas bisnetas.
A última vez em que
houve uma execução legal por guilhotina na França (segundo semestre de 1977)
ocorreu depois do lançamento do primeiro Star Wars, o IV, nos cinemas (primeiro
semestre de 1977).
Nos EUA, há execuções
legais até os dias atuais. Sempre ao lado na maca onde vai ser aplicada a
injeção letal, há um telefone para que o governador tenha possibilidade de
ligar até o último minuto para mandar suspender a execução. A última execução
legal no Brasil ocorreu em 1876, o ano em que o telefone foi inventado.
Certamente não havia um recém inventado telefone no meio no mato onde foi
colocada a forca.
domingo, 4 de outubro de 2015
Sobre a partidarização da TV Cultura
A TV Cultura, que pega não só em São Paulo mas também em todo Brasil, já foi sinônimo de TV pública de qualidade. Não é mais. O PSDB de São Paulo fez algo que nem a ditadura militar fez: transformou a TV Cultura em um veículo de propaganda ideológica do partido do governo estadual de São Paulo. Dessa forma, a TV Cultura virou uma Fox News tupiniquim. As maiores estrelas passaram a ser Luís Felipe Pondé e Marco Antônio Villa. O Roda Viva passou a ter quase sempre convites de acordo com interesses políticos. A bancada de entrevistadores, com muitos elementos da Veja, passou a ser especialista em levantar a bola para o convidado politicamente selecionado cortar. A banca que entrevistou o Gilmar Mendes há alguns anos, por exemplo, tinha Reinaldo Azevedo e Eliane Castanhede.
O limite do cérebro humano causando o limite da ciência econômica
Uma das dificuldades que a ciência econômica tem é o limite de capacidade armazenamento do cérebro humano, assim como o limite da capacidade de entrada de novas informações por hora.
Assim, quem deseja dominar o conhecimento de fronteira da ciência econômica tem que ser meio ignorante em outras ciências sociais. Entender o que é produzido atualmente exige horas de leituras de artigos, com muitos modelos cheios de letras gregas. Não sobra tempo para outras leituras. Ainda por ...cima, é necessário se especializar em um ramo da economia (micro, macro, internacional, trabalho, setor público etc) para entendê-lo muito bem.
Por outro lado, quem deseja ser multidisciplinar, conhecer todos os ramos da economia, conhecer todas as obras clássicas do pensamento econômico (Riqueza das Nações, Capital, Teoria Geral, Capitalismo Socialimo e Democracia etc), entender das outras ciências sociais, entender de Filosofia, dificilmente vai conseguir se atualizar sobre o conhecimento de ponta das ciências econômicas dos últimos dez anos.
Pode ter um gênio ou outro com capacidade de entender de tudo. Mas o que muitos economistas fazem é o "ciclo de vida": se atualizam no conhecimento de fronteira até os 40 anos de idade, e viram multidisciplinares depois disso.
A engenharia de computação desenvolvem computadores com capacidade cada vez maior de armazenamento. Se a engenharia genética fizesse isso com cérebros, poderia haver supereconomistas.
enfiada no cu enfiada no cu enfiada no cu
Assim, quem deseja dominar o conhecimento de fronteira da ciência econômica tem que ser meio ignorante em outras ciências sociais. Entender o que é produzido atualmente exige horas de leituras de artigos, com muitos modelos cheios de letras gregas. Não sobra tempo para outras leituras. Ainda por ...cima, é necessário se especializar em um ramo da economia (micro, macro, internacional, trabalho, setor público etc) para entendê-lo muito bem.
Por outro lado, quem deseja ser multidisciplinar, conhecer todos os ramos da economia, conhecer todas as obras clássicas do pensamento econômico (Riqueza das Nações, Capital, Teoria Geral, Capitalismo Socialimo e Democracia etc), entender das outras ciências sociais, entender de Filosofia, dificilmente vai conseguir se atualizar sobre o conhecimento de ponta das ciências econômicas dos últimos dez anos.
Pode ter um gênio ou outro com capacidade de entender de tudo. Mas o que muitos economistas fazem é o "ciclo de vida": se atualizam no conhecimento de fronteira até os 40 anos de idade, e viram multidisciplinares depois disso.
A engenharia de computação desenvolvem computadores com capacidade cada vez maior de armazenamento. Se a engenharia genética fizesse isso com cérebros, poderia haver supereconomistas.
enfiada no cu enfiada no cu enfiada no cu
sábado, 3 de outubro de 2015
Havia alternativa à política macroeconômica Palocci Levy Meirelles do primeiro mandato do Lula?
Os principais nomes da condução da política macroeconômica do
primeiro mandato de Lula eram o Ministro da Fazenda Antônio Palocci, seu
secretário do Tesouro Joaquim Levy e o presidente do Banco Central Henrique
Meirelles. Eles conduziram uma política mais criticada pela esquerda do que
pela direita. Criticada não apenas pelo então recém criado PSOL, como também
por integrantes do próprio PT e organizações da sociedade civil vinculadas ao
PT. As ideias que nortearam esta política voltaram ao governo com o retorno de
Joaquim Levy ao governo, agora como Ministro. Por isso esta discussão é
importante. Então, havia alternativa à política macroeconômica do primeiro
mandato do Lula?
Resposta muito simples: sim, mas a alternativa seria inevitavelmente
mais antipopular do que a que foi implementada.
A política macroeconômica de Palocci/Levy/Meirelles foi a manutenção do
tripé criado no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, que consistia em
regime de metas de inflação, câmbio flutuante e geração de superávits primários.
Quando Lula assumiu em janeiro de 2003, a inflação anual estava em 12%. O dólar
estava valendo quase quatro reais. Quem falar que esses eventos que ocorreram
antes do Lula ser presidente ocorreram por culpa do Lula leva tabefe.
Logo no início de seu primeiro mandato, a equipe econômica de Lula fez
um ajuste fiscal mais duro do que o atual. O superávit primário superou os 3%
do PIB nos quatro anos de mandato e foi superior ao do segundo mandato de
Fernando Henrique Cardoso. A taxa Selic foi mantida alta, no patamar de 26%,
até a inflação começar a ceder. As reduções posteriores foram modestas. Os
generosos aumentos reais do salário mínimo só começaram em 2005. Em 2003 e
2004, houve apenas reposição da inflação. O mesmo ocorreu com os salários do funcionalismo
público.
E quais foram os resultados? A inflação caiu a ponto de chegar aos 3% em
2006, abaixo do centro da meta. O dólar chegou a R$2,10 em 2006 e continuou
caindo posteriormente, até chegar a aproximadamente R$1,60 em meados de 2008.
A relação dívida líquida/PIB caiu de 50% quando Lula tomou posse pela
primeira vez para 45% quando Lula foi reeleito, e continuou caindo depois. O
PIB cresceu a uma média anual de 3,5% no primeiro mandato de Lula, média
superior a dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso, mas bem inferior à
média dos países emergentes entre 2003 e 2006. No segundo mandato de Lula,
o PIB cresceu a uma média anual de 4,5%. A parcela dos brasileiros vivendo
abaixo da linha de pobreza era de 33% quando Lula tomou posse pela primeira
vez, 25% quando Lula foi reeleito, e continuou caindo. O coeficiente de Gini
passou de 0,59 para 0,55, e continuou caindo posteriormente. A participação da
indústria de transformação no PIB no primeiro mandato de Lula caiu de 17% para
16,5% e continuou caindo depois. As exportações dobraram no primeiro mandato de
Lula. A participação dos manufaturados se manteve constante no primeiro mandato
e passou a cair no segundo.
Como foi dito logo na abertura do texto, a política econômica do
primeiro mandato de Lula poderia ter sido diferente. A queda da taxa Selic
poderia ter sido mais rápida, a valorização real do real poderia ter sido
menor. Se isto tivesse ocorrido, a situação da indústria de
transformação poderia ter sido melhor, e a relação indústria de
transformação / PIB poderia ter subido, ao invés de ter caído. Como a
indústria de transformação difunde aumentos de produtividade para outros
setores da economia, a taxa de crescimento do PIB poderia ter sido maior.
Porém, e este porém é muito importante, para ter reduzido mais a taxa Selic e
para ter evitado uma supervalorização real do real, era necessário ter
feito um superávit primário ainda maior do que o que foi feito, e ter concedido
aumentos menos generosos de salário mínimo e salário do funcionalismo público.
Em poucas palavras: se o governo, em nome do apoio à indústria, resolvesse
abrir mão da política monetária e da política cambial para controlar a
inflação, teria que utilizar de forma mais intensa a política fiscal e a
política salarial para este objetivo. Fazendo isso, o PIB poderia ter
crescido a taxas mais elevadas, mas a queda da desigualdade poderia ter sido
mais lenta, uma vez que o salário mínimo e os gastos com o social, que ficariam
menores, ajudam a reduzir a desigualdade.
Como era de se esperar, esta política macroeconômica foi criticada por
economistas keynesianos desenvolvimentistas não esquerdistas como Bresser
Pereira, José Oreiro, Delfim Netto e José Serra. Eles falaram que a
supervalorização real do real estava provocando a desindustrialização da
economia brasileiro. Defenderam maior superávit primário para evitar a
supervalorização e para poder reduzir mais os juros.
Estranha foi a maneira através da qual esta política macroeconômica foi
criticada pela esquerda. Se é de esquerda, por que defender que a política
macroeconômica deveria ter focado mais o crescimento e menos a redistribuição?
A solução foi fazer de conta que alguns dilemas não existem e propor soluções
não realistas. As críticas pela esquerda também apontaram para a
desindustrialização e para os juros altos, mas ao contrário dos keynesianos
desenvolvimentistas não esquerdistas, os esquerdistas defenderam também um
superávit primário menor, ou seja, mais gastos públicos, e aumentos ainda
maiores de salário mínimo. O que eles fizeram foi basicamente sugerir ligar o
ar condicionado e o aquecedor ao mesmo tempo. Salários maiores neutralizariam o
efeito de um câmbio mais favorável, e a desindustrialização ocorreria de
qualquer maneira. Real desvalorizado, salários crescentes, gastos públicos
elevados e juros baixos produziriam uma tremenda inflação. O que os críticos
esquerdistas da política econômica do primeiro mandato do Lula sugeriram foram
parcialmente aplicados no primeiro mandato da Dilma, e os resultados ficaram
aquém do esperado por eles.
Esta mistura de industrialismo com Estado Social defendida por parte da
esquerda ocorre por causa da influência que o pensamento da Cepal dos anos 1950
ainda exerce. Os cepalinos consideravam que uma melhor distribuição de renda
favoreceria a industrialização da América Latina porque o aumento da população
com poder aquisitivo favoreceria a implantação da grande indústria, que poderia
aproveitar economias de escala. O problema é que o mundo atual não é igual ao
da década de 1950. A inclusão da Ásia no comércio mundial mudou tudo.
Atualmente, para ter manufatura é necessário ter trabalho barato. Alguns
perguntariam: mas e a Alemanha? Lá os trabalhadores recebem bons salários, mas
como a produtividade deles é alta, o custo do trabalho não é alto. E as
indústrias da Alemanha são mais intensivas em tecnologia, e não em trabalho. E
mesmo assim, o que tornou possível a reindustrialização da Alemanha na década
de 2000 foi uma política deliberada de redução de salários.
A escolha de Lula e sua equipe de não priorizar a indústria de
transformação foi acertada? É uma pergunta difícil de responder. A razão
indústria de transformação / PIB, que já foi de 35% no seu auge em 1985,
encontra-se atualmente próxima dos 10%. Perda de participação da indústria de
transformação no PIB é um fenômeno que ocorre em todos os países que se
desenvolvem ao longo do tempo. A curva que mostra a relação entre PIB per
capita e indústria de transformação/PIB tende a ter o formato de uma
montanha. Sobe no início quando a sociedade de torna menos agrícola e mais
industrial e desce posteriormente quando a sociedade se torna menos industrial
e mais voltada para os serviços (sim, eu sei que "serviços" é um
termo muito simplista e amplo, mas não prejudica o argumento). E mesmo o
desenvolvimento não impossibilita que um país seja um grande exportador de
produtos primários. Japão, Alemanha e Coreia do Sul são países muito
desenvolvidos e exportadores de manufaturas. Canadá, Dinamarca, Noruega,
Austrália e Nova Zelândia também são países muitos desenvolvidos e são grandes
exportadores de produtos primários. Se o Brasil um dia for Primeiro Mundo
(será?), provavelmente será mais parecido com Canadá, Dinamarca, Noruega,
Austrália e Nova Zelândia do que com Japão, Alemanha e Coreia do Sul. Por outro
lado, é possível dizer que a desindustrialização relativa (indústria perde
participação no PIB, mas não cai em absoluto), embora normal, foi prematura no
Brasil. O topo da montanha da razão indústria de transformação/PIB foi atingido
em um patamar ainda baixo de PIB per capita, se for feita comparação com o que
ocorreu em outros países. Desde a década de 1990, ainda no tempo dos Fernandos,
quando a economia brasileira foi se tornando menos industrial e mais de
serviços, diferente do que ocorreu em outros países que passaram por este
fenômeno, aqui, os serviços que mais cresceram não foram os típicos de países
mais avançados.
Se era melhor ter sido mais popular ou mais industrialista, difícil
saber. A única certeza que existe é a de que é impossível ser mais popular e
mais industrialista ao mesmo tempo. Conforme dito anteriormente, isto é querer
ligar o ar condicionado e o aquecedor ao mesmo tempo.
Uma política que visasse deliberadamente produzir uma taxa de câmbio
favorável à indústria de transformação seria uma política desenvolvimentista.
Os exemplos mais conhecidos de políticas desenvolvimentistas foram aquelas
praticadas por Coreia do Sul, Taiwan, Cingapura e também pelo Brasil entre 1930
e 1980. Em todos estes exemplos, os governos que praticaram tais
políticas NÃO foram trabalhistas social democratas populares voltados para
o povão.
Como o Brasil teve entre 1930 e 1980 uma política que favoreceu rápida
industrialização, elevadas taxas de crescimento do PIB, mas também elevada
concentração de renda e ganhos mais modestos nos indicadores sociais, e entre
1980 e 2002 houve nem crescimento, nem redução de desigualdade, foi
compreensível o primeiro governo eleito por forças de esquerda depois de 38
anos ter dado prioridade ao social em relação à indústria.
O PSOL fez seu papel de oposição em criticar a política econômica.
Estranho foi o próprio PT ter batido nesta política. Enquanto o PSOL se opunha
ao governo como um todo, o PT era governo e criticava a política econômica,
tratando esta política econômica como parte não integrante do governo, como um
alien. Talvez isso fosse compreensível do ponto de vista político. Se esta
política não tivesse sido bem sucedida, a crítica a esta política serviria como
uma apólice de seguro ao PT. Mas o problema é que esta política foi bem sucedida.
Realmente, o PIB brasileiro cresceu menos em 2006 do que a média dos países
emergentes. Mas é preciso lembrar que Rússia e Venezuela tiveram crescimento
mais alto durante o mesmo período porque estavam saindo de depressão e estavam
sendo beneficiadas por preço do petróleo crescente. A Argentina também estava
saindo de depressão. China e Índia ainda tinham PIB per capita baixo, e é
natural que PIB de países assim cresça mais. Até 2006, achava-se que o PIB
brasileiro tinha crescido menos do que cresceu de fato. Foi descoberto em 2007
que o PIB brasileiro tinha crescido mais, quando o IBGE revisou os dados. A
política econômica do primeiro mandato de Lula permitiu reduzir a inflação de
12% para 3% (até exagerou, se fosse 4,5% já estava bom), o que possibilitou
reduzir os juros posteriormente, fazer o PIB crescer bastante em 2007, 2008 e
2010, aumentar o gasto social e diminuir a miséria. Recusar a autoria de uma
política macroeconômica de seu próprio governo que deu certo foi uma estratégia
burra para o PT. Perdeu a possibilidade de ganhar o lugar de fala como
responsável na gestão das finanças públicas. Mesmo pessoas que gostam do PT por
considerar um partido sensível com o social não confiam no PT como um partido
responsável pela prudência na gestão das finanças públicas. Este lugar de fala
ficou injustamente com o PSDB, mesmo com a gestão nada responsável durante o
primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso. Mesmo algumas pessoas que
consideram o PSDB elitista acham que o PSDB “tem um lado bom” que seria a
responsabilidade na gestão das finanças públicas. Dizem os peessedebistas mais
lambe saco que no primeiro mandato, Lula seguiu a política macroeconômica do
PSDB. Como se superávit primário, câmbio flutuante e metas de inflação tivessem
propriedade intelectual.
É irônico notar que embora os simpatizantes de Guido Mantega sejam os
mais entusiastas defensores do real desvalorizado, foi durante as duas eras
Joaquim Levy (entre janeiro de 2003 e março de 2006, e a partir de janeiro de
2015) dentro de governo do PT que o real esteve mais desvalorizado. A maior
supervalorização real do real ocorreu durante a era Mantega (entre abril de
2006 e dezembro de 2014), que não por coincidência foi a era em que era pregado
menos rigor na política fiscal.
É injusto, porém, culpar Guido Mantega pela atual crise econômica. Dizer
que a política econômica do Brasil só foi bem conduzida até março de 2006
(alguns chegam a dizer dezembro de 2002) é puro mimimi ideológico. Houve
grandes superávits primários até 2008, a política anticíclica de 2009 foi
necessária e ajudou a diminuir o efeito da crise internacional no Brasil. Não
dá para atribuir apenas ao Pedro Malan e ao Antônio Palocci o mérito pela
conquista do investment grade em 2008. Guido Mantega já estava na cadeira de
ministro há dois anos quando isto ocorreu.
O desarranjo só começou no ano eleitoral de 2010. Ainda havia tempo de
Dilma corrigir isso em 2011. Um ajuste naquele ano poderia ter sido bem menos
doloroso do que em 2015. Ela até ensaiou um ajuste em 2011, mas depois deixou
pra lá. As maiores trapalhadas na condução da política econômica ocorreram
entre o segundo semestre de 2011 e 2014.
Observações
1) Embora eu tenha
criticado neste texto aqueles que defendem a redução dos juros na marretada, e
que durante um determinado momento os juros altos no Brasil foram necessários
sim para reduzir a inflação, eu reconheço que mesmo quando não é necessário,
vai haver lobistas do setor financeiro pregando terror com inflação e
defendendo os juros altos. O Paul Krugman vem mostrando muito bem como isto vem
ocorrendo nos Estados Unidos, em que a taxa básica de juros está próxima de
zero, não há risco de inflação, mas há os lobistas que estão sempre vendo este
risco onde não tem visando elevar os juros.
2) Não usei as palavras ortodoxia
e heterodoxia neste texto. São palavras relacionadas à academia e não à
política, portanto, não cabem na discussão deste texto. Não é visão sobre
política fiscal e monetária que diferencia ortodoxo de heterodoxo. É o jeito de
fazer ciência: ortodoxos são dedutivos, heterodoxos são indutivos.
Assinar:
Postagens (Atom)