sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

O que os estúpidos de extrema-esquerda e extrema-direita têm em comum?

Ambos enxergam Franklin Martins e Cesare Battisti em posição de igualdade.

Espiritismo saiu do armário, e a umbanda?

Diz esta matéria

Espiritismo saiu do armário, e a umbanda? Lista traz 100 livros sobre religião afro
O espiritismo saiu do armário em 2010 com uma série de lançamentos de filmes e livros. No maior país católico do mundo, que testemunhou o avanço evangélico nesta década, já não causa mais tanto escândalo declarar ser seguidor de outras crenças. Mas depois da doutrina do médium Chico Xavier, qual será a próxima religião no Brasil a dar a cara para bater?
Nas livrarias, as religiões afro-brasileiras ganham cada vez mais espaço e atenção dos leitores.

...
http://www1.folha.uol.com.br/livrariadafolha/852557-espiritismo-saiu-do-armario-e-a-umbanda-lista-traz-100-livros-sobre-religiao-afro.shtml

Resposta minha: o espiritismo saiu do armário, a umbanda saiu do armário, o judaísmo saiu do armário, o islamismo saiu do armário. No Brasil não existe ódio contra qualquer religião, mesmo as não cristãs. No Brasil persiste o ódio apenas contra quem não tem religião. As eleições majoritárias continuam valendo uma missa.

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

O melhor álbum de rock da década de 2000


Não sou crítico musical e não pretendo emitir uma opinião especializada ou objetiva. Qualquer lista ou escolha de tops que se pretende ser objetiva gera muito mimimi. O mesmo não vale para simples opiniões pessoais, baseadas no próprio gosto.
Então, subjetivamente, considero A Woman A Man Walked By, da cantora inglesa Polly Jean Harvey, produzido em parceria com o compositor e multi-instrumentista John Parish, o melhor álbum de rock da década de 2000.
Neste decênio, foram lançados vários bons álbuns de rock. Podemos falar do Elephant (White Stripes), do You Could Have It So Much Better (Franz Ferdinand), do Accelerate (REM), do Aha Shake Heartbkreak (Kings of Leon) e de muitos outros. Mas o que diferencia o A Woman A Man Walked By dos outros é que este é um dos poucos álbuns com A maiúsculo lançados na era do MP3. Os outros são amontoados de boas músicas.
Este álbum é menos melhor do que os meus favoritos de décadas anteriores. No topo dos anos 60, eu colocaria o Sgt. Peppers dos Beatles. No topo dos anos 70, eu colocaria o Dark Side of the Moon do Pink Floyd. No topo dos anos 80, eu colocaria o Rattle and Hum do U2. Quanto aos anos 90, sou dividido. Meu coração opta pelo Ten, do Pearl Jam, e minha cabeça opta pelo OK Computer, do Radiohead.
A PJ é muito menos conhecida do que estes mencionados, porém, apresenta algumas vantagens em relação a alguns destes. Compare-se com Pearl Jam. Tanto o PJ de Seattle quanto o PJ da Inglaterra iniciaram suas carreiras em 1991. O PJ de Seattle foi certamente muito maior durante sua fase de auge. Porém, o PJ de Seattle esgotou sua criatividade em 1998, enquanto o PJ da Inglaterra a mantém até os dias atuais.
Um benefício colateral que ouvir PJ Harvey trouxe para mim foi aumentar o interesse pelo rock com vocal feminino produzido nos anos recentes. Yeah Yeah Yeahs, The Kills e Le Tigre são boas bandas.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

Celso Amorin, o sexto maior pensador global de 2010

A Revista Foreign Policy fez uma lista dos 100 maiores pensadores globais de 2010. Quem ficou no topo foram Warren Buffett e Bill Gates. Na sexta posição ficou Celso Amorin.


6. Celso Amorim
for transforming Brazil into a global player.
Foreign minister Brazil
Celso Amorim wouldn't crack a smile at the old canard that Brazil is the country of the future, and always will be. The wily and urbane Brazilian diplomat, finishing off his second term as foreign minister, has done his utmost to make his country an international powerhouse -- right now.


continua em
http://www.foreignpolicy.com/articles/2010/11/29/the_fp_top_100_global_thinkers?page=0,5

domingo, 19 de dezembro de 2010

A atualidade do texto de Marx de 1853 sobre a Índia

Neste início de século XXI, vemos muita gente que se considera de esquerda tolerando a existência de práticas sociais cruéis em ambientes onde vigoram culturas não-ocidentais. Tudo isso em nome do anti-imperialismo e da suposta aceitação à diversidade cultural. A indignação a estas práticas tendem a gerar acusações de pró-colonialismo ou tentativa de ocidentalização forçada.
Marx não pensava assim. Em um artigo de jornal publicado em 1853, o filósofo-economista de Trier mostrava os danos que a colonizaçãobritânica havia causado à Índia. Porém, Marx não deixou de demonstrar como as tradições culturais indianas antes da colonização eram opressoras. E enxergou que embora a colonização tivesse sido motivada por interesses abjetos, teve como efeito colateral positivo o desmantelamento da estrutura social da Índia.

Vale a pena ler o texto
http://www.marxists.org/portugues/marx/1853/06/10.htm


Destaque para os parágrafos finais

Ora, por mais triste que seja do ponto de vista dos sentimentos humanos ver essas miríades de organizações sociais patriarcais, inofensivas e laboriosas se dissolverem, se desagregarem em seus elementos constitutivos e serem reduzidas à miséria, e seus membros perderem ao mesmo tempo sua antiga forma de civilização e seus meios de subsistência tradicionais, não devemos esquecer que essas comunidades villageoisies idílicas, malgrado seu aspecto inofensivo, foram sempre uma fundação sólida do despotismo oriental, que elas retém a razão humana num quadro extremamente estreito, fazendo dela um instrumento dócil da superstição e a escrava de regras admitidas, esvaziando-a de toda grandeza e de toda força histórica. Não devemos esquecer os bárbaros que, apegados egoisticamente ao seu miserável lote de terra, observam com calma a ruina dos impérios, as crueldades sem nome, o massacre da população das grandes cidades, não lhes dedicando mais atenção do que aos fenômenos naturais, sendo eles mesmos vítimas de todo agressor que se dignasse a notá-los. Não devemos esquecer que a vida vegetativa, estagante, indigna, que esse gênero de existência passiva desencadeia, por outra parte e como contragolpe, forças de destruição cegas e selvagens, fazendo da morte um rito religioso no Hindustão. Não devemos esquecer que essas pequenas comunidades carregavam a marca infame das castas e da escravidão, que elas submetiam o homem a circunstâncias exteriores em lugar de fazê-lo rei das circunstâncias, que elas faziam de um estado social em desenvolvimento expontâneo uma fatalidade toda poderosa, origem de um culto grosseiro da natureza cujo caráter degradante se traduzia no fato de que o homem, mestre da natureza, caia de joelhos e adorava Hanumán, o macaco, e Sabbala, a vaca.
É verdade que a Inglaterra, ao provocar uma revolução social no Hidustão, era guiada pelos interesses mais abjectos e agia de uma maneira estúpida para atingir seus objetivos. Mas a questão não é essa. Trata-se de saber se a humanidade pode cumprir seu destino sem uma revolução fundamental na situação social da Ásia. Senão, quaisquer que fossem os crimes da Inglaterra, ela foi um instrumento da História ao provocar esta revolução. Nesse caso, diante de qualquer tristeza que possamos sentir diante do espetáculo do colapso de um mundo antigo, temos o direito de exclamar como
Goethe: "Deve esta dor nos atormentarjá que ela nosso proveito aumenta,O jugo de Timur não consumiumiríades de vidas humanas?(Goethe, Westostlicher Diwan. An suleika.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

A defesa de tese de Aloizio Mercadante

Nesta sexta-feira, o futuro ex-senador e futuro Ministro de Ciência e Tecnologia Aloysio Mercadante defendeu sua tese de doutorado no Instituto de Economia da Unicamp. Seu trabalho foi um balanço dos oito anos de governo Lula, classificado pelo senador como um período de "novo desenvolvimentismo".
Nunca na história desta República uma defesa de tese havia recebido um público tão elevado. Todas as cadeiras do auditório do Instituto do Economia da Unicamp foram ocupadas. Algumas pessoas se espremeram de pé nos corredores. Outras pessoas viram o evento no telão instalado no saguão do prédio do IE.
Quem atraiu um elevado público foi não apenas o candidato a doutor (que já tem o poder de sozinho atrair um grande número de pessoas para palestras), como também a composição prevista da banca, que incluia João Manuel Cardoso de Mello, Maria da Conceição Tavares, Luiz Carlos Bresser-Pereira e Antônio Delfim Netto. Isto é para os fãs de economia o mesmo que uma partida entre Gustavo Kuerten e Andre Agassi é para os fãs de tênis.
Maria da Conceição Tavares não pode comparecer por causa de uma gripe. Ricardo Abramovay a substituiu. Foi uma perda e um ganho. A banca perdeu o conhecimento, a sabedoria, o humor e os divertidos palavrões da Conceição, mas ganhou pluralidade. Os quatro membros originais tinham orientações partidárias diferentes e haviam participado de governos diferentes, mas todos eles eram desenvolvimentistas e seguiam alguma orientação keynesiana. Escalados para avaliar um trabalho de um desenvolvimentista com orientação keynesiana. Ricardo Abramovay, embora não seja um liberal puro, sai um pouco da linha dos outros três.
Em sua exposição de 45 minutos, Mercadante defendeu que o governo Lula se diferenciou tanto do velho nacional-desenvolvimentismo de 1930-1980 quanto do neoliberalismo de Collor e Fernando Henrique Cardoso. Os quatro eixos principais do governo Lula teriam sido o estabelecimento de um modelo de desenvolvimento econômico comandado pelo desenvolvimento social, em que a economia seria puxada por um mercado de consumo de massas; o fortalecimento da democracia; a inserção externa soberana, e a nova política energética (principalmente com a descoberta do pré-sal). Mercadante também discutiu as políticas macroeconômica, científica, ambiental e educacional do governo Lula e ainda falou de prioridades a serem tratadas pelo próximo governo.
Os quatro avaliadores avaliaram positivamente a tese, assim como avaliam positivamente o governo Lula. Apesar disso, os quatro observaram discretamente que o trabalho procurou evidenciar muito mais os aspectos positivos do que os negativos do governo Lula e que exagerou ao ver 2002 como um ano de ruptura, negligenciando o que havia sido feito de continuidade a governos anteriores. Também foi destacada a conjuntura internacional favorável que vigorou até 2008, principalmente por causa do crescimento da China. Mas como a banca era composta por pessoas qualificadas, ninguém falou que tudo de bom que ocorreu no governo Lula foi resultado do governo FHC.
O próprio Mercadante reconheceu que é impossível separar totalmente o histórico militante do PT que ajudou a escrever o programa de governo do Lula desde 1989 e que foi um grande líder do governo no Senado e o acadêmico que vai fazer um trabalho de análise do governo de seu partido.
Como afirmou Delfim Netto, economistas entendem de diferenciar o produto para vendê-lo mais caro. Quase todos fazem isso. Ao comentar a avaliação de Mercadante da política científica e tecnológica do governo Lula, Delfim Netto afirmou que a Embrapa já existia desde 1970 e a Embraer desde 1967. Também afirmou que a despeito do crescimento absoluto das exportações no atual governo, as exportações brasileiras hoje equivalem a 1,3% das exportações mundiais e que isto já ocorria em 1980-1984. Bresser-Pereira lamentou a não continuidade da sua reforma de 1995.
A principal crítica de Delfim Netto à tese de Mercadante foi a de considerar que o desenvolvimento alicerçado no social teria iniciado no governo Lula. Para o ex-ministro, o modelo social teria iniciado com a Constituição de 1988. Bresser-Pereira falou da falta de abordagem teórica da tese. Abramovay reclamou que a tese foi muito pessimista (e às vezes contraditória) em relação às privatizações de FHC e observou que foi negligenciado que não só a esquerda, mas as forças políticas chamadas de neoliberais, também lutaram pela redemocratização do Brasil. João Manuel Cardoso de Mello sugeriu um texto mais curto, abordando menos temas, porém, de uma forma mais aprofundada.
No geral, a apresentação de Mercadante foi muito boa, os comentários da banca também, e o mesmo vale para as réplicas. O único problema a ser mencionado foi o clima de chá de comadres. Discussão com civilidade é muito importante para elevar a qualidade intelectual do país. Porém, fazer enormes elogios ao candidato ou a outros integrantes da banca antes de cada crítica ou manifestação de discordância já vira puxa-saquismo.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A transferência do poder



Uma imagem sobre a transição de um governo para o outro.

Fiz no Paint. Não tenho Photoshop.

As formas criativas de participação popular online na administração de Hamburgo

Desde meados dos anos 90, algumas cidades da Europa vêm promovendo a participação popular na elaboração do orçamento municipal. Muitas destas cidades se inspiraram no modelo do orçamento participativo de Porto Alegre e adotaram procedimento semelhante. O acréscimo que as cidades européias forneceram foi o uso de tecnologias da informação. Embora exista esta ferramenta nova, ela é, na maioria das cidades, utilizada para atividades tradicionais do ciclo de elaboração do orçamento participativo: coleta de demandas dos cidadãos, discussão destas demandas, votação de uma lista de demandas prioritárias. As cidades que adotam o orçamento participativo online contraram empresas de tecnologia que fornecem uma plataforma eletrônica para as mencionadas atividades.
A cidade de Hamburgo, na Alemanha, fez um programa diferente de participação popular online, o
Bürgerbeteiligung an der Haushaltplannung. Nessa cidade, o foco não é criar uma lista de obras públicas prioritárias. Os participantes debatem formas de alocar os recursos com mais eficiência, evitar gastos desnecessários e investir em projetos que levam retorno econômico à cidade. O programa não ocorre anualmente e não discute o orçamento anual. O objetivo é debater mudanças de longo prazo no perfil do gasto público da cidade.
A criação do Bürgerbeteiligung an der Haushaltplannung teve início em 2005, quando uma comissão composta por legisladores da cidade contratou uma empresa de projetos de participação na Internet. Esta empresa, em parceria com a Universidade Técnica de Hamburgo, criou uma plataforma eletrônica chamada DEMOS.
O primeiro ciclo de participação ocorreu em abril e maio de 2006. Na primeira etapa, os participantes criaram e debateram tópicos em um fórum online disponibilizado no DEMOS. A medida em que assuntos apareciam, eles eram debatidos com mais profundidade em sub-fóruns. Propostas que aparecerm nos sub-fóruns foram sistematizadas em documentos criados em conjunto pelos participantes no DEMOS, através de wikis (o exemplo mais conhecido no mundo de elaboração de textos por wiki é a Wikipedia). Modificações finais nos documentos wiki foram discutidas no fórum principal, ao final da etapa de participação. As discussões online e as sistematizações de sugestões foram auxiliadas por moderadores.
Outra novidade disponibilizada pelo DEMOS foi o "calculador de orçamento". Nele, os participantes podem sugerir modificações de prioridades gasto da administração da cidade por tema (educação, saúde, policiamento, ciência e tecnologia, trânsito, cultura, esportes). Só é possível sugerir aumento no gasto em um tema se sugerir correspondente redução em outros. O calculador indica o quando exato deve ser cortado em saúde, cultura, esportes etc para elevar uma certa quantidade em educação. O objetivo do "calculador de orçamento" é conscientizar os cidadãos de que os recursos são limitados e que, portanto, não é possível ter mais de tudo.
Apesar de inovador, o Bürgerbeteiligung an der Haushaltplannung não foi um sucesso de público. Em 2006, apenas 2870 pessoas participaram. Isto corresponde a 0,16% da população da cidade. Em cidades alemãs que adotam métodos mais simples de orçamento participativo, o total de participantes atinge por volta de 1% do total da população da cidade. Além disso, o perfil dos participantes é diferente do perfil da população da cidade como um todo. Há uma participação desproporcional de homens (85% dos participantes), jovens (76%), com educação superior (75%).
Ao todo, foram criados 1228 tópicos no fórum. Estes tópicos foram sistematizados em 38 sugestões concretas. Cada uma delas recebeu um documento em wiki contendo descrição, formas de implementação, prós e contras, e nome dos autores. Das 38 sugestões, 7 eram relativas a projetos de investimento, 4 eram relativas a criação, aumento e redução de impostos, 5 eram relativas a aumento ou redução do papel do governo local em determinados temas, 15 eram relativas a reduções de custos e 7 eram relativas ao aumento da eficiência na administração. No "calculador de orçamento", a maioria dos participantes sugeriu aumento dos gastos em educação, atendimento às crianças e ciência, e redução dos gastos em policiamento, esportes, cultura, justiça, integração, família, meio ambiente, trânsito e saúde.
A comissão de orçamento da casa legislativa de Hamburgo e os demais integrantes da casa apenas revelaram que tomaram conhecimento das propostas do Bürgerbeteiligung an der Haushaltplannung, mas não houve um compromisso formal em adotá-las. Houve algumas emendas parlamentares baseadas nestas propostas, com menção explícita.
O Bürgerbeteiligung an der Haushaltplannung foi repetido em 2009. Nesse mesmo ano, a cidade de Erfurt, com apoio da universidade local (eu me incluindo), adotou procedimento semelhante. O método de participação foi menos complexo, mas também foi criada uma plataforma de Internet para debate e sistematização de propostas para a administração local.


Mais informações podem ser encontradas em

http://www.buergerhaushalt-hamburg.de/ (Site do programa de orçamento participativo de Hamburgo. Só pode ser lido em Alemão)

http://www.binary-objects.de/ (Site da Binary Objects, empresa que colaborou na criação da plataforma deste e de muitos outros mecanismos de participação online. Tem versão em Inglês)

domingo, 28 de novembro de 2010

Brasil ascendente, Argentina decadente. É mesmo?

Quando a partir de 2003, a Argentina sob o governo Kirschner passou a apresentar taxas de crescimento do PIB nitidamente superiores às do Brasil, os pessimistas em relação à política econômica argentina atribuíram o resultado à simples recuperação da depressão. Passaram-se sete anos e viu-se que a recuperação da depressão não explica tudo. Em 2009, a distância do PIB per capita argentino do PIB per capita brasileiro estava tão grande quanto em 1998, data início da crise argentina que durou até 2002. E para 2010, a Economist prevê que o PIB argentino crescerá 8%, enquanto que o brasileiro crescerá 7,5%.
De 1980 para os dias atuais, houve um leve distanciamento entre os dois países. Em 1980, o PIB per capita brasileiro equivalia a 77% do PIB per capita argentino. Em 2009, esta relação estava em 72,3%.

Relação PIB per capita Brasil / PIB per capita Argentina

Fonte: IMF database

A Argentina teve grande crescimento econômico entre 1880 e 1914. O Brasil teve grande crescimento econômico entre 1930 e 1980, se aproximando da Argentina em PIB per capita nesse período. Esta tendência foi não apenas estancada, como levemente revertida nas três décadas mais recentes.
A realidade mostra um cenário bem diferente de estereótipos como o do Brasil como país do momento e país do futuro e da Argentina como país do passado.
Quando se compara Brasil e Argentina com os Estados Unidos, observa-se outro cenário pouco animador. Somente a partir de 2004 o Brasil começou a reverter o processo de distanciamento do PIB per capita dos Estados Unidos, iniciado em 1980. Ainda assim, a recuperação é lenta. Em 1980, o PIB per capita brasileiro equivalia aproximadamente a 30% do PIB per capita estadunidente. Esta relação chegou a 20% em 2003 e alcançou 23% em 2009.

Relação PIB per capita Brasil / PIB per capita EUA, relação PIB per capita Argentina / PIB per capita EUA

Fonte: IMF database

sábado, 27 de novembro de 2010

O que dividiu o Brasil entre Dilma e Serra?

O Tratado de Tordesilhas!!!


Mapa tirado de http://www.cartacapital.com.br/politica/os-tons-do-azul


O mapa eleitoral brasileiro mostra um fato curioso: a linha que marca a divisão político-partidária do Brasil de 2010 não é muito diferente de uma linha traçada em 1494.
Os estados vermelhos estão quase todos eles na área lusitana desde a origem. Os estados azuis estão na área que deveria pertencer aos espanhóis.
As excessões de um lado foram Amazonas, Pará e Amapá; e de outro foi o Espírito Santo. Mas ao observar a história desses estados, é possível perceber que estas excessões não são tão excepcionais assim. A região do Amazonas atraiu interesse de colonizadores desde os primórdios da chegada dos ibéricos ao continente americano. O Espírito Santo demorou para ser ocupado como um todo porque os índios que lá habitavam não eram dos mais amigáveis.
Em poucas palavras: Dilma venceu nas áreas de colonização precoce e Serra venceu nas áreas de colonização tardia. Se foi apenas coincidência ou se existe alguma relação de causalidade, eu não sei.


Em um post anterior, eu cheguei a afirmar que o mapa eleitoral do Brasil atual é o oposto do mapa eleitoral dos EUA atual. Aqui, o PT vence, em geral, nos estados mais pobres, enquanto que lá, o Partido Democrata vence, em geral, nos estados mais ricos. Mas considerando a história e não a renda dos estados, vê-se que existe um padrão semelhante, e não oposto. Assim como o PSDB vence em estados do Oeste, de colonização mais tardia, o Partido Republicano também vence em estados do Oeste (tirando os litorâneos), onde a ocupação por brancos também demorou mais para acontecer.

sábado, 20 de novembro de 2010

A triste romantização do monoglotismo feita por Lula

Não tenho o hábito de ver coisas erradas em discursos do Lula e considero anedóticos os mimimis feitos pelos de sempre contra o uso de expressões coloquiais e contra as "críticas à mídia".
Mas um discurso, em particular, foi um péssimo exemplo para um país que quer se tornar desenvolvido.
http://www.youtube.com/watch?v=keyVjdMFJec
Neste discurso que era para ser supostamente contra o preconceito, Lula berrou as seguintes palavras a partir do 1:20.

"Uma vez eu estava almoçando na Folha de S. Paulo, um diretor da Folha de S. Paulo perguntou pra mim escuta aqui ô candidato, o senhor fala Inglês? eu falei não, como é que você quer governar o Brasil se você não fala Inglês?, eu vou arrumar um tradutor, mas assim não é possível, o Brasil tem que ter um presidente que fala Inglês, aí eu perguntei pra ele alguém perguntou se o Bill Clinton fala Português?, não, mas eles achavam que o Bill Clinton não tinha obrigação de falar Português, era eu, o subalterno, do país colonizado, que tinha que falar Inglês"

Em primeiro lugar, não tem nada de errado um presidente não falar idiomas estrangeiros. Mesmo os presidentes que falam idiomas estrangeiros utilizam intérpretes no ofício.
Mas não há problema algum em achar que Lula, como um cidadão, e não como presidente, devesse falar Inglês, assim como os demais cidadãos brasileiros. O aprendizado de idiomas estrangeiros facilita a circulação de informação, conhecimento e idéias, contribuindo para o desenvolvimento econômico, social e cultural. Dialogando com outros povos, é possível conhecer e compreender outras formas de pensar, e por isso, o aprendizado de idiomas estrangeiros está muito mais vinculado ao combate do que ao fomento de preconceitos.
Infelizmente, vivemos em um país onde não apenas grande parte da população pobre, que estudou em escola pública de baixa qualidade (o que já é um problema grave), não fala o idioma de Shakespeare. Há muitos monoglotas de classe média com diploma de bacharelado.
A comparação o presidente do Brasil falar Inglês/o presidente dos EUA falar Português foi improcedente. Há, no planeta em que vivemos, chefes de Estado de 200 países. Muitos destes chefes falam Inglês. Seria difícil esperar que para compensar, o presidente dos EUA falasse cada um dos idiomas maternos dos chefes de Estado que falam Inglês.
Um exemplo interessante é o do ex-presidente da Rússia Vladmir Putin. Ele falava Inglês e não tinha interesse em saber se o Bush falava Russo. Nas mesas de negociação, Putin levava vantagem. Ele entendia o que Bush falava em Inglês, e aproveitava para raciocinar a resposta no tempo em que o intérprete traduzia para o Russo. Bush, que não falava Russo, tinha que prestar atenção para o intérprete. Putin podia ter muitos defeitos, mas não era colonizado nem líder de país subalterno.
Dizem que na China, outro país nem um pouco colonizado e subalterno, quando um ocidental é visto andando pelas ruas, as mães chinesas olham para suas crianças e falam "aproveita essa pessoa para praticar o Inglês que você está aprendendo na escola".
Mesmo os franceses, que em outros tempos eram hostis ao idioma do outro lado do canal, estão percebendo o tamanho da tolice. Os jovens falam Inglês com menos objeção. Ah sim, quem vai para a França para trabalhar ou estudar, mesmo que o trabalho ou o estudo sejam em Inglês, deve aprender um pouco de Francês anteriormente, para o dia a dia, e o turista que não fala Francês deve consultar o básico em guias turísticos, porque abordar um local, em seu próprio país, em outro idioma, não é uma atitude muito polida. O mesmo vale para qualquer país. Isso tudo, porém, mostra não que não é importante falar Inglês, mas sim que é muito bom aprender um segundo idioma estrangeiro.
Quem não gosta de idioma de outro país é a direita, principalmente aquela que fomenta o preconceito. O NPD da Alemanha defende o fim das aulas de Inglês para crianças no Jardim da Infância. O candidato democrata a presidente dos EUA em 2004 John Kerry tinha vergonha de assumir em público que falava Francês, porque os republicanos estavam em forte campanha anti-França.

domingo, 17 de outubro de 2010

Mensagem aos eleitores de Marina Silva

Não votei em Marina Silva no primeiro turno. Votei em Dilma Roussef. Por concordar mais com o projeto político de Dilma. Não tenho objeções à pessoa de Marina. Durante esta campanha eleitoral, eu sempre discordei da posição dos petistas mais fanáticos, que consideravam Marina Silva uma traidora ou que sua campanha era útil para a direita.
Acredito que os eleitores de Marina Silva têm muitas objeções, algumas delas bastante compreensíveis, à candidata Dilma Roussef e ao governo Lula. Mas certamente não acreditam em clichês propagados por alguns eleitores de José Serra como o de que “o governo Lula é o mais corrupto da história”, “todos os acontecimentos positivos do governo Lula foram iniciados por FHC” ou “o Bolsa Família foi feito para comprar voto de vagabundo”. Quem acredita nisso não teria votado em uma histórica militante do PT, que permaneceu no partido até 2009 e no governo Lula até 2008.
Portanto, não será difícil dialogar com os eleitores de Marina Silva. Respeitando e discutindo as críticas que possam ter à Dilma e à Lula, pretendo demonstrar que aquilo que os eleitores de Marina Silva procuram pode ser mais facilmente encontrado na candidatura de Dilma Roussef do que na de José Serra.
Em primeiro, lugar, obviamente, a questão ambiental. É verdade que a atenção dada pelo governo Lula ao meio-ambiente ficou aquém do esperado. Mas ao menos, os ambientalistas disputaram espaço dentro do governo Lula. O trabalho iniciado por Marina Silva e continuado por Carlos Minc gerou resultados. Como pode ser verificado aqui, o deflorestamento bruto da Amazônia Legal vem apresentando forte declínio desde 2004. Naquele ano, foram desmatados aproximadamente 28 mil quilômetros quadrados. Em 2009 foram desmatados menos de 10 mil.
Em um eventual governo Serra, os ambientalistas teriam espaço muito mais reduzido. A senadora Katia Abreu, aliada de Serra, chamou o ministro Carlos Minc de ecoxiita. Tasso Jereissati, outro aliado de Serra, endossou. E como foi muito bem demonstrado no blog de Idelber Avelar, as áreas das Regiões Norte e Centro-Oeste que apresentaram mais desmatamento foram as áreas que deram mais votos a José Serra. O blogueiro também demonstrou que o PSDB se opôs à Operação Arco de Fogo, que foi fundamental para a redução contínua do desmatamento da Amazônia.
Ainda indiretamente relacionado ao tema, é importante lembrar as ações do governo Lula contra o trabalho escravo. Durante o governo Lula foram retirados seis vezes mais trabalhadores da condição de escravidão do que durante o governo FHC. Durante esta campanha eleitoral, Dilma Roussef assinou um compromisso contra o trabalho escravo.
Em segundo lugar, assim como a própria Marina Silva, seus eleitores também podem ter algumas críticas à política externa do governo Lula. Eu também tenho. Desaprovei completamente as declarações do presidente Lula a respeito dos oposicionistas no Irã. Mas são poucos os líderes de países democráticos que não mantém boas relações com regimes autoritários. Bajular o tirano do Irã é muito ruim, mas a campanha de José Serra é bem pior, ao mobilizar os setores da sociedade que querem trazer as idéias do Irã para nossas terras. Apesar de alguns problemas, a política externa do governo Lula acumulou mais sucessos do que fracassos. Basta comparar a cobertura da imprensa estrangeira com a cobertura da imprensa brasileira ao nosso governo. Os jornais Le Monde e El País consideraram Lula o “homem de 2009”.
A política externa deste governo permitiu diversificar as exportações brasileiras e fortalecer os países em desenvolvimento nas negociações mundiais sobre comércio e finanças.
Em terceiro lugar, é importante comentar a repercussão que sites serristas, logo após o primeiro turno, deram ao tratamento desrespeitoso que alguns dilmistas concederam a Marina Silva antes do primeiro turno. É verdade que em meio a muitas críticas qualificadas, alguns eleitores de Dilma fizeram críticas desqualificadas à candidata verde. Mas cada eleitor tem sua opinião pessoal que muitas vezes diverge daquela de seu candidato. Insultos bem maiores à Marina Silva foram encontrados no campo serrista. Um colunista aliado de Serra há uma década chamou Marina de “santinha da floresta oca”. Em contrapartida, Luís Nassif, um dos mais conhecidos colunistas favoráveis a candidatura de Dilma Roussef, fez um ótimo texto elogioso sobre Marina Silva. O texto foi escrito em 19 de agosto, quando era esperada a vitória de Dilma no primeiro turno.
O próprio José Serra afirmou que Marina Silva e Dilma Roussef são parecidas. Ele não parece preocupado em obter os 10% cativos da candidata verde. Ele parece preocupado apenas em obter os outros 10% de última hora, aqueles que optaram por Marina Silva no primeiro turno simplesmente por rejeitarem Dilma e Serra.
Depois de discutir e rebater muitos supostos motivos para não votar na Dilma, pretendo apontar motivos para votar na Dilma. Um deles é o voto de solidariedade. Gostaria que não apenas quem votou em Marina Silva, mas também quem votou em Plínio ou quem anulou no primeiro turno pensasse nisso.
Para nós da classe média, pouco faz diferença no nosso cotidiano quem é o Presidente da República. Para milhões de brasileiros, que recentemente ultrapassaram a linha de indigência ou a linha de pobreza, o governo Lula fez a diferença, para melhor. Não apenas por causa do Bolsa Família e do Luz para Todos, como também por causa do aumento do salário mínimo e do crescimento da economia. Em solidariedade a essas pessoas, eu recomendo o voto em Dilma Roussef, para manter estas conquistas. São essas pessoas que têm poucos meios para se expressarem e ainda são esculachadas por alguns “cientistas políticos” e por colunistas de baixa qualidade.
E por fim, a questão de gênero. Por muito tempo, considerei pouco relevante o fato de Dilma Roussef ter a possibilidade de ser a primeira mulher a ocupar a cadeira de Presidente do Brasil. O gênero não faz alguém ser melhor nem pior. Jamais gostaria que Yeda Crusius ou Katia Abreu fossem uma ou outra a primeira mulher presidente. Mas como nesta campanha os elementos machistas e retógrados da sociedade brasileira, que sempre existiram, mas estavam adormecidos, subitamente acordaram. Portanto, a eleição de Dilma Roussef teria importância simbólica fundamental.

sábado, 16 de outubro de 2010

Os boatos sobre o auxílio-reclusão

Eu nunca recebi nenhuma corrente de e-mail a respeito do auxílio-reclusão, mas conheço muitas pessoas que receberam. Algumas acharam as mensagens ridículas, outras acreditaram.
Por isso, achei importante divulgar a verdade sobre o benefício.
Nas correntes de spam, havia duas mentiras:
1. Todas as famílias de presidiários recebiam o auxílio-reclusão.
2. Famílias com muitos filhos recebiam grandes quantidades de dinheiro.
O verbete da Wikipedia http://pt.wikipedia.org/wiki/Aux%C3%ADlio-reclus%C3%A3o explica de forma bastante didática o benefício. E esclarece que:
1. O auxílio-reclusão só é válido se o requerente for contribuinte da previdência social, ou seja, se exercer atividade remunerada regular.
2. Existe um teto do benefício em 810 reais. O benefício não pode ultrapassar este teto, mesmo se o número de dependentes for grande.
Em suma: as famílias dos piores criminosos não recebem o auxílio-reclusão, porque os piores criminosos não contribuem para a Previdência.

Os boatos foram espalhados há algum tempo, portanto, a motivação eleitoreira não é muito direta. Mas pelo teor do texto comentado por quem recebeu, havia intenção de mostrar o governo Lula como protetor dos criminosos. A verdade é que o auxílio-reclusão foi instituído em 1991.

Quem repassou o spam sem pesquisar é apenas um elemento muito bobo. Quem escreveu o texto do spam publicou deliberadamente uma farsa. Informações verdadeiras sobre o auxílio-reclusão são facilmente disponíveis.

domingo, 10 de outubro de 2010

Em 1985, FHC criticava uso de demagogia religiosa em campanha eleitoral

Belo discurso

http://www.youtube.com/watch?v=uyvWXZDlhNY&feature=related

2:45
"A cruz não há de ser usada para obter o voto. O voto é coisa séria. A cruz mais ainda"

3:08
"essa campanha... Eu não imaginava tão áspera, tão cheia de baixeza"

3:50
"Fazem da fé, instrumento de ambição pessoal"

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Mitos existentes na comparação entre a era FHC e a era Lula

Eu sei que este assunto não é o mais importante para decidir se o melhor presidente do Brasil seria Dilma Roussef ou José Serra, mas neste clima de campanha eleitoral, muitas informações inverídicas circulam, pela imprensa e pela web.
Portanto, decidi fazer esta postagem para responder a dois mitos difundidos por propagandistas do PSDB, que são os seguintes:
1. O PIB do Brasil cresceu mais durante o governo Lula do que durante o governo FHC porque Lula teve a sorte de pegar uma conjuntura internacional favorável, enquanto FHC pegou muitas crises internacionais
2. Os bons indicadores da economia durante o governo Lula ocorreram porque FHC "colocou a casa em ordem", depois de ter "pegado a casa desarrumada"

Vamos ao primeiro mito.
Como é possível ver na tabela 1, o PIB do Brasil durante os oito anos de FHC (1995-2002) cresceu a uma taxa média geométrica anual de 2,28%, enquanto que a média dos oito anos de Lula (2003-2010) foi de 3,98% (considerando a expectativa modesta de crescimento de 7% em 2010). A diferença de crescimento do PIB mundial não foi muito grande: 3,40% nos oito anos de FHC, 3,82% nos oito anos de Lula.
A tabela 2 mostra que enquanto na era FHC, o crescimento do PIB brasileiro foi equivalente a 67% do crescimento do PIB mundial; na era Lula, o crescimento do PIB brasileiro superou levemente o crescimento do PIB mundial. Portanto, a diferença entre o desempenho da economia brasileira na era FHC e o desempenho da economia brasileira na era Lula não pode ser explicada pelo desempenho da economia mundial.
É importante lembrar também que durante a era Lula, o PIB brasileiro cresceu um pouco mais que o mundial somente por causa do grande diferencial obtido no segundo mandato, quando o Brasil reagiu bem à crise internacional. Durante o primeiro mandato, quando a economia mundial estava em expansão, o PIB do Brasil teve desempenho decepcionante, e seu crescimento correspondeu a apenas 76% do crescimento do PIB mundial. Mas curiosamente, foi nesta época que a grande mídia mais elogiava a política econômica do governo Lula. Palocci era visto como uma divindade. Enquanto isso, a revista Carta Capital, tida como chapa-branca, mostrava que outros países emergentes (incluindo a teimosa Argentina) estavam tendo desempenho econômico bem melhor. Curiosamente, quando o PIB brasileiro passou a crescer consideravelmente mais que o PIB mundial, a grande mídia passou enxergar mais negativamente a política econômica do governo.

Tabela 1: crescimento do PIB nos locais e períodos selecionados (elaboração própria)

Dados obtidos em http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2010/02/weodata/index.aspx

Tabela 2: relação crescimento do PIB brasileiro / crescimento do PIB mundial em períodos selecionados (elaboração própria)

Dados obtidos em http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2010/02/weodata/index.aspx

O gráfico 1 mostra que nos últimos 16 anos, o período de maior crescimento do PIB mundial se deu entre 2004 e 2007, durante a era Lula. Mas o pior momento da economia mundial, 2008-2009, também ocorreu durante a era Lula. O biênio 2001-2002, final da era FHC, foi de estagnação mundial por causa do estouro da bolha acionária das empresas de alta tecnologia nos EUA. Mas o período 1995-2000 não pode ser considerado uma conjuntura internacional desfavorável. É verdade que houve algumas crises cambiais em países emergentes, mas a vulnerabilidade do Brasil a elas estava ligada a políticas econômicas internas (o que será visto a seguir). Paralelamente às crises nos países emergentes nos anos 90, os EUA, o maior parceiro comercial do Brasil na época, vivia o maior período de prosperidade de tempos recentes. Quem tem curiosidade em saber mais sobre este tema, pode ler um texto de Ricardo Carneiro, que mostra que o baixo crescimento do PIB brasileiro ocorrido na era FHC teve pouca relação com os efeitos das crises internacionais.
Outro detalhe que pode ser observado pelo gráfico é o de que nos oito anos de FHC, em apenas um deles, o PIB brasileiro cresceu mais que o mundial: foi 1995, justamente o primeiro ano. Na era Lula, o PIB brasileiro cresceu mais que o mundial em 2004 e em todos os anos do segundo mandato (2007-2010).

Gráfico 1: crescimento do PIB em locais e anos selecionados (elaboração própria)

Dados obtidos em http://www.imf.org/external/pubs/ft/weo/2010/02/weodata/index.aspx

Em relação à América Latina, os desempenhos comparativos de Lula e FHC foram semelhantes. O PIB da região cresceu consideravelmente mais entre 2003 e 2010 do que entre 1995 e 2002. Mas em outros países, como a Argentina, o crescimento maior também sucedeu à reversão de políticas neoliberais.


Agora vamos ao segundo mito.
O segundo mito parte de uma verdade: a de que um governo não deve ser avaliado exclusivamente pelos indicadores ocorridos durante o período do próprio governo, porque os indicadores de um governo são influenciados pelas ações de governos anteriores e as ações de um governo influencia indicadores de governos posteriores.
Porém, não é verdade nem que FHC pegou o inferno de governos anteriores, nem que FHC deixou o céu para Lula.
É inegável que a estabilidade de preços proporcionada pelo Plano Real tenha trazido enormes benefícios econômicos e sociais ao Brasil. Mas para atingir a estabilidade maior, foram criadas, algumas vezes de forma desnecessária, instabilidades menores.
Vejamos primeiro às finanças públicas: o setor público brasileiro gerou superávits primários no início dos anos 90. No primeiro mandato de FHC, o superávit primário foi zerado. Só foi reestabelecido, na casa dos 3%, quando o governo foi forçado a fazer isso, por causa da crise cambial de janeiro de 1999.

Gráfico 2: superávit primário do setor público

www.ipea.gov.br

Observando os superávits operacionais, a situação fica ainda pior. Havia um razoável equilíbrio no início dos anos 90. No primeiro mandato de FHC, foram feitos enormes déficits. Isto foi resultado, além da eliminação do superávit primário, do pagamento de juros enormes como resultado da vulnerabilidade do Brasil às crises cambiais de países emergentes.

Gráfico 3: superávit operacional do setor público

www.ipea.gov.br

O descontrole das finanças públicas no primeiro mandato de FHC teve impacto na relação dívida pública/PIB, que era declinante no início dos anos 90 e cresceu acentuadamente de 1995 a 2002, declinando posteriormente.

Gráfico 4: relação dívida pública/PIB em %

www.ipea.gov.br

A política cambial irresponsável do primeiro mandato de FHC, além do impacto causado nas finanças públicas por causa dos juros elevados, gerou danos nas contas extenas, que foram o responsável pela vulnerabilidade às crises internacionais. O saldo comercial, positivo até 1994, tornou-se negativo entre 1995 e 2000. O saldo em transações correntes, em razoável equilíbrio até 1994, tornou-se fortemente negativo posteriormente.
A abertura comercial não explica a deterioração do saldo comercial. Isto porque quatro anos depois do início a redução de tarifas e eliminação das barrerias não tarifárias, o saldo comercial ainda era positivo.

Gráfico 5: saldo comercial e saldo em transações correntes no Brasil em US$

www.ipea.gov.br

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Moralismos seletivos: Serra, celebridades, Tiririca...

1. No debate de candidatos promovido pela TV Globo, José Serra atacou Marina Silva por ela ter permanecido como ministra de Lula mesmo depois do mensalão. Mas a principal cheerleader da campanha de Serra na Internet só saiu do PT dois anos depois do mensalão. Concorreu ao cargo de deputado federal em 2006 pelo PT, já depois do mensalão.

2. Não votei no Netinho, mas a presença de celebridades na política não é uma patologia. Se uma parcela da sociedade se sente mais bem representada por celebridades do que por políticos tradicionais, isto faz parte da democracia. Noto que muita gente que ficou com nojinho da candidatura do pagodeiro acha cool a figura mencionada no tópico anterior. Para essa gente, celebridade só vale se for voltada para o público da sala de estar. Se for voltada para o público da cozinha, a política fica vulgar.

3. Muita gente alertou, com razão, que os votos no Tiririca ajudariam a eleger mensaleiros. Bom, um dos eleitos pelos votos do Tiririca foi um delegado que colocou sua própria carreira no sacrifício para investigar... um dos principais suspeitos de ter colocado dinheiro no mensalão. Portanto, muitas das pessoas que odeiam o partido do mensalão acabaram enxergando um lado positivo no Tiririca, por ter auxiliado alguém que pode esclarecer mais detalhes do mensalão. Ei, agora eu lembrei, muitas destas pessoas citadas também odeiam este mencionado delegado. Mas quem quer ver os mensaleiros punidos não deveria gostar deste delegado? Hmmm, vai ser muito complicado explicar aqui nestas curtas notas. Deixa para depois.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

A destruição do mito do "paulista reaça"

Embora as principais candidaturas para a Presidência da República convirjam para o centro desde 2002, quem acompanha debates na web e nas ruas pensa que o Brasil vive clima de intensa polarização, não apenas política, como também regional.

Surgem estereótipos regionalistas estúpidos. Um deles é o do "nordestino vagabundo que vota no PT porque recebe o Bolsa Família". O outro, igualmente estúpido, com sinal trocado, é o da "elite paulista preconceituosa" ou do "paulista reacionário".
Estas eleições ajudaram a afundar este estereótipo por vários motivos:
1. É natural que um candidato a presidente obtenha maioria onde ele foi governador. Mas 59,4% dos eleitores de São Paulo votaram contra José Serra. Em 1989, Collor obteve maioria esmagadora no estado de Alagoas.
2. Plínio teve mais do que 1% dos votos no estado de São Paulo, mas não no Brasil como um todo.
3. O candidato a senador mais votado foi um ex-guerrilheiro. O segundo foi uma feminista. O terceiro foi um artista popular negro. O quarto foi um engajado em ética empresarial e causas ambientais.
4. Somente São Paulo e Rio de Janeiro elegeram deputados do PSOL.
5. Foram eleitos muitos deputados federais de partidos de esquerda. Com a ajuda dos votos em um humorista cearense (ou seja, tem gente que pode ter mal gosto para votar, mas não é preconceituosa).
6. O partido que obteve maior número de cadeiras na Assembléia Legislativa foi o PT, com 24. O PSDB obteve 23.

Uma tendência interessante pode ser observada no mapa eleitoral publicado no Estadão. Em azul claro estão os municípios onde Serra teve maioria simples, em azul escuro onde ele obteve maioria absoluta. Em vermelho claro estão os municípios onde Dilma teve maioria simples, em vermelho escuro onde ela obteve maioria absoluta.
É possível observar que Dilma obteve algumas vitórias no Oeste, em municípios localizados no Vale do Ribeira e no Pontal do Paranapanema, perto da divisa com Paraná e Mato Grosso do Sul. Tradicionalmente, o voto de esquerda em São Paulo esteve concentrado em bairros pobres de municípios grandes e ricos. Principalmente nas regiões metropolitanas de São Paulo e Campinas, e nos eixos da Anhanguera, da Anchieta e da Dutra. O Oeste, que apesar de ser a parte menos rica do estado, era uma fortaleza conservadora. Esta tendência está sendo revertida.




Obtido em http://www.estadao.com.br/especiais/geografia-do-voto,120705.htm

sábado, 2 de outubro de 2010

Incrível! Um potencial "argumentasso" ainda não foi utilizado!

As eleições são amanhã e ainda não vi nenhum colunista, nenhum ex-cineasta, nenhum acadêmico blockbuster, dizendo:

"No dia 3 outubro de 2010, a Alemanha celebra exatos 20 anos de reunificação, e enquanto isso, os brasileiros vão as urnas para decidirem se querem seguir o caminho da Alemanha Ocidental ou da Alemanha Oriental"

Parece que tentar transformar um debate entre capitalismo com Estado pequeno e capitalismo com Estado grande em um debate entre capitalismo e comunismo virou um argumento obsoleto.
Felizmente!

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

De 2000 a 2008, o Datafolha SUPERESTIMOU a votação do PT na véspera

A última vez que a Datafolha cometeu um erro grave ao subestimar a votação em um candidato do PT ocorreu na eleição para governador de São Paulo em 1998. A pesquisa de véspera apontava Paulo Maluf em primeiro com 31%, e em empate técnico, em segundo, Francisco Rossi, Mário Covas e Marta Suplicy, respectivamente com 18%, 17% e 15%. Para evitar um segundo turno entre Maluf e Rossi, alguns simpatizantes do PT deram voto útil em Covas. Depois de apurados os votos, Maluf terminou realmente na frente, Covas foi para o segundo turno com uma pequena vantagem sobre Marta, e Rossi terminou alguns pontos atrás. O voto útil induzido pela pesquisa tirou Marta do segundo turno. Mas foi um simples erro, cometido também pelo Ibope. Muito provavelmente, alguns eleitores indecisos optaram pela Marta na última hora.


Depois disso, a tendência mais comum da Datafolha é superestimar a votação do candidato do PT nas pesquisas realizadas em véspera de eleição. Isto vale para as eleições para prefeito de São Paulo, senador de São Paulo e presidente do Brasil.
A tabela abaixo mostra em vermelho escuro os erros de superestimação dos votos do PT em menos de um ponto percentual, em vermelho claro os erros entre um e dois pontos, e em laranja os erros em mais de dois pontos (este último tipo de erro é superior à margem).

Percentuais de votos válidos em candidatos em eleições selecionadas, de acordo com pesquisas Datafolha divulgadas na véspera e resultados finais divulgados pelo TSE

Fonte: Datafolha e TSE
Nas eleições para prefeito de São Paulo de 2000, 2004 e 2008, a votação da Marta foi superestimada no primeiro e no segundo turno. No primeiro turno de 2004 e 2008, os erros foram bastante acentuados.
Nas eleições para senador de São Paulo, a diferença entre Suplicy e Afif apontada pela pesquisa de véspera foi brutalmente superior à diferença verificada na apuração.
No primeiro turno das eleições para presidente do Brasil de 2002 e de 2006, a votação de Lula foi superestimada. O instituto apontava nas duas vezes a possibilidade de decisão no primeiro turno (em 2002 pela margem), o que acabou não ocorrendo.
Somente na eleição para governador de São Paulo, a superestimação da votação no candidato do PT não ocorre. Em 2002 e 2006, assim como havia ocorrido em 1998, o candidato do PT cresceu significativamente da véspera para o dia da votação. Nas três vezes, pode ter ocorrido o efeito Lula. O eleitor sabia que ia votar em Lula, mas deixou para decidir votar no candidato do PT a governador só no dia.
Os resultados divergentes em relação à pesquisa de véspera e ao resultado oficial podem ter duas causas: mudança de decisão do eleitor na última hora e erro de amostragem. A pesquisa boca de urna estaria imune à primeira fonte de erro. Mas as pesquisas boca de urna do Datafolha de 2000 e 2002 foram mais semelhantes às pesquisas de véspera do que ao resultado final. Portanto, o erro pode estar na escolha da amostra.
Posteriormente, o Datafolha não fez mais pesquisas boca de urna.
Em 2010, as pesquisas do Datafolha apontam vantagem menor para a Dilma do que as pesquisas de outros institutos. Pode ser que o instituto tenha aprendido a coletar amostras que não superestimem a votação no PT.
De qualquer forma, a observação do histórico de pesquisas e resultados eleitorais mostra aos petistas que eles não devem comemorar antes da hora. Como dizia um provérbio chinês do século VI DC, "o jogo só termina quando o juiz apita".

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Marina Silva é a preferida da USP, Serra é o segundo

Uma pesquisa realizada pelo Datafolha com estudantes, professores e funcionários da Universidade Estadual de São Paulo, nos dias 13, 14 e 15 de setembro, mostrou que 31% dos entrevistados pretende votar em Marina Silva, 27% em José Serra, 21% em Dilma Roussef, e 7% em Plínio Sampaio. Foram entrevistados 698 estudantes, 162 funcionários e 154 professores.
As preferências dentro de cada grupo foram as seguintes:

Estudantes
Marina Silva 31%
José Serra 28%
Dilma Roussef 20%
Plínio Sampaio 7%

Funcionários
Dilma Roussef 37%
Marina Silva 28%
José Serra 14%

Professores
José Serra 38%
Dilma Roussef 25%
Marina Silva 22%
Plínio Sampaio 7%

Dados completos da pesquisa, inclusive com intenção de voto para governador, podem ser encontrados em http://www.jornaldocampus.usp.br/index.php/2010/09/marina-e-serra-sao-os-mais-votados-na-usp/

Normalmente se espera que candidatos de esquerda tenham melhor desempenho dentro de universidades do que fora delas. Quando o principal partido de esquerda tem baixa preferência dentro da melhor universidade do Brasil, há um sinal de crise de idéias. Há lugares em que discursos contra "mídia golpista" ou "formadores de opinião" não encontram boa recepção.
Considerando os votos na esquerda a somatória de Dilma, Marina e Plínio, e os votos na direita os de Serra, a proporção esquerda-direita na USP é 59-27 e no Brasil como um todo (segundo a última Datafolha) é 62-28. Ou seja, a distribuição de votos na esquerda e na direita na USP segue a tendência nacional, mas muitos esquerdistas na USP optam por Marina Silva e Plínio Sampaio. O PT perdeu espaço em uma antiga fortaleza.
Isto é um sinal amarelo para o partido vermelho. Um partido não pode depender exclusivamente de votos de pessoas satisfeitas com a economia. Estes votos já foram da Arena em 1970, do PMDB em 1986 e de FHC em 1994.

domingo, 5 de setembro de 2010

Será que o Paul Krugman leu meu blog?

Em 6 DE AGOSTO eu escrevi:

"...o desemprego da Alemanha no auge da crise foi de 7% e o dos EUA foi de 10%. Ou seja, o mercado de trabalho da Alemanha, com maior regulação, maior seguro-desemprego e maior taxa de sindicalização, funcionou melhor durante a crise do que o mercado de trabalho dos EUA. E isso tudo era considerado vilão do bom funcionamento dos mercados de trabalho pela ortodoxia...".
http://blogdomarcelobrito.blogspot.com/2010/08/logica-de-celso-ming-e-similares.html

Em 29 DE AGOSTO eu escrevi:

"Agora, até mesmo o mouse do meu computador sabe como serão as muitas coluninhas que aparecerão em cadernos de economia e jornais de business nos dois casos.
Se a economia dos EUA se recuperar melhor, as causas apontadas serão a maior flexibilidade dos mercados de trabalho, o menor valor e menor abrangência do seguro-desemprego, o menor poder dos sindicatos, o menor peso dos gastos sociais, e a menor carga tributária.Se a economia da Alemanha se recuperar melhor, as causas apontadas serão a maior rejeição do governo conservador ao uso de déficits fiscais como estímulo, e a política de contenção dos salários".
http://blogdomarcelobrito.blogspot.com/2010/08/quem-tera-melhor-recuperacao-depois-da.html

Em 2 DE SETEMBRO, Paul Krugman escreveu:

"What is this telling us? German growth hasn’t been great, one quarter notwithstanding; but it avoided US-style mass layoffs even when it was slumping badly. Part of the explanation is the Kurzarbeit program of work-sharing; also, Germany’s labor laws and its strong unions have led to a situation in which workers aren’t treated as much as variable costs as they are here.
So American conservatives now holding up Germany as a role model are actually praising the virtues of
Eurosclerosis, and disparaging American-style capitalism".
http://krugman.blogs.nytimes.com/2010/09/02/kurzarbeit/

domingo, 29 de agosto de 2010

Aloizio Mercadante e Manuel Zelaya: unidos pelo chapéu e pelo bigode


http://noticias.terra.com.br/eleicoes/2010/fotos/0,,OI134785-EI15311,00-Mercadante+visita+Festa+do+Peao+de+Boiadeiro+em+Barretos.html




Quem terá melhor recuperação depois da crise? EUA ou Alemanha?

Os resultados do PIB dos dois países do quarto trimestre deste ano só aparecerão no início de 2011. Nem eu, que sou um ser humano pensante (será?), tenho alguma previsão.

Agora, até mesmo o mouse do meu computador sabe como serão as muitas coluninhas que aparecerão em cadernos de economia e jornais de business nos dois casos.

Se a economia dos EUA se recuperar melhor, as causas apontadas serão a maior flexibilidade dos mercados de trabalho, o menor valor e menor abrangência do seguro-desemprego, o menor poder dos sindicatos, o menor peso dos gastos sociais, e a menor carga tributária.
Se a economia da Alemanha se recuperar melhor, as causas apontadas serão a maior rejeição do governo conservador ao uso de déficits fiscais como estímulo, e a política de contenção dos salários.

É igual comentarista de futebol de segunda-feira que já tem opinião formada no sábado sobre um determinado jogador. Se este jogador entra só no segundo tempo e o time perde, é porque ele teve pouco tempo para jogar. Se ele entra só no segundo tempo e o time ganha, é porque ele teve papel decisivo.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

A crença em Deus aproxima um chefe de Estado dos valores?



José Serra acha que sim. E passa uma péssima mensagem para um país que quer se modernizar, não apenas na economia, mas também nas idéias. Quem acredita em Deus pode até mesmo dizer que o país é abençoado, porque ao contrário do que ocorre em alguns países da Ásia, da África e da Europa Oriental, no Brasil não há conflitos religiosos. No Brasil há pessoas de diferentes crenças e que na maioria das vezes se respeitam e se toleram. Mas falta uma coisa para melhorar: no Brasil também há pessoas que não têm crenças, e estes, embora não sejam perseguidos, são incompreendidos por uma larga parcela da população. Esperava-se de um intelectual que fosse um líder, para ensinar as pessoas a tolerar quem é diferente, e mostrar que acreditar em Deus não faz alguém nem melhor nem pior. Mas para tentar ganhar uns votinhos a mais, endossar só um preconceitozinho a mais é visto como uma arma necessária.

Parece ser uma sistemática estratégia da campanha do Serra atacar a falta de religiosidade da Dilma. Índio da Costa já fez isso no Twitter. No debate de ontem promovido pela TV Canção Nova, ele afirmou que Dilma não compareceu ao evento entre outras coisas porque não queria se expor por causa do 3PNDH. Ou seja, o candidato tucano quis que os padres atacassem Dilma por causa do programa. Serra teve a oportunidade de ter perguntado diretamente à Dilma sobre o plano, durante o debate na Band, mas não teve galhardia suficiente. Prefere que os ataques partam de terceiros. Não quer perder a parcela cult de seu eleitorado, aquela que recebe ensinamentos de uma ex-VJ da MTV. Por causa disso também, acusou o 3PNDH de criminalizar quem é contra o aborto. O plano não criminaliza quem é contra o aborto. Apenas defende a legalização do aborto. Mas eufemismos são necessários para não assustar a mencionada parcela cult.

Posturas bem diferentes tiveram a evangélica Marina Silva e o católico Plínio Arruda Sampaio no debate de ontem. Os dois deixaram claramente que mesmo sendo religiosos, são contra o uso destas para desrespeitar quem não tem religião ou quem não segue costumes recomendados por religiões. Plínio pode ter pisado na bola no Twitter, mas no debate esteve impecável, defendendo a legalização do aborto por questão de saúde pública, defendendo a lei anti-homofobia, e de uma forma bastante simpática aos religiosos, defendendo a retirada de símbolos religiosos de prédios do Estado. Marina Silva, outrora acusada se ser fanática, teve resposta completamente diferente da de Serra na pergunta sobre a importância do Presidente da República acreditar em Deus.

Será que quem tanto batia em Marina Silva por seu suposto fanatismo vai agora bater em Serra? Ou será que a objeção à Marina não era o seu suposto fanatismo em si, mas sim o fato dela ser da igreja da concorrência?

Será que quem ficou indignado com a recusa dos jogadores evangélicos do Santos de visitar, à revelia deles, um centro espírita, vai ficar indignado com o Serra? Ou o motivo da indignação seria o simples fato destes jogadores serem da igreja da concorrência?

Vamos esperar que um dia sejamos como a Austrália, onde uma primeira-ministra não precisa de dedos para assumir que é atéia

http://www.youtube.com/watch?v=3hMgY8z96dE

Ou os Estados Unidos, onde seu presidente faz um contundente discurso a favor do Estado laico

http://www.youtube.com/watch?v=eVuOTwlMEjU

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Plínio teve um dia de Índio

Até agora, Plínio Arruda Sampaio vinha tendo uma postura digna. Usava sua candidatura para defender suas idéias. Ele e Marina Silva eram candidatos de vida própria.
Em 2006, Heloísa Helena e Cristóvam Buarque, em um ou outro momento, poderiam até ser criticados por beneficiarem indiretamente a candidatura do PSDB. O mesmo não pode ser dito nem de Plínio, nem de Marina.

Mas hoje Plínio pisou na bola. Sobre a ausência de Dilma no debate promovido pela TV católica, o candidato do PSOL fez o seguinte comentário no Twitter:

Dilma não irá ao debate da rede Vida. Logo a candidata menos conhecida. Considera-se eleita e esnoba o eleitorado católico

Nada contra a histórica ligação de Plínio com a Igreja Católica. Não é só porque o cara é de esquerda que ele não pode ser religioso.

Agora, foi surpresa negativa vê-lo imitando Índio da Costa ao fazer demagogia com religião.

O título do Internacional na Libertadores

O mais recente título do Internacional na Taça Libertadores da América não foi o décimo quarto título do Brasil na competição. Foi o décimo quarto título de clube brasileiro.
A Taça Libertadores da América é disputada por clubes, e não por nações.

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Pirataria e desenvolvimento econômico

Texto interessante da Spiegel, sobre a opinião de um historiador alemão a respeito do desenvolvimento econômico de seu país no século XIX. Ele argumenta que a demora do seu país para adotar leis de direitos autorais favoreceu a proliferação de livros, o aumento da parcela de letrados na população, e portanto, a expansão do conhecimento e o desenvolvimento industrial.

No Copyright Law
The Real Reason for Germany's Industrial Expansion?
By Frank Thadeusz


Did Germany experience rapid industrial expansion in the 19th century due to an absence of copyright law? A German historian argues that the massive proliferation of books, and thus knowledge, laid the foundation for the country's industrial might.
The entire country seemed to be obsessed with reading. The sudden passion for books struck even booksellers as strange and in 1836 led literary critic Wolfgang Menzel to declare Germans "a people of poets and thinkers."
"That famous phrase is completely misconstrued," declares economic historian Eckhard Höffner, 44. "It refers not to literary greats such as Goethe and Schiller," he explains, "but to the fact that an incomparable mass of reading material was being produced in Germany."
Höffner has researched that early heyday of printed material in Germany and reached a surprising conclusion -- unlike neighboring England and France, Germany experienced an unparalleled explosion of knowledge in the 19th century.
German authors during this period wrote ceaselessly. Around 14,000 new publications appeared in a single year in 1843. Measured against population numbers at the time, this reaches nearly today's level. And although novels were published as well, the majority of the works were academic papers.
The situation in England was very different. "For the period of the Enlightenment and bourgeois emancipation, we see deplorable progress in Great Britain," Höffner states.


Continua em
http://www.spiegel.de/international/zeitgeist/0,1518,710976,00.html

domingo, 15 de agosto de 2010

Juca Kfouri X Guarani

Comenta Juca Kfouri sobre os erros de arbitragem que beneficiaram o Galo na vitória contra o Bugre.

"O que mudou inteiramente no segundo tempo, quando Galo foi à frente e de tanto martelar fez dois merecidos gols, ambos com Tardelli, ambos com o artilheiro ligeiramente impedido, daqueles difíceis, que o bandeirinha tem autorização para deixar o lance seguir."


Mentira!
http://www.youtube.com/watch?v=1fvKxYwgLw8


Pelas imagens, é possível perceber claramente que a regra "impedimento, na dúvida, não marque" não pode ser aplicada a estes dois lances, porque em nenhum deles havia desculpa para ter alguma dúvida.
No primeiro gol, a distância não era muito pequena, e além disso, o lance não foi tão rápido assim. Em nenhum momento, Tardelli esteve atrás dos marcadores do Guarani. Foi bem diferente do gol impedido de Tevez contra o México, em que os marcadores mexicanos recuaram rapidamente e confundiram o bandeirinha.
No segundo gol do Atlético Mineiro, Tardelli estava só um pouquinho adiantado. Mas em cobrança de falta, era obrigação da bandeira ter prestado atenção na linha de impedimento.


Se o São Paulo tivesse perdido tomando dois gols daquele jeito, era muito provável que Juca Kfouri falasse que o time estava sendo perseguido por ser opositor do Ricardo Teixeira. Por motivo muito menor, o colunista já insinuou isso.
O mesmo ele não falaria do Corinthians. Juca Kfouri tem muitos defeitos, mas a contaminação de suas opiniões por paixão clubística não é um deles. Agora, se o Timão tivesse ganhado algum jogo com gols iguais ao do Galo, Juca Kfouri seria capaz de insinuar que seu time de coração estava sendo favorecido por ser aliado de Ricardo Teixeira.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Aborto, vida, dignidade e perguntas

Sociedades que aceitam o aborto defendem menos a vida humana do que sociedades que não aceitam?

A vida humana tem que ser defendida desde seu suposto início para que não seja banalizada?

Aceitar o aborto de anencefálicos levaria à uma aceitação da violência contra os doentes?

Interessante observar este mapa da Wikipedia sobre a situação legal do aborto no mundo.


Em azul claro estão os países onde o aborto é completamente legal. Em verde claro estão os países onde o aborto é legal em uma ampla variedade de casos. Em preto estão os países onde a legalização varia conforme a região. Em laranja estão os países onde o aborto só é legal em casos de problemas cerebrais, risco pra mulher e estupro. Em vermelho estão os países onde nem mesmo o estupro justifica o aborto. Em azul escuro estão os países onde o aborto é ilegal para qualquer caso.
Em que tipo de país morrem mais crianças através da criminalidade e das guerras civis?
Em que tipo de país morrem mais crianças por doenças ou por falta de cuidados médicos adequados?
Em que tipo de país os deficientes físicos e os enfermos recebem menor atenção?
Que tipo de país nós queremos ser?

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

A lógica de Celso Ming e similares

http://blogs.estadao.com.br/celso-ming/2010/08/02/o-jogo-virou/
Diz Celso Ming na postagem de 2 de agosto de seu blog:

Enquanto a economia dos Estados Unidos cambaleia e levanta apreensões, a economia da locomotiva europeia, a Alemanha, apresenta súbita recuperação para euforia geral.
Depois da prostração que durou mais de um ano, na semana passada a Federação da Indústria Alemã (BDI) publicou seu relatório trimestral em que projeta para 2010 crescimento de 2% e aumento das exportações de 8%.

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O exemplo alemão é foco de grande controvérsia. Ao longo desta crise, o governo da chanceler Angela Merkel rejeitou sumariamente a criação de novos estímulos destinados a tirar a economia do sufoco.
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Mais do que isso, como não conta com moeda própria, o governo alemão não pode aumentar a competitividade do produto nacional por meio de desvalorização cambial, como costumam fazer os governos quando querem empurrar exportações e inibir importações. Para obter efeito equivalente, a decisão foi comprimir salários e aposentadorias para derrubar os custos de produção e aumentar a capacidade de exportar.
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Em poucas palavras: o colunista do Estadão vinculou a melhor recuperação da economia da Alemanha, em comparação com a recuperação da economia dos EUA, à decisão do governo alemão de não recorrer a estímulos fiscais.
Com base nos demais textos que Celso Ming escreve e nos textos que outros colunistas que pensam como ele escrevem, não há maiores dificuldades em adivinhar o que tais colunistas diriam caso fosse a economia dos EUA que tivesse se recuperado melhor. A explicação estaria no mercado de trabalho mais flexível, na carga tributária mais baixa e no welfare state menos generoso.
Aconteça o que acontecer, estará sempre "provado" que políticas econômicas conservadoras funcionam melhor. As explicações para os fatos já estão prontas antes mesmo dos fatos acontecerem. O raciocínio funciona do seguinte modo: se a economia do país A vai melhor que a do país B, seleciona-se as políticas de A que são mais conservadoras que a de B e define-se estas políticas como a causa. Se a economia do país B vai melhor, seleciona-se as políticas de B que são mais conservadoras que as de A e define-se estas como a causa.
Da comparação entre Alemanha e EUA podem ser retiradas outras conclusões, dependendo da orientação ideológica prévia do observador. Como foi possível ver no texto, o desemprego da Alemanha no auge da crise foi de 7% e o dos EUA foi de 10%. Ou seja, o mercado de trabalho da Alemanha, com maior regulação, maior seguro-desemprego e maior taxa de sindicalização, funcionou melhor durante a crise do que o mercado de trabalho dos EUA. E isso tudo era considerado vilão do bom funcionamento dos mercados de trabalho pela ortodoxia que Ming defende. E mais: o mercado de trabalho regulado e a carga tributária mais elevada não estão atrapalhando a competitividade da indústria exportadora alemã.
E por falar em competitividade das exportações, não existe a dicotomia desvalorização nominal X compressão de salários. Ambos são meios para se atingir um único fim: a desvalorização real. Nisto é possível criticar a Alemanha. Desvalorização real serve para país com déficit isolado no balanço de pagamentos ou com recessão isolada. Em um contexto de recessão global, desvalorização real é política de empobrecer a vizinhança.

Durante as últimas duas décadas, foi esporte favorito do jornalismo econômico conservador (quase um pleonasmo) exaltar a superioridade do modelo norte-americano de Estado pequeno em comparação ao modelo europeu continental de economia social de mercado. O seguro-desemprego, os sindicatos, os impostos altos e os gastos sociais supostamente estariam fazendo a Europa ficar para trás. Já foi demonstrado aqui que a superioridade dos EUA neste período nem foi tão marcante assim.
Agora que surgem evidências em contrário ao habitua raciocínio, pesca-se uma ou outra coisinha em que um país europeu continental é mais conservador, e aí a explicação está dada.
Rigor científico é uma coisa grande demais para caber em uma coluninha jornalística.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Isto pode ser definido como hipocrisia

Hoje Juca Kfouri falou isso de Dunga:
"E (Dunga) elogiou o sistema educacional do Zimbábue, porque viu crianças uniformizadas na rua e foi bem tratado pela população que o abordou gentilmente.
Ainda bem que, certamente, Dunga entende muito mais de futebol."

http://blogdojuca.uol.com.br/2010/06/a-selecao-do-dunga/

Mas somente um dia antes, o colunista cometeu o mesmo equívoco que foi motivo de críticas ao treinador da seleção brasileira:
"Ah! Em tempo: a África do Sul está quatro anos à frente do Brasil em termos de Copa do Mundo.
O aeroporto de Johanesburgo dá de 10 a 0 em Guarulhos e de 15 no Galeão, com a vantagem adicional de não ter favelas no caminho para o centro, nem balas perdidas.
E o asfalto? Olha, o asfalto é de dar inveja a qualquer prefeito brasileiro."

http://blogdojuca.uol.com.br/2010/06/o-passeio-no-zimbabue/

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Seria a camisa da seleção canarinho uma homenagem à Casa de Habsburgo?

Até 1950, a seleção brasileira jogava de camisa branca. Depois disso, adotou a camisa amarela. A idéia era que o uniforme tivesse cores da bandeira nacional.
A bandeira brasileira atual data da Proclamação da República, em 1889. Houve apenas algumas adições de estrelas, por causa da adição do número de estados.
A bandeira adotada pela República não é muito diferente da que vigia durante o Império. Aquela, ao invés do círculo azul, tinha o brasão imperial.
A bandeira imperial foi adotada desde a Independência, em 1822. Foi desenhada pelo artista francês Jean-Baptiste Debret, sob encomenda de D. Pedro I. Não houve explicação oficial para a adoção do retângulo verde e do losango amarelo. Mas acredita-se que o verde foi escolhido por ser a cor da Casa de Bragança, de onde veio D. Pedro I, e o amarelo foi escolhido por ser a cor da Casa de Habsburgo, de onde veio D. Leopoldina. http://pt.wikipedia.org/wiki/Bandeira_do_brasil
Bom, e na hora de escolher a cor da camisa da seleção, optou-se (muito provavelmente sem intenção) pela cor da família da imperatriz. Ou uma, ou outra família seria homenageada. O acaso, ou o gosto estético, definiu a escolha da cor dos Habsburgos.
A Áustria não disputará a Copa do Mundo de 2010. Mas os austríacos não ficarão muito órfãos. Têm para quem torcer.

domingo, 30 de maio de 2010

Jabá no meio da reportagem

Por que alguém, ao reportar um trágico acontecimento, "anunciaria" a faca usada no crime e o hipermercado onde o crime ocorreu? Teria sido algum erro na hora de copiar e colar?

Da Folha Online
Homem que esfaqueou três em mercado de SP foi contido meia hora após ataque
"Quem quer morrer?", dizia o auxiliar de pedreiro que matou uma pessoa e feriu duas com uma faca de churrasco anteontem à noite num
hipermercado de Guarulhos, na Grande São Paulo.
José Marcelo de Araújo, 27, percorreu quase todas as seções do Extra, no centro, ameaçando as pessoas. Empunhava uma faca de churrasco, que furtou no próprio local (Tramontina, modelo Ultracorte, pacote com quatro tamanhos: R$ 53,90).
Era dia de promoção --a Quarta Extra (até 30% de desconto em frutas e legumes). A loja estava cheia.
A primeira vítima foi o comerciante chinês
Ding Yu Chi, 60, esfaqueado próximo à banca de tomates, ao lado da mulher. Sem motivo aparente, Araújo deu-lhe duas facadas na barriga. Afastou-se e voltou a esfaqueá-lo. Ao todo, desferiu oito golpes.
...
http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/742147-homem-que-esfaqueou-tres-em-mercado-de-sp-foi-contido-meia-hora-apos-ataque.shtml

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Padrão de distribuição geográfica do voto: o Brasil virou EUA e os EUA viraram Brasil

Em uma eleição realizada em países de dimensões continentais, com território heterogêneo em termos de economia, sociedade e cultura, como seriam os resultados por região? Existiria a tendência das partes mais ricas de um país optarem por candidatos progressistas e as partes mais pobres optarem por candidatos conservadores? Ou a tendência seria a oposta?
Observando dois países gigantes, como o Brasil e os Estados Unidos, é possível dizer que a polarização política regional não segue um padrão imutável no tempo. Há tendências que podem ser invertidas.
No Brasil, o voto nos estados mais pobres foi mais conservador do que nos estados mais ricos por um longo período, que durou de 1945 a 2000. UDN, Arena e PFL tinham mais força nos estados das regiões Norte e no Nordeste, enquanto que PTB, MDB e PT tinham mais força nos estados das regiões Sul e no Sudeste. Em 2002, não houve polarização regional. Lula ganhou de lavada em todas as regiões do Brasil. Nas eleições municipais de 2004, teve início a tendência do PT e do PSB serem partidos mais fortes no Norte e no Nordeste. Esta tendência foi acentuada na eleição presidencial de 2006. Uma tendência, porém, persistiu: São Paulo como um estado que pende para a direita e o Rio de Janeiro como um estado que pende para a esquerda.
Nos Estados Unidos, o voto nos estados mais ricos foi mais conservador do início do século XX até o final dos anos 70. O Partido Republicano tinha muita força em estados ricos, como Maine, New Hampshire, Connecticuit e Vermont no Nordeste, e a Califórnia no Oeste. O Partido Democrata tinha muita força em estados mais pobres, como os do Sul. Os candidatos locais eleitos pelos sulistas não eram nem um pouco esquerdistas, pois o Partido Democrata era o preferido dos segregacionistas. Mas os sulistas, com exceção de 1964, 1968 e 1972, votavam nos candidatos presidenciais democratas, como Roosevelt, Truman, Kennedy e Carter, assim como eleitores progressistas do Norte. Nos anos 80, não foi possível enxergar polarização geográfica do voto porque os republicanos levaram as eleições presidenciais de lavada. A partir de 1992, o mapa eleitoral dos EUA começou a ser redesenhado. O Nordeste, invertendo a situação anterior, tornou-se uma fortaleza democrata, enquanto que o Sul, também invertendo a situação anterior, tornou-se uma fortaleza republicana. Apesar de algumas inversões, algumas tendências persistiram. Nova York, Massachussets e o DC sempre foram e continuaram sendo democratas, e o Oeste interiorano sempre foi e continou sendo republicano.
Em resumo, o padrão de distribuição geográfica do voto no Brasil em tempos presentes é o mesmo que o dos EUA em tempos passados e vice-versa.
Os mapas a seguir, com os resultados das eleições presidenciais brasileiras de 1989 e 2006, e os resultados das eleições presidenciais norte-americanas de 1976 e 2008, mostram bem as tendências descritas.

Vencedor da eleição presidencial no Brasil de 1989 por estado


Vencedor da eleição presidencial no Brasil de 2006 por estado

Fonte: Ipeadata

Vencedor da eleição presidencial nos EUA de 1976 por estado


Vencedor da eleição presidencial nos EUA de 2008 por estado

Fonte: Wikipedia


É possível ver nos mapas grandes inversões nos dois países. Vejamos o Brasil primeiro. O único estado que prefeririu Lula em 1989 e Alckmin em 2006 foi o Rio Grande do Sul, que é um dos estados brasileiros com maior qualidade de vida. Em Santa Catarina, Lula quase ganhou em 1989, e em 2006, Alckmin ganhou com um pouco mais de folga. Já a Região Norte, foi inteira de Collor em 1989 e quase inteira de Lula em 2006.
Nos Estados Unidos, também houve mudanças marcantes. Muitos estados vermelhos viraram azuis e muitos estados azuis viraram vermelhos. Em 1976, Jimmy Carter levou o Sul (o da Confederação) quase inteiro, só faltou a Virgínia. Grande parte do Nordeste optou por Gerald Ford. Em 2008, Obama perdeu em quase todo o Sul. Ganhou apenas, justamente na Virgínia, e também na Carolina do Norte e na Flórida. O Nordeste foi todo para Obama. Dois estados enormes, como o Texas e a Califórnia, inverteram os lados.
Qual seria a explicação mais plausível para esta instabilidade de polarização política por regiões em grandes países? Podem ser os temas de campanha.
Quando o que divide os eleitores são temas econômicos, como o tamanho do Estado, o total de gastos em programas sociais e o papel do Estado em redistribuir renda, a poliarização por classe social costuma ser mais acentuada. Os ricos tendem para a direita e os pobres tendem para a esquerda. Como nos estados mais ricos há mais pessoas ricas e nos estados mais pobres há mais pessoas pobres, a polarização de classes se transforma em polarização regional, e portanto, o voto em regiões ricas pende para a direita e o voto em regiões pobres tende para a esquerda.
Quando temas culturais como religião, homossexualidade, aborto, educação e criminalidade tornam-se importantes para a definição do voto, a polarização de classe é suavizada. Candidatos com visões progressistas sobre estes temas tendem a atrair o voto de parcela da população mais letrada da classe média alta. Candidatos com visões conservadoras sobre estes temas têm penetração em parcela importante da classe média baixa e da população pobre das áreas rurais. Estados mais ricos, com cidades maiores, população mais urbana e maior influência de universidades tendem a serem mais progressistas do que estados mais pobres, com grande parcela de população vivendo em zona rural ou em cidades pequenas. Apesar disso, a polarização de classe neste caso não é completamente eliminada. Os candidatos esquerdistas são os preferidos dos mais pobres que vivem em estados mais ricos.
E o que esta análise serve para prever o futuro político no Brasil?
Muito provavelmente, a polarização regional da eleição presidencial de 2010 será a mesma que aconteceu na de 2006. Serra será preferido no Sul, em São Paulo e talvez no Centro-Oeste, e Dilma será preferida no restante no Brasil. Pelo que as pesquisas atuais indicam, porém, a polarização será mais suavizada.
Nos próximos anos, com a população do Brasil cada vez menos pobre, e com cada vez mais gente entrando na classe média, temas culturais podem ter importância crescente, em detrimento de temas econômicos. Neste caso, o mapa eleitoral no Brasil pode ser novamente redesenhado, e não sabemos como será o novo desenho.

Observação: agradeço aos comentadores do blog do Luís Nassif por alertarem que o mapa de 1989 estava errado. O erro foi corrigido.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Apesar do que os cricríticos dizem, o Robin Hood de Ridley Scott é um excelente entretenimento

O filme Robin Hood de Ridley Scott, atuado por Russel Crowe, recebeu apenas 44% de avaliações positivas no Rotten Tomatoes.
Os críticos muitas vezes focam-se muito em aspectos técnicos e não se colocam no lugar da platéia que quer simplesmente diversão.
O filme tem tudo que se espera de um épico: cenas realistas de batalhas medievais, muita ação, belos cenários, Cate Blanchett etc. Se o roteiro seguiu uma fórmula pré-pronta, isto não se constitui em um defeito. Fórmulas que habitualmente dão certo, se dão certo, é porque têm seus méritos.
Robin Hood não superou Gladiador, mas manteve muitas qualidades deste. Russel Crowe de Robin Hood estava um Maximus dez anos envelhecido. Deu certo.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

A purgante manada anti-Dunga

Eu acho que Neymar e Ganso deveriam estar no grupo dos 23, como reservas, porque poderiam servir mais do que Grafite (bom, mas nem tanto) e um dos oito meias.
Mas esse mimimi anti-Dunga está purgante. Fora essas duas decisões (e a de levar Gomes, e não Vitor), o trabalho do anão silencioso está correto. Formou um grupo, se impôs evitar que vaidades individuais atrapalhem, como ocorreu em 2006. Deixar Adriano e Ronaldinho Gaúcho de fora contribuiu para evitar maiores problemas. Além do mais, estes dois nem vinham jogando tudo isso.
Piores do que os que clamavam por Ronaldinho Gaúcho foram os que clamavam por ..., ... Roberto Carlos. Defendo que Roberto Carlos viaje com a seleção só se for para cantar.
Às vezes, virar as costas para a imprensa e para a opinião pública dá certo. Basta comparar o Parreira de 1994 com o de 2006. O Parreira I ignorou os clamores por Edmundo, Edílson, Rivaldo, Marcelinho e outros, fez um time com uma estrela - o Baixinho - e muitos esforçados - Zinho, por exemplo - e soltamos o grito de campeão depois de 24 anos. O Parreira II deixou a imprensa escalar todo o time e deu no que deu.

Os "corneta" dizem que esse time de Dunga é ruim. A afirmação é verdadeira ou falsa? Nem uma coisa nem outra. Uma afirmação é verdadeira quando pode ser provada que é falsa mas não é. A afirmação de que esse time é ruim nunca pode ser provada que é falsa. A prova da falsidade seria a conquista da taça. Mas os "corneta" já avisaram de antemão que mesmo se for campeão, esse time é ruim. Ou seja, já eliminaram de antemão a possibilidade de qualquer julgamento objetivo de sua afirmação. Se eliminam esta possibilidade, como fazer nos convencer de que estão certos?

Apesar de defender a comissão técnica em muitas decisões, eu faço uma crítica: Dunga e Jorginho deveriam ser mais bem educados para tratar com a imprensa.

domingo, 9 de maio de 2010

Porque o sistema eleitoral alemão é melhor que o britânico

O Reino Unido tem um sistema eleitoral distrital puro. O país é dividido em distritos com quantidade razoavelmente igual de eleitores, distritos que podem abarcar vários bairros de uma cidade grande ou várias cidades pequenas, e cada distrito elege seu deputado por votação majoritária.
A Alemanha tem um sistema eleitoral distrital misto, tanto para a câmara federal, quanto para as câmaras estaduais. Existe a divisão de distritos semelhante à do Reino Unido. Mas na Alemanha, cada eleitor dá dois votos: um voto nominal para eleger o representante de seu distrito, um voto em legenda. Os votos não precisam ser do mesmo partido. A proporção de representação dos partidos na casa legislativa é determinada pelo voto na legenda (partidos com menos de 5% são excluídos). Definidas quantas cadeiras cada partido terá, estas cadeiras são preenchidas primeiro pelos eleitos em eleição majoritária nos distritos. Depois de todos estes ocuparem as cadeiras, o restante é preenchido pelas listas fornecidas pelos partidos.

As vantagens do sistema misto são as seguintes:
> Direito à representação para os pequenos partidos, que representam posições políticas minoritárias. Na Alemanha, há seis partidos no Bundestag. Os verdes, por exemplo, que representam 10% dos eleitores, teriam apenas 2 das 600 cadeiras se a eleição fosse feita pelo sistema distrital puro. Os liberal democratas, que representam mais de 10% dos eleitores, não teriam direito à representação. No Reino Unido, há pequenos partidos somente porque norte-irlandeses, galeses e escoceses votam em partidos diferentes. Na Inglaterra, apenas três partidos foram eleitos.
> Parlamento melhor representando a divisão partidária dos eleitores. No Reino Unido, os liberal democratas tiveram mais de 20% dos votos e menos de 10% das cadeiras porque eles "quase" ganharam em muitos distritos, mas o "quase", para eleições majoritárias não conta. Na Alemanha, os liberal democratas tiveram 15% dos votos, e portanto, 15% das cadeiras. No sistema distrital puro, pequenas diferenças de votos nas urnas são amplificadas na hora de compor o parlamento. Em 2005, no Reino Unido, os trabalhistas tiveram um pouquinho a mais de votos que os conservadores, e muito mais cadeiras.
> Não necessidade de dar voto útil. No sistema distrital puro, os pequenos partidos são atrofiados não somente porque não conseguem maioria nos distritos, como também, alguns de seus simpatizantes acabam votando em um dos partidos grandes, pensando na escolha do "menos pior".

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso chegou a dizer que para ser implantado no Brasil, o sistema distrital puro seria melhor porque os eleitores teriam dificuldades de entender o distrital misto. Na prática, isto causaria pouquíssimos problemas, uma vez que o atual sistema brasileiro de voto proporcional de lista aberta é de compreensão ainda mais complicada. Provavelmente FHC sabe que em uma eleição com voto em legenda, o PSDB teria desempenho pífio.